Não era pra ser assim... escrita por Madreamer


Capítulo 13
Mudanças drásticas




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            Acordei desnorteado. Minha cabeça doía como se tivesse recebido uma pancada. Meu campo de vista não passava de uma escuridão sem fim. Meu peito começou a doer em angústia e um grito se formou em minha garganta. Levantei-me num pulo, mas o grito não passou de um muxoxo.

            — Marco? — ouvi uma voz me chamar. Ela me soava familiar, porém, não consegui identificá-la imediatamente — Marco, você tá bem?

            — Jean? — sussurrei. — Cadê você?

            — Como assim? Estou bem ao seu lado — segurou minha mão e pressionou-a levemente.

            Eu recuei e afastei minha mão de seu agarro.

            — Tá tudo bem? — perguntou preocupado.

            — Eu... Eu não sei... Por que eu não consigo te ver?

            Jean segurou a respiração.

            — Você não tá me vendo? — sua voz trêmula me fez ter vontade de abraçá-lo e dizer que tudo ficaria bem, mas eu não sabia onde ele estava.

            — O que aconteceu? — questionei sem ter certeza de que realmente queria saber a resposta.

            Jean suspirou pesado e começou: — Era seu aniversário de vinte e quatro anos. As crianças estavam com Marina e você trabalhou comigo no restaurante. Antes de fecharmos a loja, pedi pra você comprar uns ingredientes no mercado lá perto e ia te fazer uma surpresa quando você voltasse.

            Ele respirou fundo e deu uma pequena pausa antes de continuar.

            — Um ladrão apareceu no restaurante e você chegou logo depois. O cara se assustou, te empurrou e saiu correndo. Você caiu, bateu a cabeça e desmaiou. A médica falou que você pode ter tido uma concussão.

            — Eu vou poder enxergar?

            — Eu não sei. Você só acordou agora. A médica só te examinou quando você estava inconsciente. Eu vou chamá-la. Você vai ficar bem sozinho?

            Balancei a cabeça afirmativamente apesar de querer gritar "não".

            Ele voltou pouco depois e uma voz feminina começou a me fazer perguntas. Jean segurou minha mão durante todo o processo e eu não o rejeitei dessa vez.

            A médica deu o veredito: eu tive uma concussão, mas ela não pôde dizer nada conclusivo sobre minha visão.

            — Você tá bem? — Jean perguntou quando ficamos a sós.

            Sentei-me e abracei minhas pernas. Escondi minha cabeça entre elas e chorei.

            — Marco?

            — Me deixa sozinho! — minha voz saiu mais fria do que eu esperava.

            Ouvi passos distanciarem-se lentamente e uma porta abrir e fechar logo em seguida.

            Entreguei-me ao pranto.

            Aproximadamente dez minutos depois, ouvi crianças correndo. A porta se abriu e elas pularam em cima de mim.

            — Papai! — gritaram ao mesmo tempo.

            — Sentimos sua falta — Petra falou.

            — E a vovó não deixou a gente te visitar antes — acrescentou Samuel.

            Voltei a chorar. O fato de que eu provavelmente não veria meus filhos crescerem me entristeceu, mas o fato de que eles sempre estariam comigo melhorou meu humor.

            Abracei-os e disse-lhes inúmeras vezes que os amava. As lágrimas logo tornaram a manchar minha face. Lágrimas de felicidade.

            Ouvi passos novamente e, dessa vez, minha mãe se manifestou:

            — Tudo bem, crianças. Agora é minha vez.

         As crianças beijaram minha bochecha e desceram da cama. Senti minha mãe tocar minha mão e, logo em seguida, ela me abraçou.

         — Fiquei tão preocupada! — disse por fim. — Você tá bem? — perguntou ao segurar meu rosto entre suas mãos e secar minhas lágrimas.

         Neguei com a cabeça e escondi meu rosto em seu peito. Envolvi seu corpo com meus braços e puxei-a para perto de mim.

         — Eu tô com medo — choraminguei.

         — Eu sei, filho. Eu sei — ela me abraçou mais forte e acariciou meus cabelos. Ouvi-a soluçando pouco depois.

         Ficamos embalados por alguns minutos, até que Jean pediu que ficássemos a sós.

         — Eu posso... Segurar sua mão? — perguntou.

         Assenti e estendi minha mão: — Desculpe por aquilo. Eu só... Precisava de alguns minutos sozinho.

         Ele pegou minha mão e depositou um beijo nela. Ficamos em silêncio.

         — Eu tô com saudade do seu rosto — falei por fim.

         Jean segurou ambas minhas mãos e levou-as ao seu rosto. Percorri sua face com meus dedos lentamente, demorando-me em seus lábios. Apreciei cada centímetro dele e beijei-lhe a bochecha antes de desabar em seu peito e entregar-me ao pranto.

         Jean repousou uma mão em minha cabeça e acariciou meus cabelos. Seus braços logo me cercaram e ele me pressionou contra si.

         — Amor, vamos dar um jeito — sussurrou em meu ouvido.

         Balancei a cabeça afirmativamente e aninhei-me em seu peito.

         Jean se desvencilhou do abraço pouco depois e secou meu rosto com os polegares.

         — Te amo — falou.

         — Também te amo — solucei. — E você continua com a mesma cara de cavalo da qual me lembro — disso com um sorriso soturno.

***

        Gostaria de dizer que os primeiros dias foram os mais difíceis, mas seria mentira. As primeiras semanas foram as mais difíceis. Eu levantava tarde, não me alimentava direito. E então eu me lembrava de minha família e começava a me esforçar um pouco mais, mas não o suficiente.

        Além de abandonar o desenho, eu não podia ver meus filhos sorrirem, nem os olhos de Jean brilharem. Eu aprendi a valorizar essas pequenas coisas quando já era tarde.

        Minha mãe ficou conosco por um tempo. Eu e Jean tínhamos saído de sua casa há alguns anos, mas não morávamos muito longe dela. Ainda assim, ela insistiu em dormir na nossa casa por uns dias para ter certeza de que eu ficaria bem.

        O incidente havia ocorrido há mais ou menos um mês. As crianças já estavam na escola e eu ainda não tinha saído do quarto naquele dia. Ouvi Jean se aproximar. Ele arrastou uma cadeira e colocou-a ao lado da cama. Sentou-se e segurou minha mão.

        — Marco, eu tô preocupado com você. Você quase não sai do quarto, não come direito. Você emagreceu. Seus ossos estão tão visíveis que me dói olhar pra você. Eu sei que esses últimos dias têm sido difíceis, não só pra você, mas pra nós também. Faz um mês que eu não vejo seu sorriso, meu amor.

         Fiquei em silêncio. Passei minhas mãos por meu corpo e senti meus ossos facilmente. Ele tinha razão. 

         — Lembra-se do ano no qual nos conhecemos? Eu ganhei uma competição de piscar, lembra? E o perdedor teria que fazer o que o ganhador pedisse, certo? Aqui vai meu pedido: se esforça. Eu cansei de te ver desse jeito e, se você continuar assim... Não vai ter mais Marco pra eu amar. Se esforça um pouquinho. Por nós, por nossos filhos, por Marina. Por favor. Eu não quero te perder. Nós não queremos te perder.

         Fechei os olhos e respirei fundo. As lágrimas caíram antes que eu percebesse.

         — Me desculpe... Eu não sabia que... Eu não queria preocupar vocês...

         — Shhh. Tá tudo bem, meu amor — disse ao me abraçar. — Joy! — ouvi o cachorro se aproximar assim que seu nome foi mencionado. Ele subiu na cama e esfregou sua cabeça em minha mão, pedindo carinho. — Alegria, lembra? Esse foi o nome que você deu pra ele há sete anos. E eu sei que tem sido difícil ficar alegre nas últimas semanas, mas nós estamos juntos nessa, tá bom? Somos uma família. Você não precisa lutar suas batalhas sozinho, ok?

         Afastei-me dele e sequei minhas lágrimas. Assenti.

         — Obrigado, amor. Eu não sei o que faria se você não estivesse comigo.

         — E nem precisa saber, já que isso nunca vai acontecer. Eu prometo. Você nunca estará sozinho.

         Jean segurou meu rosto entre suas mãos e beijou minha testa. Peguei uma de suas mãos e acariciei-a.

         — Te amo, Jean.

         — Também te amo.


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Notas finais do capítulo

* "Joy" significa "alegria" em Inglês.
Sei que foi um salto muito grande - 7 anos -, mas achei melhor pulá-los a ficar "enchendo linguiça".
Estamos chegando ao fim da estória. Gostariam de ver alguma cena específica? Eu posso encaixá-la na fic, se possível. ;)
*Outras estórias minhas: https://mds-scribbles.tumblr.com/



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