Apenas uma garota... escrita por Luana Nascimento


Capítulo 22
Elizabeth - Interlúdio


Notas iniciais do capítulo

Olá, people!
Siiiim, esse capítulo tem o ponto de vista de Elizabeth e está curtinho, mas está bom. Ele teve a intenção de ser curto assim mesmo.
Os versos que aparecem no capítulo são da música Fool's Gold, de Passenger.
Link: https://www.youtube.com/watch?v=88yaczyz-Ro
Espero que gostem :D



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/626534/chapter/22

Espero que não se surpreendam comigo aparecendo nessa história; de fantasma, só tenho a denominação errônea. Acho que o apelido que Shelly me deu caiu bem: Gaspar. Gasparzinho era amistoso e não queria assustar ninguém, então considerem-me no mesmo calibre. Os fatos que irei narrar aqui aconteceram nas duas horas em que Shelly deu o seu cochilo na carreta.

Sabe, estar morta tem suas vantagens, me tornei uma observadora. As pessoas têm suas particularidades bem definidas, porém algumas precisam de uma espécie de beliscão para fazer coisas surpreendentes. Isso aconteceu na madrugada do dia 11 de outubro de 2003.

Sim, diferente de Shelly, gosto de datas definidas. Uma semana é algo tão vago e sem sentido. Assim como um dia. Em um dia qualquer, você pode ter comido um prato especial, ido ao parque ou até morrido, mas são datas muito marcantes para dizer que foi apenas um dia qualquer. Se as pessoas soubessem o valor da vida, lembrar-se-iam de cada coisa que fizeram e o dia em que elas fizeram, incluindo a hora. Ou não, seus cérebros não comportariam tanta informação.

Onde eu estava?

Ah, claro. Deixem-me começar.

Eve McCarthy entrou no quarto de Ben sem sua costumeira postura autoritária e firme, parecendo saída de uma briga. Os cabelos pretos estavam frisados e bagunçados, as roupas em desalinho. O porquê de ela estar assim? Ela quis. Assim que chegara em casa, sacudira o cabelo, tirara o seu blaser, jogara os saltos na sala de qualquer jeito.

Mrs. McCarthy havia ido ao hospital logo após depôr contra seu colega de trabalho, afinal, precisavam ver se ela não havia se machucado depois de quase ser enforcada. Depois de averiguarem que ela estava bem, a mulher pensou nas palavras de Shelly: "Se essa fosse a sua última escolha, você a manteria?"

— Não, Miss Revenry — ela sussurrou para si. — Agora eu sei a resposta.

Given up on treasure chests that wash upon the shore

'Cause fool's gold never seems to keep its shine

Eve entrou no quarto onde Ben estava, parecendo perdida e confusa. Acompanhar seus pensamentos era simples. Ela sentia-se arrependida de ter ido à reunião, pensando na chance quase perdida de se reconciliar com seu filho.

Caminhou lentamente até o leito, onde Ben dormia devido aos medicamentos. Sua alma vagueava por onde havia fotografado, estando longe do seu corpo. Eve acariciou seus cabelos, como não fazia havia onze anos. Por que deixei de fazer isso, a mulher se perguntou com lágrimas nos olhos, gostando de acariciar sua cabeça com cabelos lisos, negros e grandes, quase como o seu próprio corte chanel, porém maior, mais desfiado e masculino.

— Olá, Benners. — Eve sussurrou, ainda no mesmo movimento de acariciar a cabeça do filho.

Vi uma possível missão ali. Corri até Ben, que estava vendo a Golden Gate, o segurei pela mão e em segundos voltamos ao quarto. Eu me escondi, pois eles precisavam se entender, já que Shelly se propôs a salvar Eve. Ben pareceu confuso, mas parou ao escutar sua mãe falando:

— Saudades de quando eu podia te pegar no colo e fazer isso até você dormir. De quando te ensinei código Morse. Quando foi que as coisas mudaram, Ben? — as palavras escapavam livremente pelos seus lábios finos e lívidos. — Provavelmente quando minha irmã morreu. Foi tão dolorido, éramos tão unidas, fiquei tão amarga. Sinto muito se o que fiz te magoou. Eu queria tanto que você me ouvisse e acabei me distanciando. Hoje, eu não sei o que fazer para ter você de volta. Queria saber o que fazer, queria te entender. — Eve parou de falar, as lágrimas rolando pelo rosto, os olhos vermelhos. — Farei algo que você não vai gostar nada, mas que talvez me ajude. Fique bem, meu filho.

Devo dizer que eu me surpreendi com a última colocação de Eve. Fazia anos que ela só o chamava pelo nome. Ben observou ela partir, mas julgando aquela cena surreal demais, despertou desorientado, no momento em que seu pai voltara ao quarto. Sentiu o cheiro da sua mãe e indagou:

— Eve estava aqui?

— Sua mãe teve um fim de dia difícil e passou por aqui para saber como você estava, mas já foi. — William não quis deixar o filho nervoso, por isso ocultou a sua quase morte. — Volte a dormir.

Ben apenas deu de ombros, acomodando-se melhor no leito.

I always seem to lose whatever I find

Yeah, I always seem to leave it all behind

Voltando a Eve no quarto de Ben, ela entrou, observando a decoração paradoxal do local. Viu os pôsteres, o som, a TV, o videogame, a cama desarrumada, o cheiro forte e agradável do perfume de Ben, o balde de roupas sujas. Porém, nada disso continuou a interessá-la depois que ela viu o grande mural de fotografias. As imagens impressas pela Polaroid estavam lá, mostrando toda a visão de mundo de Ben.

O interessante de se estar morta é que comecei a enxergar o quanto as pessoas gritam sua visão de mundo de alguma forma, não importa qual seja: fotos, desenhos, cálculos, ações, letras, movimentos, posturas, tecnologias, fisionomias, suspiros. Elas não deixam de mostrar como enxergam o que vivem, os fatos que ocorrem com outrem, a natureza, outras pessoas. E o mural de Benners McCarthy era o seu berro gutural e claro sobre como ele achava que as coisas eram.

Idosos sentados e abraçados em um pôr-do-sol, crianças correndo e brincando, um ladrão indo preso, um navio saindo do porto, um parede grafitada com um cara de dreadlocks, Melinda e seu ritual indígena... Eve ficou em pé, distraída, por um bom tempo contemplando as fotografias do filho, como se estivesse prestigiando, em um museu, os feitos de um artista.

Três fotografias no topo do mural chamaram-lhe a atenção e lhe emocionaram: uma mãe abraçando o filho pequeno, uma família desconhecida reunida e a ponte Golden Gate em um dia nublado, as torres vermelhas prevalecendo, a ponte pênsil fazendo o seu trabalho de ligar um ponto a outro. Era como se ele dissesse: o que eu mais sinto falta.

Existe um conceito oriental chamado solo sagrado, onde você não usa sapatos, chinelos ou derivados nos pés, pois ali você pode se conectar com o espiritual, o sagrado e a sabedoria, além de ser uma forma de demonstrar grande respeito. Acredito que Eve buscou e encontrou esse conceito de uma forma diferente naquele dia.

Give me golden afternoons in May

Give me silver moons that light my way

And I won't ask for fool's gold anymore


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E aí, o que acharam? Fofinho? De boas? Sentimental?
Críticas, comentários, sugestões, desabafos, teorias da conspiração e loucuras abaixo vvvvvvvvvvvvvv
Até logo o/



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Apenas uma garota..." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.