Apenas uma garota... escrita por Luana Nascimento


Capítulo 2
Capítulo 2 - O garoto novo: 1ª parte


Notas iniciais do capítulo

Saindo da monotonia da sua vida, aparece um novo garoto na escola em que Shelly estuda, que tem algo em comum com a menininha dos cabelos dourados.
Espero que gostem.



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Acordei com o barulho do despertador: 06:10 a.m. Ouvi minha mãe gritar:

— Shelly, levante-se ou você vai se atrasar!

Rolei no chão, sem um pingo de coragem.

— Eu tenho mesmo que ir à escola? — indaguei com a voz mais pastosa do que a de um bêbado.

— Se você quiser aprender alguma coisa e ser alguém na vida... — ela argumentou no seu habitual tom energético.

Levantei-me com relutância do chão, desliguei o despertador, guardei meus desenhos. Depois, me dirigi até o banheiro e olhei para o meu rosto. Meus olhos estavam com menos olheiras. Que sucesso. Enfim, escovei meus dentes, me enfiei embaixo do chuveiro, tomei um banho rápido. Depois, saí, vesti a combinação de jeans, tênis e blusa, coloquei corretivo, pois as olheiras não haviam sumido, e desci as escadas. Quando cheguei à cozinha, minha mãe falou:

— Viu? Valeu a pena dormir mais um pouco.

Se ela souber que passei corretivo...

— É, foi legal. — respondi evasiva num meio sorriso.

— Fiz panqueca salgada. — ela disse num sorriso fraternal.

Minha mãe realmente era bonita, cara. Eu tinha herdado os meus olhos verdes e o meu sorriso dela. Seus cabelos ruivos reluziam no sol e, embora tivesse uma ruga aqui e outra ali, era incrivelmente bem conservada. Alguns diriam que sua perfeição era quebrada pela enorme cicatriz de queimadura do cano de escape de uma moto que ela ganhara quando adolescente em sua perna direita. Eu não me importava. Só me importava com o nariz grande, que eu também herdara dela.

Nem tudo é perfeito, certo?

— Hum, que delícia! — exclamei ao morder a panqueca.

Ok, posso ser uma louca que tem sonhos/pesadelos premonitórios, mas eu gosto de comer. Provavelmente, o motivo é a falta de sono que dá muita fome. Tomei meu café em silêncio. Quando acabei, peguei meus livros, me despedi da minha mãe e saí para esperar o ônibus escolar.

Acho que devo descrever minha casa: um primeiro andar creme, a janela do quarto extra aparecendo ao lado do meu quarto (embora minha janela seja lateral, não frontal), a porta branca, um tapetinho de boas-vindas, uma árvore à direta cheia de galhos cujo nome me é desconhecido. Por dentro, assim que você entra, tem um sofá, duas poltronas (uma de cada lado do sofá pequeno), uma TV de 21 polegadas em uma pequena estante à sua esquerda. À direita, há a escadaria.

Logo adiante e um pouco na diagonal para a esquerda, tinha uma mesa redonda com quatro cadeiras. Pequena, até. Mais à frente, havia uma entrada para a cozinha. Após a cozinha, há uma pequena e estreita área de serviço e depois a porta dos fundos com o batente. Do lado da escada, há uma porta que deveria ser uma garagem, mas que estava cheia de tralhas.

Subindo a escadaria, que é levemente inclinada à esquerda quando vai subindo, há um corredor na mesma direção. Há de frente lá no final um amplo banheiro. Na direita, o quarto da minha mãe e seu closet. No da esquerda, o quarto reserva, que é uma suíte, e o meu quarto, que também é uma suíte, com uma diferença: o meu quarto ficava à direita da escadaria e o reserva, à esquerda.

Peguei o ônibus, conversei com algumas pessoas e logo eu estava na escola. Cheguei à minha sala e me sentei na minha carteira habitual: canto da parede, primeira da fila.

Ah, rápido esclarecimento: eu fazia o 2th grade.

Fiquei olhando alguns alunos quietos com cara de zumbi até que chegou um garoto novo na sala. Os cabelos loiros, sorriso tímido e simpático, nariz afilado. Quando olhei para os olhos do garoto, quase sofri uma síncope. Os olhos eram da mesma cor e formato que o da menininha do meu sonho. Azuis meio cinzentos. Desviei o olhar e respirei fundo. O garoto aproximou-se de mim e perguntou com sotaque americano:

— Está tudo bem?

Ok, Shelly, autocontrole é tudo.

— Sim, não se preocupe. — respondi à pergunta fazendo a minha voz ficar extremamente calma e natural.

— Você ficou meio pálida...

Ri, procurando não demonstrar meu nervosismo. E com sucesso.

— Eu sou pálida. Ah, você é novo por aqui.

— Ah, que distração a minha. — Ele parecia alguém com quem seria bom conversar e relaxar em algum parque. — Meu nome é Jaden, sou transferido, vim da Califórnia. — ele apresentou-se estendendo a sua mão num sorriso de dentes bem distribuídos.

— Meu nome é Shelly e eu vivo aqui desde que me entendo por gente. — Apertei a mão estendida e procurei sorrir da melhor forma que pude.

— Nome diferente. Sua mãe tem criatividade.

A professora de francês chegou toda contente, como sempre.

Bon jour, meus amores! — ela cumprimentou animada com sua voz irritante.

Eu olhei para a turma. Como ela desejava bom dia para uma turma de alunos com cara de mortos vivos com aquele tom de voz?

— Antes de começar a aula, quero lhes apresentar nosso novo aluno, Jaden Pendlebury.

Jaden olhou para todos, parecendo querer engolir a vergonha, e acenou.

— Oi.

— Jaden, querido, já tem algum lugar para sentar-se? — a professora perguntou em sua voz finíssima.

— Para falar a verdade, eu cheguei agora. — ele respondeu num sorrisinho sem graça, provavelmente rindo da voz da criatura que estava diante dele.

— Ótimo! Fique aí com Shelly! Ela é uma excelente aluna, você vai ser muito bem influenciado. — ela disse entrelaçando os dedos.

Sorri meneando a cabeça.

— Então, alunos, vamos continuar com a conjugação verbal de ontem.

A professora continuou a falar e Jaden indagou com sorriso irônico enquanto sentava-se:

— Excelente aluna?

— Dizem que alunos são excelentes em babar professores. Com ela é o contrário.

Jaden abafou o riso com uma mão. Depois, ele se focou na aula e eu, sabendo do assunto em peso, peguei o meu caderno e o abri na última folha. Comecei a me lembrar de um dos sonhos que tive e que não desenhei. No começo, tudo não passava de rabiscos até que tudo foi tomando forma.

No final do segundo horário da aula de francês, acabei o desenho. Era a imagem de um menino de, no máximo, dois anos, numa rua escura, cheia de lama, chuvosa, cheia de árvores sem folhas. Um cenário assustador. Um casal se aproximava do garotinho em um carro. Lembrei-me do resto do sonho.

O menininho chorava desconsolado e muito assustado. A rua era escura, não consegui identifica-lo. Ele parecia tão... perdido.

Mamãe... Mamãe! – ele gritava e chorava em meio a chuva, caminhando devagar.

Um casal que passava ali viu o pobre garoto e apiedaram-se dele. O homem freou o carro e a mulher saiu de dentro dele. Ela pegou rapidamente o menino e fê-lo sentar-se no colo dela, tentando enxuga-lo.

Oh, Robert, pobre garoto! Deve ter pais pobres... Vamos levá-lo. – ela pediu com jeitinho.

Ah, não sei, Adele. Vai que os pais o procuram! – Robert argumentou, mas estava tentado a levar o menino.

O menininho recomeçou a chorar.

Não podemos deixa-lo na chuva! Vai acabar adoecendo! – Adele rebateu.

Adele... – ele ia começar, mas foi interrompido.

Por favor! Ele vai ser um consolo ao meu coração depois... Depois de...

Aparentemente, ela era incapaz de terminar a frase. Robert a olhou e decidiu:

Certo. Se não virmos nenhum anúncio procurando esse garoto ou algo do tipo, ficamos com ele.

Adele beijou seu marido.

Ah, Robert, você é um amor!

A mulher pegou o garotinho e falou:

Você vai ser muito feliz conosco.

E o carro partiu, levando consigo sua nova esperança de felicidade.

Quando a professora saiu da sala, o novato falou comigo.

— Shelly, depois você poderia... — Jaden começou uma frase, mas quando olhou o desenho, se interrompeu. Sua face ficou pálida e eu o vi estremecer. Ele passou a mão pelo rosto e me olhou.

— Está tudo bem? — indaguei. A expressão dele estava me assustando.

— Como você... Esse desenho... — ele parecia incapaz de formular uma frase completa.

— Vamos lá para fora beber uma água, ok? Ok — decidi, assustada.

Eu o puxei e ele simplesmente se deixou conduzir. Levei-o até o bebedouro e ele bebeu alguns goles d'água.

— Sente-se melhor? — indaguei solícita. Jaden olhou diretamente para os meus olhos... e eu senti um choque atravessando o meu corpo.

— Você me conhece de algum lugar? – ele questionou com ar sério.

— Não. — respondi confusa.

— Tem certeza? — ele perguntou novamente.

— Você está bem? — questionei mais confusa ainda.

Jaden sacudiu a cabeça.

— Estou bem, não se preocupe. Vamos voltar. Só te peço uma coisa: tem como você guardar aquele desenho para mim?

— Quer que eu te dê?

— Não. Não agora. — ele negou com ar perturbado. – Depois. Você faz esse favor para mim?

— Certo. Eu vou guardar.

Ele pegou em um dos meus ombros e falou isso para mim em um tom mais sério impossível:

— Você desenha muito bem, Shelly. É um dom.

Passei a mão pelos meus cabelos, sem graça. E o toque me salvou.

— Vem, novato. Vamos dar um tour pela escola. Aproveitar o intervalo de 10 minutos, eh*?

Jaden apenas me seguiu.


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Notas finais do capítulo

*expressão canadense como o nosso "né?," recurso da manutenção da comunicação, que pede uma concordância da parte da outra pessoa do diálogo. Em alguns momentos no texto, substituirei por né, ok, certo e outras variações.
"Gostou? Sim? Não?
Gostou do que?
Não gostou do que?
E os personagens? São legais? Ou não? Qual você gostou mais?
A escrita? Legal? Tem erros? Se tiver, avise, pelo amor de Deus.
O enredo? Como você se sentiu ao ler o capítulo?
Pronto, eis um comentário.
Saíam das sombras, leitores fantasmas."
By Lua Reyna via face, adaptado ;)