Alice era uma menina extremamente criativa!

Todas as noites, Alice juntava toda a sua família na sala de estar e lhes narrava sobre mais uma de suas criações.

Certa vez, em um almoço de família, Alice resolveu começar uma nova história, coisa que ela nunca tinha feito antes. Dessa vez a história se passava em um tal de Wonderland. Sua família adorou a história e os mais velhos ficaram comentando sobre a criatividade da menina que, segundo eles, não tinha fim. Alguns até falavam sobre a capacidade da menina de imaginar coisas maravilhosamente malucas. Sua prima, Margareth, disse que na idade de Alice, nunca tinha imaginado coisas tão incríveis e impossíveis ao mesmo tempo.

A pequena menina, explosiva como era, ficou extremamente irritada com os comentários dos outros sobre sua aventura e sobre sua pessoa. Margareth, por estar ao seu lado, foi a escolhida para que se descontasse toda sua raiva. Pegou a garrafa de vinho tinto, que estava a sua frente, e virou todo o conteúdo no belo vestido estampado da garota.

Naquele momento, Margareth levantou-se assustada. Enquanto encarava a enorme mancha roxa no vestido, a menina ia andando sem perceber na direção da escada que levaria à cozinha. Alice, tomada pela fúria, empurrou sua prima com uma força surpreendente em direção ao andar de baixo. A cada pancada na escada, Margareth soltava um grito de dor.

Sua família estava surpresa com a atitude da jovem menina. Seus pais, claramente desapontados, resolveram mandá-la para um sanatório, onde iria passar sete anos, para que pudesse pensar melhor sobre seus atos. Sua irmã conseguiu convencê-los a reduzir o tempo de estadia da pequena criança no sanatório. Separaram algumas coisas para Alice e puseram-na em uma carro em direção ao manicômio da cidade.

A menina ficou cinco longos anos internada, imaginando se algum dia voltaria para Wonderland e reveria os grandes amigos que fizera quando estava por lá. Mas quando seu tempo no sanatório estava acabando, Alice já não pensava mais em seu querido país com tanta frequência quanto antes.

Quando seus pais e sua irmã foram busca-la, a garota já estava com dezessete anos. Ela não se lembrava de quase nada de Wonderland, somente dos seres incríveis, que agora ela achava ter imaginado em uma brincadeira infantil.

Quando chegou à sua antiga casa, sentou-se no sofá frente à janela e começou a olhar para a piscina de águas turvas que havia logo abaixo. Ela desejava pular, mas como estava muito suja, temia que seus pais brigassem. Porém, a cada segundo que se passava, Alice ficava pensando se não seria mais fácil pular e deixar que o peso que carregava — e que agora obrigava aos seus pais a também o fazerem — afundar na água lhe levando junto. Sem dar tempo para pensar duas vezes, se despediu de sua gata, que havia ouvido todas as suas histórias, inclusive as sobre Wonderland.

Após a breve despedida, a menina subiu no parapeito da janela e contou até três, para então pular de cabeça na grande piscina que aumentava de tamanho a cada milésimo de segundo. Durante a queda, se lembrou da outra queda que a levara a um mundo fantástico, onde conhecera seres incríveis que prometera se lembrar até o fim de sua vida. E durante aqueles últimos segundos que julgava serem o fim, ela repassou todas as aventuras que passou em Wonderland e tentou se lembrar de todos os personagens que participaram da sua história fantástica.

No momento em que a água bateu em sua pele, Alice desejou que seus amigos estivessem ali junto dela. E por um segundo, conseguiu ver, pela última vez, o grande sorriso de Cheshire.

Aquele foi o seu último pensamento antes de por fim perder a consciência. Para sempre.