— Vilu, você está bem? – Maxi perguntou, assim que terminei de guardar meu material no armário.

Assenti com a cabeça baixa, bocejando.

A verdade é que não dormi direito esta noite de tanto pensar no que tinha acontecido e quando finalmente consegui tive um pesadelo horrível. Acordei bem tarde e a minha sorte era que o meu pai não estava e que não tenho aula na primeira hora. Ainda estou um pouco confusa quanto a isso, tanto que nem sei o que é real e o que não é. Confesso até que chorei um pouco. Um pouco muito.

Meus olhos inchados me entregavam.

— Não quer aproveitar esse primeiro horário para dar um cochilo? Ou prefere jogar água na cara o tempo todo para despertar? Vai tirar sua maquiagem.

— Uhum – murmurei, deitando a cabeça no ombro dele. O que foi que ele disse mesmo?

— Mas no meu ombro não, tá? Vai procurar o León para isso, ele adora te mimar, não vai negar ser encosto!

— O que aconteceu com o León? Ele está bem?

— Você, que dormiu na casa dos pais dele, não sabe, imagine eu que só o vi ontem na reunião da banda.

Fechei os olhos enquanto o Maxi falava um monte de coisas que o sono não me permitia entender. Eles estavam tão carregados que nem preciso contar vaquinhas para dormir. Opa, vaquinhas?

— Violetta, pelos Céus, vai ao banheiro lavar esse rosto! Você não pode ficar assim, caindo nos meus ombros.

— Um unicórnio, cinco unicórnios, sete unicórnios...

— Se conta carneirinhos, não?

— Na minha imaginação são vaquinhas que parecem unicórnios. Vai da criatividade de cada um.

Quando consegui abrir os olhos, percebi que o Maxi já estava irritado, sem paciência comigo. E eu não podia deixá-lo assim porque estava sozinha e ele é a única pessoa que posso confiar aqui dentro, já que perdi o León e duvido muito que a Francesca queira olhar na minha cara depois de eu tê-la acusado de algo que nem sei se ela fez. Até agora tudo tem indicado que sim.

Essa situação me motivou a ir ao banheiro e lavar o rosto para acordar mais. Não tinha absolutamente ninguém então fui rápida. Tenho pavor de ficar só, ainda que seja no banheiro do Studio. Quando eu estava prestes a sair, a Fran entrou e eu acelerei meus passos. O clima não ficou tão legal.

— Violetta não vá! – Ela chamou assim que me aproximei da porta. Parei imediatamente, surpresa.

— Fran, eu...

— Você estava com ciúmes, por isso fez aquela cena toda.

— Eu com ciúmes? Francesca por favor, né?

— Ciúmes porque o León não estava te fazendo companhia como sempre fez. Nem a Ludmila era tratada daquele jeito e na primeira vez que ele me tratou assim, você estranhou.

Queria poder dizer que era só por isso e teria minha melhor amiga de volta. Mas não era tão simples e o meu sonho me fazia desconfiar mais ainda. Minha expressão deve ter entregado o que eu pensava, o que a fez continuar.

— Acha mesmo que eu, Francesca Caviglia, a sua melhor amiga e a maior e primeira Leonetta Shipper da história, teria coragem de destruir a suposta amizade que vocês dois têm? Não me confunda com a Ludmila, foi ela quem provocou todo esse estrago.

— Suposta?

— Claro que vocês são amigos, mas não vejo como só isso.

Agora assim eu vejo a Fran que estava a cada momento me perguntando se eu e o León já tínhamos assumido o que sentíamos. E também havia a possibilidade de ter sido a Ludmila, só que ela não tem noção do que está acontecendo.

— Mas só nós duas sabíamos disso, Fran.

— E o Tomás não? Não acha que ele e a Ludmila tenham alguma coisa a ver com tudo isso?

— O Tomás nunca seria capaz de prejudicar alguém.

— Bom, acredite se quiser. Eu sei o que fiz e minha consciência está limpa. Lamento que não confie em mim e espero que um dia possa abrir os olhos. Quando esse dia chegar, vai na minha casa porque, provavelmente, vou estar sem celular.

— Se esse dia chegar, vou te ligar porque, provavelmente, seu celular vai estar no bolso da sua calça.

Ela riu fraco e respondeu:

— Vou me lembrar desse detalhe, obrigada!

Balancei a cabeça negativamente e saí do banheiro, agora mais desperta. Eu achava que o Maxi me esperava em um lugar próximo, mas aquele falso – um novo apelido carinhoso – me abandonou. Fui para a sala de música onde será a primeira aula de hoje, só que não era com o Beto, era com o Pablo que ia dar canto. Os horários estão confusos desde que a minha mãe viajou porque as aulas dela não se encaixavam com o horário do professor que a está substituindo e nossas aulas vagas não compensam.

No teclado, toquei algumas músicas que tinha aprendido e que já sabia antes de entrar aqui, inclusive cantei e toquei a música do meu exame de admissão, uma composição minha e da minha mãe. Por um momento, senti como se já tivesse vivido isso antes. Estava associado ao meu sonho. Então agora a Fran e o León vão entrar na sala e vou descobrir que eles estão namorando?

Claro que não. Continuei cantando, sentindo o som daquelas palavras. Vi Ludmila entrar na sala e esperei que ela me fizesse parar de cantar, mas ela não o fez. Seu comportamento está muito estranho ultimamente.

Já estava me preparando para seus gritos que eu cantava muito mal, que isso era uma aberração nos ouvidos dela e lá lá lá. É o que o costume faz, não?

— O que veio fazer aqui? – Perguntei quando terminei de cantar.

— Conversar com você.

— Comigo? Não temos nada que conversar, Ludmila – disse, juntando as partituras e guardando na minha pasta.

— Nem sobre a sua bela história de amor impossível com o Tomás?

— Do que está falando?

— Pelo menos metade do Studio sabe que rolou algo entre vocês lá na Espanha. Só pode ter sido a Francesca, não? Afinal, um fato como esse só deve ser contado para a melhor amiga.

— A Fran não tem nada a ver com isso.

— Se não tivesse, vocês não estavam se estranhando.

Quanto mais a Ludmila falava, mais argumentos a Fran tinha para me convencer. Ela podia estar certa e eu não a quis escutar. Mas, por outro lado, essa história já está circulando por aí e a Ludmila deve ter descoberto dessa maneira. De que outra forma teria sido? Duvido muito que o Tomás tenha contado alguma coisa para ela. Ele não seria capaz de fazer uma coisa dessas.

— Não estamos nos estranhando.

— Ah claro que não. Ninguém viu aquela ceninha que você fez quando a viu com o León, né? Por falar nisso, acho incrível como são as coisas. Primeiro, o Lion me troca por você e depois te troca pela Francesca. Ou talvez tenha terminado comigo por ela também e só tenha te usado para disfarçar isso.

— A minha situação com eles dois não deve estar uma das melhores, mas não vou permitir que fale assim deles. São meus amigos.

— Eram, Violetta. Eram. E agora nós duas podemos nos juntar e…

— Por que eu me juntaria a você? – Perguntei sem paciência.

— Porque temos interesses em comum. Você quer o seu melhor amigo e eu quero o meu namorado, – ex-namorado – e está muito claro que a Fran é um empecilho. Precisamos tomar uma atitude já, Violetta!

— Ok, ok. Você é capaz de guardar um segredo?

— Se eu fosse você não confiaria tanto em mim, mas sou todo ouvidos para você me dizer o que quiser, ainda mais se tiver algo a ver com Tomletta, o melhor otp que todo o universo respeita.

Respirei fundo na tentativa de me acalmar e não falar umas boas coisas para essa menina. Ela não muda nunca. E que história é essa de “Tomletta, o melhor otp que o universo respeita”? Nada contra, mas é passado. Não quero voltar com essa história, não vale a pena tentar por algo que o “universo” sabe que não vai dar certo, primeiramente porque estou afastada dos meus amigos por isso e, segundamente, por causa do meu pai. Claro que ele não permitiria.

Outra coisa, eu não faria nada contra a Fran, por mais magoada que esteja com ela.

Além do mais…

— Antes o León esteja com a Francesca do que com você Ludmila. Não é planejando maldades que você vai conseguir voltar com ele. E não, eu não vou me juntar com você para fazer isso. Se for fazer, faça, mas não conte comigo. Violetta já vai! – Falei e só depois que saí da sala me dei conta do que tinha dito. Essa menina está me deixando louca.

Pelo visto, não será um dia tão fácil como eu queria que fosse. Fechei os olhos com força e abri rapidamente com a esperança de ter sido um pesadelo, mas agora é real e não preciso que ninguém me belisque para que eu tenha certeza disso.

Peguei o meu celular e liguei para o meu pai. Quem sabe não tornaria o dia um pouco melhor?