Sempre Em Meu Coração escrita por Carpe Librum


Capítulo 6
Para alguém de Breaking Bad


Notas iniciais do capítulo

Esta é minha também (sim, eu, Maira para os alunos e Rain aqui neste mundo. É bom que saibam que não estou roubando o pseudônimo daquela moça. Sou eu mesma.)
Alguns dias antes da leitura e digitação das cartas dos alunos, eu estava envolvida nessa série. Acabei sentindo uma necessidade enorme de "desabafar" sobre o final. Então estou me agradando com mais uma carta. Porque eu posso, haha.



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Campinas, 19 de junho de 2015.

Caro Senhor White,

Não sei por que tive vontade de escrever-lhe, já que mesmo depois do fim ainda não sei como me sinto a seu respeito... Não, na verdade não é isso. Eu sei como me sinto. E, principalmente, sei como devia me sentir. Não parecia no começo, mas você era mau. Simples assim. E há dentro de mim um certo moralismo hipócrita e teimoso que me faz hesitar em admitir o quanto eu gostava disso, o quanto gosto um pouco mais de você do que consegui te odiar.

O fato é que conhecer sua real natureza acabou sendo um processo um tanto assustador, mesmo que infinitamente interessante e surpreendente. É como quando não se consegue deixar de olhar para um acidente, por exemplo. E você fica ali, sentindo pena, empatia, medo e uma dose inconveniente e quase cruel daquele doce alívio de saber que, pelo menos daquela vez, não era você nas ferragens. Mas há algo de misteriosamente perfeito em sentir tantas coisas opostas ao mesmo tempo, como quem olha para o negativo de uma fotografia e apenas supõe o que está realmente ali.

Eu supus muitas coisas ao seu respeito (e descobri outras tantas sobre mim ao analisá-lo), mas acho que errei mais do que acertei. Você era, e continua sendo, um cara difícil de classificar. Aliás, eu nem sequer sabia como chamá-lo.

Pensei em Walt, mas era assim que o chamavam os de sua família, então não achei apropriado. Para o bem e para o mal, eles nunca souberam de exatamente tudo o que eu sei sobre você. Digo para o mal, pois eles nunca conheceram os detalhes. E penso que para o bem pelo mesmo motivo. Certas coisas é melhor não saber. Dizem que o diabo está nesses tais detalhes e talvez tenham razão. Deus sabe que eu gostaria que você não tivesse torturado o Jesse contando a ele sobre a Jane.

Mas voltando a como chamá-lo, pensei em Walter também, porque era seu nome, mas pareceu que era pouco. Pelo mesmo motivo, Heisenberg foi brevemente considerado, mas descartado em seguida. Parece-me que cada um deles contempla apenas um lado de quem você era. Então, eu percebi. Você sempre me chegou por uns olhos específicos, olhos que não sabiam, mas que nunca chegaram a se enganar completamente. Olhos de Jesse Pinkman, para quem você sempre foi Mister White.

Dá quase para ouvir a voz sonora e debochada dele, não é? Com aquele jeito que ele tinha de soltar o ar no último fonema. Mister Whitsss. (Alunos!) Era um pouco irritante até, mas eu gostava. Sempre tive um fraco por aquela vulnerabilidade que você atacava e protegia ao mesmo tempo. E acho que você também. Ninguém passa imune pela vida de professor, por mais intocável que seja, você sabe. “Yeah, yeah, that bitch Mister Whitss is all gay for me. Rightss”, Jesse diria. Aquele merdinha boca suja!

Você não sabe disso, estava sonolento e dopado quando aconteceu, mas depois da briga por causa do rastreador de GPS, você chamou seu próprio filho pelo nome dele. O Júnior não entendeu nada, mas eu tive a confirmação do que já sabia. Daquela coisa que ficava evidente a cada vez que você tentava salvá-lo da própria imprudência ou seja lá do que fosse que o levava a fazer besteira atrás de besteira. Jesse era sua única companhia nas trevas em que se meteram juntos. Jesse era filho do Heisenberg.

E foi assim que você o quebrou. Seu pequeno brinquedo que gostava de fingir que era bandido.

Lembra-se do “crec”? Tenho certeza de que você também o ouviu. Foi naquele dia em que ele viu a notícia sobre o “desaparecimento” de Drew Sharp. Deu para escutar o irreversível rompimento de alguma coisa dentro dele, de alguma coisa que mudou tudo. Você pode alegar que a morte do garoto não foi sua culpa, e que Jesse é tão culpado pelas escolhas erradas que fez (e pelas consequências delas) quanto você é pelas suas. Mas, sabe, Mister Whitss, ele nunca entendeu ao certo no que estava se metendo, você sim. Em certo momento. E ao invés de libertá-lo, você o prendeu mais a si. Não lhe bastava que Jesse tivesse seu próprio abismo, você o queria em sua própria queda. E ele foi leal a você, mesmo quando lhe custou tanto, pelo menos até descobrir que a sua lealdade era apenas por você mesmo.

Por isso você devia a ele. Aquela coisa toda que armou no final para salvá-lo. E mesmo assim você acabou sozinho. Você, sua inteligência prodigiosa e sua alma arruinada. Por essa razão eu tive tanta pena de você no fim quanto tive no princípio, apesar de tudo o que houve entre essas duas pontas. Não sei se você gostaria disso, mas foi assim que aconteceu.

Você pode até ter sido aquele que batia à porta, e podia ser Heisenberg, Walt, Walter... O falsamente inocente Walter White. Mas se você me pedisse para dizer seu nome, como pediu aos traficantes de Phoenix, eu o chamaria de Mister Whitss. E eu, apesar de não dever, gostava do Senhor White, professor, pai dedicado, traficante e cozinheiro de metanfetamina, vilão épico que fundiu por um tempo meus valores e me fez torcer pelo bandido.

Espero que tenho valido a pena para você.

Atenciosamente,

Rain


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Notas finais do capítulo

“Se isso é verdade, se você não sabe quem eu sou, então talvez o melhor caminho seja pisar com cuidado.”

W.W.

Épicoooo!



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