Eu amaldiçoava a minha falta de sorte em todos as línguas que conhecia, no entanto o motorista do táxi não parecia prestar muita atenção. Meu reflexo, refletido na divisória de vidro, gritava para os quatro ventos que minhas últimas horas não haviam sido muito fáceis. Claro, sempre fui uma ruiva muito bonita, mas naquele momento, parecia uma maluca a caminho do hospício.

Meu cabelo vermelho, antes preso em uma trança embutida, agora estava quase que completamente solto, com várias mechas voando ao redor de meu rosto. Meu rímel já havia manchado e escorrido faziam séculos, devido ao meu não muito breve lamento quando o pneu do táxi furou, e sim, eu parecia uma morta viva de filme de terror com a cara toda borrada. Sem contar que antes disso tudo, meu voo tinha atrasado e quase morri de tédio no aeroporto.

Belo modo de começar uma vida em Londres!, pensei.

O táxi parou em frente a um complexo de apartamentos e não perdi tempo, fui logo abrindo a porta e saindo. O motorista me ajudou com a única mala que eu havia trazido e o agradecendo, paguei a corrida.

Respirei fundo e virei-me para o prédio. Era bonito, quase que completamente revestido de vidro. Fui até o porteiro e me apresentei:

– Bom dia. Sou Heather Sharpe, a nova moradora do apartamento dezoito.

O homem era baixinho e um pouco rechonchudo. Tinha cabelos brancos e ralos e deveria estar em torno dos cinquenta anos.

Ele me olhou fixamente por alguns longos segundos, fazendo-me consciente da minha condição pavorosa – Ele devia estar decidindo se eu estava falando a verdade, ou se era apenas uma fugitiva de alguma instituição para menores procurando refugio. Certamente uma ameaça a sociedade. – e em seguida assentiu.

– Seja bem-vinda. – disse e finalmente sorriu, logo digitou a senha do portão eletrônico para me deixar entrar.

***

EM MANUTENÇÃO.

Foi a primeira coisa na qual prestei atenção ao entrar no prédio. Uma maldita placa amarela na frente do elevador que dizia: EM MANUTENÇÃO.

Realmente, só era o que me faltava para encerrar essa manhã com chave de ouro!

O jeito eram as escadas.

Bem, de acordo com as informações escassas que Lorew – a mulher que me gerou. – me deu, eram três apartamentos por andar. Ou seja, eu morava no sexto.

Oh, droga.

Me dirigindo as escadas, rezei para os deuses de todas as religiões não me deixarem, sei lá, morrer no meio do caminho e então iniciei aquela tarefa árdua.

***

– Respire, Heather. – ordenei a mim mesma o que me pareceu serem horas depois, mas foram apenas minutos. Longos minutos. Eu estava no quinto andar. – Respire. Falta apenas mais um.

É nisso que dá ser uma pessoa nem um pouco atlética. Haviam poucos pertences dentro de minha mala, pois eu havia deixado para comprar tudo aqui, mas, ainda assim, ela me pareceu pesar umas cem toneladas.

Arrastei-me pelo último lance de escadas e poderia ter gritado de alegria quando cheguei ao último degrau, mas a essa altura já não tinha mais ar. Sentei-me ali, deixando de lado os saltos que havia desistido de usar no segundo andar e deitei-me para trás fechando os olhos.

– Eu te amo. – murmurei para o chão frio e plano.

– Desculpe, mas o que foi que você disse?

Levantei alarmada e olhei o Ser que havia falado e estava atrás de mim. Ele era alto, de cabelos escuros e olhos claros. Ridiculamente bonito. Tinha a testa levemente franzida e me olhava com o que me pareceu ser preocupação.

Aquilo me fez lembrar que eu parecia um lixo, mas meu coração fez uma dancinha estranha no peito. Esse garoto me lembrava uma das minhas mais recentes paixões platônicas…

Não, Heather! Não pense nisso! Não ouse se apaixonar por um garoto que você nem conhece!

Infelizmente meu coração nunca teve ligação alguma com meu cérebro e sempre fez a coisa errada.

Bem, eu nunca disse que era uma garota normal.