I Won't Give Up escrita por Kaline Bogard


Capítulo 2
Parte 02 de 03


Notas iniciais do capítulo

Voltei!! Sentiram minha falta? Espero que sim!

Resolvi postar essa na segunda para começar bem a semana.

Boa leitura!! :D



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I Won't Give Up

Kaline Bogard

Parte 02 de 03

Kagami teve a impressão de que aquela foi a viagem mais longa de sua vida. E a mais caótica. Atualizações chegavam o tempo todo através do rádio do helicóptero, e as notícias eram cada vez piores. Sabia agora que as torres de comunicação em Sendai tinham sido varridas pelas ondas. Não havia sinal de celular nem mesmo emergencial. Por isso Daiki estava impossibilitado de retornar suas mensagens ou atender suas ligações.

Quando o helicóptero alcançou a área atingida, Taiga se sentiu tragado para um filme norte-americano sobre o final do mundo. Uma película terrível, aonde nenhum efeito especial precisava ser usado, pois o estrago era real.

Na zona periférica, o mar começara a recuar lento, deixando atrás de si um rastro de lama, entulhos e destruição. Carros se amontoavam de maneira impossível, casas e prédios haviam cedido. Podia ver barcos em lugares onde antes haviam ruas e avenidas. E ao longe, na direção da praia, nada mais existia além do mar invadindo a costa, lentamente recuando e levando consigo tudo o que podia.

A cena aumentou o desespero de Taiga a um nível estratosférico. Daiki estava ali, no meio daquela destruição...

Então o piloto avisou que iriam pousar e começou a manobrar em direção ao telhado de uma grande construção que se erguia no meio da catástrofe e reconheceu como o prédio da prefeitura de Sendai. O helicóptero deixou os bombeiros convocados e sequer desligou os motores, sabendo que levantaria vôo em breve. Havia muito o quê fazer.

Kagami e seus companheiros foram em direção a um grande grupo de homens uniformizados: paramédicos, policiais e outros bombeiros. Um homem falava alto em um megafone, dando as instruções e fazendo um resumo da situação.

— ... mergulhadores já agindo nas imediações. A prioridade é uma varredura ao sul e ao sudeste. Todas as vítimas estão sendo encaminhadas para hospitais em Yamagata e Fukushima. Há previsão de mais abalos, mas em menor escala...

Enquanto ouvia, Taiga olhou ao redor, seus companheiros de Brigada estavam por perto. Fora isso, não viu nenhum rosto familiar. A esperança de que Aomine estivesse ali logo se dissolveu.

— Lembrem-se, homens: a água fez uma destruição sem precedentes. Temos relatos de explosões em redes de gás, instalações elétricas danificadas, trens descarrilados, metrô submerso, pânico civil. Todo cuidado é pouco, não apenas com a população, mas com a própria segurança. Quero os homens especializados em salvamento aquático e resgate submerso daquele lado. Um grupo tático para desencarceramento seguirá com o Comandante Yushimoto. Precisamos de paramédicos nos dois campus da Faculdade de Tohoku, onde, a princípio, estão sendo agrupados os resgatados. Os demais, formem equipes para as varreduras com o VSAT e o VSAE. Dispensados.

Kagami e seus companheiros se separaram para cumprir as ordens. Tinham treinamento bom o bastante para saber em que time se encaixariam. Por isso, Taiga juntou-se a um grupo de cinco homens que ficariam responsáveis pelo VSAE. Depois de breves cumprimentos, o pequeno time rumou para dentro da prefeitura. O prédio fôra lavado pelas ondas. Havia barro em todos os lugares, equipamentos eletrônicos estavam espalhados pelo corredor, muita gente ia e vinha de um lado para o outro, tomando providências. Era caótico.

O elevador estava fora de serviço. Foi preciso descer todos os lances de escadas até chegar a rua, onde uma camada de lama tornava a visão inacreditável. Lama, destroços, carros amontoados, pessoas desorientadas, oficiais tentando ajudar de alguma forma.

— Isso mais parece um pesadelo — um dos bombeiros falou pra ninguém em especial, mas ganhou a atenção de Taiga. Ele viu a identificação presa em seu uniforme. Chamava-se Suzuki.

— Tem alguma notícia sobre o Departamento de Polícia em Aoba? — sabia que era lá que aconteceriam as reuniões de Daiki.

— Nada bom — Suzuki respondeu, seguindo em direção ao caminhão tanque. Tinha barro até os joelhos — Uma parte do hospital desmoronou. As ondas chegaram lá com quase quatro metros de altura.

Taiga ficou arrepiado com a informação. Não podia ser pior!

— Os grupos de resgate conseguiram chegar lá?

— Ainda não. Tem um time aéreo fazendo reconhecimento e triangulando o perímetro. Começaram a tirar as vítimas agrupadas no alto dos prédios. Mas a água do mar ainda dificulta a ação. Precisamos de mais algumas horas para poder enviar a nossa frota. Se prepara Kagami — ele disse após ler a identificação de Taiga — O pior em Nakayama já passou, mas o estrago é fora de escala. Não vai ser bonito.

O rapaz engoliu em seco, sem querer render ao desespero. O instinto mais primordial o fazia querer ir para o grupo de ação aérea e ajudar na região de Aoba. Mas sua especialidade era outra. Tinha que acreditar na eficiência dos colegas de trabalho. Eles conseguiriam encontrar Daiki. Sua convicção de que ele estava vivo era inabalável.

Com o coração dividido entre a esperança e o desespero, Kagami entrou no VSAE junto com os demais e o potente veículo abriu caminho a força no barro, rumo a região de Nakayama. O barulho de helicóptero indicava que mais voluntários chegavam de partes não atingidas do Japão.

Pela janela do VSAE, Taiga pôde ver outros veículos do corpo de bombeiros, especializados nos difíceis tipos de resgate, circulando entre os destroços. Viu um time que recolhia corpos. Pessoas cujo destino fatal já estava selado. Algo explodiu em um lugar mais distante, apenas o barulho alto e a fumaça negra se erguendo rumo ao céu evidenciavam o ocorrido.

A certo momento, um novo abalo fez o veículo deslizar na lama. O motorista experiente conseguiu manter o controle, em partes por não ser de alto nível na escala. Algo perto do 5.0, talvez.

Levaram o dobro do tempo do que demorariam para chegar em condições normais. Um VSAT já estava agindo em Nakayama. Foram de encontro ao grupo, pegar atualizações sobre a situação.

— Temos três equipes na área. A maioria dos prédios já foi evacuada. Faltam aqueles dois, mas ambas as estruturas estão comprometidas. Discutíamos agora os riscos de enviar homens atrás de vítimas ainda vivas — o homem que parecia no comando foi explicando para eles. Era alto e forte, de expressão grave e barba cerrada.

— Se tiver alguma pessoa presa lá dentro é certo que esteja machucada — Suzuki ponderou sobre a situação.

Taiga concordava com o pensamento. As ruas estavam tomadas de lama, a mesma paisagem que os acompanhara por todo o caminho. Apesar disso e da ameaça a respeito da estrutura, os prédios estavam em pé, sem nenhum desmoronamento aparente. Uma pessoa em perfeitas condições conseguiria sair sem problemas.

Enquanto refletia silencioso, Kagami permitiu que os olhos avermelhados percorressem o cenário. Alguns sobreviventes recebiam ajuda para entrar no VSAE, todos com as roupas molhadas, sujos, assustados...

Impressionados pela fúria da natureza que devastara a região. Podia compreendê-los: vira cenas pela televisão e ficara chocado. Como seria presenciar aquilo ao vivo e a cores? A dúvida o fez estremecer. Daiki. Daiki enfrentando aquilo, talvez sozinho, em um lugar longe de casa.

— Kagami? Kagami?! — o chamado um tanto impaciente tirou Taiga de suas reflexões. Ele voltou-se para Suzuki e reparou que alguns dos homens já se colocavam em ação. Envergonhou-se pela distração.

— Suman — ele disse.

— Não se deixe impressionar, garoto. Aqui nem é a pior área — o outro homem, de barba cerrada, soou mais simpático. Seu nome era Hayato e ele dividia a estupefação com Taiga. Olhava ao redor e tinha a sensação de estar em um filme de péssimo gosto. Mal podia acreditar que aquilo era uma parte do Japão.

— Você vem comigo — Suzuki orientou — Vamos verificar o quarteirão. O restante faz a varredura em um edifício de cada vez.

— Concentramos as vítimas no parque — Hayato informou — Temos paramédicos e espaço para o helicóptero manobrar. Prioridade para feridos. Deixem os óbitos para o pessoal escalado.

Suzuki e Kagami concordaram. Logo pegaram o material básico para auxiliar, principalmente corda, kit Life Support, lanterna para cabeça, ferramentas.

Enquanto se afastavam, Kagami pegou o celular do bolso do casaco e deu uma espiada. Sem sinal. Não foi uma surpresa, apenas uma verificação motivada pela esperança. Se conseguisse entrar em contato com Aomine, ter alguma notícia, qualquer que fosse! Guardou o aparelho outra vez.

O caminho era difícil, além da lama haviam destroços por toda a rua, obrigando-os a passar por cima, sem ter como desviar.

— Você veio de onde? — Suzuki perguntou para quebrar o silêncio.

— Tokyo.

— Aa. Eu vim de Osaka, mas nasci aqui — calou-se ao sentir que o chão tremia muito de leve. Fez um sinal para Kagami parar de andar. Quando se estabilizou, a dupla avançou — Já avisaram que teremos terremotos ocasionais pelas próximas horas. Nada de muita magnitude.

— Aa — então Taiga caminhou até um dos veículos aglomerados próximos ao meio fio do outro lado da rua. Não precisou chegar muito perto para descobrir que as duas pessoas lá dentro estavam mortas, o vidro traseiro se quebrara e permitira que a água entrasse. Uma morte terrível.

— Vamos em frente — Suzuki falou baixo.

Um helicóptero sobrevoou a área em direção ao leste, muito provavelmente levando vítimas recolhidas até a Faculdade de Tohoku.

Avançar foi penoso em muitos sentidos. O caminho cheio de obstáculos, mais corpos. Homens, mulheres, crianças, idosos. Animais de estimação. Itens pessoais tragados pelo mar: um porta-retratos aqui, um aparelho eletrônico ali. Roupas, móveis, brinquedos. Nada foi poupado da fúria da natureza.

Dobraram a primeira parte do grande quarteirão, apenas para ter uma visão similar. Destruição, entulho, desamparo. Morte. O ar tinha uma estranha densidade e estagnação. Era cada vez mais difícil respirar.

Diante da desolação inexorável, Kagami sentiu um princípio de pânico. A Vida parecia ter perdido muitos soldados naquela tragédia. E Daiki... Seu namorado não podia estar naquela estatística. Não Aomine.

Balançou a cabeça com força. Não podia se dar ao luxo de ter tais pensamentos pessimistas. Daiki era um policial bem treinado e cheio de destreza. Ele era o cara imparável nas quadras, que não seria derrotado por nada nem ninguém. A não ser por Kagami Taiga.

Não desistiria de ter esperanças!

Focou sua atenção na missão que recebera: encontrar as pessoas que precisavam de socorro. Notou Suzuki se aproximando de uma lanchonete construída entre dois prédios. Ele espiou pela fachada de vidro quebrado.

— Não parece ter ninguém vivo — apesar de dizer isso acabou entrando.

Taiga olhou para os prédios em volta, visivelmente tinham sofrido com o Tsunami. Logo sua atenção foi desviada para Suzuki que saia da lanchonete. Seu ar desolado foi sinal eloqüente de que não encontrara sequer um sobrevivente.

— Que inferno, Kagami. Essas pessoas não tiveram chance... — respirou fundo — O que acha desses prédios?

— Confirma se a estrutura está segura. Podemos olhar — sua voz saiu neutra, não queria demonstrar o que pensava: a possibilidade de encontrar alguém vivo num dos pequenos prédios era mínima.

Suzuki acionou o radio preso no colete e entrou em contato com o comandante da missão.

— QAP Hayato san?

Em alguns segundos a resposta veio com um pouco de estática.

QAP Suzuki.”

— Tem informação sobre os prédios ao lado de uma lanchonete chamada Lemon Pie?

Estável. É o próximo que vamos verificar. Identifica alguém necessitando de ajuda?”

— Não. Solicito autorização para entrar e fazer a varredura.

Concedido. Estamos finalizando aqui e já alcançamos vocês.”

— Entendido. QRT.

QRT Suzuki.”

— Temos autorização. Vamos começar por aquele, de três andares. Depois verificamos o outro.

— Aa.

Não foi uma investida fácil. A água do mar entrara através de algumas janelas, trazendo consigo um estrago significativo. Mas não encontraram nenhum corpo, nem mesmo uma pessoa ferida. A única surpresa do lugar foi um gato, que escapou correndo de um dos apartamentos, todo molhado e meio sujo. O bichano deslizou pelo chão e desapareceu antes que pudessem fazer qualquer coisa.

Suzuki sorriu. Um pouco de vida para variar.

— Vamos dar uma olhada no outro.

O prédio em questão era mais alto, cerca de seis andares. Outro residencial com dois apartamentos por andar. O elevador velho não funcionava, todavia não o usariam nem se houvesse eletricidade. O risco era muito grande.

Lance após lance repetiram a ação de olhar apartamento por apartamento, em busca de alguém. Foram até o sexto andar e vieram descendo e investigando na esperança de localizar sobreviventes.

A situação era similar à do outro edifício. Não encontravam ninguém, nenhum dos moradores. Apenas no primeiro andar, em um dos apartamentos isso se alterou. A porta jazia escancarada, aberta pela força da água. Era o andar mais próximo ao chão, logo sofrera maior impacto da grande onda.

No que sobrara do quarto principal jazia uma mulher, e ao lado dela uma criança, por volta de três anos, ambas mergulhadas na baixa camada de água marítima que cobria o chão. A força da onda foi tanta que a menininha perdera um dos sapatos, o pé pequenino e descalço trazia um ar de fragilidade tão grande que Taiga sentiu um nó na garganta. Seu primeiro instinto foi abaixar-se e iniciar o procedimento de primeiros socorros: massagem cardíaca para reanimar o coração. Porém Suzuki o segurou pelo braço, impedindo seu gesto impetuoso.

— É tarde demais — ele afirmou o óbvio. Uma sombra de puro pesar endureceu seu rosto sisudo. Nada poderiam fazer por aquelas pessoas, a não ser seguir em frente e buscar alguém com vida — Esse é só o começo, Kagami. No próximo quarteirão tem uma Escola Fundamental.

Continua...


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Notas finais do capítulo

No próximo saberemos se o Daiki está entre os vivos ou mortos. Ou... desaparecidos. Não se esqueçam da terceira opção. Alguém arrisca um palpite? >)
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Informações:

Veículos de socorro e assistência tática (VSAT) e Veículos de socorro e assistência especial (VSAE).


Mapa Tohoku
http://www.tohoku.ac.jp/en/about/map_directions.html


Código “Q” usado para facilitar a comunicação:
http://www.tudosobreseguranca.com.br/portal/index.php?option=com—content&task=view&id=488&Itemid=149