Outono escrita por Makimoto


Capítulo 10
Capítulo 10 // Parte I — Pacto Selado;


Notas iniciais do capítulo

Oi, gente, há quantos séculos não nos falamos? Eu sei, eu sei, faz muito tempo que eu não atualizo a história, mas a verdade é que um monte de coisa aconteceu nesse meio tempo e, confesso, eu fiquei bloqueada com esse último capítulo por causa da parte técnica da coisa. Sim, eu tive muita dificuldade com as cenas do jogo. Talvez muitas pessoas estejam esperando um texto super técnico, com jogadas descritas minimamente, e eu espero não decepcioná-los por optar narrar de um modo mais brando. Apesar do claro foco no esporte que a história tem, eu cheguei à conclusão que o foco é ainda maior em relação aos personagens, aos dramas pessoais e, porque não, ao romance. Não faria sentido escrever a história inteira de um jeito e, de repente, no último (ou penúltimo) capítulo, passar para uma narrativa mais técnica. Pelo menos é assim que eu penso. Decidi manter o foco no romance e narrar o jogo por cima mesmo. Explicado isso, vamos lá... Estamos finalmente chegando ao fim de Outono. Foi uma longa e árdua jornada até aqui. Alguns leitores acompanham desde o início, outros pegaram o bonde andando, mas eu gostaria que soubessem que todos vocês foram essenciais para que a história fosse concluída. Foi o apoio de todo mundo, as boas vibrações e o carinho, que me fizeram continuar e não desistir (mesmo eu tendo desejado isso em vários momentos). E me sinto orgulhosa por ter persistido. Ah, e não pensem que estou ignorando ninguém, por favor, quem me conhece sabe que eu só respondo comentários quando eu atualizo. Então nas próximas horas estarei respondendo todos os comentários pendentes. E... Obrigada. ( •̀ᄇ• ́)ﻭ✧ Mas não fiquem tristes, não. Leiam o recadinho que vou deixar para vocês no final. (ps: sim, eu mudei a capa, em homenagem ao final de Outono, o que acharam? Comentem a respeito plsssss~)



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O som dos tênis riscando o chão da quadra ecoava com força apesar dos gritos e do barulho que vinha das arquibancadas. Todos os olhares externos estavam voltados para a bola que quicava de um lado para o outro e para os movimentos dos atletas que a manuseavam. O painel eletrônico que exibia o placar, com letras e números grandes e piscando em vermelho, os lembrava que a discrepância era grande. Em meio a suspiros ofegantes e urros de uma plateia em sintonia, os protagonistas da aguardada competição esportiva batalhavam pela posse de uma vitória que vinha se tornando cada vez mais penosa.

Já estavam na metade do primeiro período e a atmosfera entre os jogadores da Shunkashūtō era tenso. Havia preocupação no semblante de cada um deles. A pressão do time da Wakusei, que se movia com precisão e sincronia quase perfeitos, era esmagadora. Tudo acontecia rápido demais e era difícil ter tempo para pensar em qualquer coisa. Sons estridentes de apitos ecoavam no local, somados às ondas de gritaria que se vez em quando — nos momentos em que a bola estava mais perto da cesta — tomava conta da quadra.

Peguei! — Exclamou Naoki ao receber o passe executado por Kai.

Já dentro da área restritiva, o pivô flexionou os pés no chão, usou o impulso para subir e, finalmente, encestou com uma enterrada.

A contagem no painel mudou — o quatro se tornou seis —, mas a diferença em relação ao onze ainda era consideravelmente perigosa. Os atletas se entreolhavam com hostilidade disfarçada, apesar do aperto de mão caloroso no início da partida, pois todos queriam a mesma coisa e não havia espaço para solidariedade esportiva. Ainda estavam no início, mas a apreensão que serpenteava entre eles bagunçava o tempo e o fazia parecer mais comprido do que na realidade era.

A bola retornou à quadra na posse do time adversário, que prontamente avançou em direção à cesta onde deveriam pontuar, ao mesmo tempo em que os jogadores restantes da Shunkashūtō se posicionavam para defendê-la. Kai marcou o ala-armador oponente, que estava com a bola em mãos, enquanto Emiko e Ryūma protegiam a linha do garrafão a fim de criar uma distância ainda maior entre o ala — que tencionava receber a bola — e seu objetivo.

...!!

Desfrutando da vantagem da própria altura, o ala-armador driblou, com aparente facilidade, a marcação de Kai e realizou um passe quicado que concedeu a posse de bola ao ala. O último, por sua vez, apanhou-a, saltou, arremessou e conseguiu uma cesta de três pontos.

A diferença voltou a crescer.

A expressão no rosto do moreno era séria. Aquele sorriso confiante, que sempre inspirava não só Emiko, mas o time inteiro, já não estava mais lá. Demonstrava estar concentrado no jogo, focado em cada mínimo movimento, todavia todos sabiam que tinha alguma coisa errada. E isso era claro mesmo para os que não faziam ideia do que tinha acontecido no vestiário. A ruiva, em contrapartida, o observava com um aperto no peito; de preocupação, de agonia e desespero, e, principalmente de culpa.

Tinha algo que ela queria dizer. Algo importante.

Droga... — Rei murmurou para si mesmo.

Fica frio. — Naoki pôs a mão no ombro dele. — Ainda temos chance.

Ryūma, na linha que delimitava a área da quadra, lançou um olhar confidente à Emiko antes de lhe passar a bola. Os dois correram juntos, lado a lado, até que se depararam com o bloqueio adversário. Trocaram olhares rápidos, confirmando mudamente o passe que haviam treinado avidamente, e permutaram a esfera alaranjada entre si. Habilmente, concentrada em manter suas mãos firmes, Emiko ergueu o olhar e analisou rapidamente as possibilidades.

Naoki estava ao lado do garrafão, praticamente entrando na área, enquanto Rei estava sendo marcado pelo ala da Wakusei. Um rápido vislumbre na situação atual foi o suficiente para que a menina, em memória dos incansáveis treinos aos quais se submeteu, chegasse à conclusão de que Kai, que estava na lateral, era a sua melhor escolha.

No momento em que ela o fitou, no entanto, sentiu um calafrio.

A expressão no rosto dele moreno era fechada e severa. Não porque estava bravo com ela, ou porque a culpava por qualquer coisa que tivesse acontecido, mas sim porque seu interior borbulhava. Havia um misto de decepção e ansiedade que bagunçava seus pensamentos e o impediam de se focar naquilo para o qual tinha se preparado tanto. Seu tempo de reação, que normalmente era muito bom, estava lento, bem como sua capacidade de raciocínio rápido. Ele sentia os dedos formigarem de modo incômodo. Fazia esforço para controlar a respiração que insistia em descompassar.

Emiko engoliu em seco, encarando Kai diretamente por alguns segundos, com o coração disparado. Eles se comunicavam sem palavras. Ele dizia à garota o quão perturbado estava, e ela lhe pedia calma. Tinha muita coisa acontecendo. Precisavam vencer. Ainda havia muito o que falar.

A bola tornou a quicar no chão e foi direto para as mãos do ala da Shunkashūtō. Ele ergueu o corpo graciosamente, apoiando a bola com as mãos, enquanto se preparava para atirá-la de onde estava.

Por um ínfimo instante, Emiko teve um vislumbre de uma cena ocorrida tempos antes, naquela mesma quadra. Lembrava-se de ter os pensamentos roubados pela imagem deslumbrante de Kai com a bola das mãos, fitando a cesta fixamente, com nada em seu campo de visão além do próprio objetivo.

Ele estava perfeito naquele dia. Era aquele olhar que ela gostava de ver; que a inspirava, que lhe dava a certeza de que, quando estava na quadra, nem mesmo o dissabor de uma derrota a faria infeliz.

O encanto se dissolveu no instante em que a bola voou em direção ao aro, quicou sobre ele e derrapou para fora. Foi como o desfazer violento de um conto de fadas que se despedaçava em cacos de vidro imaginários. Os semblantes de expectativa se transmutaram em tristeza pura, enquanto os de preocupação, do time oposto, se desmancharam em alívio.

O árbitro apitou, invalidando o ponto, e anunciou a abertura para um rebote.

Emiko mirou Kai, que parecia incrédulo diante do fato de ter errado aquela cesta, e depois para os companheiros de time que demonstravam estar tão espantados quanto o moreno. E a partida não parou, pois, bastou que a bola voltasse para o jogo para que Rei, ávido por aproveitar a oportunidade de marcar, se deslocasse com toda a velocidade que pôde em direção ao outro lado da quadra. Naoki o acompanhou, seguido do capitão, mas a ruiva, ainda marcada pelo assombro, observava um ala incrédulo que ainda custava a acreditar no que tinha acabado de acontecer.

Em uma jogada combinada e ensaiada inúmeras vezes, Rei e Naoki trocaram passes rápidos enquanto driblavam os adversários e se aproximavam da área restritiva. Esperavam que o loiro é quem fosse pontuar, tanto por sua posição no time quanto pela altura avantajada, principalmente porque ele dava a entender que entraria no garrafão e tentaria uma enterrada ali mesmo. O que aconteceu, entretanto, foi que, antes de realmente adentrá-lo, ele fez menção de arremessar, flexionando os joelhos para um possível salto, e os ludibriou ao executar um passe arriscado por baixo do braço de um deles.

Rei agarrou a bola com firmeza e arremessou-a com sucesso para uma cesta de três pontos.
O juíz apitou o fim do primeiro período.

————— ♣ —————

Após incansáveis horas de busca, e de vasculhar todos os lugares possíveis onde ele poderia estar, finalmente o encontrou na quadra de esportes da escola. Tinha uma cópia da chave e isso lhe dava passe livre a qualquer horário. E justo naquela tarde de sábado, no dia do almoço em família planejado pelo pai de ambos — que deveriam estar uma fera àquela altura —, tudo o que Hibiki menos queria era ouvir o discurso de sempre; sobre o futuro, sobre os planos chatos e, principalmente, sobre o quão imprudente estava sendo ao passar tanto tempo enfurnado na escola treinando “aquele jogo idiota”.

— Finalmente eu te achei! — Exclamou Emiko ao apoiar as mãos no joelho enquanto recuperava o fôlego. — O que diabos deu em você, por que saiu daquele jeito?

— Eu precisava tomar um pouco de ar. — Respondeu o irmão com um sorriso despreocupado e com a bola de basquete nas mãos.
O lugar estava silencioso e vazio.

— Claro. — A ruiva abriu os braços em ironia. — Porque a rua na frente do restaurante não era o suficiente; você tinha que andar mais de um quilômetro para vir em um local fechado, que contraria toda a ideia de “tomar ar”, e deixar o papai furioso.

— Ele é forte, vai superar. — Deu de ombros com um olhar brincalhão e fez sinal com a cabeça para que ela se aproximasse.

A ruiva ergueu a sobrancelhas, espantada com a coragem ele demonstrava mesmo conhecendo o temperamento do pai, porém o seguiu.

— Quer tentar uma cesta?

— Eu? — Indagou estupefata. — Não não, isso... Isso não é para mim. Você é o astro da quadra aqui, maninho.

— Vamos, tenta. — Hibiki insistiu.

A ruiva concordou e ele a ajudou, posicionando-se atrás dela, a arremessar e acertar a bola na cesta logo acima de sua cabeça. Ela sorriu.
Havia uma fagulha de felicidade incendiando seu coração.

— Nunca esqueça disso. — Hibiki murmurou, virando-se com um semblante decidido, e fitou a irmã. — Existe um lugar para todos nós. Um lugar onde nos sentimos seguros, acolhidos, onde todas as preocupações parecem finos grãos de areia. Um lugar onde o nosso coração bate acelerado, onde nos sentimos empolgados o tempo todo, onde rimos e choramos, onde nos importamos; porque vai ser importante. Porque, quando estamos nele, fazemos diferença. E a quadra, essa quadra, é esse lugar para mim.

“Eu sei que o papai quer que eu seja um advogado de sucesso, que eu trabalhe com ele e, talvez, no futuro, assuma a empresa, mas... eu não quero. Eu pensei muito sobre isso. Tentei seguir esse rumo, no início, porque pensei que seria o certo a fazer e porque eu não queria decepcioná-lo, mas eu percebi que não seria feliz assim. Eu não seria feliz preso em escritório. Funciona para algumas pessoas, não para mim. Quando eu estou aqui, com os caras, eu sinto que estou fazendo o que nasci para fazer, e você não faz ideia do quão incrível é a sensação. Aqui eu me sinto livre. Eu quero vencer uma competição, ergueu o troféu e urrar, quero gritar para o mundo ouvir que Hibiki Kojima está chegando.”

Ele sorriu para ela e acrescentou:

— Eu espero que você se sinta assim um dia, Emiko. Que você encontre o seu “lugar especial”.

————— ♣ —————

O segundo período estava para começar e o curto intervalo entre ele e o primeiro foi utilizado para trocar recobrar o fôlego e repôr o time em campo. O treinador havia percebido as falhas no posicionamento de Kai e, embora não entendesse o que estava acontecendo, decidiu mantê-lo em jogo. Precisava guardar as jogadas mais agressivas para o fim pois, analisando o modo de jogar da Wakusei, tinha percebido que eles costumavam avançar muito no inicio, para garantir a pontuação, e diminuíam o ritmo conforme a partida se desenrolava. A estratégia era tentar pontuar arremessos longos e seguros, de preferência cestas de três pontos, mas tanto a média de altura dos adversários era maior quanto a experiência em campo.

Estamos indo bem. — O homem mais velho disse quando todos se reuniram próximo aos bancos.

‘tá brincando? — Naoki, cansado e suado, o defrontou. — Ou você está cego ou... ou não está enxergando. Quer dizer, os caras estão acabando com a gente!

Seguramos mais do que eu esperava. — Ryūma se impôs.

Vamos continuar mantendo a posição. Nomura, você fica na defensiva e só marca quando estiver seguro. Tente repassar a bola para o Naoki sempre que perceber uma brecha. — O treinador se pronunciou em tom severo para Kai antes de se voltar para o capitão. — Nagai, você faz o mesmo.

Ryūma, ostentando o número nove na camisa, balançou a cabeça em concordância.

Kojima e Takagi ficam no banco até o próximo tempo.

Ambos se sentaram, enquanto o restante, acompanhados dos reservas que substituiriam os titulares fora de jogo, se distanciavam em direção à quadra sob o som remanescente do apito. Kai e Emiko trocaram olhares nervosos rapidamente.

No instante em que a partida recomeçou, a menina ergueu os olhos para as arquibancadas. Em meio a muitos rostos desconhecidos, que se dividiam entre alunos de ambas as escolas, berrando e gritando em incentivo aos times, encontrou, ali, no cantinho, a figura de sua mãe. Ela sorria e acenava. O espaço vazio do lado esquerdo da mulher fez o estômago da garota borbulhar.

“Pai...”

Embora ele tivesse deixado claro que não compareceria, Emiko ainda nutria esperanças dentro de si. E o despedaçar delas doía muito.
Seu olhar foi tragado, logo em seguida, para um garoto de cabelos castanhos que a olhava fixamente e estava posicionado do lado direito de sua mãe.
Era Hal.

————— ♣ —————

O transe no qual estava imersa, mantido, principalmente, graças à brandura inesperada dos lábios do garoto de cabelos castanhos, fora bruscamente interrompido pelo ruído estrondoso que parecia vir do lado de fora do vestiário. Ambos se separaram nervosamente — primeira ela, e depois ele — e se voltaram na direção do som. O que quer que tivesse sido, no entanto, parecia ter desaparecido tão repentinamente quanto chegou. A atmosfera mágica e silenciosa tinha sido quebrada tão profundamente que atordoou aqueles que dela participavam.

— Desculpe. — Hal disse. — Eu não queria te deixar desconfortável.

— Tudo bem, eu... — Suspirou. Ponderou sobre o que diria a seguir, mas a pressão do momento chegava a ser mais esmagadora que a da quadra.

— Pode falar. — Ele encheu o peito e se esforçou para passar uma sensação de confiança. — Já faz muito tempo que a coisa que eu mais quero é ouvir você, Emi.

— Eu desejei esse momento por muito tempo. — O coração da ruiva retumbava dentro do peito como uma orquestra frenética. — Desde o momento em que te conheci, naquele dia chuvoso em que você se mudou para a minha rua, eu gostei de você. Eu não sei se o amo, porque eu nunca senti isso por ninguém e não tenho nada com o que comparar, mas a sua existência, os dias que passávamos juntos, as coisas que fazíamos juntos, todas essas coisas me faziam indefinidamente feliz.

“Você não tem culpa pelo que aconteceu, ninguém tem, eu finalmente entendi que nem eu mesma tive apesar de ter me punido todo esse tempo por acreditar no contrário. Eu sei que você pensa que eu fui covarde. Eu fugi, sim, porque não me sentia capaz de lidar com a partida dele que me assombrava em todos os lugares para onde eu ia. E isso me mudou. Eu não sou a mesma pessoa que partiu no início do ano, assim como não sou a mesma pessoa que voltou depois disso. Eu cresci e acho que agora eu consigo conviver com a ausência do meu irmão ainda que ele tenha levado consigo um pedaço grande do meu coração. No entanto, todas as coisas ao meu redor também mudaram, e isso inclui como eu me sinto em relação aos outros.”

Hal a olhou com ansiedade. Ele se esforçava para esconder a inquietação que agitava dentro de si. Queria ouvir o que ela tinha a dizer, porque era a primeira vez que ela se abria tão profundamente desde o dia da tragédia, mas seria hipócrita se não admitisse que as palavras que ele mais aguardava não tinham nada a ver com Hibiki.

— Eu gosto de você, e esse sentimento não vai mudar. — Proferiu, finalmente. — Porque ele é puro e verdadeiro. E por isso eu espero que você entenda que existem coisas que eu preciso fazer e que compreenda as decisões que eu tomar.

— Eu te amo, Emi. — Ele encheu os pulmões de ar e sentiu a garganta ficar seca. — Eu amo você.

Hal tomou a mão da menina com a sua, deslizando os dedos dela por entre os seus delicadamente, e os dois se fitaram em silêncio por algum tempo. Ainda havia muito a dizer, mas palavras eram dispensáveis. Assim como sempre havia sido, o que era importante ficaria subentendido.

O som estridente do apito do árbitro vindo da quadra foi marcou o fim da cena. Os dedos da menina ruiva deslizaram singelamente e desvencilharam-se dos dele. Hal proferiu uma frase em voz baixa, quase inaudível, que Emiko guardou para si dentro do peito. Ela partiu, sem olhar para trás, em direção à porta do vestiário que a conduziria direto para a quadra.

————— ♣ —————

Os últimos minutos do segundo período estavam tão difíceis e disputados quanto os do anterior. A bola ia para lá e para cá, ora pelo ar ora quicando no chão, e os movimentos sincronizados de ambos os times eram aclamados pelos espectadores enlouquecidos que urravam e gritavam o nome dos participantes. O placar estava aberto em quarenta para o time da casa contra quarenta e cinco dos visitantes. Pés dançavam sobre o chão da quadra, enaltecendo o gingado preciso e compassado executado pelos jogadores, quando o ala rival conseguiu ultrapassar a defesa alheia e fazer mais dois pontos.

A torcida da Shunkashūtō, desolada, calou-se, enquanto a da Wakusei comemorava com um estardalhaço. A balbúrdia era tanta que o som do apito do árbitro, anunciando o fim do tempo e o início do intervalo de quinze minutos, perdeu-se ali dentro. Os de uniforme azul batiam nas mãos um dos outros, parabenizando-se mudamente pelos pontos feitos, e os de trajes vermelhos se entreolhavam em um misto de confusão e agonia. A diferença entre os pontos, que há pouco tempo estava quase equilibrada, passava a crescer exponencialmente.

Os anfitriões se dirigiram ao banco com uma curta corrida. Estavam suados e sem fôlego. O semblante do treinador estava fechado, refletindo a ansiedade e o descontentamento com o desenrolar do jogo, mas ele não disse nada durante os segundos seguintes. Kai não olhou para ninguém e ficou cabisbaixo durante todo o processo. Ryūma não tirava os olhos dele, demonstrando preocupação, e Naoki parecia um pouco irritado. Emiko e Rei, que até o presente momento estavam sentados esperando para retornar à partida, suspiraram individualmente.
Um ar de derrota circulava no ar.

Ninguém falou que ia ser fácil. — O treinador se manifestou ao dar de ombros. — E a coisa está bem difícil por aqui.

Ainda podemos vencer, treinador? — Ryūma o questionou.

Claro que podemos, você ouviu o juiz apitar o fim da partida?

Todos bufaram.

Agora você, rapazinho... — Ele se dirigiu à Kai de maneira intimidadora. — Você está distraído. Não sei o que diabos aconteceu com você, mas é melhor deixar fora da quadra. Tem muita coisa em jogo aqui. E se você falha, não afeta só a você não; afeta todo mundo. Não puna seus companheiros por seus problemas pessoais. Foque a sua mente aqui. O resto fica para depois. Fui claro?

O moreno ouviu em silêncio e balançou a cabeça em resposta.

Emiko, que não suportava mais a atmosfera sufocante entre eles, aproximou-se do rapaz e cochichou:

Tem um minuto?

Discretamente, ela segurou no braço dele — suado e escorregadio — e o conduziu pelo corredor entre as arquibancadas. Seus olhos, por reflexo, procuraram a mãe e Hal, mas não os avistou a tempo.

Retornaram pelo caminho de outrora, porém, no momento em que o rapaz viu as portas do vestiário e as palavras que tinha ouvido retornaram à mente, ele parou repentinamente. Emiko, por consequência, também parou, e foi ali que seus olhares se cruzaram em uma aceitação mútua de que precisavam mesmo conversar.

Olha, eu sei que você—

Espera. — Ele a interrompeu, segurando-a pelos braços. Embaraçado pelo ato, soltou-a. — Só escuta.

Emiko assentiu.

Eu gosto de você, e você sabe disso. Eu nunca disse abertamente antes, mas eu tenho certeza que dei todos os sinais para que você percebesse. E eu sei, não somos nada um do outro, mas... eu ouvi a conversa entre você e o engomadinho. Ele gosta de você. Eu não planejava escutar, mas escutei.

Ela entendeu a procedência do barulho que os tinha interrompido.

Eu estou sendo um imbecil. Quer dizer, eu não tenho direito nenhum de me sentir assim. Você não me deve nada. — Ele coçou a cabeça visivelmente nervoso. — E sei que estou estragando tudo ali na quadra porque eu não consigo me concentrar. A cena ficando vindo na minha cabeça e eu não consigo fazer nada.

Kai... — Emiko tentou falar, mas fora novamente interrompida.

Desculpa. — Ele disse com firmeza enquanto pousava as mãos sobre os ombros alheios mais uma vez. — Não por gostar de você — não, eu não vou me desculpar por isso —, mas por estar fazendo tudo errado. Eu sou um idiota. Você lutou muito para chegar aqui e eu sei o quanto esse jogo significaria para o Hibiki, o quanto significa... para você. E por gostar de você, tudo o que é seu passou a ser importante para mim. E independente de qualquer coisa, eu vou te dar essa vitória, Emiko. Para você e para eles. Confie em mim.

Emiko sorriu. Covinhas se formaram em suas bochechas e ela apoiou a própria mão sobre a de Kai em seu ombro. Antes que ela pudesse dizer qualquer coisa em resposta ao curto monólogo de seu companheiro, Naoki apareceu no final do corredor e gritou para que eles voltassem logo.

Naquele momento, mais do em qualquer outro, ela sentiu que era capaz de proteger seu sonho com as próprias mãos. O sonho que também foi de alguém muito importante.

O juíz segurava a bola entre os dois jogadores mais altos de ambos os times, posicionados dentro do Círculo Central, enquanto o resto observava ansioso para ver quem começaria o terceiro período com a posse de bola. Kai, Ryūma e Naoki, que já tinham estado em dois períodos consecutivos, agora assistiam do banco. Os dois atletas — Rei e o pivô substituto da Wakusei — se encaravam ameaçadoramente. As faíscas invisíveis que brotavam dos olhos alheios declarava que nenhum deles estava disposto a ceder.

O apito mais uma vez se fez presente.

Saltaram os dois, mas foi Rei quem deu um tapa na bola. Ela chocou-se com força no chão e foi direto para a mão de Emiko. Em movimentos rápidos, ela deu os primeiros passos em direção à área de defesa. Seus olhos acompanhavam o fluxo dos outros jogadores que se aproximavam para tentar contestar. Um deles se interpôs em seu caminho, mas ela o driblou e conseguiu continuar. Logo à frente havia uma marcação de zona que a impossibilitaria de prosseguir. O ato seguinte foi um passe de ombro, firme e certeiro, para o ala reserva.

Ele livrou-se da própria marcação, entrou na área restritiva e tentou um arremesso, mas a bola bateu na Tabela, contornou o aro e caiu. O pivô da Wakusei, graças à sua altura vantajosa, conseguiu o rebote. No momento em que ele quicou a bola no chão, entretanto, Emiko, que tinha se aproximado sorrateiramente e o marcava, roubou a bola e a tomou para si.

Ela esvaziou a mente. Os sons das arquibancadas, dos apitos e de seus companheiros de equipe gritando foram lentamente se distanciando enquanto tudo parecia acontecer em câmera lenta. Deslizou os dedos pela superfície áspera da bola, sentindo intimamente a textura, segurou-a com firmeza e arremessou-a novamente.

O resultado foram dois pontos.

A sensação de marcar um par de pontos pela primeira vez era tão poderosa que quase a fez perder o ar. Emiko tentou não sorrir tanto, não queria deixar tão claro que era a primeira vez que ela acertava uma cesta difícil, mas era quase impossível. Mordia os lábios, as mãos tremiam, seus olhos vasculhavam o cenário em busca de um porto onde pudesse depositar aquela inquietação que a queimava por dentro. Ergueu os olhos e percebeu a mãe sorrindo e acenando, entusiasmada, e Hal, do lado dela, igualmente feliz.

Foi quando seus olhos encontraram os do ala, no entanto, sentado no banco, sorrindo de canto, que ela se sentiu verdadeiramente feliz. Quase podia ouvi-lo dizer “bom trabalho, Kitsu”. Gostava do tom de voz que o rapaz tinha. E do tom brincalhão e arteiro com o qual sempre se dirigia a ela. Sua pele morena brilhava ao ser tocada pelas luzes do ginásio, como as dunas de um deserto infinito e sedutor, e seu aceno de cabeça foi como a aprovação que ela sempre esperou dos outros.

Ryūma e Naoki estavam ao lado dele, e também sorriam, o primeiro balançando a cabeça positivamente enquanto o segundo erguia os polegares.
Pela primeira vez naquele jogo, a possibilidade da vitória parecia uma realidade palpável.


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Notas finais do capítulo

Sim, conforme vocês viram no título e no final do texto, ainda tem a segunda parte do desfecho, aehooo, todos comemoram! ヽ(⌐■_■)ノ♪♬ Quando eu parei para escrever o capítulo, me arrependi de não ter reservado os dois últimos (e não apenas o último) para o jogo, porque ficou IMENSO, chegou aos 8k! Então eu dividi em dois capítulos. E isso 'tá me dando toc porque eu detesto número quebrado. Eu estou pensando em escrever um epílogo também, pra ficar nos 12, porque número par eu gosto. Mas ainda não é certo. Enfim, icem as bandeiras!!1!1! Em que time vocês estão? Hm hmmm? Comentem pra mim~