The L World - 1984 escrita por Leo Guedes


Capítulo 1
Capítulo 1- E se der errado? Que dê.


Notas iniciais do capítulo

Olá leitores...
Leitores antigos não me matem, eu só tinha tempo pra postar duas, então...
Leitores novos, bem-vindos...
Espero que curtam e comentem...
Enfim, boa leitura...



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1984, 23 de Fevereiro

Maria Fernanda Winch, aquela garota linda de 15 anos com os cabelos cacheados da mesma cor que seus olhos negros, estava andando pelo colégio durante o intervalo das aulas com seu ar inocente. Era impossível vê-la passar e resistir ao impulso de virar a cabeça para olha-la com mais atenção.

Então ela chegou ao seu destino, a sala de artes no fim do corredor norte. Sempre ficava vazio naquele horário e não precisava se preocupar de ser pega com o mau exemplo supremo do Centro Educacional São Sebastião.

Lena Sarajevo, 18 anos, era uma rockeira típica com seus jeans rasgados, camisetas escuras e botas pretas. Os olhos eram sempre cobertos por uma camada de maquiagem escura que dava à garota um ar rebelde e encrenqueiro, mas Nanda não conseguia ver nada além do sorriso doce que Lena não conseguia conter quando estavam juntas.

Logo ao abrir a porta, Maria Fernanda suspirou ao ver a garota encostada na bancada com os braços cruzados. Vestia uma camisa do Ramones com as mangas longas erguidas até os cotovelos, uma calça jeans desbotada e rasgada nas coxas e nos joelhos, botas pretas que iam até o meio da panturrilha, pulseiras de couro com pontas e spikes nos dois pulsos e os cabelos soltos e cacheados cheios como uma juba de leão. Os olhos de Lena se ergueram e um sorriso se espalhou pelos lábios ao constatar quem havia chegado.

—Oi. –ela disse desencostando da bancada e levando uma das mãos ao bolso da calça enquanto bagunçava o cabelo com a outra.

—Oi. –a outra respondeu fechando a porta atrás de si, então foi se aproximando. –Não sabia que estaria aqui. Dissemos que a semana passada tinha sido a ultima vez.

—Não, baby. –o sorriso doce converteu-se em maldoso, o que ficava extremamente atraente nela. –Você disse que não deveríamos mais fazer isso e eu disse “certo”, mas, caso não tenha percebido, ironia é meu idioma nativo.

—Você é uma idiota. –Nanda revirou os olhos e se virou para ir embora, mas Lena a alcançou a tempo de virá-la para si novamente e prensá-la contra a porta de madeira. –Argh. Uma grande idiota.

—Sou. E você também é por gostar de mim mesmo assim. –dito isso, Lena uniu seus lábios com os da baixinha de forma intensa.

Maria nem se deu ao trabalho de tentar resistir, não conseguiria. Nunca conseguia. Estava inegavelmente apaixonada por aquela roqueira irritante. Por quê? Porque não podia ter o bom senso de ouvir todos os comentários que rodavam pelos corredores do CESS? “Ei, ei! Não chega perto dessa tal Sarajevo não. Ela é encrenca pura. Olha só pra ela. Dá até medo de passar perto.”.

Mas não, ela chegou perto, deu uma chance para conhecer o que havia por trás das roupas, da maquiagem e dos fones do Walkman. Descobriu o lado doce, inteligente e divertido daquela garota tão estranha. Aprendeu a amar cada defeito e idiotice presente nela. E nada podia fazer para mudar isso, pois ela lhe retribuía com a mesma força devastadora.

Porém era mais que óbvio que aquilo nunca daria certo. Elas nunca sairiam juntas de mãos dadas pela praça principal da cidade como todos os outros casais, jamais teriam um encontro romântico ou ficariam abraçadinhas em algum lugar em que qualquer pessoa pudesse vê-las. Alias, não conseguiria nem olhar para ela direito em público. Em nenhuma circunstância poderia deixar que descobrissem que estavam juntas.

Conseguia imaginar a repulsa nos olhos de seus amigos se soubessem o que ela era, podia ver nitidamente em sua cabeça como seus pais ficariam decepcionados, seus avós surtariam sem sombra de dúvida e seus irmãos com certeza não a perdoariam nunca.

Mas quando estava nos braços de sua rockeira, nada disso parecia ter a mínima importância. E quanto mais tentava se agarrar a algum canto racional de sua mente, mais seu corpo se atirava na insanidade daqueles lábios com sabor de cigarros mentolados.

Lena segurou os cabelos na nuca de Fernanda e os puxou levemente, fazendo com que sua cabeça fosse para trás dando mais liberdade para explorar sua boca com a língua. Nanda, por sua vez, estava cada vez mais envolvida com aquele beijo enlouquecedor e suas mãos ganharam vida própria e entraram por baixo da camisa da rockeira, arranhando fortemente a pele levemente morena.

—Ai. –Lena murmurou embora aquela dor fosse, de alguma forma, prazerosa.

—Lena. –Nanda gemeu cravando ainda mais as unhas na rockeira quando os lábios dela foram descendo por seu pescoço ameaçando marcar.

—Nandada. –respondeu com um sussurro que causou arrepios intensos na mais nova. –Eu quero tanto você.

—Isso é tão errado. –tentava manter a voz controlada, mas continuava saindo como um gemido estrangulado. –Tão errado.

—Diz que não quer. –Lena se afastou apenas o bastante para olhar dentro da imensidão negra dos olhos de Maria. –Diz e eu nunca mais piso nessa sala, nunca mais te procuro e esqueço que um dia de conheci e considerei o ser humano mais encantador que já existiu.

—Eu... –as sobrancelhas da mais velha se ergueram em um questionamento mudo. –Eu... Lena, é difícil pensar direito com você tão perto.

—Tá bom. –a garota de preto se afastou e ergueu as mãos poucos segundos antes de cruzar os braços. –Diz que não quer. E antes de qualquer coisa, sinto-me no dever de lembra-la, senhorita Winch, que não se deve mentir.

—Argh. –a baixinha deixou a cabeça ir para trás até encostar-se à madeira fria, cada músculo de seu corpo ficando tenso pouco a pouco. –Como vou saber o que quero, Sarajevo? Só tenho 15 anos.

—Está me acusando de te manipular? Não sou muito mais velha que você, ainda estou no colégio e moro com meus pais. Ainda canto ridiculamente alto e me acabo de pular em shows de rock and roll sem pensar que vou levar uma baita de uma bronca quando chegar em casa. Não aja como se a culpa fosse minha.

—Não foi isso que eu quis dizer. –Maria bufou e voltou a encarar seu maior pecado. –Eu só quero dizer que, tudo bem, eu me sinto desgraçadamente atraída por você e não posso negar, mas isso não me define, define? Eu posso não ser assim. Eu não deveria vir aqui e me perder na sua boca com gosto de menta. Talvez eu devesse me sentar e abrir um livro, ler e reler mil vezes a mesma página até que não fosse só mais uma tentativa frustrada de pensar em você.

—E se te definisse? Qual seria o grande problema nisso? –Lena explodiu enquanto começava a vascular os bolsos em busca se seu maço de cigarros.

—Qual seria?! Argh. Qual seria o grande problema nisso?! Isso é errado! Somos... Somos duas garotas, duas pessoas do mesmo sexo, Lena!

—E daí? Porque você acha que isso é errado? Quem disse que isso é errado? –inquiriu estourando a bolinha do palito preto e colocando-o na boca enquanto guardava o maço para em seguida pegar o isqueiro.

—E daí?! –Nanda se aproximou e puxou o cigarro dos lábios de Lena, jogando-o no chão. –Isso É errado, Sarajevo! Não é normal! Nem... natural.

Fernanda estava esperando que a rockeira ficasse furiosa com sua atitude e explodisse com gritos e mais gritos, mas ao invés disso ela riu. Riu muito. Riu uma gargalhada tão gostosa que com certeza teria levado a mais nova à acompanha-la se não a tivesse deixado tão confusa.

Pacientemente, Lena puxou novamente o maço do bolso ainda segurando o isqueiro, pegou um dos cigarros e estourou a bolinha, levou-o a boca e com toda a calma do mundo guardou o maço e acendeu a ponta do palito com os olhos fixos nos de Nanda.

—Não é... “normal”. –riu fracamente enquanto deixava a fumaça sair pelo nariz com uma sensação refrescante devido ao mentol. –Nem “natural”. Essa tua teoria é muitíssimo interessante. Gostaria muito se entende-la, senhorita Winch. Caso a senhorita disponha de tempo para me explica-la melhor, é claro.

—Por Deus, Lena, pare com a ironia.

—Ironia? Imagine. Só estou curiosa para saber como você pode não achar isso “natural” já que todos os seus hormônios explodem desejando o meu corpo, meus toques.

—Lena...

—E quanto à normalidade... –tragou mais uma vez, deixando os pulmões cheios por alguns instantes. –Você quer mesmo ser “normal” em um mundo onde os países atiram bombas uns nos outros achando que assim terão paz? Quer mesmo achar que é errado simplesmente amar alguém que te faz bem? Negue o quanto quiser, mas eu sei que te faço bem.

—Você acha que eu te amo?

O sinal que dava fim ao intervalo soou pelos corredores do CESS, mas nenhuma das garotas deu a mínima atenção.

—Espero que sim porque te amar sozinha seria realmente... Inconveniente. –Lena sorriu de lado e em seguida mordeu o lábio inferior, não queria parecer nervosa, mas havia de fato declarado o já óbvio amor que sentia pela mais nova.

—Argh. –Nanda praguejou baixinho e virou de costas por alguns segundos, apertando o próprio cabelo com ambas as mãos. –Sarajevo você é tão...

—O que?! Eu sou o que? Irritante? Petulante? Idiota? Chata? Estranha? Manda ver, Winch. Não vai ser nada que eu nunca tenha ouvido de você.

—Eu estava pensando em dizer “sexy”, mas é, tenho que concordar que você é tudo isso também. Irritante, petulante, idiota, chata e estranha.

Lena riu mais uma vez e se aproximou de Maria Fernanda, abraçando-a com força. –E você me quer mesmo assim.

—É, eu quero. Eu te quero muito.

—Na verdade, eu não te deixaria ir mesmo que você quisesse. Sinceramente, eu não conseguiria desistir de você.

—Eu já esperava isso de você, Lena Sarajevo.

—Não pode me culpar, o coração quer o que ele quer. Simples assim.

—Não é simples, mas é assim.

—Já deveríamos estar na sala de aula.

—A gente podia fingir que não sabe disso.

—Eu gostei da sua ideia.


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Notas finais do capítulo

E aí? Como ficou? Coisa de época, meio complicado de escrever, mas eu mesma gostei do resultado... E vocês?
xoxo
Atenciosamente, Déborah Santana...

P.s.: Eu não sei se existiam cigarros mentolados nessa época e sinceramente não é um assunto que muito me interessa, só não vejo a Lena fumando cigarros convencionais.



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