Moon escrita por SurfinBird


Capítulo 1
Moon




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A última coisa de que ela se lembrava eram silhuetas femininas dançando contra a luz e uma mão lhe escapando dos dedos. Como quem acaba de acordar de um sonho, ela lembrava apenas de sentir fortes emoções e de ter se esquecido de alguma coisa importante. Quem ela era? Tentava se lembrar, assim que despertava do que parecia ser um sonho profundo. Ela surgiu em um clarão-relâmpago sob as nuvens coloridas e cortou os céus como um foguete. Deu-se conta em um sobressalto que estava dentro de um avião monomotor, em um céu cor de rosa. Não fazia ideia de como acabara naquele lugar, mas sentia que sabia muito bem controlar aquele avião. Apesar disso, talvez fosse tarde, o veículo mirava diretamente ao chão e a garota só pode fazer uma manobra desesperada para tentar recuperar a altitude. Arrastando-se pelo chão de mal jeito, o avião fez um pouso de emergência e acabou chocando-se contra uma pequena casa logo a frente, no meio do nada onde existia somente verde. A casinha de madeira fez-se em pedaços, explodindo para todos os lados com a queda do monomotor.

Era Asami Sato, a aviadora. Podia agora se lembrar claramente de seu nome. Curiosamente, notava também que não se machucara com a queda. Asami retirou seu capacete e avaliou seu estado para determinar o quanto absorvera o impacto, como fazem os pilotos. Ela vestia uma jaqueta justa que completava um traje escuro. Sentindo-se um tanto tonta, ela deixa seu avião para pisar naquele ambiente estranho que lhe parecia um tanto alienígena. Aparentemente, se achava agora no que restou da sala de estar, com todos os móveis do cômodo despedaçados e louça espatifada no piso.

Haviam também pequenas molduras para retratos familiares, todas vazias, caídas sobre a estante, que pareciam lembrar Asami que ela mesma estava a procurar por algo importante, ou alguém, antes do acidente. Podia sentir seu coração acelerar quando pensava no assunto. Mais ainda quando levou um susto com a aparição repentina de uma espécie de homem-peixe. O peixe humanoide exibia um sorriso irreal e quase ria do susto que dera em Asami.

- Não se assuste! Não é sempre que recebo visitas de uma moça bonita como você. Você quer chá?

- Visita.... Você morava aqui? Me desculpe pela casa, se tivesse algo que eu pudesse fazer!

- Você pode aceitar minha companhia! – O peixe já servia o chá. – Não sinta pena da casa. Não me importo com ela. Para falar a verdade, não me importo com coisa alguma. Já você, coitada, parece um tanto perdida. De onde veio?

- Eu não me lembro. Mas lembro de estar em busca de alguém importante para mim. Você acha que pode me ajudar?

- Tudo em seu tempo. O chá vai te ajudar a esquecer esse assunto. Por enquanto, podemos nos conhecer. Me chamam Kommienezuspadt, e você?

- Asami.

Não pareceu a Asami que demorou para que novos seres coloridos amigáveis em formas de animais se juntassem à mesa para o chá com Kommienezuspadt, mas na verdade, ela perdia a noção do tempo. O homem-peixe era livre de desejos e objetivos, portanto o tempo lhe escapava entre os dedos. A chaleira com chá era infinita e todos estavam propensos a viver naquela mesma mesa por muito tempo, já que nada tinham para fazer. Aos poucos, os rostos tornavam-se familiares à Asami. O Lontra, a flor de lótus, a esfinge, o ganso. Sem se dar conta, fora pega pelo feitiço do chá e já convivia entre eles, sempre rindo como os outros. Mas felizmente, certo dia teve um lapso momentâneo de lucidez.

- Eu não quero ficar aqui para sempre, eu... me lembro de que procurava por alguém importante.

- Você é quem sabe, aqui você viveria feliz para sempre. – Diziam os convidas em coro.

- Não posso ficar aqui nem mais um minuto! - Asami levantou-se, determinada.

Ninguém se movera para reconstruir a casa aquele tempo todo, então seus destroços ainda estavam no exato mesmo lugar. Vasculhando, conseguiu encontrar algumas peças para construir uma máquina que a levasse para longe. Não demorou muito para transformar um misto dos restos da casa e do avião em uma espécie de automóvel. Os seus novos amigos em seu ciclo infinito de inocentes risadas não sentiriam sua falta, então Asami não se deu o trabalho de se despedir. Kommienezuspadt logo a esqueceu.

Ainda que não soubesse em que lugar do mundo estava ou mesmo quem era, Asami agora sabia o que queria. Ou pelo menos, sabia que queria alguma coisa. Ela conduzia o carro à esmo, esperando que seu instinto a levasse pelo caminho certo. Conforme ela avançava, as nuvens apresentavam um estranho tom encardido, como se fossem bonitas há um tempo, mas não mais. Chegando mais perto, podia distinguir uma silhueta gigantesca e uma trilha que levaria à uma clareira. Asami deixou o carro estacionado e deu de cara com uma placa.

“CUIDADO, GIGANTE MIRACULOSO”

Sem demonstrar medo, Asami atravessou a trilha e não tardou para encontrar-se com o gigante. A floresta era coberta por um nevoeiro, portanto a forma definida do gigante não era visível de longe, mas agora a visão era bem clara. Tratava-se na verdade de uma moça morena bem crescida, cujo corpo superava a altura das árvores e escapava da floresta. Ela parecia brincar com os quatro elementos, fazendo malabarismos com cada um deles, mais parecendo dançar um balé exótico. Uma labareda de fogo quase atingiu Asami, que recuou alguns passos por precaução. Por dentro, a mata era feia e morta.

- Eu sou Korra! – Disse o gigante. – Você não tem medo de se aproximar? Ninguém tem coragem para me enfrentar! Pode começar a correr!

Era hora de mostrar coragem, e fugir nem mesmo passava por sua cabeça. Asami aproveitou a oportunidade para provocar um pouco o gigante. Deitou-se na grama e ficou observando o céu fechado. Todas as tentativas do gigante de chamar a atenção dela foram infrutíferas, então Asami fechou os olhos.

- O que você tem? Está me ignorando? – O gigante implicou.

Por um momento, tudo ficou mais negro, mas durou pouco. Ninguém queria se aproximar ou a compreendia, e mesmo os raros corajosos queriam se manter longe daquele orgulho exacerbado. Mas a chegada de Asami forçou o gigante a repensar sua atitude e abordá-la de outra maneira. Logo, não apenas as flores e folhas tinham vida renovada, mas também os galhos, relva e raízes. Algumas árvores até sorriam. O céu abriu-se como cortina e o mais impressionante de se olhar, o gigante começava a diminuir de tamanho cada vez mais. Até que o gigante se tornou apenas Korra. Acostumando-se com o novo tamanho, levou as mãos à testa sentindo uma estranha tontura. Korra sentia-se como se tivesse acabado de acordar de um pesadelo. Esfregou as mãos nos olhos, logo em seguida piscando repetidas vezes para desembaçar a visão e enxergar a bela moça deitada à sua frente, de olhos fechados.

- Ei. – Chamou Korra, aproximando-se lentamente. Sua voz não era mais imperiosa e trovejante como antes. – Quem é você afinal?

Korra se ajoelhou em frente a Asami e ficou olhando-a descansar. Era como se já a conhecesse há muito tempo. Seus traços eram perfeitamente bem desenhados e sua pele artisticamente pintada. Era uma boneca de porcelana e uma guerreira implacável ao mesmo tempo. A impressão causada em Korra fora tão grande, que ela acreditou que poderia se machucar quando tocasse em seu rosto com a ponta dos dedos. Bastou esse pequeno gesto para que a aviadora abrisse os olhos, arregalando-os, bastante surpresa.

Aliás, Asami não presenciou a transformação do ambiente e acreditou ter aparecido de repente em um lugar completamente diferente. Do mesmo modo, não reconhecia aquele rosto moreno de olhos incrivelmente azuis, pois antes a beleza de Korra estava ofuscada. Se fosse mais ingênua, talvez pensasse que o gigante a tivesse matado e agora fora acordada no céu por um anjo, mas logo raciocinou que eram a mesma pessoa.

- Você está bem... Asami? – Korra se assusta com as próprias palavras.

- Ah, sim! Eu só estava sonhando acordada.

- Não é estranho que eu tenha adivinhado seu nome?

- Um pouco, mas de alguma forma igualmente estranha, não estou surpresa.

Olharem profundamente nos olhos uma da outra, resgatando aos poucos algumas impressões. Tecnicamente, não há diferença concreta entre a imaginação e a lembrança, e o passado só existe na lembrança das pessoas. Ou seja, o passado é alterável. É o que ouvira dizer uma vez. A mente é traiçoeira, e talvez tivesse danificado a sua naquele acidente. Um momento de mãos dadas, uma dança, beijo. Imagens vivas ganhando cores. Tudo acontecia novamente na cabeça de Asami, que aos poucos convencia a si mesma de que não haveria como ser apenas imaginação.

Pressentindo que havia encontrado o elo perdido com seu passado, Korra se levanta com ânimos renovados e ajuda Asami a ficar de pé também. Pegando-a pela mão, sente seu coração guiando-a para o caminho que as duas deveriam trilhar. Muita mata havia crescido ao ponto de quase ocultar aquela passagem, mas rastros de uma antiga trilha ainda eram visíveis por onde Korra e Asami atravessavam. Quando o caminho se tornara muito difícil, Korra dobrou a terra em duas para abrir uma passagem. E quando tiveram que atravessar o rio, também controlou a água para parti-lo em dois.

No fim do caminho, um antigo trem negro e trilhos antigos, qual elas embarcaram. Asami não viu dificuldade para conduzi-lo, como se tivesse nascido para isso, e assim elas puderam partir. Não havia necessidade de combustível. Para elas era bem claro, que já haviam se encontrado em outro mundo ou outra vida.


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