“O amor salva você de você mesmo.
É a escada para quem está no fundo do poço.
É a bússola para quem está perdido.
É a luz, é a salvação para quem está
refém da escuridão.”
Laureane Antunes

Sakura, eu sei quantas vezes você teve que conviver com a distância entre nós. Afinal de contas, quando ainda éramos meras crianças eu já a impunha a você.
Acompanhei, sem muita proximidade, a evolução do sentimento que você tinha por mim. Não sei precisar quando, mas percebi que aquela garota apenas interessada na minha aparência deixou de existir.

Havia algo maior envolvido.

E apesar da minha relutância, você conseguia me atingir com seus cuidados, sua preocupação, suas tentativas de aproximar-se...
Você me atingia, mas eu não podia me importar o suficiente. Não podia permitir-me sentir.

Mesmo assim, eu sentia.

Eu senti um ódio profundo ao vê-la machucada na floresta da morte. A vontade de acabar com todos aqueles que ousaram tocar em você. Foi a primeira vez que me perdi em meio a esse sentimento sujo e foi a primeira vez que você me resgatou dele, abraçando-me com força.

Aquele vínculo, aquela preocupação... Estava tudo errado. Tanto você, quanto Naruto e Kakashi acabaram alcançando um lugar que eu não poderia deixar que habitassem.

Era necessário retirar vocês de lá o quanto antes. Cortar laços.

E então, naquela noite fria, você estava me esperando. Você sabia da minha partida, mesmo sem eu ter dito nada.

Você sempre me conheceu, afinal de contas. Sempre soube das minhas fraquezas.

Perceber isso atingiu-me de tal maneira que eu não podia simplesmente ir embora sem dizer nada.

"Obrigado, Sakura"

E foi a segunda vez que eu impus uma distância entre nós. Dessa vez, bem mais cruel. Era uma distância física, quilômetros. Nada de correspondência e nem de dar notícias.

Hoje tenho consciência do que você passou por minha causa. Do quanto sofreu. Mas na época eu estava imerso demais na escuridão para perceber. Eu não me importava com mais nada, apenas com meu objetivo.

Eu não me importava.

Eu não podia me importar.

Eu não queria me importar.

O tempo passou rápido demais para mim. Ocupado demais em focar no que desejava do fundo da minha alma, os anos passaram batidos.

Apáticos.

Até que o dia pelo qual esperei toda a minha existência chegou. Vinguei meu clã, matei meu irmão.

A sensação tão esperada de felicidade não atingiu-me. Não havia nem um resquício de alegria, nem nada parecido. Era apenas um vazio incômodo.

Até eu saber a verdade.

E, provavelmente, não há dor maior do que descobrir que você é a causa da morte de alguém que te amava acima de tudo.

Enlouqueci.

Qualquer resquício de luz que ainda existia foi totalmente nublado pelo ódio que habitava meu ser.

Ódio de mim. Ódio de Konoha. Ódio de quem morava naquele lugar. Ódio de quem tentava me impedir.

Ódio de Naruto. Ódio de você.

Eu estava muito no fundo, Sakura. Tão fundo que não via nada além do que estava gravado tão forte em minha mente. Eu iria acabar com todos aqueles que viveram bem e felizes às custas da vida de Itachi.

E mais uma vez eu tentei impor distância entre nós, mas de forma definitiva. No mesmo dia eu tentei te matar duas vezes. Mais uma vez eu cometeria o erro de matar alguém que me amava mais do que eu merecia.

Seu olhar profundamente magoado não atingiu-me. Dificilmente algo me atingiria naquele estado que eu me encontrava, tão fundo para ser tocado.
Nunca terei palavras para agradecer ao Naruto e ao Kakashi por terem me impedido. Afinal, naquela época, eu não me importava.

Eu não podia. Eu não queria.

No final, a distância entre nós não mudou. O tempo passou e a verdade foi revelada diante dos meus olhos. Aquela nuvem negra rareou, embora ainda estivesse ali.

Mas vocês precisavam da minha ajuda na Guerra, e eu já tinha essa condição. Foi quando te vi novamente.

Você cresceu, Sakura.

Tornou-se uma kunoichi exemplar. Corajosa. Uma excelente médica-nin.
Você até mesmo me salvou, quando eu já quase perdia as esperanças de sair daquela dimensão repleta de areia.

Foi quando, depois de tantos anos, nossos olhares se cruzaram. Meu braço mantinha você de pé, em um semi-abraço. E ao olhar pra você, eu não consegui não me importar.

Mas eu precisava.

Ainda tinha que matar Naruto... Ele era o único empecilho para que eu assumisse como hokage e acabasse com aquele sistema corrompido ao qual todos estavam habituados.

Tsc... O quão deturpada a minha mente estava?

Errei.

No meu egoísmo, feri Naruto de forma definitiva. Algo que nem mesmo a Kyuubi conseguiria restaurar.

Feri a mim mesmo.

E só ao ver o corpo ao meu lado, sangrando abundantemente junto comigo, percebi meu erro.

Meus erros. Imperdoáveis, até para mim.

No fim de tudo, que espécia de ser humano eu me tornara?

E lutando com a dificuldade que tenho para expressar o que sinto, assumi meu erro. Falei com Naruto, como devia ter feito há tanto tempo.

E então você surgiu na minha frente, chorando. Feliz por nós dois. Você esperou tanto por aquele momento, não é mesmo?

E me perdoou sem eu precisar falar nada, como você sempre fez. Mas eu precisava falar, porque sem toda a escuridão ao redor eu sentia.

Eu me importava.

Fica difícil analisar, mas talvez eu sempre tenha me importado. Apenas não queria e não me permitia. Mas sem aquela nuvem a nublar minha mente, eu conseguia ver claramente o que há tanto tempo tentei fingir que não existia.

E você chorou. E sorriu. E tratou de nós.

E voltamos para casa.

Com a ajuda de Kakashi e Naruto, fui absolvido dos meus crimes. Vocês me acolheram novamente, mas o que eu fiz não seria facilmente esquecido. Pelo menos, não por mim.

Eu me culpava pelas atrocidades que cometi. Pelo que fiz vocês passarem.
Eu precisava me afastar. Pensar, refletir. Ver o mundo que já conhecia, mas agora sem o ódio tampando minha visão.

E pela terceira vez impus uma distância a nós.

Eu precisava me redimir comigo mesmo, principalmente. E você nada tinha a ver com meus pecados.

"Obrigado, Sakura." Por me amar, por me esperar, por me perdoar.

Por não ter desistido.

"Vejo você em breve". Não vejo a hora de poder te ver novamente. De ser digno do que você sente. De olhar em seus olhos sem lembrar das lágrimas que já fiz com que derramasse.

Toquei sua testa. Eu te amo.

Vi muitas coisas, ajudei muitas pessoas, mudei alguns conceitos. E você me esperou, como sempre fez.

Quando retornei, anos depois, você me aceitou com alegria. E, mesmo redimido comigo mesmo, sei que talvez eu não mereça tamanho sentimento.

Mas eu sempre fui egoísta. E eu te amo.

Aparentemente tudo estava em paz. Eu estava tranquilo e feliz, como cheguei a pensar que nunca seria. E quando eu achei que não havia mais o que você pudesse fazer por mim, você fez.

Você me deu uma família.

Eu pensei que nunca poderia sentir tanto amor, mas eu senti ao ver a pequena garotinha em seus braços.

Uchiha Sarada. Minha filha. Nossa filha.

Eu já não era o último Uchiha vivo. Depois de tanto tempo eu realmente tinha um lar, como meus pais também tiveram.

E tudo estava bem... Até as investigações que eu fazia para Konoha surgirem com uma nova ameaça. Algo tão perigoso quanto a Kaguya. Talvez ainda mais.

Por Deus, Sakura. Eu não poderia deixar algo do tipo acontecer. E você sabe que não poderíamos permitir que essa informação se espalhasse por Konoha.
Os resquícios e a dor da última guerra ainda eram sentidos. E eu podia impedir.

E iria.

Então, eu impus a distância entre nós mais uma vez. E você chorou, mas aceitou.

Me apoiou.

Quando fui me despedir, quase desisti.

Sakura, a dor de despedir-me de você e de Sarada atingiu-me quase como algo físico.

Mas isso era ser ninja, afinal de contas. Sacrifícios eram necessários.

A paz deveria ser mantida, afinal nossa filha não precisa crescer em um mundo como o que nós dois crescemos.

Ela merece mais.

Eu daria mais a ela.

Cuide dela por mim, Sakura. Cuide de você.

Espere por mim, mais uma vez, mesmo que eu já não tenha o direito de te pedir isso.

Toquei sua testa. Beijei seus lábios.

"Obrigado, Sakura" Por me amar, me perdoar, por me entender.

Por ser tão minha.

Por me fazer seu.

Por me dar tudo o que eu sempre desejei ter novamente.

"Vejo você em breve"