Tobias estava sentado em uma espécie de bancada, com suas duas mãos apoiando todo seu corpo enquanto Hermione enrolava algumas ataduras em seu pé e Prim aplicava uma espécie de gel em suas costas. Durante todo o processo Tobias ficou com a cara fechada e não pronunciou palavra alguma. O fato de ter ficado sem camisa exibiu toda a tatuagem em suas costas, algo que era uma representação de seu íntimo, o seu particular, e todos ali presentes estavam vendo.

— Pronto. – disse Hermione por fim, dando um pequeno suspiro. – Seu pé não quebrou, mas torceu feio. Vai ter que andar o mínimo possível.

Ele apenas acenou com a cabeça e manteve seu olhar distante, ainda com sua expressão séria. Prim analisou suas costas procurando mais algum ferimento e suspirou satisfeita.

— Terminei aqui. – disse.

Tobias logo esticou a mão e pegou sua camisa, puxando-a consigo e antes de começar a vestir Prim rapidamente agarrou com força e puxou de volta.

— Nem pensar. – repreendeu franzindo suas grossas sobrancelhas. – Você não vai vestir isso enquanto sua pomada não estiver seca.

Tobias bufou e desceu da bancada com cuidado, virando-se em direção a uma porta e caminhando em sua direção para se afastar de todos. Enquanto caminhava era possível ver os seus músculos em suas costas, tornando possível perceber o quanto estava tenso. Enquanto isso, Prim se direcionou à Tris e passou a pomada em suas feridas. Sua situação não estava tão grave quanto a de Tobias, mas ainda necessitava de algum remédio. Prim terminou em menos de 10  minutos.

Não havia lenha naquele local, o que dificultou a fazer uma fogueira, mas por sorte Ethan tinha um machadinho guardado consigo e puderam quebrar alguns imóveis de madeira para fazer lenha, e juntos com as enormes pilhas de papel e a técnica de Annabeth para fazer fogo, eles fizeram uma. O barulho da fogueira estalando era acompanhado pelos respingos da chuva lá fora. Não estava tão forte, porém não havia resquício de que iria parar tão cedo.

— Vamos ficar aqui por um tempo? – perguntou Edward.

— Sim, não só por conta da chuva, como também pela recuperação do Tobias. – disse Hermione. – O problema é que estamos com pouca comida.

Clary que estava sentada, abraçando seus joelhos fitou os irmãos ruivos.

— Estamos longe da cidade? – perguntou.

Ron ficou de pé e pegou o mapa que estava em cima da bancada que Tobias estava sentado, abriu e ligou uma lanterna.

— Bom, nós estamos bem aqui. – disse apontando para o desenho de um vilarejo. – A cidade está aqui. Então nós estamos a... – fitou o mapa como se estivesse fazendo um cálculo. – 800 km da cidade. De carro duraríamos uns dois ou três dias no máximo para chegar lá, mas como ele provavelmente está estraçalhado e vamos a pé, talvez uma semana. – disse por fim.

— Mas de qualquer forma, estatisticamente falando, estamos próximos? – Harry perguntou.

— Exatamente. – respondeu Ron.

Hermione se sentou no chão, suspirando um tanto aliviada.

— Ótimo, é uma boa notícia.

Já era de madrugada e todos estavam um tanto cansados do dia que tiveram, então alguns deles simplesmente se deitaram e adormeceram. Tris se sentou e fitou a porta a sua esquerda, a qual Tobias tinha ido. Mordeu o lábio inferior hesitando em ir lá, mas por fim decidiu ficar de pé. A porta dava em uma sala espaçosa, com janela de vidro bem grandes, favorecendo numa ótima vista da cidade. Tobias estava sentado lá perto, com um de seus braços apoiados no joelho, ainda sem camisa, parecendo bastante distraído. Ele fitou o vidro e conseguiu ver o reflexo de Tris atrás de si e se virou para encará-la. Ela estava parada no meio da sala próxima a uma mesa, com um curativo na testa.

— O que você quer? – perguntou Tobias voltando seu olhar para a janela de vidro.

Tris abriu a boca três vezes antes de dizer. Tobias apenas a fitava através de seu reflexo no vidro e viu sua indecisão em que dizer.

— Vim ver se está bem. – foi apenas o que disse.

Tobias abaixou seu olhar e deu de ombros.

— Estou bem. – foi só o que respondeu.

Tris comprimiu os lábios e acenou com a cabeça, ficando lá parada durante cinco segundos.

— Que bom. – disse e virou de costas, caminhando até a porta.

Tobias apertou os olhos suspirando e ficou de pé.

— Tris! – chamou e ela imediatamente parou e se virou. Ele balançou a cabeça e franziu as sobrancelhas numa expressão confusa, até que disse. – Porque me salvou?

Tris abriu a boca com as palavras não saindo, ela não esperava essa pergunta. Comprimiu os lábios e olhou em seu rosto.

— Eu estava em dívida com você. – disse.

Sua expressão ficou mais confusa ainda.

— Você já salvou minha vida uma vez, lembra? – respondeu Tris come se houvesse lido seus pensamentos.

A imagem de tudo repassou na mente de Tobias e ele recordou daquele dia. Tris foi a última a subir a escada enquanto os sedentos cercavam o grupo das garotas. Um deles puxou seu pé e ela lutava inutilmente enquanto mais deles se aproximavam até que ele desceu e a ajudou. Se não houvesse feito, Tris estaria morta.

Tobias apenas acenou com a cabeça.

— Então por isso salvou a minha. – disse por fim. – Mas... e enquanto suas regras de não voltar para...

— Eu não... – ela apertou os olhos. – Não fala dessas regras, são idiotas. – disse olhando para o chão e entrelaçando as mãos. – Assim como eu era.

Tobias ficou em silêncio, por um momento se sentiu tentado a confortar Tris, vendo-a daquele jeito, mas afastou o pensamento, sentindo-se um idiota. Novamente ficaram em silêncio e tudo aquilo estava incômodo.

— Obrigado. – disse Tobias por fim.

Tris apenas acenou com a cabeça e deu um pequeno sorriso saindo da sala em seguida. Tobias retornou a se sentar e olhando pela janela, sentindo novamente o desconforto o atingir. Ele não havia perdido o habito de enfrentar seus medos, portanto permaneceu lá até começar a amanhecer.

Quando Tris voltou para o local em que o grupo se encontrava e viu Jace sentado. Ela rapidamente ficou confusa, pois ele a olhava como se tivesse chutado um filhote de cachorro, mas ele nada disse, apenas desviou o olhar e retornou a se deitar. Tris ficou parada por dez segundos de pé esperando outra reação, mas ela simplesmente estava cansada, então se aproximou de Hermione e deitou ao seu lado enquanto o peso do sono o atingia e ela facilmente adormeceu.

O sol já estava alto, com seus raios começando a se espalhar pela sala em que estavam. Jace comia uma fatia de pão enquanto conversava com Ethan e Peeta, parecia bastante distraído, afinal. Enquanto isso Annabeth e Hermione estudavam em seus livros sobre chuvas ácidas. A sede de conhecimento das duas se igualava de uma forma que chegava a ser engraçada, pode-se dizer que era a razão para se darem tão bem. Alguns apenas se mantinham sentados sem dizer algo, o fato de estarem naquele prédio os deixavam entediados. E Tobias estava sentado num canto com uma carranca no rosto, odiava a ideia de ficarem lá sem fazer nada.

Jace se levantou e caminhou em direção à uma das salas para pegar água, justamente onde se encontrava a loira. Tris o ficou encarando irritada por sua atitude estranha.

— Jace. – chamou e ele não respondeu. Virou o rosto se segurando para não gritar. O que diabos ele tinha? – Jace, eu falei com você!

Ele deu um suspiro alto, parecendo impaciente.

— O que você quer? – perguntou lhe encarando por fim.

— Qual seu problema comigo?

— Problema? – tentou desconversar.

— Não venha com esse papinho desentendido. Há algo errado? – perguntou erguendo uma sobrancelha.

Jace pigarreou, relutante por dizer algo, mas ele estava bastante irritado e chateado.

— Bom, digamos que o fato de você estar muito amiguinha do Tobias é um problema. – disse baixinho para que ninguém ficasse ouvindo sua discursão com Tris. O que ele menos queria era que todos vissem ou ouvissem algo sobre seu relacionamento.

Tris estreitou os olhos numa expressão desacreditada, não gostando da ideia de Jace estar com fodidos ciúmes imbecis.

— Por favor! – soltou entediada. – É sério que é por isso?

— Pensa que não ouvi você falando sobre dívidas e sobre sei lá o que sobre, é tudo graças a ele.

— É claro, eu tinha esta dívida. Ele me salvou uma vez. – falou Tris cerrando os dentes de irritação.

Jace sentia que nada daquilo fazia sentido, e também que seus sentimentos não estavam fazendo sentido. Ficou encarando a baixinha loira que estava numa expressão irritada enquanto travava uma batalha mental consigo mesmo.

— Acabou Tris. – ele disse enquanto Tris dava um passo para trás.

Ela se manteve em silêncio. Por um momento ele jurou que havia percebido ela ter ficado mais pálida, portanto, Tris apenas engoliu o nó formado em sua garganta e manteve sua postura.

— Ótimo. – respondeu dando um sorriso e se afastando de Jace.

Quando Tris passou pela porta levando ao corredor deu de cara com Bella, que pareceu ficar vermelha como um tomate ao vê-la. Bella fechou os olhos desejando que o chão a engolisse.

— O quanto você ouviu? – perguntou Tris, desejando não ter sido tão dura em seu tom de voz.

— Acho que muita coisa. – ela encolheu os ombros um pouco envergonhada. – Eu sinto muito, não foi minha intenção.

Tris desviou o olhar. Sabia que Bella estava sendo sincera, pois a conhecia a um bom tempo. Bella nunca foi de se meter em suas conversas e muito menos invadir seu espaço e nem o das outras meninas.

— Tudo bem. – disse dando um sorriso fraco.

Bella mordeu o lábio inferior.

— Está bem? – perguntou, encarando-a com dúvida.

— Vou ficar. – acenou com a cabeça. – Só... não conte pra ninguém sobre isso.

Bella acenou com a cabeça e Tris se distanciou. Bella entrou na sala viu Jace com um olhar distante, não soube muito bem como reagir, apenas pegou a água e saiu do local, por um momento sentiu que queria espancar o rapaz. Enquanto voltava para a sala, ouviu algumas pessoas rindo e conversando, parou por um momento, até que desistiu da ideia de voltar para lá e subiu as escadas, indo para a cobertura, ou algo considerável a isso. O prédio estava destruído quase pela metade, então não existia mais cobertura. As paredes do último andar estavam todas estilhaçadas e haviam várias coisas jogadas no meio, como cadeiras e mesas, e alguns móveis. O céu estava um pouco azulado, algo que ela não via a um bom tempo e contemplou aquele céu, apesar do sol não ser dos melhores. Quando se deu conta, ouviu o barulho de passos e quando olhou para trás viu Edward parado na escada.

— Desculpe. – falou. – Não sabia que estava aí.

Bella apenas deu de ombros e acenou com a cabeça, mas por dentro sentiu um nervosismo espalhar pelo seu corpo fazendo suas mãos se tremerem. Agradeceu mentalmente por estarem distantes o suficiente e Edward não perceber.

— Hum... Tudo bem. – foi só o que respondeu e ele rapidamente desceu as escadas.

Ela voltou seu olhar para a frente olhando para o céu sentindo o sol em contato com sua pele.

— Bella! – ouviu a voz de Clary.

Diabos, agora todo mundo resolveu subir agora? Pensou um tanto incomodada e se virou para encarar a ruiva atrás de si.

— A Katniss vai sair pra caçar com Tris, Lena e alguns meninos, quer vir conosco? – perguntou.

Bella ergueu as sobrancelhas, ainda estranhava o fato de ouvir Katniss e Tris na mesma frase, mas decidiu não comentar e acenou com a cabeça. Ela realmente sentia que precisava fazer algo de útil para se distrair. Ao descer as escadas e entrar na sala em que o grupo sem encontrava Katniss estava arrumando suas flechas, enquanto Tris afiava suas facas com uma pedra e Lena estava sentada na bancada balançando os pés. Percy estava arrumando sua munição em uma arma e Ethan afiava seu pequeno machado, eles provavelmente iriam junto.

— Ela vem. – disse Clary pegando sua nove milímetros carregada.

— Ótimo, vamos logo porque eu estou ansiosa para matar alguns bichos. – falou Katniss com seu arco em mãos.

Bella pegou qualquer arma que possuía mira e saiu com o resto do grupo. Algumas nuvens cobriam o sol, dando uma sombra agradável para todos e facilitando a vista de pássaros no céu.

— Certeza que é seguro comer esses bichos? – perguntou Ethan um pouco curioso.

— Eles eram meu jantar quando estávamos só eu, Clary e Prim. – respondeu Katniss. – Até agora não tenho uma terceira perna, nem tenho um olho na nuca, então, é seguro.

Ethan apenas deu de ombros e continuou caminhando atrás de Katniss. Durante um tempo, não houve sinal de bicho algum, mas em seguida Katniss viu dois voando para a direção leste. Ela atirou sua flecha e Bella atirou com seu revólver, mas as aves estavam muito altos fazendo a flecha de Katniss voar para longe e apenas Bella acertou, fazendo o animal cair no chão.

— Já dá para brigarmos feito animais por esse aqui. – diz Katniss sorrindo enquanto pega o pássaro e amarra num pedaço e corda e carregando-o consigo.

— Não acho que isto seja o suficiente para todo mundo. – diz Percy analisando o pássaros nas mãos de Katniss.

— E não vai ser mesmo. – Diz Katniss comprimindo os lábios e arregalando os olhos num olhar de certeza. – Precisamos levar ao menos três desses para ter o que comer. Eles são ótimos, porém são muito pequenos e nós somos muitos.

Eles retornaram a caminhar, enquanto procuravam o sinal que qualquer animal e conseguiram mais dois dos benditos pássaros e mais um esquilo que Ethan conseguiu matar. Não era de todo grande coisa, mas serviria para não ficarem de estômago vazio. Enquanto retornavam, perceberam já estar escurecendo. Quando passaram por uma vila de casas, Percy ouviu um barulho desagradável e soltou um muxoxo, sabendo o que era.

— Gente olhem ao redor e cuidado. – advertiu enquanto um grupo de sedentos começava a se aproximar.

Era um grupo pequeno deles, algo que eles davam conta, mas não podiam negar que estavam um pouco cansados da caçada. Ethan atirou seu machado e acertou na cabeça de um deles, que caiu no chão. Katniss atirou sua flecha prendendo um deles na parede. Enquanto Bella, Tris, Lena e Percy atiravam para os lados matando vários de uma vez. Um deles pega Ethan enquanto ele recupera seu machado e ele luta para afastar o bicho, mas rapidamente Bella atira enquanto o sangue espira e o sedento cai por cima de seu corpo. Ela dá um gemido de desconforto.

— Caralho, não sabia que estava tão desacostumado com isso. – disse ficando de pé.

O último deles Tris matou com sua faca e o grupo se juntou observando todos mortos. Estavam todos ofegantes e ensanguentados, bastante cansados. Decidiram sair logo de lá, caso aparecessem mais. Ao subirem as escadas e entrarem na sala onde se encontravam o resto dos amigos todos o encararam em descrença.

— Argh, vocês estão horríveis! – disse Peeta.

— Abra sua boca para falar de novo e você fica sem comer. – disse Katniss colocando seu arco, os três pássaros e o esquilo em uma mesa de madeira.

— O que aconteceu? – perguntou Annabeth.

— Um grupo de sedentos. – respondeu Lena. – Nos pegaram de surpresa e agora estamos bem cansados. – disse bufando enquanto se encostava numa parede e deslizava até sentar no chão.

— É, estamos. – Falou Katniss fazendo o mesmo.

— Fiquem relaxados aí, eu cuido desses bebês aqui, enquanto alguém se vira para fazer a fogueira porque eu não faço. – disse Peeta pegando uma faca e começando a trabalhar com os animais.

Tris, Ethan e os outros se sentam cansados enquanto o resto cuida do jantar e eles bebem uma merecida quantidade de água.