Itachi não se espantou nem um pouco ao ver a garota em frente a sua casa logo pela manhã. Para falar a verdade já havia se acostumado com suas constantes visitas.

— Ohayo, Sakura. O que te trás aqui há essa hora? — perguntou, mesmo já sabendo a resposta. Moveu-se um pouco para o lado, lhe dando passagem. Viu a menina entrar com duas sacolas grandes e cheias de suprimentos.

A kunoichi acenou com a cabeça e lhe deu um sorriso. — Ohayo, Itachi-san. Vim trazer tomates fresquinhos para o Sasuke-kun. Sei o quanto ele gosta de comê-los logo cedo.

Assim como as outras vezes, Itachi só era capaz de olhá-la com pena. Quase toda vila sabia dos sentimentos que a rosada nutria por seu irmão, como também sabia que ele não tinha o mínimo interesse nela. Só usava e abusava de Sakura como se ela fosse sua escrava particular e aquilo já estava lhe dando dores de cabeça. Não conseguia entender como Sasuke superava o limite da estupidez a cada dia que passava.

Seguiu-a até a cozinha, vendo a garota colocar as sacolas no balcão e retirar alguns tomates de lá, assim como outras frutas e temperos.

— Sasuke-kun já acordou? — perguntou. Suas mãos se mexiam com habilidade enquanto cortava as frutas e as dispunha sobre o prato.

Itachi negou com a cabeça. — Ele ainda está em seu quarto. Sakura, tem certeza de que tudo isso é necessário? — disse se referindo ao banquete feito por ela.

Ela suspirou. — Sasuke-kun precisa ficar forte. Quero que ele tenha saúde e continue sendo excelente em suas missões. O Clã Uchiha é de grande ajuda a Konoha e essa é só minha forma de retribuir. Mesmo que o Sasuke-kun não perceba isso... Só de vê-lo bem, eu fico bem. — e por último sorriu, pegando o prato decorado e o suco que havia comprado mais cedo.

Ia desaparecer pelo corredor mais uma vez, porém a voz de Itachi interrompeu seu percurso:

— Você é uma boa pessoa, Sakura. E meu irmão pode não demonstrar isso, mas tenho certeza que ele se sente agradecido por tudo que você faz. — mentira. Itachi nunca teria certeza daquilo. Se uma coisa que notou durante os anos foi que Sasuke só se importa com uma pessoa: ele mesmo. Não era justo com a garota. E mesmo assim ele estava ali, mentindo, passando uma imagem de bom moço de seu irmão que ele já não sabia se existia mais. Ver Sakura lhe lançar um sorriso radiante diante disso só fez seu coração apertar no peito.

“Isso vai ter consequências...” — refletiu com amargor.

Sakura lhe deu mais uma olhada antes de continuar seu caminho. Uma parte em seu interior se contraiu ao ouvir as palavras de Itachi. Não porque ela se sentiu mal a ouvi-las, mas sim porque vinham do Uchiha errado. Anos e mais anos de devoção a Sasuke e ele nunca tinha murmurado nem um “obrigado”. Mas Itachi o conhecia melhor do que ninguém então talvez ele tenha razão. Pelo menos, era nisso que ela queria acreditar. Precisava acreditar.

Parou em frente à porta e bateu de leve. Estranhou quando não obteve nenhuma resposta. Bateu novamente, dessa vez com um pouco de mais força e foi surpreendida em ver a figura masculina pela manhã. Seus cabelos estavam desgrenhados, seu peitoral musculoso nu e com algumas cicatrizes espalhadas que, ao contrário de muitos homens, lhe davam um charme a mais, além da calça pendendo sobre o quadril mostrando levemente sua roupa íntima. Em outras situações Sakura ficaria tão vermelha quanto os tomates que estavam dispostos no prato, mas em seu rosto nada se via mais do que espanto.

— Sasuke, quem é? — a voz de dentro do quarto desviou sua atenção das marcas arroxeadas no pescoço do moreno. Sasuke se mexeu só um pouco, mas o suficiente para que ela notasse uma garota deitada na cama usando apenas uma coberta para cobrir sua nudez.

Olhou para o shinobi mais uma vez, vendo alguns arranhões em seu corpo. Seu estômago se contraiu.

O prato e o suco foram arrancados de sua mão e a porta se fechou em seu rosto com um baque. Olhou para a madeira escura, presa em seus pensamentos, na tentativa em vão de compreender o que tinha acabado de acontecer. Mais uma vez sem nenhuma palavra de agradecimento; nenhuma consideração, só a típica indiferença. Durante todos esses anos Sasuke só foi capaz de dar-lhe isso.

Ainda sem ter noção da realidade, começou a andar pelo corredor, arrastando seus pés em uma velocidade mínima. Sentiu um peso sobre seus ombros e seus olhos começaram a arder. Virou-se rapidamente quando ouviu a porta abrir novamente e Sasuke apareceu em seu campo de visão.

— Ah, Sakura. Deixei minhas roupas sujas no lugar de sempre. E dessa vez trate de não lavá-las junto com as suas. Odeio aquele cheiro de flores impregnado nelas. É irritante. — e dito isso, ele voltou para dentro do quarto.

“Trate de não lavá-las junto com as suas”

“Odeio aquele cheiro de flores...”

“Sakura, você é tão irritante”

“Você só me atrapalha, Sakura”

"Seja útil pelo menos uma vez"

“Vá embora...”

“Vá embora...”

“Vá embora...”

“Irritante.”

Ela não se importou com as lágrimas que banhavam seu rosto, não hesitou em sair correndo do distrito Uchiha e não deu a mínima para os olhares que recebia enquanto corria por entre as ruas de Konoha.

Seu coração estava partido. Na verdade, com o passar dos anos ele se quebrava com cada palavra de indiferença, cada olhar repreendedor, cada forma diferente de humilhação.

Aquilo tinha passado de todos os limites possíveis. Matava-a por dentro saber que tinha estendido aquela situação por tanto tempo, mesmo com os avisos constantes que sua mente lhe dava. Tinha sido burra! Estúpida!

Irritante!

Quando finalmente chegou ao seu destino, não pensou duas vezes antes de abrir a porta e desabar sobre para os braços amigáveis, que diversas vezes tinham lhe acolhido quando se culpava por ter feito algo errado ao seu já-não-tão-mais-querido companheiro de equipe.

Não estava pensando direito e nem queria fazer isso. Mas, ao encarar os olhos azuis a sua frente, pronunciou a única certeza que tinha no momento:

— Preciso esquecer o Sasuke-kun!