Evolution: Parte 3 escrita por Hairo


Capítulo 3
As Raízes da Confiança


Notas iniciais do capítulo

Galera eu gosto bastante desse capítulo, e apesar de não avançar tanto quanto outros na trama principal, é bem importante para o desenvolvimento dos personagens. E ele também tem lá as suas surpresas ;)

Espero que gostem!



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Capítulo 3 – As Raízes da Confiança

Dave pretendia passar o dia inteiro em seu quarto, recluso e refletindo sobre o que acontecera aquela manhã. Uma série de informações que ele fizera os amigos prometerem não contar à polícia vazaram e por mais que os policias pudessem ter descoberto a maioria delas de outra maneira, eles não poderiam saber do romance entre ele e Mindy a não ser que alguém que soubesse os tivesse contado, e a lista de pessoas que tinham essa informação era bastante curta. Jake os vira se beijando no quarto deles, Mary Jane os viu de mãos dadas e Dave lhe contou todo o resto, Mindy obviamente sabia e possivelmente Rusty tivesse tido acesso a essa informação através da morena. Os dois últimos, entretanto, não estavam no raio de alcance da polícia e a confirmação de Dave eram as perguntas feitas pelo detetive Henry sobre o paradeiro deles. A polícia não sabia onde eles estavam e, até o interrogatório de Dave, não sabiam o que eles faziam. O que significava que um de seus dois amigos não era digno da confiança que depositava neles.

Sua primeira suspeita fora contra Mary Jane. A ruiva era a candidata número um não apenas por discordar de Dave durante o café da manhã, mas também por ter se juntado recentemente ao grupo. Agora que parava para pensar, Dave percebeu que muito pouco sabia sobre a menina alegre, descontraída e descolada que adotara como amiga. Desde o primeiro encontro, nas finais do torneio de iniciantes, a menina havia sido tão calorosa, receptiva e aberta, então o rapaz nunca tivera motivos para considerá-la menos do que uma amiga. Afinal, ela se candidatou a ajudá-lo nas buscas por Mindy, uma menina que ela nem ao menos conhecia e ainda passou uma enorme quantidade de tempo com Dave enquanto faziam sua busca. Ela também tinha se provado bastante inteligente, além de ser uma grande treinadora, com habilidade no campo de batalha. Mas, além disso, ela era um verdadeiro mistério. Ele não sabia nem quantas insígnias ela possuía. O pensamento de quão pouco a conhecia era assustador, mas pior era o medo de estar errado e cometendo uma grande injustiça contra uma pessoa boa, honesta e acima de tudo, querida.

O problema era que, se seguisse por esse lado e tomasse como pressuposto que estava errado sobre Mary Jane, ele teria que desconfiar de Jake, um garoto que, apesar de bastante esperto e inteligente era apenas um garoto. Dave julgava conhecê-lo bem, mesmo que durante a viagem os dois não tenham se aproximado como Mindy havia feito. O garoto parecia ter um grande carinho pela menina e ele lembrou que não havia hesitação no tom de Jake quando ele se ofereceu a acompanhá-la em sua missão suicida, mesmo que isso significasse abandonar Dave e Eevee por sabe lá quanto tempo. Ainda assim ele não podia imaginar que aquele garoto pudesse traí-lo. Sua índole se mostrara quase impecável durante a viagem e ele sempre fora prestativo e até carinhoso. Tinha um sério problema quanto ao controle de nervos e tendia a falar de mais, mas nunca demonstrou dificuldades de entender uma situação séria. Além de ter praticamente concordado instantaneamente com Dave quando ele pediu para que não falassem de Mindy. Por mais que o garoto quisesse falar alguma coisa, Dave duvidava que ele gostaria de prejudicar Mindy desse jeito.

Eevee subiu no colo do garoto deitado e se aninhou como fazia costumeiramente quando seu treinador se mostrava pensativo ou triste. O menino começou a acariciá-lo gentilmente sem lhe dirigir nenhuma palavra, ainda perdido em seus próprios pensamentos quando a raposa marrom lhe surpreendeu e lambeu carinhosamente o seu rosto. Dave piscou e levou a mão automaticamente onde o Pokémon havia lhe lambido, acariciando levemente a pele no lugar e então olhou para o amigo deitado em seu peito com um fraco sorriso no rosto.

– Pois é, Eevee, acho que só posso confiar inteiramente em você.

– Uee... – respondeu o Pokémon em um tom fraco e triste.

Já passava das quatro da tarde quando Dave ouviu batidos na sua porta e suspirou. Acreditou que Mary Jane e Jake tivessem desistido de tentar falar com ele. Naquele momento os dois já deveriam ter raciocinado qual fora o motivo do garoto ter se refugiado ali e deveriam entender que ele não queria falar com ninguém. Ainda assim, após de cerca de um minuto onde Dave ignorou as batidas, ele ouviu uma voz inesperada do lado de fora.

– Dave – dizia a voz da enfermeira Joy, fazendo o menino se sobressaltar – Estou passando para avisar que acabei de transferir o Oddish para a enfermaria normal e ele já está consciente. Se você quiser vê-lo, já pode tudo bem? Desculpe o incomodo.

O menino de Grené levantou-se imediatamente e correu para a porta, girando a chave duas vezes para destrancá-la e cumprimentar a enfermeira. De repente o menino se sentiu ávido para sair do quarto em que se prendera e distrair a sua cabeça com outros assuntos que não deixavam de ser importantes. Seria a primeira vez que falaria com o Pokémon com quem ele vinha se preocupando desde a noite anterior. A mulher de cabelos rosa lhe indicou a direção da enfermaria geral e sorriu ao lhe dizer que ele seria o único Oddish que o menino encontraria por lá.

Sem perder tempo o menino se encaminhou a passos largos com Eevee em seu encalço até a sala que ela indicara. Abriu as portas duplas da entrada e passou por elas rapidamente, já procurando o Pokémon de planta. A sala era incrivelmente ampla e nem parecia caber dentro do edifício que, de fora, parecia tão pequeno e simples. Uma série de pequenas camas confortáveis se espalhava pelas fileiras coladas às duas paredes principais que se estendia por mais de dez metros. Uma dupla de Chanseys patrulhava as camas passando pelos Pokemons e avaliando o estado de suas recuperações enquanto tomavam notas em suas pranchetas de metal. Dave não demorou a encontrar quem procurava mais para o fundo da sala, logo após um pequeno Slowpoke que parecia dormir pacificamente. Entretanto o menino hesitou antes de iniciar contato. Estivera tão preocupado com o estado de saúde de Oddish que esquecerá que o Pokémon provavelmente nem o reconheceria, já que não teve muitas chances de vê-lo. Dave teria que se explicar, dizendo que fora ele quem ateara fogo na parte de cima de seu corpo e era o provocador do incidente que o colocara no hospital para começar. Ele nem ao menos sabia como começar quando percebeu que Eevee tomara a dianteira e já havia subido na cama de Oddish, que parecia bastante assustado.

– Uee, eevee uee! – dizia a pequena raposa marrom, que parecia tentar iniciar uma conversa com Oddish e explicar o que estava acontecendo. Quando o Pokémon indicou Dave com a cabeça, o menino percebeu que talvez fosse um bom momento para se apresentar.

– Olá – disse ele, timidamente – meu nome é Dave e fui eu quem te trouxe aqui. Como você está se sentindo?

Oddish olhou longamente para Dave sem esboçar nenhum tipo de reação. A planta parecia bastante perdida e, acima de tudo, triste, e não dizia sequer nenhuma palavra. Seus pequenos olhos vermelhos piscaram suavemente e Dave pensou tê-los visto se encher d’água antes dele virar de costas para o garoto e fechá-los. O menino sentiu-se desanimado. Eevee imediatamente voltou a tentar falar com Oddish com empenho e Dave torcera para que seu amigo conseguisse convencer Oddish de que Dave não queria o seu mal. Ainda assim, Oddish não respondeu, permanecendo imóvel, de costas para o garoto. Dave decidiu que era a sua vez de tentar.

– Olha Oddish, eu não sei o que o Eevee está lhe falando, mas eu tenho que lhe pedir desculpas pessoalmente. Eu juro que não imaginava machucar você daquele jeito e essa nunca foi a minha intenção e, desde então, eu só quis ajudar você. Trouxe você até aqui o mais rápido possível e estive do seu lado sempre que pude. Eu sei que você não me conhece, mas eu acho que se você me der uma chance, podemos ser bons amigos...

O Pokémon planta interrompeu o discurso de Dave se virando rapidamente para ele, com uma expressão que misturava raiva e tristeza. Não havia duvidas de que o Pokémon estava chorando enquanto tinha dado as costas para o treinador, mas agora ele parecia estar sendo lentamente controlado pela raiva. Oddish olhou o menino a sua frente dos pés a cabeça, avaliando-o e depois se virou para Eevee, falando pela primeira vez.

– Oddish! Oddish! Oddish, Od!

– Eev, ueev!

– Oddish, odissh! Odiish!

O tom do Pokémon de planta parecia resignado e revoltado, e Eevee parecia não conseguir acalmá-lo, por mais que tentasse. Enquanto isso a angustia de não entender o que estava sendo dito torturava Dave que permanecia sentado ao lado da cama de enfermaria, tentando entender pelas expressões e tom de voz o caminho que o dialogo tomava. Ele podia não entender como ou porque, mas uma coisa ele sabia: Oddish não estava nem um pouco feliz. Finalmente, depois de alguns minutos de uma aparentemente fervorosa discussão entre os Pokemons, Oddish se virou novamente de costas para o garoto e Eevee deixou a cabeça cair.

– O que ele disse Eevee? O que está acontecendo?

Eevee pulou para o colo de Dave e pegou com suas patas dianteiras uma Pokebola do cinto do menino, antes de tentar passar ao seu treinador o que Oddish dissera.

– Uee, ueevee! – disse ele, apontando para a Pokebola e balançando negativamente a cabeça.

– Ele não quer ser capturado? – disse Dave, voltando a olhar para Oddish, que continuava a lhe dar as costas – Mas eu nunca disse que iria capturá-lo. Eu só queria ajudar ele a melhorar!

– Eevee, uee – respondeu o Pokemon, levantando os ombros. Aparentemente Eevee tentara falar isso ao Pokémon de planta, mas ele parecia não acreditar em suas palavras.

– Pois bem – agora Dave voltava a encarar as costas de Oddish, certo de que o Pokemon ainda o ouviria, mesmo que não quisesse responder – Então está decidido. Oddish, as Chanseys devem ter lhe avisado que você deve sair daqui amanhã de manhã, então eu vou esperar e te acompanhar até o lugar em que te encontrei, para que você possa encontrar novamente os seus amigos. O que acha disso?

Eevee sorriu no colo de Dave, mas Oddish não respondeu a proposta do garoto, mantendo-se imóvel, de costas, fingindo dormir.

– Bom, quem cala consente – concluiu o garoto, levantando-se decidido – Vou pedir a enfermeira que me avise quando você for liberado.

Com isso Dave rumou para fora do quarto, fingindo satisfação consigo mesmo. A decepção com o tratamento que recebera de Oddish, porém fora um balde de água fria em suas expectativas de poder se distrair com alguma coisa de todos os problemas que o cercavam. Ele esperava encontrar um novo amigo naquele Pokémon, mas tudo o que encontrara fora ressentimento e desconfiança. O menino não podia culpar inteiramente a pequena planta, porque sabia que as coisas não deviam estar fazendo muito sentido em as cabeça naquele momento. Em um momento ele estava descansando tranqüilamente em baixo da terra, no seguinte ele está em chamas e desmaiando, para acordar em um lugar estranho, cheio de máquinas e humanos. Ele tinha motivos para desconfiar do garoto, mas, ainda assim, ele estava errado. Naquele momento Dave percebeu que ele estava em uma situação parecida com a que o Pokémon recém curado enfrentava. Ele tinha todos os motivos do mundo para desconfiar de seus amigos, mas, será que estava errado?

Ele encontrou com Mary Jane saindo de seu quarto enquanto se voltava para o seu. Ela ficou estática no corredor olhando para o menino, que continuou em sua direção e parou bem a sua frente. Os dois se entreolharam sem saber o que dizer.

– Dave, olha, você tem que ouvir a gente... – começou a menina, mas ele levantou a mão, interrompendo-a. Sua expressão não era mais de raiva ou desentendimento, portanto ela obedeceu.

– Eu sei que tenho que ouvir vocês, mas agora não tudo bem? Amanhã a gente conversa, pode ser? Eu preciso ajeitar as coisas na minha cabeça...

– Mas Dave...

– Não insiste MJ, por favor. Eu não quero acreditar que vocês contaram alguma coisa, mas agora minha cabeça está rodando ok? Desculpe.

A menina se deu por vencida, suspirando e concordando com a cabeça. Em seguida, tentou manter a conversa. Não queria que o clima entre os dois ficasse mais pesado do que já estava.

– Como está o Oddish?

– Ele está bem e acordado, mas não quer falar comigo. Está com medo de que eu vá capturá-lo, acho.

– Nossa, que pena. E eu que já estava até contando que você ia ficar com ele...

– Seria legal, mas não tem problema. Eu prometi que amanhã vou levá-lo de volta para o lugar onde o encontrei.

A ruiva sorriu verdadeiramente, olhando com admiração para o garoto a sua frente. Ela esquecera esse jeito de Dave de querer concertar as coisas.

– Isso é muito legal Dave.

– Valeu. Eu também preciso dar uma caminhada sozinho. Depois a gente pode seguir viagem.

A menina não contava em ter que esperar até pelo menos a metade do dia seguinte naquele centro Pokémon no meio da estrada, mas ficara contente em saber que o garoto planejava seguir viajem com eles, portanto, decidiu aceitar o plano dele. Dave continuou a andar, se despedindo da menina com um singelo sorriso desanimado e seguiu em direção ao seu quarto. No meio do caminho mudou de idéia e resolveu ir à sala de telefones para fazer uma ligação que ela já deveria ter feito há algum tempo.

Seguiu pelo corredor e passou pelo saguão de entrada, acenando educadamente com a cabeça para a enfermeira Joy que lhe sorria do balcão enquanto organizava sua mesa. Entrou então no salão de videofones e sentou-se na primeira máquina que encontrou, discando imediatamente o número de casa. Dave tentou se lembrar exatamente da última vez que falara com seus pais e percebera que deixara passar tempo de mais sem dar noticias. Eles provavelmente estariam preocupados. Martha atendeu a ligação como de costume e abriu um sorriso contagiante ao ver a imagem do filho do outro lado da tela.

– Dave, Eevee! Mas que surpresa maravilhosa! Nós já estávamos ficando muito preocupados filho. Como vocês estão?

– Estamos bem mãe – disse o garoto, enquanto Eevee sorria e acenava com a pata para a tela. Ver a mãe de novo fez com que o garoto percebesse o quanto sentia falta dela e de seu carinho constante. Poucas vezes ele se sentira sozinho como sentia-se agora e poder falar novamente com os pais era quase revigorante – e vocês, como estão?

– Estamos bem, meu filho, muito bem. A fazenda vai muito bem e seu pai até mesmo conseguiu dar um pequeno aumento para o nosso ajudante. E felizmente as perguntas sobre você parecem diminuir. Há muito tempo não tocam no assunto.

Dave levou isso como um sinal positivo. Na pequena cidade de Grené um assunto pequeno podia tomar conta da vida das pessoas por muito tempo e saber que a sua partida, que coincidiu com uma seqüência de eventos estranhos envolvendo a Equipe Rocket estava finalmente sendo esquecida. Era a primeira boa notícia que recebia em relação a Equipe Rocket em muito tempo. Além disso, indicava que seus pais provavelmente estavam cada vez mais seguros em casa.

– Que ótimo! Isso me deixa até mais tranqüilo.

– Pois é, por aqui agora só se fala no seqüestro do Professor em Cardo. Você o conhece não é meu filho? Sabe como ele está?

– Conheço sim, mãe, ele está melhorando. Falei com o laboratório ainda ontem, mas por favor, não comente isso com ninguém ok? Finja que não sabe de nada e que não tem nada a ver com isso – O menino sabia que podia confiar plenamente em sua mãe e que ela era uma pessoa de coração bom, mas como a maioria das pessoas na cidade, ela se envolvia nessas conversas e dar informações de mais poderia ser perigoso.

Naquele momento o garoto ouviu o barulho da porta de casa sendo aberta e pouco depois ouviu a mãe cumprimentar o pai, avisando-lhe quem estava no telefone. Jonathan apareceu imediatamente, ainda suado e sujo do dia de trabalho, mas claramente feliz por rever o filho.

– Oi pai! – Cumprimentou o garoto, abrindo ainda mais seu sorriso. Precisava de conselhos, e ninguém melhor que eles para lhe ajudar naquele momento em que se sentia perdido. Lembrou-se que foi seu pai que sugeriu que ele seguisse para Cardo no inicio de sua jornada e, pelo que Dave podia lembrar, aquela fora a melhor decisão que ele já tomara até então.

– Dave, como está?! Olá Eevee – cumprimentou Jonathan.

– Estou bem pai. Não tenho enfrentado muitos problemas ultimamente – mentiu Dave, para não alarmar os pais por enquanto. Logo, porém, pretendia desmentir essa história.

– Que ótima notícia. Por aqui as coisas parecem ter se acalmado também. Onde está agora?

– Estou no caminho de Celadon pai, em um centro Pokémon. Acho que no máximo semana que vem estarei lá – Dave deu sua resposta sorridente e tranqüilo, mas o rosto de seus pais mudou assim que a ouviram. Rapidamente eles ficaram sérios e trocaram um olhar preocupado. – Por que? O que houve?

– Filho então você acabou de sair de Zaffre não é? – perguntou seu pai, tenso.

Dave ficou surpreso por ver que seu pai havia estudado cuidadosamente o mapa de Kanto e o carregava praticamente em sua mente, mas, principalmente, por não ter antecipado que ele fizesse isso. Sempre fora um homem cuidadoso, inteligente e atento e com certeza devia acompanhar a jornada do seu filho o melhor que podia, mesmo que Dave não mantivesse contato muito constante. Rapidamente Dave entendeu o porque da mudança de expressão de seus pais.

– Pois é, acabei de passar por lá, alguns dias atrás. É mais ou menos sobre isso que queria conversar com vocês. Preciso de ajuda.

Jonathan e Martha Hairo puxaram uma cadeira e sentaram-se lado a lado em frente ao telefone, ouvindo atentamente o relato de Dave sobre os últimos dias. Ele lhes contou tudo, até mesmo sobre o seu inicio de relacionamento com Mindy, noticia que fez sua mãe suspirar e seu pai guardar um sorriso para ele, enquanto Dave continuava a história com pressa sem dar espaço para interrupções desnecessárias. Há muito tempo não era tão honesto com alguém e não se abria daquele jeito. Quando finalmente chegou ao questionamento policial e as descobertas que a polícia fizera os dois adultos pareciam concentrados e pensativos.

– E então? O que eu faço? Será que foram mesmo os meus amigos que contaram alguma coisa? Se sim, quem foi? Se não, como que a polícia sabe? E como eu posso continuar fugindo da Equipe Rocket se eu não confio em quem está do meu lado? – As perguntas eram feitas com certo tom de desespero e Martha foi rápida em parar o garoto.

– Dave, se acalme e respire. Você precisa pensar direito antes de tomar conclusões como essa. Suas suspeitas têm muito pouco fundamento!

– Como assim? – disse Dave, surpreso. Não esperava que seus pais lhe dissessem isso.

– Filho, eu entendo a sua preocupação, mas agora não há muita coisa que você possa fazer para provar o que você está dizendo.

– Mas ninguém sabia que eu estava com a Mindy mãe, e o policial ficou sabendo disso como?!

Dessa vez foi o pai do garoto que continuou – Dave, você chegou a Zaffre sem esconder isso de ninguém não é mesmo? A enfermeira da cidade pode ter notado assim como muitas outras pessoas que estavam no Centro Pokémon. E o policial com certeza conversou com todos eles antes de vir falar com vocês. Nada impede dele ter conversado com você já sabendo disso...

Dave não tinha realmente pensado por esse lado, mas ainda assim, alguma coisa não se encaixava.

– Mas pai, se ele já sabia, por que ele não comentou nada comigo quando me interrogou? Por que ele fingiu não saber de nada?

Jonathan parou por alguns segundos para pensar, mas Martha fora mais rápida em responder a pergunta do filho.

– Ora Dave, ele podia estará querendo retirar o máximo de informação de você e ver a sua reação. Queria exatamente saber se você confirmaria o que você já sabia para que então ele pudesse confiar em você. Obviamente isso não aconteceu. Você precisa ser mais cuidadoso filho, você mentiu para a polícia!

– Sua mãe está certa, Dave. Existem milhões de motivos e possibilidades para que o policial descobrisse tudo isso sem que fossem os seus amigos a lhe contar. E você não devia ter pedido que eles mentissem por você, nem mesmo pensado em mentir sozinho. Mentir para a polícia nunca é uma jogada inteligente e você deu sorte de não ter problemas maiores por isso. Espero que tenha aprendido a lição...

Dave ficou calado por alguns segundos refletindo sobre tudo o que seus pais lhe falaram, sem saber como responder. Teria ele acusado injustamente os amigos? Se sim, devia-lhes muitas desculpas. Mas algo ainda parecia estranho. Os pais tinham lhe dado argumentos plausíveis e inteligentes, mas por algum motivo ele ainda não estava convencido. Ainda não se sentia bem em saber que a polícia sabia de tudo aquilo.

– Olha filho, eu sei que é difícil, mas você não pode começar a desconfiar de seus amigos assim, ou pode acabar sozinho. E sozinho você é um alvo muito mais fácil. Você precisa relaxar e deixar isso para trás. A ajuda da polícia provavelmente é algo muito bom e me deixa até mais tranqüila – dizia sua mãe. Dave ouviu tranqüilamente, preferindo omitir a sua suspeita de que a Equipe Rocket tivesse alguém infiltrado nas forças policiais. Não podia comprovar isso e só serviria para deixar a mulher mais preocupada.

– Eu não sei mãe, preciso pensar. Amanhã prometi ao Oddish que o levaria de volta ao lugar onde o encontrei e feri, e acho que vou sozinho para pensar. Depois eu converso com o Jake e com a MJ.

– Isso é uma ótima idéia filho – concordou Jonathan – você precisa se acalmar e se distrair. Sem contar que fico realmente orgulhoso de ver como você trata os Pokemons, mesmo que não somente os seus...

– Obrigado pai, se bem que seria bem legal ter um Pokémon de planta no time – disse Dave, sorrindo.

– Seria, mas não vão lhe faltar oportunidades. O que você não quer é um Pokemon que não queira estar com você...

– Eu sei.

– Bom, eu imagino que deva estar na hora do jantar – disse Martha, um pouco emocionada – acho que você tem que ir não é?

Dave nem tinha visto a hora passar enquanto falava com seus pais e só agora percebia que estava com muita fome. A noite caíra e ele não tinha nem percebido.

– Sim, mãe. Acho que vou comer mesmo. Muito obrigado por tudo ok? Estou com saudades.

– Nós também filho – disse a mulher, enxugando uma lágrima que caia. Despedir-se era sempre um momento emocional para ela.

– Ah mãe, não precisa chorar não é? – dizia Dave, que nunca sabia o que fazer quando isso acontecia. Jonathan passou um braço pelo ombro de sua mulher e apertou de leve, enquanto ela ria de seu filho sem jeito.

– Quando você tiver um filho você vai entender... – disse ela.

– Se cuida garoto – disse o pai, sorridente.

– Vocês também. Amo vocês – e com um aceno de mão ele desligou a ligação, sentindo-se mais leve e contente.

Na saída perguntou a enfermeira se poderia comer em seu quarto e ela, a contra gosto, acabou aceitando. Ele não se sentia confortável com a possibilidade de encontrar MJ ou Jake e se sentar com eles, mas também não se sentiria bem entrando no refeitório e sentando-se em outra mesa propositadamente, deixando claro que ainda estava com raiva, quando, na verdade, estava apenas confuso. Então comeu com Eevee em seu quarto e logo dormiu, descansando de um dia que fora incrivelmente parado e cansativo ao mesmo tempo. Desligar a sua cabeça por algumas horas era tudo o que o garoto queria no fim daquela noite.

Quando acordou no dia seguinte, Dave sentiu-se refrescado e descansado. Deitara-se cedo, portanto acordou sozinho, por voltas das oito da manhã, sem muitas dificuldades. Aos poucos foi vencendo o que lhe restava de sono e de preguiça, se levantou, lavou-se, trocou de roupa e se encaminhou ao salão de entrada do Centro Pokémon, ainda vazio. Parou no balcão e cumprimentou a enfermeira Joy, que o recebera, como sempre, com um sorriso acolhedor.

– Bom dia Dave, como vai?

– Muito bem, obrigado. Como vai o Oddish enfermeira?

– Ele está ótimo e pronto para ser liberado. Apliquei uma ultima dose da pomada contra as queimaduras ontem antes dele dormir, e logo irei até lá liberá-lo. Gostaria que eu lhe avisasse?

– Na verdade, queria ir junto enfermeira. Prometi que iria levá-lo de volta ao lugar onde o encontrei, mas não sei se ele confia muito em mim. Tenho medo que fuja e acabe se perdendo.

A mulher de cabelos rosa sorriu ainda mais abertamente para ele, se juntando a lista daqueles que o cumprimentavam pela sua atitude aparentemente gentil e fora do comum. Aquilo já estava ficando até ficando cansativo para o menino, que não via nada mais justo a fazer do que o que ele se propusera. Fora ele quem causou tudo aquilo, logo deveria se certificar de reparar o dano da maneira que pudesse. Será que tão poucas pessoas fariam isso como todos diziam? Ele preferia não acreditar nisso.

A enfermeira concordou quanto a avisá-lo antes de liberar Oddish e disse que havia tempo para que ele ao menos tomasse café da manhã, então Dave agradeceu-lhe e se encaminhou para o refeitório. Para a sua surpresa, apesar de ainda ser antes das nove da manhã, Jake e Mary Jane já estavam lá comendo juntos, aparentemente conversando sobre o restante da viagem. Dave suspeitou que eles tinham acordado cedo de propósito para encontrá-lo antes que ele saísse, mas preferiu não comentar nada. Seu humor estava consideravelmente melhor do que no dia anterior, e ele se sentia disposto a conversar com os amigos. Eles fitaram o garoto do momento em que ele entrou até ele se encaminhar na direção da mesa deles, olhando com o que parecia um leve sorriso para os amigos. Tinham esperado muitas possíveis reações do garoto, mas até Mary Jane teve de admitir que aquela não era uma delas.

– Bom dia! Posso me sentar com vocês? – A expressão de Dave era uma mistura de ansiedade e nervosismo. O menino temia qual a resposta eles poderiam ter a essa repentina mudança de atitude. Entretanto os dois concordaram com a cabeça, ainda surpresos e sem palavras. Aproveitando a chance, ele voltou a falar – Olha, eu preciso falar com vocês. Na verdade, me desculpar. Eu posso ter exagerado na minha reação ontem e eu deveria ter ao menos conversado com vocês...

– Concordo – disse Jake, mostrando um pouco de ressentimento, mas dando espaço para o menino continuar.

– Eu não sei o que aconteceu, acho que tudo isso em pouco tempo mexeu um pouco com a minha cabeça e eu não estava pensando direito. De qualquer jeito não quero ficar arrumando desculpas para o modo como eu agi. Isso não tem nada a...

– Está bem, Dave, a gente entendeu – disse Mary Jane, sorrindo como sempre – você está parecendo o Jake falando e eu sei que tem mais coisa ai. Desembucha.

Jake não conteve uma pequena risada com o comentário da ruiva, que aos poucos ia conquistando a confiança do garoto mais novo. Olhando novamente para Dave, agora mais aberto a ouvir o que o garoto tinha a dizer, ele teve que concordar com a amiga.

– Pois é, Dave. Fala logo...

Dave não conteve um sorriso ao perceber que seus amigos o haviam perdoado quase instantaneamente e que provavelmente não haveria muitas discussões sobre o ocorrido, mas, ainda assim, ele sabia que não podia fugir do assunto que o trouxera ali.

– Vocês são de mais, sabiam? – disse ele, procurando as palavras certas para continuar até a parte mais delicada da conversa.

– Nós sabemos, agora continua – disse MJ, ainda sorrindo.

– Bom, como vocês perceberam o detetive Henry acabou descobrindo um monte de coisa a meu respeito, e olha que eu nem faço parte da investigação, mas o mais importante é que ele descobriu tudo o que eu tinha combinado com vocês de não falar...

– Eu sei – disse a ruiva – eu disse que não era uma boa idéia mentir para a polícia. Mas eu não acredito é que você achou que nós tivéssemos contado. A polícia tem mil jeitos de descobrir essas coisas Dave.

– Eu sei, me desculpe, eu errei mesmo – Dave sentiu-se envergonhado - Mas é que teve uma pequena informação que eu não pensei que a polícia pudesse ter sem que vocês tivessem contato...

– O que? Que informação? – disse Jake, curioso como de costume.

– Que eu e a Mindy tínhamos uma relação um pouco além da amizade – disse ele.

– Mas fui eu quem disse isso para eles! – disse MJ, fazendo Dave sobressaltar-se.

– O que?! – disse ele, sem acreditar – como assim?!

– Bom, eles me perguntaram porque eu decidi me juntar a vocês e eu disse que como você a Mindy estavam começando a ser um pouco mais do que amigos quando ela foi embora, eu achei que você podia precisar de uma amiga. Mas eu não disse para onde a Mindy tinha ido embora. Mantive a história que a gente combinou...

Dave sentiu seu rosto ficar vermelho de vergonha e de arrependimento. Ele não imaginara que isso poderia ter acontecido. Em momento nenhum a idéia de que ele não pedira para que eles escondessem o relacionamento dos dois lhe passou pela cabeça. De fato, não fazia sentido esconder isso, pois essa informação, sozinha, não tinha utilidade nenhuma para a polícia. Apenas unida a informação de que Mindy estava indo de encontro a Equipe Rocket é que ela podia ser interessante, e eaquela informação eles poderiam ter conseguido por outros meios, apesar de ele ainda não saber como.

– Nossa, MJ, eu nem pensei que... – Dave não sabia o que falar, nem conseguia olhar diretamente para o rosto da garota, mas ela não deixou de sorrir por um segundo.

– Pois deveria ter pensado senhor Hairo. Mas eu te entendo. Tem um monte de coisa acontecendo. Uma hora você ia pirar...

Dave sorriu, sem saber o que falar, e ficou olhando para a garota por um longo tempo enquanto ela comia seu café. Jake foi quem o trouxe de volta a realidade.

– Bom, então agora que o Dave não está mais maluco, será que a gente pode começar a pensar em sair daqui? Esse Centro Pokémon está começando a me cansar.

Nesse momento, a voz da enfermeira Joy se fez ouvir da entrada do refeitório atrás deles.

– Dave, quando você quiser vir...

– Estou indo enfermeira, obrigado – disse Dave antes de se voltar para Jake – Olha só, temos mesmo que falar disso. Depois do alerta de ontem, eu não sei se é uma boa idéia seguirmos por essa estrada. O detetive disse que podemos estar sendo seguidos...

– Mas por onde... – começou Jake, mas Dave parou-o com um sinal de sua mão e continuou a falar.

– Olha, eu ainda quero ir para Celadon e não vou sair da rota que a Mindy traçou, mas a idéia de ir voando para lá já começa a parecer mais interessante.

Mary Jane sorriu abertamente enquanto Jake paralisou-se na cadeira, olhando estaticamente para Dave.

– A gente conversa melhor quando eu voltar ok? Mas por enquanto, essa é a minha opinião...

O garoto mais velho olhou para Mary Jane significativamente e ela entendeu que aquele era um sinal para que ela conduzisse essa conversa com Jake enquanto Dave estivesse fora. O menino pressentia que o mais novo ainda tivesse algumas coisas a dizer e eles já haviam perdido tempo demais, de modo que, assim que voltasse ao centro Pokémon, provavelmente na hora do almoço, eles deveriam seguir viagem o mais rápido possível.

Oddish foi liberado ainda de mau humor, muito preocupado e pouco falante. Pegou a estrada andando lado a lado com Dave, mas não dizia uma palavra sequer e nem direcionava o olhar ao humano. Tivera algumas dificuldades no primeiro passo, mas se recuperara bem e depois de alguns minutos voltou a andar com desenvoltura. Por vezes o seu rosto demonstrava preocupação e até mesmo uma ponta de medo, mas Dave fingia não perceber nada e apenas acompanhava a pequena criatura até o lugar de onde ela fora tirada. As únicas palavras ditas serviam para indicar por onde seguir e mais ou menos quanto tempo lhes restava de viagem. Dave se preocupava que se demorassem muito o sol poderia causa problemas a pequena planta, uma vez que ela tinha hábitos noturnos e acabava de se recuperar de um problema sério com queimaduras mas, mesmo com o calor, ele não reclamou nem mostrou sinais de sentir qualquer tipo de dor ou incomodo, então o menino nada fez.

Aproveitou o tempo em silencio para acariciar Eevee e trocar algumas idéias com ele. Era incrível como o fato de ter resolvido em parte os seus problemas com seus amigos o deixava mais leve e menos preocupado, mas a verdade é que aquilo era um sentimento falso. A cada passo que dava em sua jornada mais sentia o perigo o cercando por todos os lados e ele temia a vez em que ele não conseguisse escapar. Ele nunca se sentira assim antes. E ainda existia um outro problema, que apesar do menino não gostar de admitir, ainda ocupava espaço no fundo de sua consciência. A decisão de confiar em seus amigos tinha sido tomada sem nenhuma prova concreta que os defendesse, exatamente pela falta de provas que os acusassem. A suspeita, porém, não conseguia sumir de sua cabeça, e ele não conseguia entender o porquê. Talvez estivesse ficando paranóico.

Depois de uma hora de caminhada eles cruzaram o rio, onde Dave insistiu que parasse pelo menos para beber água e lavar o rosto, mesmo sob os protestos do apressado Oddish. Depois ele teve que começar a prestar muita atenção em busca do grupo de árvores que eles tinham pretendido usar como acampamento, duas noites atrás. Só após de mais de uma hora de caminhada Dave viu o chão marcado pelo fogo, perto das árvores que com certeza teriam lhe servido como abrigo aquela noite, caso toda a confusão de Oddish não tivesse acontecido. O menino percebeu que o buraco de onde o pequeno Pokémon pulara ainda estava bastante remexido, mas já começava a se disfarçar na terra e grama em volta. Ele estava verdadeiramente preocupado que quando chegassem ao lugar o grupo de amigos do Pokemon de planta já tivessem migrado para outro lugar, o que tornaria impossível devolvê-lo ao seu grupo, mas ele ficou mais aliviado ao perceber que o lugar ainda estava infestado de plantas que Jake tinha confundido com ervas naquela noite. Esboçando um sorriso que Dave interpretou como alivio, a pequena planta caminhou até um ponto especifico da grama e soltou um alto e sonoro chamado.

– Oddiish!

Rapidamente as plantas presas ao chão começaram a vibrar, aumentando de força aos poucos até que saltassem da terra e se revelassem, todas com uma expressão que se perdia entre a surpresa e a felicidade com a volta do amigo, misturados aos susto de ver Dave e Eevee ali novamente. Sem hesitar, todos se apressaram a se agrupar em volta do amigo que tinha sido ferido para lhe dar as boas vindas e Dave não pode deixar de perceber que o Pokemon mais rápido se aconchegou carinhosamente contra o corpo do Oddish recuperado. Imediatamente Dave percebeu que aquela devia ser a namorada do Oddish, o que explicava o seu medo de ser levado para longe como um dos Pokemons de Dave. Instantaneamente o menino sentiu um aperto no coração, lembrando-se de como é ruim ser forçado a se separar de quem se gosta e ele entendeu os sentimentos da planta, até mesmo perdoando-o pela grosseria. No final, não era a falta de confiança que ele tinha em Dave que o impedia de seguir com o menino. Naquela hora, Dave sentiu que devia se despedir, mas não sem antes deixar um recado para o grupo de Pokemons que ainda o olhava com desconfiança pelos cantos dos olhos.

– Se vocês deixarem, eu gostaria de dizer algumas coisas! – disse ele em voz alta, calando aos pouco as vozes dos Pokemons ali. Todos se viraram para ele, sem entender, e ele continuou – Eu entendo que vocês têm que se proteger e cuidar uns dos outros, e acho isso muito legal. A lealdade é um traço muito importante. Sei também que a maioria dos humanos não ligaria para isso e provavelmente iria querer capturar um de vocês. Eu não seria humano se não tivesse essa vontade, mas o exemplo de lealdade de vocês me fez perceber que talvez não seja esse o caminho a se seguir. Eu quero pedir desculpas a todos vocês pelo transtorno que causei, principalmente ao Oddish que eu feri e a sua companheira, que deveria estar morrendo de preocupação. Muito obrigado por terem confiado em mim para ajudar o amigo de vocês e aqui estou para provar que vocês fizeram bem, e que nem todos os humanos são tão egoístas quanto seus instintos os mandam ser. Fiquem bem e continuem assim. Foi um prazer.

Eevee olhava seu treinador com admiração quando ele terminou de falar e deu as costas para o grupo de Oddishs, voltando-se na direção da estrada. Ele tentava conter os olhos marejados quando ouviu um chamado atrás de si. Quando se virou, viu o mesmo Oddish que ferira. Ele não sabia como distingi-lo dos outros, mas sabia que se tratava dele. O Pokemon baixou a cabeça respeitosamente na direção do garoto e suas plantas quase tocaram o chão. Dave entendeu aquilo como um agradecimento pelo que ele havia feito.

– Não há de que, amiguinho. Eu só concertei a besteira que fiz...

A criatura olhou para ele sorrindo e voltou ao seu grupo, mas assim que Dave deu um passo em direção a estrada, outra coisa aconteceu. Um pequeno Oddish, um dos menores do grupo, adiantou-se na direção do garoto, com pressa e tremendo de nervoso. Dave olhou-o de cima a baixo, esperando ver o que ele fazia, mas o Pokémon simplesmente encarou-o com um olhar que ele não soube decifrar. Ele deu mais um passo, ameaçando virar-se, mas o pequeno Oddish gritou ao vê-lo fazer isso. Todo o resto do grupo estava absorto no mais absoluto silencio. Sem saber o que fazer, Dave resolveu tentar falar com o Pokémon.

– O que foi pequeno? Eu fiz alguma coisa de errado?

O Pokémon balançou a cabeça negativamente.

– Então por que não posso ir embora?

Não houve resposta. Dave não sabia como prosseguir e olhou para Eevee procurando ajuda. A pequena raposa entendeu o recado e adiantou-se para falar com a pequena criatura.

– Eevee, ue, ueeve...

– oddish, oddish odd!

– Uee! – exclamou Eevee, surpreso. Ele se virou para seu treinador e deu um pulo, tocando com o nariz em uma das Pokebolas vazias do garoto. Dave entendeu quase que de imediato.

– Ele quer seguir viagem comigo?!

O menino não podia fingir que não estava surpreso. O resto do grupo de Pokemons de planta também prendeu a respiração, também surpreendidos pela escolhe do menor de seus integrantes. Ele hesitou, mas ao ver que nenhum dos amigos do pequeno Pokémon se intrometeu, sacou uma Pokebola vazia, sem acreditar em sua sorte. O pequeno olhou-o com curiosidade e ele ficou inseguro por um instante.

– Você tem certeza? – disse. Eevee sorria ao seu pé.

Oddish balançou positivamente a cabeça, arrancando mais um sorriso do rosto do garoto incrédulo. Ele então lançou a pokebola, que foi ao ar ao som do suspiro de apreensão do resto do grupo. Ela bateu na cabeça do pequeno Oddish, que parecia surpreso, e o encobriu em uma luz vermelha, atraindo-o para dentro de si e se fechando. Imediatamente a bola vermelha e azul começou a vibrar com força e Dave não entendeu o que estava acontecendo. Oddish deveria estar cooperando e não lutando contra a Pokebola. Ela vibrou por mais um instante até que voltou a se abrir, voltando para a mão de Dave e deixando Oddish livre e aparentemente irritado.

– Oddish! Oddish! Odd! – gritava ele, dando leves saltos e balançando a cabeça, aparentemente indignado. Eevee parecia confuso.

– Uee?

– O que houve? Achei que você queria que eu te capturasse! – exclamou o menino, perdido.

– Oddish! – exclamou o Pokemon, acenando positivamente com a cabeça mais uma vez. Dave não conseguia entender o que o pequeno queria, mas Eevee aparentemente tinha obtido alguma dica, pois entortara a cabeça para o lado com uma expressão de confusão, como se não acreditasse no que ouvia. Oddish continuou.

– Odissh! Oddish ó!

Eevee ouviu com atenção e pareceu entender. Dave, ainda perdido, olhava para o amigo esperando uma resposta. Quando a raposa finalmente olhou para seu treinador, ela tinha um sorriso de satisfação no rosto. Piscou para ele e deu um passo a frente, postando-se a alguns passos do Pokémon de planta e flexionou seus joelhos, como se estivesse pronto para atacar. Não foi preciso muito mais do que isso para Dave entender.

– Você quer batalhar! – concluiu ele, sorrindo também. O Pokémon de planta concordou com ele e voltou a encarar Eevee – Então está ótimo! Eevee, vamos começar essa com um ataque rápido!

Mal Dave terminou de falar e seu Pokémon já era um borrão que atingiu Oddish antes mesmo que ele pudesse esboçar uma reação. O Pokémon de planta sentiu o golpe e foi jogado para trás, mas se levantou e voltou a encara Eevee.

– Muito bem, ele é durão – disse Dave em voz baixa, sorrindo. Com tudo que tinha na cabeça, esquecera-se o quão bom pode ser a adrenalina de uma batalha – Eevee, ele não vai agüentar muitos mais desses. Continue!

Oddish, dessa vez, tinha uma estratégia para se proteger e antes mesmo que Dave terminasse de ordenar o movimento de seu Pokémon, começara a se balançar, lançando uma enorme quantidade de pó amarelo pelo ar a sua volta. Quando Eevee se pôs em movimento, fatalmente cruzou a cortina de pó criada pelo oponente, que também sentiu o impacto do ataque de seu oponente. Oddish foi lançado para trás, mas levantou-se mais uma vez, enquanto Eevee olhava assustado para o próprio corpo.

– Eevee, o que houve?!

A pequena raposa marrom sentiu-se estranhamente dura e fixa, com bastante dificuldade de se movimentar. Era como se todos os músculos do seu corpo ficassem rígidos e contraídos, tornando-se muito difícil de realizar qualquer tipo de movimento. Ele não sabia o que fazer. Foi a vez de Oddish sorrir. Rapidamente ele se agitou novamente, e dessa vez Dave viu um par de raios vermelhos saírem dos olhos da pequena planta e fazer Eevee brilhar enquanto o menino via partículas de energia saírem de seu corpo imóvel e se dirigirem diretamente ao seu oponente através dos raios.

– Eevee, você tem que lutar contra essa paralisia! Ele está sugando sua energia!

O Pokémon de planta sugava cada vez mais energia de Eevee, absorvendo-a e se fortalecendo novamente, preparando-se para seguir o combate. Dave não sabia como proceder enquanto Eevee parecia com bastante dor, apesar de não conseguir nem ao menos mover a boca para gritar. A expressão de agonia de seu amigo começava a deixar o menino cada vez mais desesperado. Até que, de repente, o Pokémon conseguiu gritar.

– EEEVEEEE! – berrou ele, e caiu no chão, agoniado. O ataque de absorver de Oddish fora interrompido e ele se balançava sorrindo, cheio de energia, enquanto Eevee jazia no chão, sentindo dores. Para a pequena planta, aquela luta estava praticamente terminada.

– Eevee você está bem?! – perguntava o treinador, muito preocupado com seu amigo, que não lhe respondia.

Apesar da dor, Eevee começou a perceber algumas coisas que iam mudando aos poucos. Primeiramente conseguiu gritar de dor. Em seguida, seus músculos que deveriam estar paralisados se dobraram para que ele caísse no chão. Agora, ele conseguia se contorcer de dor. Aos poucos, sentia-se normal novamente, e, quando Oddish veio correndo em sua direção preparado para acabar com a luta usando um ataque de investida, ele deixou o adversário se aproximar, sem esboçar reação. Assim que estava a uma distancia segura, Eevee saltou para ficar de pé e usou os dentes para morder a planta em cima da cabeça de Oddish. Pego de surpresa, o Pokémon perdeu o equilíbrio e ficou preso pela boca da pequena raposa, que respirava triunfantemente. Dave, vendo a pequena oportunidade que tinha, não perdeu tempo.

– Muito bem. Jogue-o para o alto e use a calda de ferro!

Eevee obedeceu e com um forte movimento de cabeça lançou seu oponente no ar. Em seguida, girou o corpo e acertou-o com sua calda brilhando, acertando-o em cheio no bulbo e lançando-o contra o grupo de árvores ali perto. Dave, ainda muito ligado na ação, lançou imediatamente a Pokebola vazia, acertando o Pokémon em pleno ar, antes que se chocasse com os troncos. Dessa vez, ela nem ao menos vibrou, capturando o alvo sem dificuldades. Tanto ele quanto Eevee suspiraram aliviados, sorrindo finalmente um para o outro.

– Foi uma boa luta Eevee. Você está bem?

– Uee – concordou Eevee com a cabeça, mas ainda olhando para seu próprio corpo procurando os sinais da paralisia que ainda deveriam estar ali.

– Eevee, tem certeza? Você passou no meio de uma cortina de um forte pó paralisante e ficou paralisado por alguns instantes. Como não continua assim?! – perguntou o menino, estranhando. Seu Pokémon, entretanto, apenas voltou a olhá-lo e sorriu, como se aquilo fosse normal. Dave teria insistido no assunto se não tivesse reparado no olhar triste do grupo de Oddish que ainda estavam observando o humano que acabara de capturar um de seus amigos.

Sem hesitar, o garoto pegou a Pokebola com seu novo Pokémon e liberou-o. Ele teve dificuldades de ficar em pé, ainda sofrendo os efeitos da batalha e da captura, mas logo se equilibrou e olhou para seu novo treinador, sorrindo.

– Bem vindo ao grupo amigo. Agora acho que você deveria se despedir da sua família. – disse Dave, apontando com a cabeça para o grupo de Pokemons de planta que teria que dizer adeus a um de seus integrantes. Para a surpresa do garoto, o pequeno Oddish pulou em seu colo e acariciou seu rosto com suas folhas antes de se voltar para o restante de Pokemons. Dave não pode conter um sorriso.

Depois de uma despedida emocionada, Dave voltou para a estrada com mais uma Pokebola cheia no cinto. Agora que parava para pensar, aquele momento era de fato especial. Era a primeira vez que completava seis Pokemons em seu time ao mesmo tempo. A partir de agora, qualquer Pokémon que capturasse seria imediatamente transportado para o laboratório em Cardo. Instintivamente, o garoto sorriu. Ao menos uma boa notícia ele tinha para comemorar.

Quando chegou ao Centro Pokemon mais uma vez, encontrou Mary Jane e Jake sentados no refeitório, esperando os últimos minutos antes de o almoço ser servido.

– Oi Dave, porque demorou? Não contava em almoçar aqui, mas agora não faz sentido pegar a estrada sem comer – disse Mary Jane – Achou o resto dos Oddishs?

– Achei, e capturei um! – disse o menino, sorridente

– Que ótimo! O mesmo? – disse Jake

– Claro que não! Se fosse para capturar aquele eu não tinha voltado até lá não é Jake?

O menino corou, percebendo a besteira que havia falado. Dave e Mary sorriam.

– Eu já conto mais, agora vou deixar o Oddish com a enfermeira para ela cuidar dele enquanto a gente almoça. Acho que não o feri muito na luta, mas já que estamos aqui...

– Tudo bem – concordou Mary Jane.

– Eevee, você vem comigo – chamou Dave, fazendo com que seu Pokémon pulasse em seu ombro como de costume.

Juntos eles se encaminharam para o Hall de entrada e encontraram a enfermeira Joy com o seu sorriso habitual, atrás do balcão. Eles esperaram ela terminar de dar uma série de ordens complicadas a uma dupla de Chanseys que estavam ao seu lado e, em seguida, virou-se para os garotos.

– Olá Dave, como posso ajudá-lo?

– Enfermeira, eu gostaria que alguém desse uma breve olhada no Oddish que eu capturei agora. Ele não está muito ferido, mas como vou ficar para almoçar, achei que fosse uma boa idéia.

– É uma ótima idéia Dave. Parabéns pela captura. Se deixar a pokebola aqui, é só passar de novo depois de comer que ele estará novo em folha – disse a mulher, rindo levemente do trocadilho. Dave também sorriu, mas voltou a ficar sério quando falou novamente.

– E outra coisa. Enquanto lutávamos, o meu Eevee foi atingido por uma onda de esporos paralisantes, mas agora está bem. Isso é normal?

A enfermeira pousou seu olhar profissional por um segundo no Eevee no ombro do garoto e o examinou, fazendo com que o Pokémon se encolhesse levemente. Depois ela voltou a encarar o menino.

– Ele me parece bem Dave. O pó não deve ter surtido muito efeito, só isso.

– Mas ele ficou todo paralisado logo após o contato. Não conseguia nem falar. Aos poucos foi recuperando o movimento sozinho...

A enfermeira voltou a olhar para Eevee, dessa vez com o cenho franzido de curiosidade. Esse comportamento não era normal, pelo menos não em Eevees. Ele não devia se curar da paralisia sozinho. Estendeu a mão automaticamente para o Pokémon, mas assim que o fez, tanto raposa como treinador recuaram drasticamente. Quando ela reparou, seus olhos estavam assustados.

– Quer saber. Às vezes foi só impressão – disse Dave, defensivamente. – Quando sairmos, eu pego o Oddish. Obrigado enfermeira.

E com pressa, o menino voltou para dentro do refeitório, acariciando seu Pokémon, que ainda tremia de nervosismo.

– Está tudo bem Eevee, fica tranqüilo – disse Dave, acalmando-o.

Quando se sentou a mesa com os amigos, os dois olharam para ele e perceberam sua expressão de preocupação, assim como o nervosismo de Eevee. Ambos perguntaram imediatamente o que tinha acontecido e Dave se preparava para lhes contar, mas parou no meio do caminho, olhando-os no fundo dos olhos e se lembrando dos últimos dias. Decidiu então desconversar.

– Nada. Não foi nada – disse ele. E eles preferiram não insistir.


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam? Palpites? Previsões?

Espero vocês nos comentários!



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