"My God, my tourniquet

Return to me, salvation" — Tourniquet, Evanescence.

Ok, Claire. Vamos raciocinar um pouquinho. Você está presa em uma jaula de um animal enorme — não sei se ele deve ser enorme do tipo normal ou enorme do tipo "PRÉDIO DE VINTE ANDARES" mas ok — e selvagem, que tem a sua localização em um palácio da deusa da tortura, cheio de guardas que são demônios-fantasmas com apenas uma pessoa para me salvar, mas ela não sabe que você está em perigo. Tem coisa melhor que isso?

Tentei abrir a porta da jaula, mas ela estava trancada com um cadeado. Ah, Eve, tão esperta. Será que ela não teve uma mãe para dizer que não se pode trancar as visitas em uma jaula com animais selvagens?

Senti uma respiração pesada e quente em meu pescoço. Fechei os olhos. Era ele. Kadna, o tigre de Eve. Tentei não me mover mas era meio difícil, já que o enorme tigre me farejava com o focinho grande dele. Pude sentir o seu pelo macio em minha pele e as garras afiando a jaula. Eu não queria abrir os olhos, mas tinha que fazê-lo.

Quando os abri, a primeira coisa que veio à minha mente foi um xingamento. O tigre era do tamanho similar ao de um ônibus escolar. O seu pelo era preto — já posso dizer que gostei dele só por causa do pelo — e seus olhos azuis estavam focados em mim. Aqueles olhos...eu já os tinha visto em algum lugar. Ai, droga! Claire, pense! Aonde você já viu esses olhos?

Sem querer, recuei e me encostei nas grades da jaula. O enorme tigre grunhiu e avançou para cima de mim. O que me deixou mais assustada foi que no meio do seu avanço, ele foi envolto por uma névoa escura e sua forma mudou rapidamente. O enorme tigre do tamanho de um ônibus escolar virou um homem musculoso, de cabelos negros e um rosto incrivelmente lindo. Ele usava um terno preto e seus olhos azuis brilhavam intensamente. Eu já o tinha visto em algum lugar. Pense, Claire, pense...

O homem deu um sorriso radiante ao ver a minha expressão de surpresa no rosto.

—Olá, Claire.

Essa voz...eu já a ouvi em algum lugar, mas não consigo me lembrar. Vamos, Claire, só mais um pouquinho...

—C-como você sabe o meu nome? — Gaguejei, observando-o se aproximar de mim.

—Você não se lembra de mim, não é? — Perguntou ele, com uma expressão triste em seu rosto.

—Eu sei que já te vi em algum lugar, só não lembro onde... — Falei, examinando-o um pouco. Suas feições eram tão perfeitas e detalhadas que ele nem parecia real. O azul de seus olhos eram tão lindos que hipnotizariam qualquer um, até mesmo eu. Talvez seja por isso que Eve o aprisionou aqui. Duvido que ela iria querer perder essa beleza no mundo.

—Que tal eu refrescar a sua memória um pouco? Honeymoon Park, há um ano.

Aquelas únicas palavras fizeram a lâmpada dentro da minha mente se acender. É claro! Acho que agora é um bom momento para um flashback...

"Eu tinha fugido de casa mais uma vez. Aquela tinha sido uma das piores semanas da minha vida, algumas davam até para aguentar mas aquela era quase impossível. Meu pai estava de férias e isso o levou a me fazer de escrava. Não era nem empregada ou coisa do tipo, era escrava mesmo. Às vezes ele nem me dava comida. Mas ele fez isso de propósito, claro. Tínhamos empregada mas não sei o que deu nele naquelas férias.

Enfim, o único lugar que eu ainda não tinha usado como esconderijo era o Honeymoon Park. Sabe aquele lugar em que você tem cinquenta por cento de chance de encontrar a sua alma gêmea apenas dando um passeio? Então, o Honeymoon Park é o lugar certo para isso. Por isso às vezs eu evitava usá-lo para as minhas fugas; eu tinha medo de encontrar minha alma gêmea.

O ambiente romântico do parque também não me deixava nem um pouco feliz. A grama verde coberta por uma diversidade de rosas, lírios e outras flores deixava o parque bastante perfumado. Os arcos de casamento que se espalhavam pela trilha em volta do parque me deixavam desconfortável, assim como as melodias tocadas por um conjunto de caras vestidos de terno parecendo padrinhos de casamento. Pássaros de diversas cores sobrevoavam os casais sentados nos lindos bancos decorados com corações vermelhos, que se destacavam na cor branca. Aquele lugar parecia mais um cenário de contos de fadas.

Como eu queria ficar longe dos casais e da banda, comprei um suco de maçã e limão, em uma máquina chamativa até demais, com o único dinheiro que eu tinha e me sentei embaixo de uma árvore enorme com folhas cor-de-rosa. Eu odiava rosa, mas era o lugar mais afastado dos casais presentes.

Enquanto eu observava os casais sorrindo felizes, bebericava o meu suco e tentava afastar um passarinho azul idiota que puxava o meu cabelo, um garoto que deveria ter a minha idade assistia a cena e ria baixinho.

—Você está rindo do quê? — Perguntei zangada, olhando para o garoto.

Ele se sentou ao meu lado e o maldito pássaro azul pousou no ombro dele.

—Os pássaros foram treinados para agir docilmente com os humanos. Se você não tentasse espantá-lo, ele a deixaria sossegada. — Disse ele, dando um sorriso. Ele esticou a mão, pegou a minha e depositou um beijo de leve. — E o que uma linda garota como você está fazendo aqui, sozinha, sem ninguém para dar-lhe atenção?

As palavras dele me fizeram soltar uma risada. Afastei a minha mão dele e dei um gole no meu suco antes de dizer alguma coisa.

—Linda? — Ri com sarcasmo — Eu estou meio que tentando ficar longe das pessoas, garoto. Me deixe em paz, por favor.

—Não, obrigado. Prefiro ficar aqui.

Revirei os olhos e me levantei.

—Se quer ficar aí, pode ficar. Eu vou procurar outra árvore. — Comecei a andar mas o garoto segurou o meu braço. Seus olhos eram incrivelmente azuis e seu cabelo escuro balançava por causa da brisa suave. — Me solta, seu idiota.

—Isso é suco de maçã com limão? — Perguntou ele, olhando para a droga da lata do suco. Estava óbvio que ele queria puxar assunto.

—É, sim. Pode ficar, se isso lhe agrada. — Derrubei o suco em sua camisa turquesa e sai correndo. Não obtive muito sucesso porque ele me agarrou pela cintura, rindo, e me levou até um dos bancos de contos de fadas. Os casais não estavam nem aí para a gente. Talvez estejam apaixonados demais para notar algo.

—Você é mais abusada do que eu pensava. — Disse ele, me colocando em seu colo. Nossos rostos estavam bem próximos.

—Quem é você?

Ele deu um sorriso e segurou a minha mão.

—Jon Robert. Estudo com você há três anos.

—Hum...nunca reparei em você. Na verdade, não reparo em ninguém. — Falei.

—Então, acho que começamos bem, não acha?"

Balancei a cabeça para me livrar da lembrança. Por que nos reencontramos novamente? Por que logo o Jon e não outra pessoa? Se Jeff o vir, com certeza vai acabar em sangue.