"I am not afraid

I won't burn out is this place" — House on a Hill, The Pretty Reckless.

Quando eu vi aquela casa, pude sentir um violento arrepio por todo o meu corpo. Ela era como uma mansão daquelas que aparecem em filmes de terror. As grades afiadas serviam de cerca na frente da casa e no que parecia ser o jardim, estavam árvores mortas.

Examinei melhor a mansão. Suas paredes eram feitas de pedra. As janelas eram altas e pude ver em uma delas alguém nos observando. Uma menina de cabelos castanhos com um ursinho nas mãos.

—Sally... — Sussurrou Jeff, também olhando para a janela onde se encontrava a menina. — Eve sabe que estamos aqui.

—Claro que ela sabe. Geralmente, os deuses sabem de tudo! — Falei. Bem que eu senti uma sensação estranha, como se alguém estivesse me observando na metade do caminho. Devia ser Eve...

—Verdade... — Disse Jeff. — Vamos.

Paramos em frente à enorme porta de madeira da casa. Jeff bateu três vezes na porta. Pude perceber que ele parecia meio nervoso.

—Jeff, você está bem? — Perguntei. Ele me olhou e deu um sorriso.

—Sim, estou. — Ele deu um beijo em minha testa e acariciou os meus cabelos.

A enorme porta se abriu, revelando um homem baixinho, com cabelos brancos e olhos...bem, ele não tinha olhos. Eram apenas duas órbitas vazias. Isso me lembrou de uma história de um cara chamado Eyeless Jack, que não tinha olhos também. Será que ele existia?

—Sr. Jeffrey e Srta. Johnson, estávamos esperando vocês. — Pude ver atrás do homem vários espíritos estranhos. Aquilo me deixou meio envergonhada, porque todos olhavam para mim e Jeff. — Por favor, entrem.

Assim que eu e Jeff colocamos os pés na casa, a menina que estava na janela apareceu. Ela era linda. Seus cabelos castanhos faziam cachos perfeitos, os seus olhos eram verdes e ela tinha um ar inocente. Ela segurava um ursinho e dava um enorme sorriso para mim e Jeff.

—Olá, Sally. — Cumprimentou Jeff, dando um sorriso para a menina.

—Olá, Tio Jeff. — O sorriso de Sally se alargou. — A Tia Eve está esperando os dois no escritório dela, principalmente a Tia Claire.

—Como você sabe o meu nome? — Perguntei, surpresa.

—Eu sei tudo sobre você! Seu nome é Claire Johnson, dezesseis anos, tem depressão há dois anos, seus pais a odeiam, você não tem amigos a não ser o Tio Jeff, o Tio Slender e a Tia Kayla. Você gosta da cor preta, de pizza e ama o Tio Jeff. — Eu corei na última parte. Era verdade. Tudo o que ela disse era verdade. — Ah, e você morreu mas a Tia Kayla te trouxe de volta.

—Chega, Sally. Acho que você já conseguiu convencê-la que você sabe tudo sobre ela. — Disse Jeff, rindo.

Sally também riu mas logo depois ficou séria.

—Eu levarei vocês até o escritório. — Sally subiu as escadas e nós a seguimos. Pude sentir os espíritos nos olhando a cada passo. Jeff olhou para a minha cara e deu uma risada baixa. Acho que eu estava vermelha de vergonha ou a minha cara estava expressando a minha vergonha.

Assim que paramos em frente à porta do escritório de Eve, aquela sensação de queimação cresceu em meu peito. Uma forte vontade de beber sangue me dominou. O que diabos era aquilo?

—Jeff, não estou me sentindo bem. — Falei, me virando para ele.

—Você deve estar nervosa. Tente ficar calma, Preciosa. — Ele deu um sorriso, alargando os seus cortes, e depositou um beijo em minha testa. Aquilo me acalmou um pouco, mas a queimação continuou.

Sally abriu a porta do escritório de Eve e pediu para entrarmos primeiro.

O escritório era enorme. Havia enormes estantes de livros, assim como em uma biblioteca. O piso era de um tipo de ladrilho branco e preto com desenhos que formavam um tipo de flor. Um lírio, talvez? As paredes eram brancas com algumas tonalidades de roxo nas bordas. No teto prendia um enorme lustre prata de vidro — que praticamente iluminava o cômodo todo — que se mexia! Não estou louca, o lustre mudava mesmo de posição. Incrível...

Ao lado da porta em que estávamos, havia uma estátua de uma mulher coberta por um manto, que passava por seus cabelos além do corpo. Dois tigres a cercavam, prontos para atacar mas não a mulher; eles queriam atacar um ao outro. Era como se a mulher estivesse impedindo uma luta entre eles. Na mão esquerda, ela possuía uma lança afiada e real demais para ser, originalmente, da estátua. Na mão direita, uma névoa escura estranha flutuava, como se fosse algum tipo de magia. Aquilo não parecia ser uma coisa boa.

Em uma escrivaninha, que tinha um tom de cor de mel, perto das enormes janelas, uma cadeira vazia se encontrava à ela. Acho que era ali que deveria estar a deusa.

Eu estava tão hipnotizada com a decoração do lugar que nem tinha percebido que alguns demônios-fantasmas me olhavam, curiosos. Eles devem ser os servos de Eve, já que mantinham uma perfeita postura e usavam ternos. Aquilo era assustador e, ao mesmo tempo, tranquilizador, como o rosto de Jeff.

Foi aí que eu percebi que havia uma mulher que olhava fixamente a janela. Seus cabelos eram negros e sua pele pálida, o que me fizeram lembrar de Sádica. Um arrepio percorreu o meu corpo e tudo o que eu queria naquele momento era um beijo, em minha testa, de Jeff para me acalmar. Continuei a observar a mulher na janela. Ela usava uma capa escura por cima de seu vestido preto longo. Era possível ver as suas botas — que também eram pretas —, que deixava o visual dela meio...emo e gótico.

—Tia Eve, eles chegaram! — Exclamou Sally, parecendo alegre.

Pude sentir a mulher sorrir — como? não sei, mas eu sabia que ela exibia um enorme sorriso —, sem tirar os olhos da janela.

Ela se virou para nos olhar. Como previsto, exibia um enorme, e assustador, sorriso. Seus olhos eram de cores diferentes; um era azul e o outro preto. Isso me fez lembrar de Sádica e Kayla. Os lábios tinham um tom bem avermelhado e a sua maquiagem era de dar inveja a qualquer mulher. Era tão perfeita que eu nem conseguia descrevê-la.

—Bem-vindos ao meu palácio! Eu sou a deusa da tortura, da sede de sangue, dos psicopatas e sanguinários, das mortes cruéis e violentas, mais conhecida como Eve. — Disse a mulher, ainda sorrindo. Assim que seus olhos pousaram em Jeff, seu sorriso desapareceu. — Eu até poderia fazer você explodir e queimar no fogo do Inferno por ter feito insultos a mim, mas serei gentil com a minha visitante e deixarei o... amigo dela viver. — quando sua voz ficou violenta na palavra "amigo", soube que ela queria dizer outra coisa.

—É...oi. — Falei, meio sem jeito.

Seus olhos pousaram em mim com uma certa ternura. Ela abriu um sorriso sádico e andou em minha direção, com os olhos fixos em mim. A queimação em meu peito estava ficando mais forte ainda. Minhas mãos começaram a suar e formigar. Eve as pegou e eu senti que ia desmaiar. Seus olhos pareciam olhar a minha alma e ler a minha mente.

—Qual é o seu nome, querida? — Perguntou ela, me examinando.

—Claire. — Respondi. Eu tinha que criar coragem e manter a calma. Tinha que mostrar à deusa que eu era forte, que eu não era como aquelas garotinhas medrosas da minha escola.

—Claire...adorei! — Exclamou Eve, me fazendo levar um susto interno. — Minha jovem, teremos um longo dia juntas. — Ela olhou para Jeff. — Tenho um trabalho para você, seu assassino. Dois homens estão lá em baixo, esperando para serem torturados. E, como sempre, você tem uma dívida comigo. Agora, faça esse favor para mim.

—O quê? Eu? Fazer um favor a você? Ninguém diz o que eu devo ou não fazer! — Disse Jeff, pegando a sua faca.

—Sally, leve ele ao porão, por favor. — Pediu a deusa, ignorando Jeff.

Sally ia pegar a mão de Jeff mas ele veio até mim e depositou um beijo em minha testa.

—Tome cuidado. — Sussurrou ele em meu ouvido. Por fim, Sally pegou a sua mão e o puxou para fora do escritório.

O sorriso de Eve pareceu se alargar ainda mais. O que ela deve estar pensando? Será que ela vai me machucar? Provavelmente ela irá me matar, mesmo eu estando morta posso repetir o processo. Com certeza ela irá me levar para algum lugar da casa e me matar.

Depois de me analisar melhor, Eve mandou os demônios-fantasmas saírem da sala para nos deixar a sós. Já sozinhas, a deusa começou a me rodear, me observando mais uma vez de cima a baixo. Ela deve estar querendo me provocar ou achar os meus pontos fracos. Ela também me fez algumas perguntas, como por exemplo a minha idade e de onde eu era. Quando ela me pediu para contar a ela a história de como eu tinha conhecido Jeff, nem pensei duas vezes. Comentei cada detalhe, mesmo sabendo que aquilo poderia ser usado contra mim em um futuro próximo.

—Então foi você que matou a minha filha? — Perguntou ela, surpresa. — Incrível! Eu nunca tinha visto uma pessoa tão corajosa como você! Mas, mesmo assim, ela está viva. Não pode ser facilmente morta. — Ela olhou em meus olhos. — Ao longo dos anos, homens e mulheres tentaram matá-la mas ninguém conseguiu. Como você teve coragem de matá-la?

Tenho certeza que se eu ainda estivesse viva, minha respiração estaria acelerada e, provavelmente, eu teria desmaiado.

—Na verdade, nem sei como e de onde veio essa coragem. — Respondi com um sorriso, relembrando a sede de sangue ao "matar" Sádica. Se eu pudesse, repetiria a dose novamente.

Eve deu um sorriso sádico.

—Acho que precisamos treiná-la um pouco. Venha comigo.

Saímos do escritório e começamos a andar pelos corredores do palácio. Estava tudo calmo até entrarmos em uma sala minúscula com as paredes escuras e o piso cheio de sangue. No teto, havia tripas e órgãos, sendo apenas sustentados por algum tipo de...sei lá. Teia, talvez?

—Que lugar é este? — Perguntei, sentindo o cheiro de morte que impregnava o local.

—É aqui que guardamos a comida do meu Kadna. — Respondeu Eve, dando um leve suspiro.

—Kadna?

—Meu enorme tigre de estimação.

Abri a boca em um perfeito "O"

—Um tigre!?

—Sim, um tigre. Venha! Quero que você o conheça! — Nem tive tempo de negar ou recuar, porque a deusa pegou a minha mão e me puxou para a próxima porta, que parecia como a de uma jaula.

—Espero que ele goste de você! — Disse ela, com um sorriso.

—Por quê? — Quando me virei, ela não estava mais lá. Eve não estava em lugar nenhum.

Ela fugiu.