Prisoner escrita por bitterends


Capítulo 11
Dançando no Fogo


Notas iniciais do capítulo

Desculpem pela demora, espero que gostem.



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Alice acordou no meio da madrugada, de camisola e com o corpo coberto. O mais estranho era que ela sequer lembrava-se de ter dormido, somente lembrava-se de ter se deitado com o marido.

Tocou o outro lado da cama, não sentindo-o. Sua mente oscilou entre o alívio e o desespero.

Olhou ao redor e avistou-o sentado no largo batente da janela, olhando através do vidro em direção a luz da Lua. Khalil estava longe dali, a expressão tão serena que parecia ser outra pessoa.

Alice levantou-se devagar, indo até ele. Ela estava confusa, atordoada e estranhamente sentindo empatia pelo homem sentado na janela.

– Está frio aqui… - disse ela, tocando o rosto gelado do marido.

– Eu me acostumei a sentir frio. - respondeu Khalil, com um olhar doce e um sorriso desanimado.

Ele era um homem surreal. De demônio ao anjo em poucas horas. A bela mulher sentia-se tola por reconhecer que daquela maneira ele era capaz de abalá-la.

– Eu nunca te perguntei, Kalhil. Porém eu não parei de pensar sequer um dia… Por quê? Por que você me batia? - Ela segurou o rosto dele entre suas mãos, sentindo uma lágrima escorrer pelo seu rosto, enquanto ele desviava o olhar.

– Combinamos de esquecer o passado. - Ele retirou as mãos da esposa delicadamente de seu rosto e se levantou.

– Você não pode fugir disso para sempre.

– Mesmo que eu queira, eu não consigo fugir. Tudo o que fiz virou uma sombra entre nós, eu vejo nos seus olhos a vontade de vingança, seu ódio, seu desprezo… Eu continuo me perguntando porque não te deixo ir. Estou te forçando a ver que mudei, mas estou sempre usando da “força”. Primeiro sendo covarde, agora te deixando presa à mim… Eu tenho medo de ainda estar o mesmo.

– É difícil pra mim, Khalil. Difícil porque eu conheço dois homens totalmente opostos e não sei qual dos dois você realmente é.

– Eu também não sei, Alice.

Naquele momento, o impulso a fez abraçá-lo. Acariciou o dorso do marido, que por sua vez, se arrepiou ao sentir aquele toque tão suave. Ela sentiu o aroma inconfundível do Bulgari Black, o mesmo perfume que ele usou na primeira noite de amor dos dois.

A mulher estava com medo do que estava sentindo, pois naquele momento ela não tinha vontade de fazer mal ao marido, não queria se vingar dele. Somente queria relembrar aquele abraço que há muito não era dado ou recebido. Queria sentir enquanto o “Khalil bom” enfim estava ali, aquele sim era o homem que a apaixonou.

Alice se atreveu a roubar-lhe um beijo, ao qual foi retribuída no começo e quando as carícias se tornaram mais quentes, o marido recuou.

– Não quero que você durma de novo enquanto fazemos sexo. - Disse ele, sorrindo.

– Puxa… Eu dormi com você em cima de mim?

– Claro. Não tem como você dormir em cima de mim!

– Caramba, eu dormi transando…

– É… Eu também tentei entender, pensei que tinha te esmagado, mas você só dormiu. Ufa!

– Estou impressionada, você tem quase o dobro do meu peso e eu não senti!

– Você me chamou de gordo? - Khalil se divertiu.

– Não, de forte. Gostoso, talvez. - Alice sorriu maliciosa.

– Nem me venha com esse sorriso de safada, você dormiu enquanto a gente transava. Meu ego está ferido! - Disse ele, se jogando na cama.

– Ah, releva um pouquinho! Estou acordada agora.

– Não deveria nem ter dormido, agora quer abusar do meu corpinho…

Alice se encaixou por cima de Khalil, que não acreditava no que estava havendo, conseguia apenas sorrir.

Se divertiu ao notar o desespero da esposa ao somente abaixar sua calça o suficiente, sem tirá-la e sentar sobre ele, movimentando-se. Cerrou os olhos, fingindo dormir. Levou um leve tapa no peito por isso e ouviu Alice resmungar qualquer coisa, respondendo a ela:

– Você está muito devagar, querida.

Depois desta frase, poderia chamar a bela mulher de qualquer coisa, menos “devagar”.

***

O sol irradiando pelo quarto, batendo no rosto da moça a fez acordar. Novamente acordava sozinha na cama. Grunhiu e pensou “Somente eu posso fazer isso, Khalil.”. Virou-se para o lado, em direção ao banheiro no mesmo instante em que o marido saia dele, ajustando o relógio dourado no pulso, completamente arrumado, vestido um terno de corte perfeito.

– Bom dia, preguiçosa.

– Onde você vai? - Perguntou Alice, com seu típico mau humor matinal.

– Eu também dormi bem, muito bem aliás. - Curvou-se e beijou a testa da mulher ainda deitada na cama. - Volto ao trabalho hoje.

– Ahn… Pensei que fosse ficar mais.

– Dessa vez, não. Passei só para dar um beijo em você e ver como estavam seus pais. - Replicou o homem.

“Veio para ter certeza que eu não estava mentindo, nem fugindo. Isso sim.”, pensou ela.

– De qualquer forma, querida, estarei em casa daqui a doze dias. Quero te encontrar lá… Como combinamos. - Sorriu ele, cordialmente.

“Controlador.”

– Não se preocupe, estarei lá.

Suaves batidas na porta encerraram aquele assunto de uma vez. A doce voz de Anitta ecoou, anunciando que o café da manhã já estava pronto.

Alice levantou-se e foi até o banheiro, lavando o rosto e escovando os dentes. Colocou uma calça rosa larga de malha e uma blusa azul maior ainda. Foi para a frente do espelho na intenção de prender os cabelos e lembrou-se que não eram mais compridos. “Ufa!”.

Khalil olhou para a esposa e não conteve o riso.

– De onde saíram essas roupas?

– Do meu antigo guarda-roupas. - Respondeu ela, entre os dentes.

– Você está ridícula! - Dizia ele, entre risos.

– Cala a boca, idiota.

Alice parecia uma pré-adolescente rebelde pela manhã, isso sempre foi assim. No início do casamento, o passatempo favorito do marido era irritá-la ainda mais de manhã, dizendo que ela estava parecendo um leão de juba negra, que nem as onças que ele caçou tinham o bafo como o dela pela manhã, entre outras comparações criativas e irritantes.

Alguns meses depois ele se cansou, não tinha mais paciência para os chiliques matinais da esposa, passou a preferir deixá-la quieta até que ela sentisse vontade de conversar e sorrir, depois passou a levantar e deixá-la dormindo até que o sono esgotasse.

“Eu deveria ter dormido e acordado mais com essa mulher, antes do casamento.”

Mais de um ano e meio depois ele estava a provocando e se divertindo com isso.

Ambos saíram do quarto e se juntaram a Anitta e Matheo. A jovem murmurou um “bom dia” para os pais enquanto se direcionava diretamente para a geladeira.

– Ela ainda acorda assim todos os dias, figlio? - Perguntou Anitta para Khalil, bem baixinho.

– Sim, sogra. Todo santo dia! - Respondendo a última frase pausadamente, sorrindo em seguida e fazendo os sogros sorrirem também.

Os três interagiram durante o desjejum inteiro, menos Alice, que apenas se concentrou em comer, sequer escutou a conversa animada.

O desgraçado consegue ser encantador quando quer, não acredito que depois de tanto tempo eu caí na conversa dele. Talvez não seja apenas conversa, ele pode ter transtornos mentais… Ou pode estar arrependido de verdade, mas agora eu tenho medo dele. Eu tenho tanto medo… Mais medo do que ódio, mais medo do que já tive amor.

Olhando-o assim, não é possível odiá-lo. Só não sei se ainda seria possível amá-lo.”

Absorta em seus pensamentos, não reparou que o marido já se despedia.

– Amor, você está me ouvindo? - Chamou Khalil.

– Oi? Não, não te ouvi. - Respondeu ela.

– Estou partindo… O táxi já está na porta… Me acompanha?

– Ah, tudo bem.

Deram alguns passos em silêncio.

– Sobre a madrugada, me desculpe. Sei que você já não sente muito por mim e…

– Pare de se fazer de vítima, Khalil. Eu já disse que vou tentar superar, que iremos recomeçar. - Interrompeu-o, Alice.

– Não havia sentido sinceridade. - Respondeu ele.

– Não me importo se sentiu sinceridade ou não, apenas disse o que eu pretendo fazer.

O homem sorriu de lado antes de falar.

– Você é muito louca.

– Foi o que você fez de mim, querido. Muito louca. - Beijou-o nos lábios. - Vá com Alá. Nos vemos em casa.

O homem sorriu e entrou no carro a sua espera. Pediu para o taxista dar partida, mas parar na melhor vinícola que conhecesse .

– Ah, signore. A melhor venda de vinhos que conheço é em Atrani.

– Está tudo bem, pode ir até lá. Eu quero o melhor vinho deste lugar.

Quase quarenta minutos depois, pararam num estabelecimento chamado “Vino & Cucina Bertoncello”.

Separado em duas partes, uma para o restaurante e a outra somente para a venda de vinhos, Khalil notou que o dono ou dona daquele lugar tinham bom gosto. Possivelmente tinha mais estudo que o restante da população, mas os preços certamente era o que mantinha a clientela local.

Uma réplica gigantesca de barril abrigava a loja dos vinhos, as prateleiras os separavam por sabores. A iluminação baixa do imenso e belíssimo lustre deixava o lugar com um toque rústico e sofisticado. Certamente voltaria ali para conhecer o restaurante.

Voltou-se para as prateleiras, em busca de algum vinho que lhe chamasse atenção. Encontrou um nome... “Dolce Piccante Alice”. Riu e decidiu levar aquele, pensando em quantas “Alice” existiam pela Itália. Definitivamente, era um homem o dono daquele negócio e que, coincidentemente, também amou uma “Alice”.

***

Já era quase hora do almoço quando o humor de Alice melhorou. Havia se vestido melhor após um banho relaxante, pouca maquiagem e batom forte.

Seus pais estavam arrumados, sentados na sala.

– Não almoçaremos em casa hoje? - Perguntou ela.

– Queremos te levar para conhecer um lugar especial. - Respondeu Matheo.

– Conheço tudo aqui, não lembro de haver um lugar especial.

– Você conhecia tudo. Está pronta, miele? - Agora era Anitta quem respondia.

– Sim mama, estou.

Estavam no carro, a caminho de Atrani haviam alguns minutos.

Veio então Lorenzo à mente da moça.

“Estudou gastronomia. Abriu o restaurante. Luigi faleceu. Íamos beber ontem.”

– Pai, mãe… por que não me contaram sobre Luigi?

– Pensamos que você soubesse, já faz um tempo… - Respondeu o pai da jovem.

– Sim, fazem dois anos e alguns meses. Lorenzo era seu melhor amigo, pensamos que soubesse. - Acrescentou a mãe.

– Verdade, ele era…

Chegaram ao restaurante, Alice se encantou somente de olhar por fora. Notou que anexo a ele, havia o espaço onde os vinhos eram vendidos. Uma réplica de um barril.

Entrando no estabelecimento, reparou minuciosamente na decoração sofisticada. Ao contrário do ambiente rústico da loja de vinhos, o restaurante era mais iluminado, com grandes janelas de vidro. O lustre central era feito com algumas belas pedrarias. As mesas eram redondas com tampos de vidro e as cadeiras em alumínio. O papel de parede era neutro, pois haviam quadros pendurados em todas as paredes, relacionados a culinária, vinhos e um maior, da equipe inteira que ali trabalhava ao redor de Lorenzo e duas mulheres.

– Uau… De onde Lorenzo tirou tanto dinheiro para isso? - Soltou o comentário sem perceber.

– Ele tinha algumas economias para o restaurante, ia ser um pouco menor. Mas o pai de Lolita deu a eles de presente um pouco mais do terreno que estava à venda e a construção do restaurante e da loja de vinhos, pois ele achava que eram muito bons para não serem comercializados, então os dois se preocuparam em usar o dinheiro para a decoração. Ficou lindo, não ficou?

– Sim. - Respondeu seca para o pai.

Estava se perguntando quem era Lolita e porquê o pai dela daria um presente desses. Não fazia sentido que ele estivesse casado, pois a havia convidado para a vinícola e não usava aliança alguma em nenhuma das mãos. Pegou-se enciumada e reconheceu que era ridículo, uma vez que ela havia desistido dele e estava casada.

Porém doía saber que ele estava sendo feliz com outra pessoa que não fosse ela, que havia retornado para a cidadezinha beira-mar e ela não esteve lá para recebê-lo. Pior ainda era Lorenzo ser feliz enquanto ela sofria tanto.

Vindo da cozinha, surgia Lorenzo, retirando o chapéu de cozinheiro que escondia seus cabelos presos em um coque, abrindo os botões da dolma. Não só abria os botões, abria o sorriso também.

– Vocês chegaram! - Disse o rapaz, cumprimentando o casal com abraços e beijos e Alice, com um beijo na testa. - Eu mesmo preparei o nosso almoço!

– Lollo é o melhor de todos os cozinheiros profissionais e amadores!

– Imagine só, dona Anitta… um dia chego perto de ser um dedinho do que a senhora é! -Respondeu à senhora.

Ele estava simplesmente radiante de felicidade, entusiasmado, perguntando a todo momento o que Alice estava pensando sobre a comida, sobre o restaurante, se havia gostado. Ela deu respostas objetivas apenas, mas mesmo assim o rapaz continuou a sorrir.

Os quatro passaram duas horas juntos, quando os mais velhos disseram que estava na hora de ir. Matheo sugeriu que Alice ficasse para conversar com Lorenzo e que depois podiam buscá-la ou o próprio a levaria de volta. A insistência do rapaz a fez ficar.

– Matheo, será que é uma boa ideia deixá-los juntos… sozinhos?

– Meu amor, são dois adultos e muito amigos.

– Ela é casada agora…

– Perdeu a confiança em Lorenzo? Ele não desrespeitaria nossa filha, nunca.

– Sei disso. Só que não é preciso desrespeitar para…

– Chega de bobagens, querida. São apenas amigos que não se falam há anos.

– Está bem, você tem razão.

E ambos partiram.

A sós, Alice foi direta ao perguntar.

– Lorenzo, quem é Lolita?

O rapaz caiu na gargalhada. Recompondo-se respondeu:

– É a esposa de minha prima.

– Oi? - Perguntou ela, boquiaberta.

– Lola é a mulher da Millene, minha prima. Não se lembra? Nós três somos sócios.

– Ah…

“Que droga, por que as pessoas não explicam melhor as coisas?”

Naquele instante, o comportamento dela mudou e passaram-se horas de conversa. Ela já sabia minuciosamente a vida de Lorenzo.

Ele levou-a para o galpão pequeno em que o pai produziu seus últimos vinhos em sua fazenda, afim de beberem e conversarem.

– Agora você já sabe de tudo o que me aconteceu. Sua vez, Alice.

– Você nem imagina… Hoje eu só quero beber, posso te contar outro dia?

–Tudo bem. - Sorriu ele, mudando o assunto.

Alice não voltou para a casa dos pais naquele mesmo dia.


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