Avatar - A Trilogia do Dragão escrita por João Gabriel, Melaine_


Capítulo 2
Capítulo 2 - O medo




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Depois da frustrada cerimônia de ingresso na Academia, Jinzo foi apresentado ao seu primeiro amigo naquele lugar, o mestre Patel. O velho curandeiro da escola era aparentava ter cerca de 120 anos, sua pele era morena, suas pálpebras eram pesadas e quase não tinham forças para abrir e revelar os olhos escuros. Nascido ao sul do Reino da Terra, o mestre aprendeu tudo que sabe por ser um dos poucos homens que conheceram, “pelo menos ele conta que sim” pensava Jinzo, a biblioteca de Wan Shing Ton, o que sabe dez mil coisas, enquanto ela estava sobre a terra.

–- O senhor consegue entender o que eu tenho? - a voz de Jinzo entregava o cansaço que sentia. Seu timbre era fraco, quase rouco.

–- Deve incomodar demais não ter as respostas para tudo não é mesmo? Peço desculpas, mas não tenho conhecimento de sua condição - dizia Patel, que tinha mais disposição para falar que o paciente.

O salão médico era uma cabana na praça central da Academia, não era enorme comparados aos grandes cômodos daquele lugar, mas tinha tudo que Patel queria. Chamava a atenção pelas pequenas proporções do telhado de duas águas suspensos sobre vigas de madeira, o chão e as prateleiras eram do mesmo material. Jinzo estranhou a enfermaria parecia ser a única construção feita com material natural e não das chapas forjadas nas indústrias.

Depois de receber um tratamento com vapores para melhorar a respiração, Jinzo deu a receita as infusões para Patel prepará-las, a cada dois dias o garoto viria buscar. Dali procurou seu dormitório para descobrir os módulos que lhes foram escalados. No caminho, pensara nas matérias especificas de luta e combate, por consequência também formulava desculpas para justificar o mal desempenho sem botar a culpa na doença. Abriu o cantil para tomar um gole do remédio, quando foi abordado por um garoto do mesmo tamanho dele, mas parecia ser um pouco mais velho.

–- Wujing, você está melhor? - o garoto parecia preocupado. - o senhor Patel é um mágico, ele sarou um machucado meu bem no cotovelo, olha só - mostrando a pele cicatrizada do que pareceu ser um arranhão.

–- Com licença, eu preciso ir ao meu dormitório, preciso de repouso. - Jinzo se afastou do garoto e voltou a caminhar absorto em pensamentos.

Jinzo teria que atravessar a praça central para se dirigir ao prédio dos homens, onde as suas coisas já estavam arrumadas e teria um guia para andar por ali. A lembrança do acidente de Rukon fazia Jinzo tremer, os pesadelos sobre os súbitos ataques de fúria não deveriam fazer parte da mente de uma criança. Com apenas sete anos, não conseguia nem fingir que briga, para que não vejam suas limitações. A alternativa arrumada foi buscar na leitura o que poderia ser feito para melhorar seu desempenho nas técnicas de defesa pessoal e a tão complicada dobra básica de Fogo. Sentia que ali, com professores treinados em guerras, o verdeiro objetivo do Fogo havia se deturpado.

Seu quarto era grande, individual e no terceiro andar na edificação. Os mais abastados ficavam em baixo em cômodos duplos, os mais importantes tinha os individuais. Conferiu se estava tudo no lugar e com o mapa em mãos sairia para ir até a biblioteca separar o conteúdo para o dia das aulas. Na saída foi surpreendido por Zuko que ficou sério ao encarar Jinzo.

–- Gostaria de me desculpar, não foi inten… minha intenção atrapalhar vosso discurso - fazendo uma reverência.

Zuko olhou para Jinzo por um tempo antes de continuar a caminhada em direção ao seus aposentos. Hyung havia ensinado que gratidão e as desculpas são ótimos para aliviar o fardo da culpa, tranquiliza as pessoas com boa consciência. Sem se interessar pela reação do herdeiro real, Jinzo iria para biblioteca que ficava próximo ao grande salão. Olhando a grade, o que temera aconteceu, por ser filho do general, Jinzo foi escalado para três disciplinas de combate, dobra, agni kai e luta armada. O efeito das ervas o impediam de sentir raiva.

Para chegar na ala dos livros, como estava assinalado no mapa, Jinzo haveria que passar na frente do dormitório feminino, um edifício ornado e bem delicado. As janelas tinham bonzais coloridos e o prédio era pintado em um cor mais clara que o cinza chumbo na ala masculina.

–- Acho que você me deve desculpas! - o timbre agudo e o tom autoritário de Azula não surtiu efeito em Jinzo.

–- Minhas sinceras desculpas - fez a reverência e voltou ao caminho original, mas foi bloqueado pela neta do Senhor do Fogo.

–- Não vai passar até me dizer, o que você tem? -- de perto, os olhos âmbar pareciam mais amarelados, flamejando pela vitória a qualquer custo.

Jinzo sentou-se a frente aos pés dela e ficou esperando, em silêncio sem dizer nada, só segurando o cantil. Sob os efeitos daquela mistura, o menino não tinha forças para gritar ou chamar por socorro. Resolveu sentar no chão frio esperar alguma coisa acontecer.

–- Perdão! Gostariamos de acompanhar esse aluno a sala da direção, precisamos conversar com ele. -- era Wujing, foi ai que Jinzo percebeu que ele tinha o uniforme de segunda classe, tinha oito anos e estava acompanhado de mais dois rapazes.

–- Hunf! Escuta aqui menino doente, eu vou saber quem você é e vou estar na sua sombra - a menina esperou Jinzo se levantar para falar ao pé da orelha. Em menos de três horas já tinha inimigos.

Wujing e os segundo anistas contavam sobre as aulas e calado permanecia Jinzo absorvendo tudo que poderia dos companheiros, quem eram os melhores e quem não eram, também para onde iam os punidos pelo mal desempenho. Era um lugar chamado “Provador”, onde os fracos e com notas ruins eram avaliados até melhorar para sair e competir com os outros. “Como seria essas avaliações?” pensou.

Antes de entrar na biblioteca, Jinzo falou:

–- Obrigado, a todos vocês - agradeceu pela mentira contra Azula.

O Hall da biblioteca era um salão enorme com diversas poltronas, mesas compridas e cadeeiros para iluminação da leitura noturna. O tapete carmim se estendia por as extremidades até as prateleiras, onde voltada o frio piso de ferro, a luz entrava pelas longas janelas de vidro. Com a lista na mão, livros sobre Dobras, conhecimento de defesa e meditação foram empilhando em seus braços. Procurou uma mesa vaga e quando sentou-se para começar o estudo, uma voz interrompeu sua leitura.

–- Jinzo de Rukon, filho de Hyung? - perguntou uma senhora de idade, com uma aparência melhor conservada do que o mestre Patel.

–- Sim, pois não? - respondeu com um tosse de leve. Abriu o cantil para mais um gole. A velhinha pareceu não se importar.

–- Esse livro foi reservado para você, designado para lhe entregar em mãos. - disse lhe entregando um volume de capa preta, sem nenhum dizer na capa e na contra capa vinham os dizeres: “O dragão não pode viver para sempre preso dentro de você”. Aquilo pareceu não ter nenhum sentido para ele.

–- Agradeço - limitou-se a responder.

No momento ignorou a entrega, mas voltaria para ler sempre que a dúvida sobre quem foi o entregador desse volume. As grandes quantidades do remédio de Jinzo também causam falta de atenção e sonolência, ele lamentou-se não ter perguntado sobre a origem desse livro, ou sobre o que se tratava. Pronto, já estava ele confabulando a respeito do conteúdo daquele presente.

Após feita algumas anotações sobre o que precisaria para aulas de amanhã, Jinzo retirou os três livros da mesa e os colocou de volta nas prateleiras. Deu uma olhada na grandeza daquele lugar e imaginava que ali pudesse tão amplo e cheio de conhecimento quanto a biblioteca de Wan Shing Ton. Olhou para recepção, achou a senhora com quem falou há pouco. A bibliotecaria estava sentada em nível mais alto, atrás de um balcão arredondado de madeira vermelha, o móvel era revestido com uma grossa bandeira desenhada com dois homens dançando em volta de dois dragões gigantescos. Jinzo pegou o livro que ganhara e se dirigiu a senhora.

–- Eu poderia saber a quem devo agradecer pelo livro? - Jinzo tomou um gole de seu remédio depois de falar, temeu não ser ouvido por conta da roquidão.

–- Mestre Patel, ele é um homem muito estudioso, disse que lhe interessaria que este volume ficasse com você - respondeu sem tirar os olhos do pergaminho que escrevia.

–- Do que se trata? O livro? - Jinzo se esforçava para ganhar atenção.

–- Depende de como vai ler - falou.

Jinzo se retirou, já estava noite e tentou dar passos largos para chegar no dormitório antes que os archotes fossem apagados e a luz alaranjada desse lugar ao prateado da lua. Não andou por muito tempo naquele ritmo porque sentira dor nas pernas. Carregava o livro com uma das mãos, a outra apoiava na parede para continuar o percurso, já estava escuro e não queria tropeçar ou fazer barulho. Já bastava o episódio na cerimônia, outra vergonha em público faria o pequeno garoto querer voltar para Rukon.

Em seu dormitório, colocou o cantil ao lado travesseiro, desabotoou a capa e soltou o cinto. De pijamas, reparou as roupas ainda no chão e pensou em sua mãe, se a dona Giu estivesse ali teria lhe castigado. A casa onde moravam não tinha criados, a família era grande, todos cresceram por causa do exercito ou trabalhando para setores da indústria. Nunca tiveram empregados ou liteiras para serem carregados em procissão. Se agachou para pegar as roupas e colocá-las em cima da poltrona. Se sentiu tonto ao se levantar, a cabeça começou a doer e logo veio a lembrança do acidente de Rukon. Jinzo se assustou, aquela súbita dor era estranho porque geralmente era progressiva e não sentia nada além de dor nas pernas. Amarrou a faixa na cabeça, mais apertada do que antes, e se deitou. Pegou o livro que o Mestre Patel lhe entregou e abriu, vendo novamente os dizeres na contracapa: “O dragão não pode viver para sempre preso dentro de você”, Jinzo riu. Folheou e começou a ler os primeiros capítulos, iluminados pelo abajur ao lado de sua cama.

Jinzo sentiu um medo terrível, como se tivesse caindo em um buraco infinito, suas mãos começaram a suar e engoliu seco quando leu: “...A manifestação desse poder começa na infância, fortes dores de cabeça e até uma pequena fissura no meio da testa, segundo os sábios do fogo antigos, os primeiros Homens Combustão eram retirados de suas cidades para não oferecer nenhum perigo para a sociedade a qual pertenciam...” Desde que era pequeno, ouvia as histórias dos homens com o terceiro olho capazes de criar explosões instantâneas. O medo consistia em que eram poucos que sobreviviam aos controles desse poder e morriam por causa dos efeitos. Jinzo passou a mão na faixa, a testa ardia. Chorou porque queria Rukon de volta, queria voltar para a casa e se esconder do mundo.


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