Pensão da tia Odete. escrita por Costa


Capítulo 38
Capítulo 38


Notas iniciais do capítulo

Fala gente! Consegui adiantar mais um. Espero que gostem!



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Eu e a criatura compramos o terreno para embarcar naquele Titanic furado. Juntamos nossas economias e conseguimos liquidar, logo de cara, 8 mil. O restante dividimos em parcelas de 500 contos. Podia ter feito em maior valor para pagar mais rápido, mas não queria me arriscar a ficar sem grana para a construção a casa. Desde que comecei com isso, não tem me sobrado mais nenhum centavo.

O terreno eu coloquei no nome da Lívia, mesmo ela reclamando para colocar no meu. Independente do que aconteça conosco, aquilo já é dela e da nossa filhota, que não vai se chamar Sofia. Ela cismou com esse nome. O Terreno era bom, mas estava um pouco maltratado e cheio de capim. O Djair me deu uma força e, em dois dias à base de muitas bolhas na mão e queimaduras de sol, limpamos tudo com a enxada e a foice. Antes de começar qualquer fundação para a casa, o meu objetivo principal era garantir a segurança do lugar. E foi o que fizemos: Com a ajuda do Djair e da Flávia, em menos de um mês, muramos todo o lugar. Eu era meio ignorante, não entendia nada de obras, mas o Djair me explicou e eu aprendi. Eu e ele levantamos o muro com 2 metros e meio em volta do terreno. Às vezes, quando o Jorge e o Camilo não tinham trabalho, eles também passavam para dar uma força. Só se estressavam com o Ricky Martin. O pobre cão se viu no paraíso naquele terrenão, mas depois era um sacrifício para tirar aquela cor de barro dele. De branco, ele ficava marrom. O Jonas também vinha quando podia. Não era todo dia, mas foi de grande ajuda. A Flávia era a encarregada de fazer e mexer a massa, o concreto. Ela é meio magrinha, mas a desgraça tem uma força e uma habilidade pra isso. A Lívia, o seu Rodolfo e a dona Odete que não ficaram muito felizes. Por eles já serem um pouco idosos e por ela estar grávida, não permitimos que fizessem nada aqui. Esse trabalho pesado não é para eles. Mesmo assim, a dona Odete ainda fazia almoço e lanches para nós todo dia. Era só fazia almoço nos domingos, mas para nos alimentarmos bem, ela passou a fazer todo dia. Dizia que precisávamos nos nutrir para ter energia e aguentar o tranco. Admito, estava difícil aguentar. Começávamos aqui por volta das 10 da matina e íamos até às 5 da tarde. Só parávamos para poder tomar um banho, fazer um lanche e meter o pé para o bar. Nosso estado estava ficando deplorável. Se bem que a Flávia até gostou. O Djair era meio gorducho e estava emagrecendo com isso. Ela começou a zombar dele dizendo que estava ficando mais atraente.

Agora, mais de dois meses depois, a casa começa a ganhar vida. Ainda está só no esqueleto. Só fizemos as fundações, mas já dá para ter uma noção de como será. A casa será uma coisa simples: Dois quartos, sala, cozinha e um banheiro. Decidimos por laje ao invés de telhado. Se a família crescer muito, e espero que cresça, puxamos para cima.

Hoje já trabalhei como louco. Agora estou no meu quarto, descansando e esperando pela criatura que ainda está no curso de culinária. Ainda bem que estou de folga. Essas noitadas trabalhando aí de madruga estão acabando comigo. Acho que, depois que me sobrar uma grana, vou converter o meu boteco em restaurante. Era menos cansativo quando trabalhava de dia. Mais uma coisa para entrar na minha grande lista de afazeres. Não sabia que era tão cansativo e dispendioso casar. Por falar em casar, será que aquelas lagartixas já me destruíram as alianças? A Lívia já está desconfiada de algo. Outro dia ela comentou que estava estranhando que a Martinica e o Nero não entravam mais no buraco e que era pra eu dar uma olhada e ver se estava tudo bem com a casa delas. Acho melhor trocar as alianças de lugar. Do jeito que a criatura é, daqui a pouco ela fuça lá e eu nem vejo.

Eu fui conferir e ainda estava lá, inteira. Onde eu vou esconder esse troço agora? Melhor, quando farei o pedido? A criança já tá pra nascer e eu nada. Maldita covardia a minha. Eu sei que o sonho da mãe dela era dela casar antes que a filha tivesse filhos. Mas falta menos de 4 meses para ela dar a luz. Eu já estou tão atolado de coisas que um casamento espalhafatoso é o que menos preciso agora. Queria fazer o pedido de uma vez, ver ela andando já com a aliança, pra cá e pra lá, mas cadê minha coragem?

–Ai, Rogério, decida-se logo, homem! Tu não é um rato e ela vai dizer sim.

É isso, será hoje, mesmo que enfarte depois. Já esperei demais. Tentarei fazer algo um pouco romântico, a minha maneira, mas acho que ela vai gostar. Só precisarei do violão do Camilo emprestado. Tenho pouco mais que duas horas até ela chegar e preciso agir rápido. Já estou tremendo igual vara verde.

–Coraçãozinho lindo do pai, não pife agora. Espere para enfartar depois que eu fizer o pedido. Por que sempre parece tão fácil nos filmes? Obrigado, Hollywood, por deixar a vida real uma droga.

Não poderia fazer algo tão importante vestindo uma bermuda e uma camiseta. Mesmo com o calor infernal, coloquei terno e gravata. Estava cheirando a guarda roupa pelo tempo guardado, mas o que vale é a intenção. Enfiei a caixinha das alianças no bolso de dentro do paletó e conferi umas duas vezes. Não podia esquecer o mais importante. Escrevi, também, um recado para ela me encontrar no terreno, mas não sabia onde deixar para ela ver. Melhor deixar com a dona Odete e pedir para ela entregar pra criatura. Fui bater na porta do Camilo. Assim que atendeu, me olhou de cima a baixo. Ele não perde essa mania?

–Que beca é essa, Rogé? Vai fazer exame de fezes? –Zombou de mim.

–Ha, ha, ha, muito engraçadinho. Será que poderia me emprestar o violão, por favor? –Pedi.

–Posso, mas para quê?

–Assunto meu que não te interessa agora.

–Aí, grosso! Podia ser mais delicado com as palavras.

–Pode me emprestar?

–Não tá merecendo não, mas te empresto.

Ele saiu reclamando para buscar e o Jorge apareceu na porta.

–Vai ser hoje? –Ele me perguntou.

–Vai e estou tremendo como vara verde.

–Passo importante, não é?

–Demais. Você faria um favor pra mim?

–Claro. Basta falar.

–Entregue isso para a Lívia quando ela chegar e não deixe o Camilo ler. –Pedi entregando o papel com o recado pra ele.

–Considere entregue.

–Obrigado.

O Camilo voltou e nos olhou, desconfiado.

–Que os dois tanto fuxicam aí? –Me perguntou ao me entregar o violão.

–É assunto dele, querido. Deixa de ser curioso. –O Jorge respondeu.

–Quê? Você contou pra ele e pra mim não? Isso não é justo, Rogé! Isso não é justo. Eu sempre te tratei melhor do que ele. –Camilo protestou.

–Depois você vai ficar sabendo, Camilo. Mais uma vez, Valeu, Jorge. Não se esqueça de entregar o bilhete pra mim. –Pedi.

–Não esqueço. Pode ir tranquilo. Sorte, amigo. –Ele me desejou e fechou a porta.

Ainda consegui escutar o Camilo pedindo pra ver o bilhete e o Jorge o xingando. Camilo é comédia. Para estressa-lo, basta não incluir ele no “babado”. Esse aí deve ter sido aquelas velhas fofoqueiras que ficavam nas janelas na outra vida.

Fui para a rua, passei numa loja e comprei um cartão. Pena que não tinham flores. Não poderia deixar esse detalhe em branco, mas onde arrumaria isso agora? Catei umas flores que consegui arrancar, tá, eu roubei, na vizinhança e fiz um buquê. Ficou um pouco Frankenstein, cheio de flores diferentes e que não combinavam em nada, mas são flores. Deus, devia ter planejado isso e não feito no susto como estou fazendo. Acho que ela vai me jogar esse troço, esse ramalhete Frankenstein na cabeça. Só espero que não use o violão para me bater.

Segui para o nosso terreno, coloquei as flores no chão, em cima das bases da casa e escrevi no bilhete um “Casa comigo?”. Coloquei junto das flores e comecei a treinar e ensaiar a música. Do jeito que estou, é bem possível que esqueça a letra.

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Não sei quanto tempo fiquei ali tocando, mas congelei ao ver ela entrar pelo portão. Ela estava linda com aquele barrigão. Eu fui um idiota em ter demorado tanto assim em reparar nela.

–Por que está vestido assim e o que faz aqui? Ela me perguntou.

–Errr... Só escute a canção. Sei que estava te devendo uma e espero que goste. –Falei, quase me afogando no meu medo.

Comecei a cantar a música casa comigo do Cezar e Paulinho. Nem sei como consegui. Deu umas rateadas e gaguejei em umas partes. Ela me olhava com os olhos cheios d’água. Quando cheguei na estrofe final, parei de cantar, me ajoelhei e mostrei o par de alianças antes de falar a última frase da música:

–Casa comigo?

Ela, entre lágrimas, me abraçou e me beijou. Isso foi um sim?

–Isso é um sim?

–Ainda dúvida, Batman?

–Acho que não. –Voltei a beijá-la.

Não enfartei, mas minhas pernas ainda estão bambas. Que essa seja a primeira e a última vez que eu peço alguém em casamento. Isso é uma tortura psicológica. Nunca mais faço isso.

Continua.


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