Pensão da tia Odete. escrita por Costa


Capítulo 30
Capítulo 30


Notas iniciais do capítulo

Fala, pessoal. Capítulo novo. Consegui um tempinho pra digitar e postar. Espero que gostem.
Forte abraço!



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Minha mãe parece que vai ficar mais que o natal e o ano novo aqui já que ela me fez comprar um colchão inflável pra eu dormir. Pois é, perdi minha cama pra ela. Mas, no fundo, não reclamo. Estou adorando ter minha velha por perto. Há dias eu me alimento como nunca, sou paparicado, tenho minhas roupas passadas e o guarda-roupa arrumado. Tinha me esquecido como é bom morar com a mãe. O triste é ter que fazer o que ela quer. Ela cismou que quer ir ver a queima de fogos em Copacabana, mas eu não estou nem um pouco no clima pra isso. Como mãe tem sempre seu jeitinho para persuadir os filhos, aqui estou eu. Copacabana, 8 da manhã e ainda temos que ficar de castigo pra não perder o lugar. Por sorte, a Roseni preferiu ficar em casa. Ela e minha mãe ficaram amigas e isso me assusta.

–Filho, faz um favor pra mãe?

–E eu não faço sempre? Olha, já estou aqui, mesmo não querendo vir.

–Que rabugice! Tudo bem que você sempre foi assim, mas piorou com os anos.

–Desculpa. O que quer?

–Será que pode ir comprar algo para nós comermos?

–Claro. Tem preferência por algo?

–Não. O que você achar, pra mim tá bom. Só quero encher a barriga. Ela já está roncando.

Se não tivéssemos saído às 5 horas de casa e vindo pra cá de madrugada, agora estaríamos na pensão e com comida à vontade. Mas, o que posso fazer? Já não adianta chorar sobre o leite derramado.

Fui até uma das barracas e decidi comprar uns sanduiches naturais. Estavam um absurdo de caro, mas é melhor do que ficar com fome. Já estava voltando pro meu cantinho, mas ouvi alguém, que já imagino quem seja, me chamar. Era só o que me faltava.

–Rogé!

–Camilo, o que faz por aqui?

–Eu vim com o Jorge. Sempre passamos nossa virada de ano aqui. Foi em uma virada, há uns anos atrás, que eu conheci o meu amor.

Que “fofura”! Eu não precisava saber disso.

–Fico feliz por vocês. Cadê o Ricky?

–Eu deixei ele com a minha mãe. Ele tem medo dos fogos. E o que tu tá fazendo aqui, hein? Procurando uma namorada?

–Eu vim com a minha mãe.

–Você tem mãe?!

–Tenho.

–Eu vou querer conhecer ela. Me mostra quem é a progenitora dessa obra. –Falou apontando pra mim.

Será que precisa me cantar toda vez? Ele já faz de propósito. Levei ele até onde estávamos.

–Mãe, queria apresentar um amigo da pensão. Camilo, Telma; Mãe, Camilo.

–Prazer, dona Telma.

–Prazer, Camilo, mas me chame só de Telma ou de Tetê.

–Tetê, que história é essa, mãe? Que eu saiba a senhora não tem apelido.

–Não tinha. É assim que o pessoal lá da Bahia me conhece.

–Tu é baianinho, Rogé? Eu me amarro num baiano.

Eu mereço esse comentário.

–Não, Camilo. Sou carioca e minha mãe também, mas ela mora na Bahia.

–Que chique, dona Tetê.

–Obrigada, Camilo.

–Me diz, lá na Bahia tem muitos homens bonitões, não tem?

–Claro que tem.

–Mãe!

–Que é, Rogério? Eu não sou cega. Não liga pra ele, Camilo. Lá tem sim. Os jogadores de capoeira então...

–Conta mais, dona Tetê.

Preferi sair dali antes que aquele papo piorasse. Já era triste minha mãe falar que olha os homens, mas eu não ficaria lá para ouvir o Camilo falar de homens também. Deixei os sanduiches com eles, peguei minha garrafinha de água e fui andar pelo calçadão. Esbarrei com o Jorge, todo enrolado e cheio de tralhas.

–Rogério. Você é a última pessoa que eu esperava ver por aqui.

–Olá, Jorge.

–Por um acaso, você não viu o Camilo por aí? Eu acabei perdendo ele de vista enquanto fui estacionar.

–Ele está lá de fofoca com a minha mãe.

–Ué, você tem mãe?

Outro.

–Tenho. Dona Telma ou Tetê, que eu não sabia, adora fofocar. Vai lá que ela vai gostar de te conhecer.

–Valeu. Vou lá então. Aproveito e monto posto perto de vocês.

–Tá beleza. Vai lá.

Ele correu para o seu amado e eu fiquei aqui. O que fiz, meu Deus? Só a minha mãe já está me enlouquecendo e agora esses dois para colocar mais caraminholas na cabeça dela. Eu continuei ali, afastado, os observando de longe. Riam como nunca. Pareciam amigos que se reencontraram depois de muito tempo. Minha mãe, nesse ponto, era muito diferente de mim. Ela fazia amizades com qualquer um e em qualquer lugar. Já eu... Mas prefiro continuar com minha antipatia. Os amigos que me aturarem serão verdadeiros.

Como não estava com muito ânimo pra aguentar as piadinhas, fui andar um pouco pela praia enquanto podia. Daqui a pouco isso vai entupir de gente e ficará impossível. Acho que fique, pra cá e pra lá durante umas meia hora e decidi voltar para onde o pessoal estava. Me sentei lá e não falei nada. O assunto deles não era muito minha área. Ficamos ali um tempo, até o Jorge e o Camilo verem um conhecido e saírem correndo pro outro lado da praia.

–São bons garotos.

–Garotos, mãe? Já são uns barbados velhos.

–São mais novos do que eu e pra mim são garotos. Devem regular a sua idade.

–De barba.

– Você também já é barbado, literalmente, há dias que não faz a barba, e eu também te chamo de garoto.

–Mas você é minha mãe, é natural que me chame assim.

–Ô ciúme. Vem cá. Você sempre vai ser o meu garotinho, barbado ou não.

Ela me abraçou como fazia quando eu era criança e eu ouvi uma voz bastante conhecida e agradável.

–Que lindos!

–Lívia. –Falei.

Minha mãe levantou e já foi abraçando a criatura sem nem a conhecer.

–Então você é a Lívia?

–Sim, senhora.

–Bom te conhecer. Estava louca pra conhecer a mulher que fez o meu garoto se vestir de piranha.

–Manhê!

–Que manhê, Rogério. Eu só quero conhecer sua amiga. Lívia, não é?

–sou sim e a senhora é...

–Telma, mas pode me chamar de Tetê.

–Claro, dona Tetê.

–Sei que esse meu filho é meio rabugento e peço desculpas por ele. Ele é assim desde criança.

–Eu não sou rabugento!

–É sim Batman. Você é a pessoa mais rabugenta que eu conheço. Concordo com a senhora, dona Tetê.

–Criatura nefasta.

–Ei, Rogério. Que modos são esses? São se chama uma mulher de criatura e nem de nefasta.

–depende da mulher, mãe.

–Tudo bem, dona Tetê. Eu e o seu filho nos apelidamos de forma “carinhosa”, não é Batman amargado?

–Sabe que quando ele era criança ele tinha outro apelido? –E lá vem a minha mãe falar os meus podres.

–Jura? Me conta.

–Mãe...

–Vou fazer melhor, vou te mostrar.

Minha mãe começou a fuçar na bolsa dela e puxou uma foto antiga minha. Puta que pariu, não acredito que ela ainda tem essa foto!

–Te apresento o Garibaldo, Lívia. –Ela disse dando a foto pra criatura.

A Lívia olhou para a foto e depois para mim. Ela não conseguia parar de rir.

–Que coisinha linda que você era. E esse boá de plumas azuis? Cara, depois tu implica com o Jorge e o Camilo por serem gays.

–Eu era criança. Criança não vê maldade.

–Na verdade, Lívia, esse era uma das coisas favoritas dele. Ele adorava esse boá. Dizia que se parecia com o Garibaldo da Vila Sésamo. Não é, Garibaldo?

–Isso é covardia, mãe. Eu nem lembrava mais dessa foto.

–Sabe que Garibaldo está melhor que Batman. O apelido combina mais com você. –A Lívia tirou sarro.

–Então eu posso dizer que porquinha combina mais que criatura nefasta, não é?

–Ei, como você sabe? Por um acaso andou conversando com a minha mãe ou o meu irmão?

–Com os dois, mas sua mãe que me contou. Estamos quites.

–Mas eu tenho sua foto e é mais constrangedor.

–Eu acho que tenho mais algumas fotos, Lívia. Deixa eu achar. –Minha mãe falou e começou a mexer na bolsa.

Ela tirou de lá um pequeno álbum de fotografias. Me dava medo pensar quais fotos ela separou. A Lívia pegou e começou a esfolhar. A cada página ela me olhava e segurava o riso. Não aguentei e tive que me esticar para ver quais fotos eram. Como eu imaginava, eram as piores, iam desde minha infância à adolescência.

–Tá se divertindo? –Perguntei.

–Muito. Essas últimas aqui quando você devia ter uns 16, 17 anos são demais. Maneiro mesmo era esse seu bigodinho e o topete.

–Eu falava isso com ele, mas era teimoso como um burro. As garotas não gostavam desse bigodinho de Clark Gable que ele usava. –E vem minha mãe para ajudar.

–Que isso, gente? Eu também quero ver.

–São fotos, Camilo. Fotos do nosso Batman Garibaldo.

Camilo e Roger apareceram. Era só o que me faltava. Queria poder ser um avestruz e enfiar a cabeça na terra. Essa noite vai ser longa com as zoações que estão por vir. Eu devo ter sido o carrasco que espetou Jesus na outra vida para merecer esse castigo.

Continua.


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