Noite de lembranças escrita por Cary Monteiro


Capítulo 5
Capítulo V


Notas iniciais do capítulo

Notas no final.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/613049/chapter/5

– Rápido, para dentro da TARDIS! Antes que ele chegue aqui...

– Boa ideia.- disse Clara entrando na nave logo atrás do senhor do tempo.- O que vamos fazer agora, Doutor?

– Simples.- respondeu ele. E começou a falar num microfone:- Estamos nos dirigindo ao salão onde você assassinou uma pessoa, estaremos lá te esperando para discutir os termos de sua rendição.

– Você acha que ele vai se render? - perguntou a garota, cética.

– Nenhum pouco. Mas é melhor sabermos onde está um assassino do que não sabermos. E lá vamos nós.

A TARDIS mais uma vez decolou em seu voô quase giratório. Dessa vez seu alvo não era um vitral ou uma parede, mas sim a cúpula no salão onde estava o sangue. Ela subiu até quase o límite do domo da estação, para então descer em grande velocidade sobre o cúpula de vidro reforçado.

Bast’ak havia acabado de entrar no salão onde o Doutor falou que ia encontrá-lo. Sua grande tropa de três judoons lutava bravamente pelos corredores até alguns metros antes, quando o úlitmo dos soldados fora morto por uma serra de canos. O inicial batalhão que continha treze judoons foi reduzido a nada. Apenas seu comandante estava vivo e sem muitas esperanças.

Sua entrada apressada e heróica foi interrompida por um barulho de vidro, seguido de uma chuva dos estilhaços que se espedaçaram. Descendo entre a chuva arco-irística de vidro, estava uma grande caixa azul que a maioria das criaturas do universo ja ouvira falar, tanto como sinal de ajuda, quanto de terror.

– Rápido, Clara. Ele pode aparecer a qualquer momento.- Disse o Doutor pegando a mão de sua amiga e arrastando-a para fora da TARDIS.- Ah, oi, Bast’ak. Onde está o resto do seu grupo?

– Morto ou pior. E do seu?

– O mesmo.

– Vocês falam isso como se fosse a coisa mais natural de se acontecer.- Falou Clara em resposta a essa pequena conversa.

– Mas claro que é. Tudo nasce, cresce e morre. É a ordem natural do universo, quem sou eu pra mudar isso?

– Normalmente o primeiro na fila.- ela respondeu friamente.

– Bom ponto. Mas agora tomem cobertura, ele está vindo. - o Doutor comunicou. Todos três ficaram bastante apreenssivos. Esperando por algo para acontecer. Mas depois de longos cinco minutos, só era possível ouvir respirações. Clara suspirou irritada.

– Achou mesmo que isto fosse funcionar?! - Ela virou para o Doutor e perguntou.

– Não custava tentar! - ele se explicou.

– Se eu fosse o assassino, eu não ia me entregar assim, de bandeja. Aliás, o que houve contigo? Está todo arranhado.

– E você está completamente suja dos pés até a cabeça, mas eu não fiquei te perguntando.

– Bom, não é todo dia que se cai num container de poeira até a boca.

– Bom, não é todo dia que se pula em um arbusto coberto de espinhos… Pensando melhor…

– Doutor, acho que eu ouvi alguma coisa! - Bast’ak acionou. - Os três se calaram e procuraram por barulhos que não viessem deles próprios. Mas nada veio. Agora a apreenssão deles se transformava em terror. Eles se entreolharam, incapazes de saber como agir. O Doutor pos a mão no queixo, tentando recolher as pouquíssimas informações que tinha e pensar na sua próxima jogada, porém isto estava se tornando uma tarefa difícil quando o próprio assassino também era um jogador e tanto.

Uma luz azul intensa tomou conta do salão fazendo com que tudo banhado por ela passasse a levitar lentamente.

– Doutor! Estamos sendo abduzidos?!

– É exatamente isto que está acontecendo! Haaa! - O Doutor comentou, sorridente. Clara passou a mão no rosto e suspirou. O passeio não durou muito, a luz na verdade era um teletransporte que os levara para dentro da nave do misterioso assassino. - Em posição de ataque, Bast’ak. Agora sim tudo pode acontecer.

– Eu não preciso das suas ordens, Doutor. Eu não ganhei esta cicatriz e sobrevivi para receber ordens de um velhote!

– O velhote aqui é tão bom no que faz que nem nunca sofreu cicatrizes!

– Seguinte! O nível de testosterona está ridiculamente alto. Dificilmente isto nos ajudará em alguma coisa. - Clara comentou, tentando fazer com que os outros dois parassem de discutir.

– Clara tem razão. Estamos no ambiente do inimigo agora, precisamos fazer as questões corretas. - Uma risada gutural vinda de todos os cantos e lados interrompeu-os. O Doutor sorriu.

– Você é mesmo diferente. Eu gosto de diferente. - a voz disse.

– Temos este gosto em comum, já somos praticamente amigos.

– Muito corajoso da sua parte me enfrentar. Ou muito estúpido, talvez…

– Quem irá dizer se sou um ou outro serei eu mesmo. O seu show não foi capaz de nos abalar.

– Nada disso, Doutor. Eu apenas gosto de brincar com minhas vítimas. Ver do que elas são capazes.

– Você é um verme que eu terei o imenso prazer de esmagar! - Bast’ak gritou. O Doutor revirou os olhos, típica criatura primitiva. A voz se calou por um momento e logo retornou a falar:

– Você tem algo que me pertence, Doutor.

– É uma pena que nem eu e nem você possamos resolver isto, não é?

– Será mesmo? - alguns momentos se passaram e a voz não retornara a dizer mais nada. Um barulho ao fundo foi ouvido, como o abrir de uma porta grande e pesada. O Doutor lançou um olhar ressentido para Clara.

– O que houve, Doutor? - ela perguntou, preocupada.

– Não é nada. Vamos andar. Eu não quero facilitar para o nosso amigo.

Os três começaram a andar no corredor do lado oposto de onde havia vindo o barulho. Clara olhou pela grande janela que tinha na parede e pode ver o palácio bem abaixo deles, porém do tamanho de uma casa de bonecas, o que significava que não seria tão fácil de escapar daquela nave.

– Doutor. A essa hora você já deveria saber com o que estamos lidando, não? Doutor? - Clara perguntou enquanto andava ao lado do homem e do rinoceronte. O Doutor continuou com o olhar apenas para a frente. Ele suspirou e observou Clara.

– Clara, eu já encontrei tantos assassinos, monstros, alienígenas, tantas pessoas que poderiam se encaixar nas poucas características que eu coletei que eu não tenho como lhe dar certeza.

– Nós devíamos encontrar um meio de explodir essa nave e pronto! - Bast’ak comentou, irritado.

– Talvez um bom plano, mas eu duvido muito que nosso anfitrião nos deixará mexer em alguma coisa.

– Argh! - Bast’ak urrou. Ele pos a mão no braço esquerdo e ajoelhou ao chão. O Doutor e Clara se posicionaram cada um de um lado da criatura para entender o que havia acontecido. Devagar, Bast’ak retirou a mão da frente, mostrando o ferimento exposto. Um grande corte em seu braço que não parava de sangrar. Clara no mesmo instante retirou um lenço do bolso e amarrou em volta da ferida, tentando assim retardar o processo. O judoon pareceu surpreso com o ato de bondade.

– Obrigado, humana. Quer dizer, Clara.

– Não é nada. O mínimo que eu posso fazer depois que… - Clara interrompeu-se e levantou. O judoon pareceu confuso e continuou a olhá-la. - G’lib foi um grande soldado. Ele salvou minha vida. - Ela explicou. Bast’ak endireitou-se e afirmou lentamente com a cabeça, em sinal de respeito pelo pequeno judoon.

– Pergunta: o que não podemos ver, nem ouvir, mas que pode nos ferir?

– Talvez ele seja bastante rápido. - Clara tentou responder. O comentário fez o Doutor sorrir.

– Talvez. Mas creio que isto seja impossível devida as circunstâncias.

– Arrrgh! - Bast’ak gritou outra vez, caindo ao chão num baque. Dessa vez havia um grande corte se abrindo em suas costas. O Doutor se ajoelhou ao seu lado. - Eu… Não vou morrer ainda, velhote… - ele balbuciou em extrema dificuldade e desmaiou.

– Ótimo, menos um.

– Desculpe o mal jeito. Mas eu precisava me livrar da criatura primitiva. - A mesma voz anterior comentou, dessa vez ela podia ser sentida mais perto, como se o dono estivesse bem ali junto deles. Mas para todo lado que olhavam, não viam ninguém.

– Está invisível! Mas que golpe baixo! - O Doutor vociferou.

– Cada um usa as ferramentas que tem.

– Mantenha Clara fora disso. O que você quer está comigo.

– Dê-me as memórias e talvez eu seja misericordioso.

– Doutor, do que ele está falando? - Clara perguntou, desconfiada.

– Eu não tenho como e prefiro deste jeito. Morrerei com elas se for preciso.

– Que assim seja. - A voz disse e então se calou. As luzes se apagaram e do chão brotaram feixes de energia que iam até o teto.

– Não toque neles! Pode ser fatal! - O Doutor gritou esbaforido, separando-se de Clara. Os feixes se juntaram e formaram uma espécie de parede entre ele e Clara. O Doutor sacou a chave-de-fenda sônica e usou-a contra a parede de energia. - Clara, fique longe! - e ela obedeceu no mesmo instante, sem tirar os olhos do que o senhor do tempo pretendia fazer. Ele segurava a chave-de-fenda com as duas mãos, apontando diretamente para o espelho que ia passando a se desfazer bruscamente e soltar faíscas. Num estouro uma nuvem de fumaça se formou, deixando Clara cega para o que estava acontecendo. Uma mão pegou na sua de repente e a puxou pelo corredor, obrigando-a a correr.

– Vamos, Clara! Corra! Corra! - o Doutor exclamou e a garota passou a correr ao lado dele sem precisar ser puxada. Eles corriam para longe da fumaça, incertos de onde iam parar.

– Não tão rápido, engraçadinhos. - a voz retornou a falar. Mais feixes de energia vieram a brotar do chão sob eles enquanto corriam, tentando salvar suas vidas. Os feixes chegavam cada vez mais rápido, até que finalmente um destes veio de encontro com a Clara. Ela urrou de dor pelo choque e desmaiou ao chão.

“Aquele sonho de novo”, Clara percebeu assim que avistou o salão e as pessoas dançando nele uma valsa lenta. A música também era a mesma, mas diferente da vez anterior, ela batia de forma rítmica, como um latejar, ficando mais alta e depois voltando a ser baixa. Isto estava irritando Clara. Ela não podia curtir seu sonho em paz dessa maneira.

“Clara!! Clara!!”, ela ouviu, sem dar a menor atenção. Os casais faziam piruetas ao dançar e os vestidos, cada um mais belo que o outro, com tecidos que esvoaçavam vagarosamente pelo ar, varrendo o chão em profunda leveza. “Clara, acorde!”, chamaram outra vez. Ela conhecia essa voz. Ela achava que fosse do Doutor. Ela então se lembrou do que estava fazendo. Dos judoons, do palácio e do feixe de luz. Clara acordou olhando para um preocupado senhor do tempo. O chão da nave estava frio e sua cabeça jazia na coxa do Doutor, pulsando em dor, chegando a lhe dar náuseas.

– Clara, que susto acaba de me dar. Não faça mais isso outra vez. - O Doutor aconselhou. Clara suspirou profundamente e passou a mão no rosto.

– Doutor. O que foi que houve?

– Um feixe de energia bateu em você fazendo com que desmaiasse por conta do seu poder. Por sorte foi só de raspão. Um pouco mais e talvez você não tivesse sobrevivido. - Ele começou a explicar. Clara sentiu uma área molhada na testa com a mão e quando olhou estava manchada de sangue. Era de onde vinha a maldita dor. - O seu estado deu tempo suficiente ao nosso anfitrião de nos prender novamente, desta vez com menos espaço… - Clara observou que a parede de energia estava vibrante bem em volta deles, funcionando como uma cela. - Eu não posso tentar quebrar a barreira sem nos explodir no processo. Felizmente o assassino está em dilema assim como nós e não sabe o que fazer conosco, pelo menos por hora. - Clara ouvia tudo sem realmente prestar atenção. Ela pos a mão no chão e com um pouco de dificuldade, sentou-se.

– Doutor. Será que agora você pode explicar o que está havendo?

– Eu acabei de fazer isso.

– Sabe do que eu estou falando, e não minta para mim, minha paciência já está esgotada.

– O que quer que eu diga? - o senhor do tempo envergou as sobrancelhas, desafiando-a.

– O que foi essa conversa sobre memórias? Até agora você não me explicou o que aconteceu ontem, eu estou completamente no escuro!

– Clara, eu pedi para que confiasse em mim, não pedi?

– Olhe, eu vi o estrago no salão. Não há jeito de eu ter esquecido daquilo apenas com bebida. Apenas diga-me logo o que foi que houve. Porque insiste em esconder isto de mim?

– O seu estado. Você estava terrível depois do que aconteceu. Eu precisava fazer alguma coisa.

– Então você está me dizendo que retirou minhas memórias de ontem?

– Clara, escute-me! Isso não só foi para seu bem, como também fiz para protegê-la! O assassino está atrás de mim porque eu as tenho e não você! - O Doutor tentou esclarecer, mas Clara já olhava-o de forma inerte.

– Porque ele as quer? O que há de tão interessante nelas? - Ela começou a questionar num tom firme, sem tirar os olhos do Doutor.

– É o que eu estava tentando descobrir. Eu não posso usar suas memórias para isto. É como se houvesse um cadeado, não posso acessá-las. Achei que ele fosse um raston, por conta da extrema velocidade e inteligência de combate, mas rastons são criaturas de tecnologia tremendamente avançada, que permanecem no vale da morte, isto não seria possível. Também não explica a necessidade em apagar a memória de todo mundo.

– Me dê isso.

– O quê?

– As memórias! Passe de volta para mim. Pode fazer isso, não é?!

– Sim, claro, mas não irei. Não escutou o que eu acabei de dizer?

– Doutor, não consegue ver? Se ele quer tanto essas memórias, só pode significar uma coisa: que eu sei quem é ele. - o Doutor abaixou a cabeça.

– Sei disso, mas continua sendo muito perigoso. Comigo ele não tem como retirá-las, a não ser me matando, mas de volta a você… E ainda tem outro fator.

– Doutor… - ela passou carinhosamente a mão no maxilar dele. - Sei que vai pensar em alguma coisa e nos tirar desta. - Ele encarou-a muito sério, suspirou e desistiu de tentar lutar contra.

– Muito bem. Faça exatamente o que eu fizer. - O Doutor se posicionou bem na frente de Clara, pos as mãos em suas têmporas e fechou os olhos. A garota seguiu os movimentos, tentando esquecer a dor na cabeça e se concentrar. - Eu estou prestes a lhe passar uma noite inteira de memórias intensas. Prepare-se!


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Esse é meu capítulo favorito. Eu não queria ter que acabar a história, mas tudo tem um fim, não é mesmo? Deixe um comentário se puder e obrigada pela visita!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Noite de lembranças" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.