– Ei! - Clarke disse, subitamente mais recuperada. - Você não devia estar aqui!

Clarke não sabia o nome do garoto, nunca sequer soube que ele existia. E, definitivamente, era um invasor. Afinal, só uma pessoa foi autorizada a descer. O que ele fazia aqui? O desconhecido a encarava, parecendo entediado:

– Obrigada pela recepção calorosa, também é ótimo estar na sua companhia. - a porta se abriu e ele pôs os pés na rampa, quase em contato com o chão. - Aliás, meu nome é Bellamy Blake. Você é...?

– Clarke. - falou, ainda desconfiada. - Hã... O ar não parece tóxico. Pronto para ir?

Bellamy assentiu. O que ela estava fazendo? Estava mesmo cogitando sair da nave com um cara que ela nunca viu na vida e que, certamente, poderia ser um criminoso? Eles saltaram para fora da nave, seus pés aterrissaram na grama fofa.

Clarke focou na floresta, na luz do sol em contraste com as folhas em verde vivo das árvores. Tudo ali era tão normal e, mesmo assim, tão...perfeito. Quando Bellamy passou a sua frente, Clarke finalmente percebeu: Ele não usava o bracelete. Ele realmente não devia estar ali.

– Sei o que está pensando, princesa. - Bellamy assentiu, parando de caminhar, apenas alguns metros depois da nave. - Fiz uma coisa para ajudar alguém. É por isso que estou aqui, por isso entrei na nave. E, se sobrevivermos, o que é um grande "se", não pode contar para ninguém.

– Tudo bem...Eu... - Clarke tinha dificuldades até para abrir a boca, de tanta excitação dentro dela. Queria mudar logo de assunto. - Acho que devemos explorar, procurar água, os mantimentos da nave não devem durar mais que dois meses. Um mês, já que você está aqui.

Então, eles andaram, os dois, em silêncio, por um longo tempo. Clarke não tinha coragem de dizer alguma coisa, e Bellamy era pretencioso demais para olhar para trás e conversar com a garota. Mais ou menos, depois de uns dez metros, ele foi dizer alguma coisa.

– Por que te mandaram aqui? Mais de mil pessoas na Arca, e escolhem uma garota de 16 anos para ser a primeira pessoa a pisar na Terra, em 97 anos? - Bellamy deu um sorriso sarcástico. - Não me parece muito sensato.

– E invadir uma nave por "certo alguém" é muito sensato, certo? Aliás, eu tenho 18. - ela bufou.

– Mesmo assim, por que gastaram uma nave para apenas uma pessoa? - Bellamy questionou, desviando de um galho. - Já que queriam testar se a Terra é habitável, por que não mandaram todos de uma vez?

– A Arca está morrendo. - Clarke anunciou, sem rodeios. - Possuem três meses de mantimentos, talvez quatro depois que mandarem os 100.

– Por isso mataram seu pai e te prenderam? Ele sabia demais, você sabe demais. Por isso que te mandaram primeiro. Se você morresse aqui, não correria risco de todos saberem. - Bellamy pensou por um tempo, considerando que Clarke era muito mais que só uma loira qualquer. Ele murmurou para si mesmo. - Muito esperto.

Clarke o encarou, pensando como ele poderia saber sobre tudo aquilo. Mas, antes que questionasse, ela avistou algo que seria, no mínimo, milagroso: Água. Um rio inteiro ali, exclusivamente deles.

– Espera. Temos que ter certeza que não é perigoso. Se eu jogar uma pedra, ou algo assim, talvez possamos entrar, mas... - Clarke disse, erguendo uma pedrinha da terra. Bellamy não esperou por ela, apenas correu e se jogou na água. Ela revirou os olhos. - Claro, ou você pode fazer isso.

Ele sorriu. O sorriso de Bellamy era engraçado. Aquele tipo de sorriso que, tanto pode significar alegria e excitação, quanto malícia e mistério. O tipo de sorriso que poderia querer te matar ou te beijar.

– Bellamy, é sério! Essa água pode ser perigosa, não sabemos o que aconteceu aqui, muito menos por quanto tempo ela está nesse estado. - reclamou, ao que parecia nem notar sua existência.

Bellamy cruzou os braços abaixo da cabeça:

– Devia relaxar, princesa. Sabe que tudo vai ficar pior depois, não sabe? Depois que os 100 chegarem, eu serei o líder.

–Nós seremos os líderes. - ela corrigiu.

Clarke encarou com inveja a água cristalina e Bellamy nadando nela, tranquilamente. Ele estava provocando-a, ele sabia disso, mas...Estava tão quente, e eles tinham andado tanto...Faria mal apenas um mergulho?

Clarke tirou sua calça, e apenas isso. A última coisa que ela precisava era ficar pelada em frente de um cara que nem conhecia. Entrou rapidamente, aproveitando que Blake estava de olhos fechados.

Não pode evitar de sorrir, quando a água gelada tocou sua pele ferida pelo sol. Clarke lavou o rosto, e deixou seu corpo repousar por um instante. Só quando ergueu a cabeca, reparou em Bellamy. Ele permanecia de olhos fechados, descansando. O que tinha de errado naquela cena? Por que Clarke tinha um pressentimento de que algo ruim ia acontecer?

Foi quando ela a viu.

– B-Bellamy... - Griffin gaguejou, seu corpo inteiro congelou, enquanto se afastava e se deslocava até as rochas, fora do lago. - Bellamy, sai da água. Devagar.

Ele parecia ter acordado de un transe, quando cometeu o erro de olhar para trás. Alguns metros atrás de Bellamy, nadando sorrateiramente, estava a maior cobra que Clarke havia visto. Talvez aquilo fosse um monstro disfarçado, seria muito mais provável.

Clarke já estava fora do lago, mas Bellamy ainda residia no meio. Ela pôde ver Blake se mexendo vagarosamente, centímetro por centímetro. Se ele corresse, tinha grandes chances de ser mordido. Mas, se ficasse...

Ela pensou em tudo o que podia para ajudar, mas nada parecia muito promissor. Foi então que, com um erro de movimento de Bellamy, a serpente o notou. Agindo por puro instinto, Clarke pegou um pedregulho, mais ou menos do tamanho de sua mão.

– Bellamy, vai! - berrou, logo depois da garota ter jogado a pedra. Aquilo só pareceu irritar a cobra mais ainda, então ela jogou mais pedras, qualquer coisa que ganhasse tempo até Bellamy chegar as rochas.

– Clarke, corre! - ele ainda teve tempo de gritar para a garota, no que se aproximava da superfície.

Bellamy foi puxado para baixo. As águas voltaram a seu fluxo normalmente, calmas como nunca. Clarke gritou, não conseguiu evitar. Não podia obedecer o mais velho e simplesmente deixá-lo ali, para morrer. Como viveria sabendo que podia ter ajudado alguém e não o fez?

Então, Clarke mergulhou na água.