Save You escrita por Mrs Neko


Capítulo 7
Capítulo 7 - Vontade de Viver


Notas iniciais do capítulo

Na verdade, era para estes acontecimentos se encaixarem no capítulo 5, mas o resultado ficaria muito longo e confuso. Sem contar que a promessa heroica do Greg partiu meu coração. Então, tentarei desesperadamente não cometer o mesmo erro do capítulo 3 (que talvez será reescrito oportunamente), virar a página e continuar a história por aqui... Boa leitura!



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Mesmo enquanto a névoa de dor, uma variante do pavor do pesadelo, a contemplação de um pequeno Sherlock mutilado, torturava Mycroft, uma ideia discreta, o incômodo do movimento espontâneo e indesejado da bagunça em algum cômodo de seu palácio mental, teimava em tentar chamar a atenção do estrategista ruivo.


Desde pequeno, seu irmão caçula "brincava de cientista" com quase o mesmo entusiasmo que "brincava de pirata". Embora a última opção fosse a preferida de todos da casa, pois frequentemente o único envolvido nas aventuras marítimas do garotinho era o paciente cachorro Redbeard, e praticamente todos os estragos causados pelos teatrinhos improvisados do pequeno se restringiam a uma parte do jardim da mansão. Até que as ilhas do tesouro foram abandonadas em prol das experiências, cuja principal cobaia era o próprio Sherlock, que usualmente só parava quando um adulto o via queimado ou ferido.


Desde a mais tenra idade, ele era constantemente viciado em qualquer coisa que lhe ocupasse o intelecto. Depois de adulto, aparentemente, ele dirigiu o hábito para a cocaína. E ao conhecer o policial Lestrade, para os casos não-solucionados pela New Scotland Yard.


Enquanto houvesse um brinquedo para distrair a mente genial que guiava o coração imaturo, Sherlock sempre superaria o tédio e o passado, e conservaria a vontade de viver.


Porém, seria possível que o isolamento absoluto, a falta de uma figura adulta em sua vida, alguém capaz de guiá-lo e oferecer ternura, faria com que ele perdesse o controle da própria brincadeira inconsequente, a ponto de roçar a morte... com uma overdose?


Sua mente buscava, sem sucesso, reconstituir a sequência de ações que levou o jovem à dosagem suicida; enquanto seu coração se partia ainda mais, ao perceber, sob a máscara de oxigênio, a voz rouca do irmãozinho balbuciar fracamente, quase inaudível, chamando pelo pai e, com um fraco esgar que em algum lugar de sua inconsciência talvez fosse um riso, por Redbeard.


O diplomata secreto soltou um suspiro triste e quase imperceptível. Desviar os olhos não apagaria de sua mente a consciência da realização de um pesadelo. No entanto, o simples fato de ver o irmão, uma das pouquíssimas pessoas com quem se importara em toda sua vida, naquele estado decadente, era algo que arrancava todas as forças que seu coração ferido e seu corpo exausto tentassem juntar.
E sua amargura transformou-se em uma desagradável e constrangida surpresa, ao desviar a visão para o corredor e deparar-se com outro par de olhos exaustos e emocionados. Os olhos de Gregory Lestrade.


E estava escrito, naqueles úmidos olhos ricamente castanhos, que muito da emoção que os fazia brilhar, vinha da contemplação da inconsciência e do desespero daqueles irmãos. Um desespero de que ele próprio compartilhava, ao culpar-se por acreditar ter agido pouquíssimo, e demasiado tarde, para salvar o jovem amigo.


Com um esforço hercúleo, Mycroft afastou a mão que afagava os cachos do mais novo. Sherlock não se quebraria, não mais do que já estava, se eles rompessem o contato. Aquele toque frio e macio podia até transmitir um alívio ilusório, a noção da presença frágil do caçula no mundo dos vivos. Mas não o forçaria a recobrar a consciência.


Em poucos movimentos cuidadosos e sem barulho nenhum, o Governo Britânico saiu da UTI, ao encontro do policial.


– Muito obrigado por me chamar, inspetor.


A mesma voz eloquente e aveludada que o saudou, na rua, diante do hospital. Mas o tom claramente sincero fazia o som elegante ainda mais agradável. Greg tentou, em vão, conter um pequeno sorriso, que começou a confortar, junto com as palavras gentis, o coração do interlocutor.


– Eu é que agradeço, sr. Holmes. Só queria ter chegado no "apartamento" dele mais cedo... E talvez nada disso teria acontecido.


As pessoas comuns se iludem com tanta facilidade, notou o aristocrata, com pena da bondade ingênua de Lestrade. Mas a fala dele despertara uma possibilidade para compreender como e por que o irmão se entregara, pela última vez em um tempo considerável, a tamanha loucura.


– O senhor poderia me levar até o local em que encontrou Sherlock... por favor?


A educação impecável, que tornava o pedido quase hesitante; e naquele magnífico olhar azul-cinzento, uma estranha necessidade de descobrir algo que parecia insondável. Diante de tal apelo, tudo que Gregory podia fazer era concordar.


Apenas três passos das suas pernas longas bastavam para atravessar aquela miserável cozinha improvisada. A mesa bamba de madeira compensada ordinária; a pia gotejante, os armários vazios; restos de jornais, substâncias químicas e cacos de vidro...


Bom Deus, qual resolução maldita convencia Sherlock a permanecer escondido naquele buraco imundo?! E era de se admirar que ele não estivesse ferido quando Lestrade o levou ao hospital.


A economia de movimentos com que Mycroft percorria aquela bagunça era proporcional à infeliz facilidade com que seu palácio mental reconstituía a sequência dos acontecimentos anteriores à ligação que o chamou até St. Barts. No fundo de seus olhos, no fundo de sua mente, ele revia, milhares e milhares de vezes, a imagem ofegante do irmão enquanto se injetava e debatia; a agonia desesperada do pobre Gregory, como se perdesse um filho.


Ele já se sentia como se houvesse perdido o irmão e sufocou a agonia exatamente semelhante que sentia, ao abaixar-se para pegar os aparentes restos de um prontuário policial.


– Suponho que este era o caso em que estavam trabalhando ontem. - ele estendeu os restos da pasta, e as fotos da vítima eviscerada, para o inspetor, após folheá-la e deduzir o estopim para a insanidade do irmão menor.


– Sim, era este mesmo. - Greg estranhou a atitude apática do acompanhante e aceitou o arquivo de volta. - Mas Sherlock não viu esta pasta. Ele saiu da cena do crime, praticamente correndo, e como eu costumo visitá-lo, pra ficar de olho nele, trouxe o prontuário do caso... Um dos piores que já peguei em toda minha carreira, posso lhe garantir, sr. Holmes...


Ambos fizeram uma pausa ao ouvir um toque de celular. O estrategista do governo conferiu a mensagem recém-chegada com decepção; era uma péssima hora para ser afastado do estado grave do caçula pelo trabalho. A gravidade do chamado era ainda pior e não lhe dava escolha. Mesmo assim, sua atenção ainda estava na voz rouca e cansada do inspetor, que, num tom baixo, falava mais para si mesmo.


– Mas não entra na minha cabeça, como isso tudo pode ter acontecido. Simplesmente ainda não entra...! Quanto menos tempo entre um caso e outro, e quanto piores eles são, mais esse menino fica entusiasmado. Então por que, por que, ele tentou se matar?!


A pergunta parecia um eco ofensivo e amargo no silêncio da madrugada, um eco que fez o grisalho perceber que seus pensamentos adquiriam uma voz mais alta que a da própria mente. Quando tentou, constrangido, desculpar-se com o homem que trouxera ao apartamento esquálido, percebeu-se num vácuo, já que o ruivo elegante descia as escadas decrépitas, falando ao celular. Quando enfim conseguiu alcançá-lo, fora do prédio, viu um carro preto, de vidros fumê, se aproximar do meio-fio, com a mesma rapidez e sutileza com que Mycroft lhe disse uma frase pequena e significativa.


– Acontece, meu caro inspetor, que o pior assassinato possível já aconteceu para nós.


E enquanto ele se afastava para entrar no luxuoso Jaguar preto, Greg compreendeu que os irmãos Holmes haviam perdido um ente querido em circunstâncias traumáticas e, provavelmente, criminosas.



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Notas finais do capítulo

Você teria a bondade de me imaginar ajoelhada e chorando, com minhas orelhinhas de gato dobradas e os bigodes arrastando no chão de pura tristeza e vergonha pelos dois meses sem atualizações...? Mas, como expliquei nas notas do capítulo 5, estava afogada sob mares e montanhas de trabalhos da faculdade. Por enquanto, vou ver como consigo conciliar a escrita da fic com meu trabalho. Se necessário me bata ou me apedreje, apenas, por favor, não se apoquente. "Save You" já está chegando em sua reta final! :)

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