Begin Again escrita por arizonas


Capítulo 1
On a Wednesday, in a café I watched it begin again


Notas iniciais do capítulo

Tá aí mais uma one-shot fofinha, sem personagens profunda e psicologicamente analisados (para o meu desgosto), mas só pra vocês vomitarem arco-íris de novo, pq lately ando boazinha.Dedico essa aqui pra Lali Albuquerque, que super me incentivou, ameaçou me bater se eu não postasse etc ♥ kkkk Obrigada, linda! Por toda a sua ajuda e paciência O:) E o Peeta "muffoso" é completamente seu!!Boa leitura!PS. 'Diner' é um restaurante pequeno e barato, normalmente aberto 24 horas.Cup of Joe's é uma expressão em inglês para xícara de café preto.



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Johanna estava excepcionalmente mal humorada naquela noite. De qualquer forma, Katniss estava grata pela presença dela: os comentários da amiga eram sempre feitos por meio de cochichos para não aborrecer os clientes, mas nunca falhavam em fazê-la rir. Além disso, era bom ter companhia naquelas inóspitas horas da madrugada. Até mesmo ela, que encontrava na solidão um silêncio agradável tinha de confessar que suas noites passavam muito mais rápido com Johanna do que sem ela.

— Puta que pariu, eu preciso de um cigarro. - Desabafou Johanna enquanto se debruçava pela pequena janela que comunicava o restaurante à cozinha. Antes que Katniss pudesse responder, ela guinchou. — OI! Faça-me o favor, quantos anos você precisa pra fazer uma porra de uma torrada? — O cozinheiro, Thresh, encolheu-se enquanto rapidamente deslizava as fatias de pão crocante para um prato. Katniss sentiu pena dele. Por mais divertida que Johanna fosse, ela podia ser um pouco intensa quando insatisfeita ou cansada.

— Dá um tempo, Jô. — Katniss lançou um olhar de simpatia a Thresh quando ele entregou o prato à Johanna pelo buraco retangular e tratou de escapulir para os fundos da cozinha, como se Johanna fosse morder a mão dele se continuasse ali. — Ele é novo aqui.

— Bah! — A garota, que tinha os cabelos ruivos de pontas tingidas de cor-de-rosa, revirou os olhos. — A comissão já é uma merda nesse horário, já que ninguém são pensaria em sair pra comer de madrugada. Se o pedido atrasa, a gorjeta é ainda menor. — Johanna se justificou, e por mais que seus meios de demonstrar indignação fossem meio indelicados, Katniss tinha de concordar: a comissão naquele turno era péssima.

Apesar disso, Katniss havia aprendido a gostar da 'vez' da noite. Ela entrava às 22h e só pegava o metrô para ir para casa às 6h, mas o salário não era tão ruim apesar do número menor de clientes daquele horário. Por estar de férias da faculdade, mas nunca do aluguel do seu pequeno apartamento, Katniss tinha de aproveitar qualquer emprego que a aceitasse sem aviso prévio, e o diner havia sido o local perfeito: seu gerente, Haymitch Abernathy (que raramente estava sóbrio) não fizera perguntas e nem hesitou ao passar-lhe o avental azul bebê repleto de buttons randômicos de metal no formato de xícaras de café, panquecas e ovos com bacon.

Fazia dois meses desde que iniciou seus serviços e, até então, cuidava do lugar praticamente sozinha. Normalmente, ela era a única garçonete disposta a trabalhar naquela grade de horas doidas, naquele veneno chamado trocar a noite pelo dia, mas não se importava. Não havia muito movimento que exigisse outros garçons, e tudo que ela tinha que fazer era anotar pedidos e levá-los até suas respectivas mesas. No final do turno, esperava Haymitch aparecer e ia embora. Katniss tinha algumas olheiras para cobrir com maquiagem e estava um pouco exausta, mas saber que não ficaria em vermelho no banco quando pagasse suas contas era o suficiente para que tolerasse a rotina. Além disso, uma vez que o período letivo começasse, ela teria o seu emprego de meio período na biblioteca da faculdade novamente, e não precisaria mais passar suas madrugadas em claro trabalhando (porque certamente as gastaria estudando como doida).

No início de Agosto, no entanto, ninguém mais do que sua teimosa colega de faculdade enfiou na cabeça que iria trabalhar no mesmo lugar que Katniss, depois de decidir que passar as férias na casa dos pais não era tão boa ideia como ela pensou que seria no começo do recesso de Verão. Como também tinha um senhorio para pagar, Johanna submeteu-se a aceitar a última vaga que Haymitch podia lhe oferecer, a de uma segunda garçonete noturna — que não era realmente necessária, mas o homem tinha um bom coração. Dessa forma, as horas de Katniss passavam mais rápido, agora que ela tinha o silêncio preenchido por conversas com a amiga (algumas vezes, ela sentia falta da calmaria de trabalhar sozinha, mas não admitiria isso nunca).

Katniss estava prestes a pegar o pano para limpar as mesas vazias por simples tédio quando notou o estranho na cabine mais distante do balcão. Ele estava cabisbaixo e por conta disso foi difícil notá-lo, mas ela esperava que ele não estivesse ali por muito tempo sem ser atendido. Esticou seu avental e caminhou até a cabine, com o bloco de notas e a caneta em mãos, e o cardápio de apenas uma folha frente e verso enfiado debaixo do braço.

— Boa noite. Bem vindo ao Effie's. — Ela cumprimentou e depositou o cardápio na mesa, finalmente se sentindo útil por atender o que seria seu primeiro cliente do turno. Já passava da meia noite, e Katniss estava realmente começando a se sentir inútil.

O homem não respondeu de imediato. Ela não conseguia ver muito do rosto dele por baixo daqueles cachos loiros que caíam sobre sua testa, mas ele estava vestido como alguém da idade dela (com roupas que pareciam excepcionalmente boas), e pelo pouco de sua face que realmente aparecia, ele realmente deveria ter no máximo vinte e três.

— Só café. Preto, sem creme. Obrigado. — Ele não encostou no cardápio, e Katniss não se incomodou em anotar o pedido enquanto fazia que sim e voltava para o balcão. Encheu a xícara pequena da fumegante substância preta e levou-a em cima do pirex até a mesa do loiro.

Ele olhou para ela quando voltou, e de repente fazia muito calor ali, mesmo para uma noite de chuva pesada. Ele tinha bonitos olhos azuis e um semblante agradável de se olhar, mas assim que Katniss pousou a xícara na frente dele, seu olhar se voltou para baixo. Ele agradeceu, e ela pediu licença antes de voltar para trás do balcão.

Enquanto procurava possíveis manchas não limpas por Johanna nos copos de milkshake da última lavagem (a ruiva era péssima com louça) Katniss observou o estranho pelo rabo do olho e se perguntou porque se incomodava tanto. Quantos fregueses quietos ela havia atendido, ora? Vários. Não sabia o motivo pela sua inquietação. Talvez, era só porque estivesse excepcionalmente entediada. Tinha que ser.

Uma vez terminada sua inspeção dos copos, Katniss caminhou até a cabine do estranho para perguntar se ele desejava um refil de seu café, e franziu o cenho ao notar que o banco estava vazio. Ele tinha ido embora, e ela nem havia notado. Se não fosse pela xícara pousada em cima da mesa — ainda cheia até a boca, valia observar — e dinheiro pousado ao lado dela, ela teria pensado que tinha alucinado a presença dele ali.

Katniss suspirou, prestes a retirar a xícara de agora café frio quando notou que o pagamento deixado pelo estranho era mais do que suficiente para pagar pelo seu pedido e deixar uma gorjeta bem generosa. Vinte dólares! Ele certamente havia se enganado. Uma cup of Joe's* ali custava apenas um dólar e cinquenta, e ninguém deixaria US$18,50 de gorjeta para ela, nem se se ajoelhasse e boquetasse o cliente bem ali.

Depois de agarrar a nota, Katniss se apressou até a porta do diner, abrindo-a e enfiando a cabeça para fora na esperança de encontrá-lo ainda por ali, e informá-lo de que havia confundido o quanto deveria deixar, mas a chuva estava muito pesada, e ela já era míope o suficiente sem os óculos.

Meio tristonha e se sentindo relativamente culpada, Katniss caminhou lentamente de volta para o balcão, aonde despejou o café do loiro na pia e observou o líquido negro ir embora. A nota de vinte dólares estava pousada ao lado do detergente, e quando Johanna passou para levar alguns pratos sujos, assoviou alto para a gorjeta.

Katniss tratou de enfiar a nota no bolso de seu avental, e fez o seu melhor para não pensar mais sobre o assunto enquanto lavava a louça.

XXX

Para a surpresa de Katniss, ele voltou na noite seguinte no mesmo horário, um pouco depois da meia-noite.

Como no dia anterior, sentou-se na cabine mais afastada e não quis olhar um menu: pediu o café preto, sem creme, e Katniss levou-o para ele. Uma pequena parte dela ainda queria devolver o dinheiro a ele, dizer que havia se enganado, mas ela não era filha de nenhum empresário. Cada centavo que pudesse guardar era precioso, e o cara se vestia bem, e pela segunda vez estava bem aprumado. Vinte dólares não fariam falta para ele, mas certamente fariam para ela, então ela fingiu esquecer.

Naquela noite, outra mesa além da do estranho ficou por sua conta, fazendo com que ela não percebesse quando ele foi embora novamente. Enquanto os clientes de sua outra cabine — uns meninos de colegial, todos com cabelos compridos e gorros, que pareciam estar com uma larica inexplicável, não fosse pelo cheiro de maconha que impregnava o ar ao redor deles — comiam felizes suas panquecas, Katniss foi até a mesa agora vazia do estranho louro e sentiu suas mãos tremerem quando encontrou, além da xícara completamente cheia, outra nota de vinte dólares.

Agora, estava certa de que ele não havia cometido um erro da primeira vez. Era proposital: o estranho queria que ela ficasse com aquele dinheiro, ou era excepcionalmente burro e não sabia Matemática básica, o que ela sabia não ser o caso. Agarrou a nota e enfiou-a no bolso do avental, mas dessa vez, com mais rapidez. Não queria pensar naquele cara obviamente doido, e que ele nunca mais voltasse ali, pelo amor de Deus.

XXX

Mas ele voltou, noite após noite.

A presença dele já estava dando nos nervos, especialmente porque Johanna havia percebido as constantes notas de vinte trazidas até o caixa para o desconto do mísero valor do pedido e a coleta das gorjetas e não perdia nenhuma chance de provocar Katniss até que as orelhas dela queimassem de vergonha.

Apesar de preferir ignorar as insinuações de Johanna, Katniss havia chegado à conclusão de que não podia mais ignorar a quantia exorbitante de dinheiro que recebia apenas por um café por noite. A possibilidade de que o loiro estava tentando chamar a atenção dela e puxar um papo não era tão absurda, ela tinha de reconhecer. Talvez ele fosse muito tímido para simplesmente pedir o telefone dela, e estava tentando fazê-la tomar o primeiro passo. De qualquer forma, ela precisava confrontá-lo: já estava se sentindo culpada por tomar tanto dinheiro do moço que nem ao menos trocava uma palavra com ela.

A medida que as horas passaram naquela noite, Katniss ficava mais nervosa. Não estava excepcionalmente feliz de ter que tirar satisfações com um cliente, mas não podia protelar. O ponteiro dos minutos voava no relógio dela, por mais que desejasse o contrário. Enquanto a meia noite se aproximava, Katniss serviu milkshakes de chocolate e hambúrgueres com fritas, limpou mesas, trocou conversa fiada com os cozinheiros e cobriu alguns clientes para Johanna para que a amiga pudesse fumar, mas nada tirou sua mente do que estava prestes a acontecer.

Como em todas as outras vezes, o homem atravessou a porta de entrada bem vestido e cabisbaixo, tomando a última cabine para si e sentando-se quase encostado no vidro da janela. Katniss respirou fundo antes de arrumar o avental, dispensando levar o cardápio e o bloco de anotações e caminhou até a mesa. Dessa vez não falou seu cordial boa noite e foi direto ao assunto. Se aquele cara estava fazendo ela de palhaça, ela precisava saber. Estava lá pra trabalhar, cacete, não pra flertar.

Antes que ela abrisse a boca, ele a olhou com aqueles inacreditáveis olhos azuis e ela hesitou. No entanto, seu incômodo era mais forte, e ela desembuchou.

— Desculpe, mas... Você está dando em cima de mim, é isso? — Katniss sentiu-se constrangida só de perguntar, mas precisava fazê-lo. A situação já estava saindo do controle dela. — Você nunca nem encosta no seu café, e mesmo que tomasse até sua última gota, ele não é tão bom que mereça praticamente vinte reais de gorjeta.

Um sorriso tímido repuxou o canto da boca do loiro cujo nome ela ainda não sabia, e ele passou uma mão pelos cachos ridiculamente dourados que caíam em sua testa antes de responder, com sua voz calma e doce, uma voz que ela mal tinha tido a oportunidade de ouvir.

— De maneira alguma quero te ofender, Katniss. — Por mais que a moça soubesse que o seu nome estava emplacado em seu avental, ainda corou. — Mas não acha que se eu quisesse realmente flertar com você, eu não teria deixado meu número em um guardanapo ou coisa assim? Só acredito em pagar bem o trabalhador. — Encolheu os ombros inocentemente.

Katniss desejou cavar um buraco pelo chão do diner, enfiar-se lá dentro e nunca mais sair. Se já estava envergonhada antes, nada se comparava a como se sentia agora. Talvez a humilhação fosse tanta que o outro pensamento que tomava conta de si fosse imaginação: Ele podia ter postura de bom moço, mas aquele dar de ombros e aquele sorriso... Havia mais naquele estranho do que simples cordialidade para com uma garçonete, ela sabia disso, tinha que acreditar nisso, para o seu próprio orgulho.

— Ah. — Sua garganta seca soltou um muxoxo e derrotada, endireitou as costas. — Já que se preocupa tanto com a minha remuneração, posso pelo menos sugerir algo que não café? Você nunca bebe o seu mesmo. — Justo naquele dia, ela havia escolhido deixar o cardápio junto a pilha atrás do balcão, mas não haviam tantas opções assim e ela já o sabia de cor.

— Ok, nada mais justo. — O homem concordou, e para a surpresa de Katniss, riu. Ele tinha uma risada bonita, daquele tipo gostoso de ouvir, e aquilo a incomodou. Seria muito mais fácil esperar que ele nunca mais voltasse depois de ela ter o confrontado tão diretamente, mas ele não parecia nem um pouco interessado nisso.

— Nossas donuts confeitadas são bem gostosas, mas a essa hora da matina elas já acabaram. — Katniss murmurou, brincando com a ponta de seu avental antes de olhar para ele novamente. — Um muffin de chocolate cairia muito bem agora, mas não vendemos muffins.

Ele riu novamente e a encarou com expectativa. Aquilo a deixou nervosa; ele sempre havia se mostrado quieto, talvez até tristonho, e agora estava um poço de felicidade? Você só o pegou num dia bom, ela disse a si mesma. Se ele não estava dando em cima dela, o motivo de seu bom humor não podia ser o fato de estarem conversando.

— Porque não um chocolate quente? — Katniss recomendou o seu preferido, de repente sentindo vontade de acompanhá-lo e beber uma xícara da bebida também sem motivo algum.

— Parece bom. Pra falar a verdade, não gosto de café.

Katniss fez que sim e mordeu o interior da bochecha. Maldita fosse sua curiosidade! Queria saber porque ele aparecia ali todas as noites. Porque pedir o café era o motivo pelo qual ele vivia para entrar no diner. Porque sempre sentava na última cabine. Se deixava os cabelos caírem nos olhos propositalmente ou não e, principalmente, porque ele sempre parecia tão triste.

Ao invés disso, deu meia volta para fazer o pedido.

XXX

O café constantemente pedido virou chocolate quente, mas aquelas xícaras decoradas com chantili eram bebidas de bom grado todas as noites.

Eles nunca realmente conversavam direito, mas a presença do estranho-não-mais-estranho não a incomodava mais. Ele continuava deixando as gorjetas absurdas, mas Katniss sabia que não adiantaria reclamar, e que ele já teria ido embora quando ela voltasse para pegar a xícara vazia dele.

Numa noite em particular, um mês após a primeira visita do loiro, Katniss tivera que cuidar de cinco mesas sozinha: Johanna havia contraído uma gripe maluca que não melhorava e, enojado de ver a garçonete pingando coriza na hora de sair de seu turno, Haymitch a dera uma licença forçada, sem descontos no seu salário. Por mais cansativo que fosse, Katniss gostava de ter mais do que duas mesas para atender. Exigia mais dela, e ela certamente ganharia mais trocados no final da madrugada.

Por ter sua atenção dividida, no entanto, Katniss não pôde dar muita bola para o loiro. Apenas serviu o chocolate quente e se desculpou, correndo para trazer o refil de café para duas senhoras que fofocavam a duas cabines para o lado. Suas mãos ficaram tão ocupadas que ela só conseguiu retornar a cabine do moço para recolher a xícara e a gorjeta quase duas horas da manhã, quando ele havia ido embora há tempos.

Ao se aproximar da cabine dessa vez, Katniss teve outra surpresa: sentado ao lado da caneca de vidro e da usual nota de vinte dólares, havia um pacote de papel com a insígnia de uma padaria a qual ela não conhecia. Agarrou a sacola, e antes mesmo que a abrisse, sabia o que continha: um muffin de chocolate gorducho e suculento, assim como ela havia dito a ele que cairia bem na primeira vez em que propriamente se falaram.

Encabulada, Katniss fechou a sacola e recolheu o dinheiro e a louça, tratando de colocá-la com o resto de suas coisas nos armários do fundo do diner e fingir que aquilo não tinha acabado de acontecer.

(De manhã, quando voltou ao seu apartamento, Katniss se deliciou com o muffin, e desejou poder dividi-lo com ele, aquele homem decididamente doce, cujo nome ela nem sabia).

XXX

O diner era obrigado a fornecer dois dias por semana de folga aos funcionários, que era facultativa.

Katniss a havia recusado durante seu tempo de trabalho ali, porque dormia bem durante o dia e não podia se dar ao luxo de desperdiçar as gorjetas que cada turno trazia. Naquela semana em particular, todavia, ela estava exausta, talvez porque seu vizinho de cima tivesse arrumado uma nova namorada e eles testavam todos os cômodos do apartamento como dois coelhos (malditas paredes finas!) e ela não conseguia nem ao menos cochilar sem ser acordada periodicamente por gemidos.

Haymitch deu-lhe a quinta e sexta-feiras de folga de bom grado, e Katniss sentiu-se leve como uma pena ao alugar uma trilogia de filmes blockbuster e comprar dois potes de sorvete para aproveitar as quarenta e oito horas que teria de paz. Em certas partes de seu descanso, Katniss chegou a se perguntar em como o estranho agiria sem a presença dela, já que ela sempre havia o atendido, mas deu de ombros, pensando que provavelmente não faria diferença alguma para ele.

Quando voltou ao diner no sábado à noite, Katniss estava completamente revigorada. Era como se alguém tivesse lhe dado uma boa massagem por um longo período de tempo, e ela estava pronta para voltar ao trabalho. Era Setembro e, portanto, seu último mês de servir no diner já que logo começariam suas aulas, e ela queria aproveitar suas últimas semanas para fazer o seu melhor.

Assim que amarrou o avental na cintura, a voz de Johanna chegou aos seus ouvidos.

— O seu namorado procurou por você, ontem e antes de ontem. — A amiga estava apoiada na janela da cozinha, esperando algum pedido chegar.

O coração de Katniss bateu com tanta força que ela mal teve tempo de responder antes da ruiva tingida continuar.

— Coitadinho. Ficou desolado quando perguntou de você e soube da sua folga. — Johanna revirou os olhos dramaticamente. — E acho que estou constatando o óbvio ao dizer que não ganhei vinte dólares de gorjeta, já que ele foi embora sem pedir nada.

Katniss virou-se de costas para Johanna e apoiou-se no balcão, olhando fixo para os talheres recém lavados no secador de louças. Sabia que estava tendo uma reação exagerada, mas quase lhe faltava ar: ele havia perguntado por ela? Deus do céu, o que havia de errado com aquele cara? Ela era só uma garçonete, pelo amor de Deus, e ele só ia até ali para pedir chocolates quentes (apesar de sempre imaginar que havia outro motivo). De repente, Katniss desejou que aquele fosse seu último dia ali e que ela não precisasse entrar lá de novo e também nunca mais vê-lo.

Ele não apareceu naquela madrugada, e Katniss não pôde ignorar a maneira com que preocupou-se com sua ausência.

XXX

— Chocolate quente, né? — Katniss mordeu o lábio inferior. O loiro levantou a cabeça para olhar para ela, e fez que sim.

Ele parecia triste. Para que aparecesse de novo, levou cinco dias, cinco dias agoniantes em que Katniss se remoera, perguntando à sua memória de curto prazo se havia feito algo para magoá-lo. A resposta era sempre não, o que era ainda mais frustrante. Ela estava começando a perder as esperanças de vê-lo novamente quando ele aparecera um pouco depois da meia-noite, como todas as outras vezes.

Daquela vez, as coisas não aconteceriam como sempre. Katniss pediu ao cozinheiro dois chocolates quentes e caminhou até a cabine do moço com uma ansiedade desmantelada. Faça isso, ou vai se arrepender. Depositou a caneca dele e a outra do outro lado da mesa antes de sentar-se. Não tinha outros clientes para atender, e precisava fazer aquilo antes que perdesse o pouco de coragem que tinha acumulado.

— Então. — Katniss enfiou o indicador no chantili de seu chocolate quente e sugou a mistura do dedo. — Qual o seu nome?

A resposta demorou alguns instantes. Katniss olhava para a sua bebida, ciente de que ele a encarava, e ela não sabia se estava pronta para a intensidade daqueles olhos, não diretamente.

— Peeta.

Era um alívio saber, enfim. Ela levantou a cabeça, tomando um gole do seu chocolate ao mesmo tempo que ele. Considerou terminar sua bebida em silêncio e apenas se retirar. Metade dela dizia a si mesma que aquela havia sido uma péssima ideia, mas a outra metade (que diga-se de passagem, falava muito mais alto) mandava que ela continuasse com a bunda na cadeira.

Mais alguns goles depois, ela arriscou.

— Quando soube que eu não estava aqui... Por que não ficou? — Katniss tinha medo da resposta, mas precisava saber.

— Porque eu venho todas as noites pela sua companhia, oras. — Peeta respondeu como se fosse óbvio, e Katniss franziu o cenho enquanto seu coração disparava novamente.

— Companhia? Nós mal conversamos.

— Fazer companhia a alguém não necessariamente envolve conversa, Katniss. — Peeta a olhou com um rosto de quem muito sabia sobre ela, e ela não duvidava. Ele parecia lê-la com uma facilidade terrível. — Não que eu me oponha a isso. — Gesticulou entre os dois e enfim sorriu um dos seus bonitos sorrisos de propaganda de pasta de dente. — Aliás, é bem melhor assim.

Pela primeira vez em sabe-se-lá-quanto-tempo, Katniss sentiu o corpo inteiro corar, não apenas o seu rosto. Sabia que estava visivelmente encabulada, e aquele pensamento fez com que sua pele leitosa ficasse ainda mais vermelha. Maldita fosse!

Eles conversaram pelo resto da noite e Peeta voltou a aparecer todas as madrugadas. Quando seu etinerário permitia, Katniss se sentava e tomava chocolate quente com ele.

Ele insistia em pagar por todas as bebidas dela.

(Em uma noite em que ela não pudera se sentar com ele, ele anotara o número de celular dele em um guardanapo cuidadosamente enfiado debaixo de uma caneca. Na primeira mensagem de texto que trocaram, Katniss escreveu um 'até que enfim' acompanhado de genuíno alívio).

XXX

Peeta a beija pela primeira vez na sexta caneca de chocolate quente que compartilham, numa noite de ventania na cidade.

É rápido, mas intenso, e os lábios dele amassam os dela como se pertencessem ali desde vidas passadas. Ele está apoiado sobre a mesa, e é estranho, mas ela não se importa, e o beija de volta com avidez. Quando se separam, os arredores da boca dele estão meio avermelhados, e ela ri. Ele a acompanha, e a beija de novo antes de ir embora.

Que Deus a ajudasse, ela estava viciada em um beijo que só recebera duas vezes. Só lhe restava imaginar o que mais aquele homem faria com ela.

XXX

Ele demora uma semana para chamá-la para sair, em um dos dias que vem até o diner.

Quando ele está caminhando em direção a porta para ir embora e ela passa na frente dele, carregando uma bandeja lotada de pratos com torradas, ele simplesmente solta o pedido, fazendo com que Katniss quase derrube pães quentes em cima de uma família inteira.

(Ela aceita o seu convite para tomar sorvete no parque).

No dia seguinte, Katniss se preocupa demais com o que irá vestir para encontrá-lo, mas droga, já faz um tempo desde que ela fora no seu último encontro, e tinha algo sobre Peeta que fazia com que ela quisesse agradá-lo nos mínimos detalhes. Talvez fosse o fato de ele ser tão bondoso, talvez fossem os seus olhos, ela não sabia dizer.

Decidiu por usar uma bata florida e calças jeans. Roeu as unhas no caminho do metrô até o parque, que se reduziram a cotocos quase sangrentos. Ela o avistou num banco ao lado do sorveteiro e o seu coração disparou como o de uma maldita menina de colegial, como a tonta que ela era.

Ele pagou pelo seu sorvete de chocolate, e o dela, de morango. Os dois se sentaram no mesmo banco e conversaram, conversaram sobre a faculdade dela, a dele, sobre os irmãos dele (que, segundo Peeta, o irritavam até a alma). Por mais ridículo que soasse, Katniss riu como não ria há tempos, e droga, se aquilo não era um maldito clichê, ela não sabia o que era.

Por fim, Peeta revelou que seu pai era dono de uma padaria, e o muffin de chocolate que ele lhe trouxera era de lá.

— O seu pai é dono de uma padaria. — Katniss estreitou o olhar e fez questão de parecer aborrecida, apesar de estar apenas curiosa. — E você vinha no diner pra tomar chocolate quente?

— Confesso que não. — Peeta riu, as bochechas ficando rosadas como a de um garotinho inocente. — Na primeira vez, eu estava chateado. Tinha acabado de brigar com o meu pai, sobre a própria sucessão da padaria, inclusive, e só precisava ir pra algum lugar. O Effie's estava aberto, e era perto de casa, então...

— E nas outras vezes?

— Bom... — Peeta hesitou, corando ainda mais. — Vamos dizer que eu meio que menti quando disse que não estava querendo dar em cima de você.

— Eu sabia! — Katniss exclamou, mas ela estava rindo, e ele também. Ela nunca confessaria, mas seu peito se encheu de uma sensação gostosa, que ela não sentia há muito tempo (quiçá sabia se já havia sentido alguma vez na vida).

Peeta ficou realmente envergonhado de admitir que ia ao diner por gostar dela, mas ela o beijou no rosto e na boca várias vezes para compensar.

(Ele logo melhorou, e os dois conversaram até muito tarde naquele dia, sem se importar com a noite que caiu sobre o parque ou com os mosquitos que picaram suas pernas no calor do verão).

XXX

O fim das férias de Verão chegou mais rápido do que Katniss esperara, como sempre.

Seu último dia no diner Effie's foi dolorido, cheio de uma nostalgia antecipada. Por outro lado, ela também estava grata por poder voltar à faculdade e continuar traçando seu futuro. Era muito grata pela oportunidade de ali ter servido, mas era hora de voltar para a vida real.

No final de seu turno, despediu-se do resto dos funcionários (incluindo Johanna, que ainda veria na faculdade, mas que decidira continuar no emprego por mais um tempo) e pendurou seu avental azul bebê pela última vez com um sorriso triste. Pegou a bolsa tiracolo com os seus pertences e, lançando para o diner um último olhar, Katniss saiu para a rua iluminada da manhã de Boston e sorriu.

— Pronta pra ir? — A voz familiar, mas ainda decididamente cheia de segredos que ela queria descobrir chamou-a à sua esquerda. Peeta era parte de sua vida de maneira mais pessoal há duas semanas, desde que ele deixara o número de seu celular, e ela não queria que ele saísse dali tão cedo.

— Sim. — Katniss sorriu e segurou a mão dele, uma mão nova, mas que a segurava como se estivesse ali há anos. Ele a beijou quando se aproximou, e ela se permitiu derreter-se nos lábios dele como sempre fazia, naquela êxtase de algo recém nascido, mas tão promissor.

Katniss ainda não sabia porque Peeta sempre aparecia tão triste nas suas primeiras noites de frequentar o diner, ou se jogava os cachos na testa propositalmente ou não e estava ansiosa para descobrir, mas sua maior dúvida era porque confiava tanto no moço loiro de sorriso de comercial de pasta de dente, tendo o conhecido há tão pouco tempo.

(A resposta para sua última pergunta Katniss nunca descobriu, mas resolveu deixar por aquilo mesmo. Amá-lo daquele jeito tão bom de amar Peeta Mellark, aquele amor bom com gosto de chocolate quente já era mais do que o suficiente).


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Notas finais do capítulo

Pra mim eu continuava escrevendo isso aqui pra sempre, mas gosto também de acabar as coisas com gostinho de "quero mais" e com algumas perguntas sem resposta. ;)Espero que tenham gostado! Críticas ou elogios, por favor, deixem um review!Meu grupo de Fanfics no Facebook: https://www.facebook.com/groups/581676645266081/



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