8 Minutos escrita por Cat Hathaway


Capítulo 1
7:59


Notas iniciais do capítulo

Essa é para você, R.E.

Todas as palavras que preciso dizer estão aí.



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Eu te amo

Eu te amo

Abri meus olhos enquanto sugava todo o ar que meus pulmões achavam necessários para continuar. Era como se eu estivesse saindo de um pesadelo e minha mente não tivesse não tivesse a decência de lembrar qual era. Ainda presa ao pânico, mexi minha mão na escuridão, tateando em busca de uma luz.

Meus dedos roçaram em algo que julguei ser um interruptor e o apertei, aliviada por saber que estava certa. Só que esse alívio durou pouco quando me vi em um ambiente diferente do que estava acostumada. Muito diferente. As paredes acinzentadas eram o oposto do amarelo que sempre envolveu meu quarto. Só que esse não era o ponto alto de distinção entre o lugar em que eu estava e o que estava acostumada. Nem a falta dos meus móveis acompanhados da minha bagunça.

Era a presença de caixões e o fato de eu estar em um deles.

O salto que dei proporcionou uma queda desastrosa diretamente no chão. Só que isso não senti a dor que deveria nas palmas de minhas mãos. O pânico subiu por meu peito, fazendo-me arrastar pelo chão. Parei para fechar os olhos e colocar meus pensamentos em ordem. Ainda estava presa em um pesadelo e a qualquer hora Noah ou minha mãe viria me acordar.

Só que quando os reabri ainda estava presa na mesma situação. Minha respiração ainda estava entre cortante e meu coração bateu forte contra a palma da minha mão que repousava em meu peito. Sinais vitais. Isso era um bom sinal. Com calma planejada, me levantei e caminhei em direção ao local de onde tinha caído. Só tinha uma maneira de saber se aquilo era realmente o que estava parecendo.

Prendi meus dedos em meus cabelos cacheados e soltei um arfar que quase se igualou a um grito. Só que era uma reação natural ao dar de frente com o meu próprio corpo pálido e deitado em posição fúnebre. Dei passos trôpegos para trás em busca de suporte e deixei que meu corpo – ou espírito, não sabia o certo – pressionasse as costas na parede, descendo até sentar no chão.

“Oh, não”, olhei para minhas próprias mãos e percebi que não estava sentindo o meu corpo. Corri em direção a parede perto da porta. “Noah! Noah!”, gritei.

O desespero em meu peito duplicou ao gritar o nome de meu namorado. A urgência tomou conta do meu corpo enquanto rodeava a procura de outros caixões e sentindo-me mais leve ao constatar a ausência de outro corpo. Olhei para a porta e buscando toda a coragem que ainda tinha em meu peito fui em direção à ela. Eu só queria ir para casa. Fechei os olhos com força e...

Quando percebi estava parada bem no meio do meu quarto. Na verdade, não parecia o meu quarto. A alegria que eu sempre me gabava de envolver os quatros cantos desse cômodo não existia mais. Tudo o que restou de minhas coisas foram caixas empilhadas e móveis desmontados. Aproveitando que a porta estava aberta, desci as escadas correndo ansiando por uma explicação.

Minha mente traidora reteve o que era importante mantendo-me apenas com o básico. Eu e Noah estávamos no carro ouvindo música. Lembro de seus lábios se mexendo, mas não das palavras que pronunciou. Queria saber onde ele estava. Tinha certeza que só ele poderia me dar uma explicação plausível para o que estava acontecendo. Minhas cogitações pararam quando cheguei a sala e vi minha mãe completamente parada encarando uma foto minha.

O que mais me assustou foi o fato de meu pai estar abraçando ela. Quero dizer, meus pais nunca falavam mais que o essencial um com o outro. Se evitavam como cão e gato. Se odiavam como cão e gato. E vê-los tão próximos daquele jeito me afetou. Mostrando que ainda tinha reações humanas, minhas pernas bambearam e fui obrigada a sentar nos degraus. Queria que um deles olhasse em minha direção e arfasse de surpresa. Só escutei o soluço de minha mãe seguido por suas palavras arrastadas.

“Os médicos disseram que ela só ficou viva por oito minutos.”, ela sussurrou. Aquilo atraiu a minha atenção, fazendo-me levantar e caminhar vagarosamente na direção deles. Meu pai suspirou. “Que ela não teve nenhum dano externo, mas seus órgãos...”, ela deixou a frase em aberto e balançou a cabeça. “Eu queria saber o que aconteceu de verdade e não quadros clínicos.”

Eu também, mãe. Muito.

“E como está o garoto?”, meu pai perguntou mantendo a voz o mais controlada possível. Meu peito se apertou por saber de quem ele estava falando. Por favor que a resposta seja positiva. “Ele está se recuperando?”

Minha mãe assentiu.

“Não sei muito bem, mas eles disseram algo de cadeira de rodas.”, deu de ombros. “O que é isso comparado ao fato de estar morto?”, tinha um tom de raiva na voz dela que apenas se amenizou quando seus dedos roçaram na superfície de minha foto. “Eu queria estar lá para os seus últimos oito minutos, Cecília.”, fechou os olhos e abraçou meu pai enquanto chorava.

Tive oito minutos. O que aconteceu nesses oito minutos? E mais importante: O que aconteceu antes desses oito minutos?

Fiquei olhando para os meus pais até que o sol se pôr e eles se despedissem. Nesse meio tempo tiveram a inocência de soltar mais alguns detalhes do que havia acontecido. Foi um acidente de carro – meu carro novo, droga! – contra um caminhão. Eu perdi o controle e bati. Aquele detalhe me fez franzi o cenho já que sempre fui uma motorista rígida, do tipo que nem ligava a música para não ter distração. Mas se Noah estava comigo, algo deve ter me distraído. Sua mão boba foi minha primeira suspeita.

Levantei da escada sabendo que simplesmente estava protelando para o que tinha que fazer a seguir. Passei as mãos por meus cabelos novamente e pisquei meus olhos escuros com força, concentrando-me. Esperava que o truque desse certo. Imaginei que Noah estava na mina frente com seus olhos castanhos e emotivos – eu sempre sabia o que passava em sua mente apenas olhando-os –, seus cabelos escuros e ondulados que destacavam sua pele tom de marfim. Seu toque delicado e seus lábios macios. Suas palavras doces e seu jeito gentil de me chamar de anjo.

Quando reabri os olhos estava parada no meio de um quarto de hospital, onde, na cama, estava Noah. Ele parecia estar dormindo, mas eu sabia bem que deveria estar sedado. A enfermeira estava anotando algumas informações em sua ficha e se afastou fazendo uma cara de pena antes de fechar a porta. Pela primeira vez desde que acordei naquela confusão, me permiti chorar. Aproximei-me com cuidado como se tivesse medo de acordá-lo. Estiquei minha mão e lamentei quando não senti o roçar de sua pele contra os meus dedos.

Cadeira de rodas.

Meu olhar recaiu em suas pernas erguidas e tive que pôr a mão na boca para não arfar alto. Por seu corpo havia inúmeros hematomas e ferimentos profundos. Eu tinha estragado toda a vida dele e literalmente acabado com a minha. Nossos planos e esperanças reduzidas a pó. Solucei alto, agradecendo pela primeira vez por estar naquela condição. Eu só queria saber o que tinha acontecido.

Cedendo aos meus desejos internos, estiquei meus dedos até seus cabelos e arfei ao sentir a textura deles roçando em minha pele. O que aconteceu? O que aconteceu conosco? Com medo que minhas lágrimas se tornassem sólidas, as limpei de meu rosto e aproximei-o do dele. Pressionei meus lábios em sua têmpora, controlando os meus soluços e as dores que faziam meu peito latejar.

“Cecília?”

Abri os olhos, afastando-me de súbito de seu corpo, enquanto seus olhos castanhos me encaravam com descrença. Toquei em mim mesma, perdida com aquele contato desde meu despertar confuso. Por um segundo imaginei que ele estivesse sonhando comigo, só que sua expressão estava bastante alerta e seus olhos arregalados. Percebi sua mão se movendo até o lençol em um sinal de que tentaria se levantar. O desespero me abateu e eu fui em sua direção erguendo as mãos, tentando impedi-lo. Será que os médicos já haviam dado a notícia para ele?

“Não faça isso, Noah.”, pedi.

“É você mesma?”, ele questionou ignorando meu apelo. Seus dedos tremiam e ele me olhava de cima a baixo, como se não acreditasse. “Mas me disseram que você estava...”

“Morta?”, perguntei retórica.

Ele assentiu.

“E não é mentira.”, respondi e suspirei. Ele pôs as mãos no rosto e voltou a chorar. Quis acompanha-lo, mas sabia que um de nós dois tinha que manter o controle. Sempre tinha sido assim durante o tempo que passamos juntos, alguém segurava alguém. “Noah.”, o chamei. Ele ergueu os olhos marejados e triste. Os mesmos olhos que sempre brilhavam quando sorria. “Preciso saber o que aconteceu. Preciso dos meus oito minutos de volta.”

“Você está realmente morta?”

Desesperada por uma resposta, segurei seu rosto por entre as minhas mãos e aproximei-me até que nossos narizes se roçassem. O calor que se espalhou por meu corpo foi indescritível, assim como a palpitação de meu coração. Só ele poderia ter feito isso comigo.

“Noah, por favor.”, pedi com os olhos ardendo para chorar. “Me diga o que aconteceu com a gente.”

Ele abaixou os olhos por um segundo e temi que voltasse a chorar. Limpei as lágrimas que já estavam por seu rosto e esperei por suas palavras.

“Nós desmoronamos.”, ele começou com um fio de voz. “Começamos a brigar de novo enquanto você dirigia. E você perder a atenção e batemos. O caminhão bateu do seu lado, mas você continuou viva tempo o suficiente para...”

“Te mandar ficar acordado.”, completei a frase transtornada pelas lembranças que me abateram. “Eu me lembro. Meus últimos oito minutos.”

“Hey, amor. Nada de fechar os olhos.”, pedi com um fio de voz vendo seu rosto se transformando em uma careta pela dor. Engoli a seco, sentindo a fraqueza me tomando aos poucos, porém ao longe ainda conseguia ouvir as sirenes da ambulância de aproximando. Só mais um tempo, Deus. Só me dê o suficiente para que ele saia bem. “Eu te amo. Não importa o que aconteça daqui para frente, eu te amo.”

Eu te amo.

Foram as minhas últimas palavras.

“A culpa foi toda minha.”, ele soluçou. Pisquei com fora, voltando a realidade. “Não deveríamos ter brigado enquanto você dirigia. Não com a sua mania de passar a mão pelo cabelo quando está nervosa.”

Foi por isso que perdi o controle.

Estava tudo se encaixando na minha cabeça como um jogo e a verdade do porquê eu ainda não ter partido me abateu. Beijei sua bochecha, sentindo o gosto salgado de suas lágrimas e acariciei seu rosto com cuidado, olhando-o com carinho.

“A culpa não foi sua.”, eu respondi. “Sempre soubemos que seria difícil e que a errada sou eu. Se sofremos isso, foi por culpa da minha péssima direção.”, dei um sorriso fraco, vendo-o se acalmar. “Preciso que você entenda que não foi culpa sua.”

Ele piscou com lentidão.

“Não foi culpa minha?”

Balancei a cabeça.

“Não.”

“Não foi culpa minha.”, ele repetiu em tom de afirmação com cuidado. “Não foi culpa minha. Então foi culpa de quem?”

Dei de ombros.

“De ninguém. Talvez da vida. Mas não foi sua.”

Ele assentiu devagar e como eu imaginava, senti um clarão vindo detrás de mim. Dei um sorriso fraco com a confusão que apareceu nos olhos de Noah. Estava na minha hora de partir e por mais que tivesse planos que eu almejasse ter ao seu lado, sabia que não poderia ser egoísta. Ele encontraria alguém que cuidaria melhor dele do que eu. Talvez não o amasse tanto quanto eu amei, mas que daria o necessário e uma família, como tanto planejamos.

“Seja feliz.”, beijei sua testa e dei um passo para trás.

Os seus dedos em meu pulso foram a única coisa que me impediram de seguir.

“Você vai embora? Cecília, não vá.”, pediu com a voz fraca.

Sorri querendo tranquiliza-lo.

“Eu sempre estarei aqui, meu amor. Sempre serei o seu anjo.”

Aproveitei que seu aperto se frouxou e dei um passo para trás. Escutei-o pedindo para que eu ficasse, porém fui obrigada a ir. A luz era o que me atraía e o que me confortava. Nada seria como estar com Noah, deitar ao seu lado e acordar em seu abraço. Nada seria como beijar sua boca e escutar sua voz dizendo o quanto me amava. Mas a expectativa de que ele seria feliz me deixava mais aliviada. Fechei os olhos sendo engolida pela luz...

E acordei com o som do Justin Timberlake saindo do meu rádio. Pisquei com força e olhei ao meu redor com rapidez para não desviar a atenção da estrada por mais tempo que julgasse o necessário. Pelo canto de olho reparei que Noah estava emburrado olhando para a janela. Com o olhar de que estava pensando em alguma coisa ruim e que estava medindo se era a hora ou não de dizer. Mantive minha atenção na estrada por um segundo, equilibrando meu cérebro para não pensar em como tudo aquilo tinha acontecido.

Se é que tinha acontecido.

Contrariando todo o meu instinto de boa motorista, estiquei minha mão até que tocasse a sua e entrelacei nossos dedos. Era daquilo que eu precisava. Daquele calor. Dele. Desacelerei e virei meu rosto para sorrir.

Éramos estrelas perdidas que se encontraram foi uma boa frase de um mês, certo?”, perguntei.

Ele deu um sorriso.

“Se você quis plagiar a música do Maroon 5, sim.”

Revirei os olhos, voltando minha atenção para a estrada.

“Apenas retribuí quando você plagiou o Coldplay.”, limpei a garganta querendo engrossar a voz. “Você é minha cura e minha doença, anjo. E eu caí nessa.”, bufei. “Você é um conquistador, isso sim.”, sorri novamente com o som de seu riso. “Eu te amo.”

Um caminhão passou do nosso lado, fazendo meu coração ficar ainda mais aliviado.

“Eu também te amo, Cecília.”

Meu sorriso se ampliou.

“Eu sei disso.”


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