CIDADE DAS PEDRAS - Draco & Hermione escrita por AppleFran


Capítulo 46
Capítulo 42 - Parte 2


Notas iniciais do capítulo

MUITO MUITO MUITO OBRIGADA POR TODOS OS COMENTÁRIOS E RECOMENDAÇÕES. Sempre que eu estava desanimada, bastava ler um para eu ir correndo arrumar tempo para escrever!

NÃO DEIXEM DE LER A NOTA NO FINAL DO CAPÍTULO!!!



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Harry Potter



Ele não tinha outra opção além de ficar calado e observar. Não que tivesse algo a dizer. Havia desistido de usar as próprias mãos para lutar aquela guerra fazia tempo depois que Hermione fora capturada. Todas as decisões que tomara sem ela o levaram ao fracasso.

 

Eles eram um time. Harry, Rony e Hermione. Desde o início de tudo havia um equilíbrio perfeito entre eles. Eles tinham papeis e personalidades que se completavam. Harry se julgava impulsivo demais e curioso demais o que o fazia sempre se meter onde não deveria, mas sempre o levava de um lugar para o outro constantemente. Rony cauteloso devido aos seus medos, mas o incentivava e lhe trazia motivação e companheirismo. Hermione era extremamente mandona e autoritária, mas era responsável pela razão, solução e por colocar os pés dos dois no chão. Eles três administravam a Ordem desde a queda de Kingsley num ritmo muito satisfatório. Obviamente que todos olhavam para Harry como o grande líder, afinal de contas, a profecia era sobre ele, ele era o menino-que-sobreviveu, as pessoas queriam seguir o que ele dizia. Tudo aquilo era por ele, era por conta da profecia, era em defesa de seu nome. Harry Potter era o grande inimigo de Voldemort. Mas a verdade era que todo o sucesso por trás de Harry caia quase que cem por cento nas mãos de Hermione.

 

Por anos ele se viu um time com ela. Principalmente quando o relacionamento deles saiu do status de “apenas amigos”. Quando ela foi arrancada de sua vida, foi como perder sua razão, seu ponto de equilíbrio, aquilo que o trazia confiança. Ele tentou fazer com que a Ordem da Fênix avançasse sob seu estilo impulsivo de liderar, e querendo ou não, eles até conseguiram chegar em algum lugar, mas a falta de estratégia, o toque perfeito que só as mãos de Hermione poderiam dar, os levaram de direto para o buraco. Tentar ser o líder que as pessoas esperavam que ele fosse estava o levando a loucura. Ele preferia enlouquecer sem ter um exército de rebeldes nas costas. Por isso estava ali.

 

Ele havia apostado tudo ao confiar em Hermione. Mesmo que Draco Malfoy estivesse envolvido. Havia inclusive apostado a vida de muita gente. Só não esperava que ela fosse lhe fazer toda a surpresa que o fizera. Casada... Filhos... O que era aquilo? No meio de toda aquela guerra? E... Quem era ela? Vestida com aquela roupa, usando aqueles sapatos, andando naquela postura com aquela expressão dura que ele não conseguia penetrar. Quem era aquela Hermione?

 

—       Por que está reagindo como uma criança? – Rony cochichou para ele sentado ao seu lado na mesa da cozinha enquanto observavam quietos a movimentação na sala entre Hermione e o resto de comensais que trouxera com ela.

 

Ela vestia uma roupa diferente. Ela, Malfoy e a filha. A Comensal que estava com eles trouxe as peças de roupa de uma das expedições que fizera até a tal suposta casa que tinham. Hermione usava agora uma saia justa e escura que partia da cintura e ia até a altura dos joelhos, uma blusa clara de um tecido muito leve de manga comprida, um sapato de salto que não combinava com a Hermione que ele conhecia, os cabelos compridos perfeitamente arrumados e uma maquiagem que a deixava quase que irreconhecível. Ela vestia aquilo como se fosse algo casual. Como se estivesse indo ali no Beco Diagonal pegar a fila do sorvete. Ela não combinava com mais nada naquele lugar, apenas com o marido e a filha que estavam vestidos tão bem quanto ela. Para Harry, eles pareciam estar prontos para uma festa social na companhia de gente importante do ciclo social do Primeiro Ministro e dos seres humanos mais influentes do mundo bruxo, mas a verdade era que agiam como se estivessem de calça jeans e camiseta.

 

—       Não estou agindo como uma criança. Não acho que ela entendeu o quanto confiei tudo a ela. E não me diga que você estava esperando por... – ele encarou Hermione passar a filha pequena para os braços de Draco Malfoy. – ...por isso. – soltou sentindo um gosto amargo na boca.

 

—       Você não sabe a história dela. Não sabe a história dele. Não sabe a história deles. – Rony disse.

 

—       É inacreditável que você esteja os defendendo, Rony. – Harry soltou com nojo. – Você está olhando para Hermione Granger. Hermione Granger e Draco Malfoy. Juntos.

 

—       Você disse que esteve com eles juntos antes. Que Hermione te assegurou confiar nas ideias de Malfoy.

 

—       Eu não imaginava que eles estavam juntos. Não imaginava que eles estavam casados. Que tinham filhos. Ela estava bem cuidada, mas sempre parecia miseravelmente atordoada. Eu sempre mantive contato com Malfoy desde que ele se tornou o comandante dos Comensais de Voldemort. Eu sempre soube que ele tinha algo por trás de toda a submissão que dizia ter pelo dito mestre. Quando Hermione apareceu com ele depois que foi capturada, pensei que de alguma forma, no meio de toda vida miserável que Voldemort estava a fazendo viver, ele havia a encontrado e estava a usando como havia me usado por anos ao longo dessa guerra para conseguir o que queria.

 

—       É provavelmente isso que está fazendo. Hermione não parece nem um pouco feliz!

 

—       É claro que ela não parece feliz. Ela tem um filho nas mãos de Voldemort, Rony!

 

—       Eu estou falando de Hermione e Malfoy juntos. Eles não parecem felizes juntos. Acaso não escutou quando eles estavam discutindo no escritório?

 

—       Isso não significa nada. – principalmente quando os dois pareciam abalados com toda a situação do filho e de sabe mais o que que ficavam discutindo com os dois outros comensais que estavam ali. Parecia algo grande. Algo que haviam trabalhado por muito tempo.

 

Os dois ficaram em silêncio um bom tempo observando Hermione falando praticamente em códigos com os dois Comensais que os acompanhavam e Malfoy tentava ler um pergaminho longo que recebera com a bebê no colo. Eles estavam decidindo como iriam fazer a transição. Malfoy e ela tinham uma sintonia que mostrava o quanto suas mentes estavam ligadas. Davam as mesmas ordens, concordavam e discordavam sobre os mesmos posicionamentos. Sabiam o que faziam e sabiam exatamente como queriam.

 

—       Estou indo com eles, Harry. – Rony quebrou o silêncio.

 

Harry sentiu uma fúria subir até sua garganta, mas tornou a engoli-la. Ele não tinha o direito.

 

—       Eles não querem você. – retrucou. – Eles só estão oferecendo uma passagem de ida para todos para não terem que lidar com o meu moralismo de deixar vocês para trás.

 

—       Eu não me importo. Eles ofereceram uma passagem e eu estou indo. Tenho certeza de que é melhor do que isso aqui!

 

—       Eu não pedi para que viessem comigo!

 

—       Para onde acha que iriamos quando informou de ultima hora que a Ordem seria destruída, que a decisão havia sido sua e que não queria que ninguém o seguisse?

 

Revirou os olhos.

 

—       Não quero ter que discutir isso novamente!

 

—       Então vá com eles! Você já chegou até aqui. Já confiou até aqui. Por que está agindo como uma criança e recuando apenas porque ela tem uma aliança no dedo agora?

 

—       Não é qualquer aliança! É o anel de um Malfoy. Ela é uma Malfoy. Eles são a raça menos confiável do mundo bruxo!

 

—       Ela não é uma Malfoy! Ela é Hermione, Harry. Sempre será Hermione. Olhe para ela. Sendo toda mandona com dois outros Comensais ali. Quer algo mais Hermione do que isso?

 

—       Eu não estou brincando, Rony!

 

—       Nem eu! É claro que ela mudou. Nós mudamos também. Sempre estamos mudando! Não faço a mínima ideia do que ela passou durante todo esse tempo que esteve longe. Ela é mãe agora. Não posso dizer muito, mas tenho certeza que isso já é o suficiente para mudar muito uma pessoa. – defendeu Rony.

 

—       Eu sei! – soltou o ar frustrado. – Eu não me importo que ela tenha mudado. Eu entendo. Mas ela não quer falar com nenhum de nós. Ela não quer se justificar. Ela se acha no direito de não precisar se justificar. – sentiu aquele gosto amargo na boca novamente. - Nós somos a família dela! - Ele sabia que ela tinha suas razões e tentava se convencer de que não deveria ir além daquilo. Mas era impossível controlar os sentimentos que borbulhavam debaixo de sua pele. Sempre fora compreensivo com Hermione. Rony era quem sempre costumava encontrar uma forma de incomodá-la com sua incompreensão. E ali estavam eles dois, invertendo papéis. Suspirou e limpou os olhos soltando o ar expressivamente. – Tudo bem. Estou sendo infantil. – admitiu. – É estúpido pensar que vou ficar aqui olhando todos vocês irem embora. Mesmo que eu não duvide que se eu não for, Malfoy irá encontrar uma forma de voltar com a palavra. – balançou a cabeça tentando limpar os pensamentos. – Não vim tão longe para dar para trás com minha decisão. Eu sacrifiquei a Ordem da Fênix inteira com minha decisão. Dar as costas a Malfoy agora é como jogar tudo isso no lixo.

 

—       Vai continuar tentando ignorar Hermione como tem feito todo esse tempo?

 

—       Não vai ser difícil já que ela não tem problema em nos ignorar. – retrucou.

 

—       Eu não diria isso. – Rony alertou.

 

—       Sou impulsivo, Rony. Deixe eu dizer o que preciso dizer.

 

Notou que Draco Malfoy se aproximava com a filha no colo acompanhado do Comensal chamado Devon. Calou-se e levantou a guarda. Era como se fosse automático toda vez que precisava interagir com Malfoy. A aversão lhe subia e ele não podia ignorá-la. Era difícil ser racional com ele por perto. Aquela figura que se impunha em sua postura, vestido em suas roupas perfeitamente caras fazia um ódio rugir dentro de Harry.

 

—       Decidiu-se? – perguntou ele.

 

—       Ainda pensando. – respondeu com desgosto.

 

—       Tenho uma proposta, Potter. – ele anunciou naquela voz quase severa. O tom profundo e a expressão simples e ilegível que ele carregava no rosto era quase que um anúncio de sua superioridade do qual ele tomava com orgulho e fazia questão de expressar para pessoas como Harry Potter. A filha no colo mordia um brinquedinho que Molly Weasley conjurara para ela e encarava Draco com os olhos bem abertos. – Está pronto para ouvir?

 

—       Sim. – Rony respondeu.

 

Draco o ignorou por completo e continuou encarando Harry. Esperando por uma resposta. Harry não queria escutar Malfoy cuspindo para fora toda a influencia e poder que tinha. Mas ao mesmo tempo ele simplesmente não estava em posição para negar qualquer proposta que fosse, mesmo que, uma proposta vinda de Malfoy significasse que ele sairia ganhando muito mais do que perdendo.

 

—       Vá em frente. – soltou sem vontade alguma. Sabia que se falasse não, Draco daria as costas e seguiria a vida sem o menor sinal de que aquilo o afetara.

 

—       Tenho mais gente do que imaginava pedindo por asilo e proteção. Mais gente do que imaginava precisando sair de debaixo do nariz de Voldemort para ser útil para mim. Não consigo mantê-las todas em minha casa, por maior que ela seja. Elas precisam de mais um incentivo, e segurança e proteção é um fator muito determinante. Preciso de espaço para realocar essas pessoas e a carga de gente que vem com elas, um espaço que tenha uma estrutura tão definida e autossustentável quanto o forte de onde elas vão sair. Godric’s Hollow tem exatamente o que eu preciso. Conseguir a região e blindá-la com segurança o suficiente para ser impenetrável não vai ser um trabalho árduo já que o chefe de acampamento que tenho aqui vem trabalhando comigo a um tempo bastante considerável tendo plena consciência de que você estava se escondendo nessa casa depois da queda da Ordem. E sobre a segurança, Hermione pode levantar feitiços muito mais fortes do que qualquer muralha. Sabe disso. – ele pausou, tirou um jornal do bolso e abriu sobre a mesa de frente para Harry. – Leia isso.

 

Era um jornal que ele nunca havia visto antes. Chamava-se Diário do Imperador. O título principal chamava uma atenção absurda e dizia: Família Malfoy em guerra contra o Império. A imagem que havia relacionada ao artigo era o emblemático brasão da família Malfoy e uma outra que não parecia tão recente, mas que era uma foto oficial dos membros do ciclo interno de Voldemort onde Malfoy estava de pé logo a direita de Voldemort. Harry passou os olhos pelas primeiras linhas e só foi realmente ter sua atenção tomada alguns parágrafos depois.

 

[...]é definitivo afirmar que, sem dúvida, o Império está dividido. O poder que a família Malfoy teve para alcançar esse impacto num governo sustentado pelo medo e repressão é fascinante de ser estudado. Draco Malfoy carregou o status de general de guerra de Lord Voldemort desde que Severo Snape fora afastado do cargo logo nos primeiros anos de guerra. Por todo esse tempo o trabalho do herdeiro da família ficou conhecido por sua eficiência e constância. Ele sempre era a voz a proferir suas vitórias e seus avanços lembrando ao público que a segurança que tinham vinha do trabalho que ele, com tanto empenho, vinha desenvolvendo em nome do Mestre. Seus discursos pontuais e muito bem elaborados concluíam como moral e como lembrete que a guerra estava sendo vencida para um imperador e não por um imperador. Detalhes como esse provam que a família Malfoy vinha cuidadosamente se auto promovendo há um bom tempo, o que justifica com clareza o número exagerado de simpatizantes da causa Malfoy.[...]

 

—       Por que está me fazendo ler isso? Não tenho o menor interesse em patrocinar sua estátua de ouro, Malfoy. – queria cuspir.

 

—       Não estou brincando, Potter. – ele foi sério. Harry também não estava. – As pessoas estão achando que quero levantar uma nova ordem de governo. Elas pensam que o que eu quero é vencer o poder de Voldemort para me tornar o novo imperador quando, na verdade, apenas quero restaurar o mundo de antes.

 

—       O mundo bem sabe que Malfoys são gananciosos e não heróis. – Harry não perdeu a chance de comentar.

 

Draco resolveu ignorá-lo.

 

—       Por isso quero o seu nome associado ao meu. Quando conseguir isolar Godic’s Hollow, quero que assuma a administração do local publicamente. Quero que as pessoas saibam que sua causa está familiarizada com a minha e que estamos trabalhando juntos. – continuou. – Assim elas vão entender que meu motivo não é tomar o poder, porque elas sabem que você jamais faria parte disso se essa fosse minha motivação.

 

—       Por que minha causa tem que estar necessariamente associada a sua e não ao contrário? – Por que tudo tinha que girar em torno dele?

 

—       Dá no mesmo, Potter. Temos interesses em comum e é essa ideia que quero tornar pública. Mas não se engane. Eu vou ser quem vou te trazer de volta a vida depois da queda da Ordem. As pessoas vão saber que só conseguiu se manter vivo durante todo esse tempo porque eu quis que estivesse vivo. Eu sou o iniciador de tudo isso, sou eu quem estou armando um exército contra Voldemort. Você apenas será parte disso. As pessoas vão associar mais você a mim, do que eu a você.

 

—       E o que eu ganho com essa de viver debaixo da sua sombra, Malfoy? – Harry definitivamente não gostava de todo aquele egocentrismo.

 

—       Ganha a chance de matar Voldemort. Como consegue esquecer o motivo principal de tudo isso com tanta facilidade? – Malfoy parecia entediado.

 

—       Então admite que precisa de mim de alguma forma? – ele precisava encontrar alguma forma de atacar Malfoy. Aquela expressão crua, vazia e intocável era agonizante para ele.

 

—       Eu não preciso de nada além da minha família. Você é apenas parte do meu plano principal, isso não significa que não tenho outros. Posso administrar isso sem o seu nome. Se não quiser se afiliar a mim, o que não é nada inteligente da sua parte, não muda muito para o meu lado. Não sei para o seu. Se quiser, pode continuar com sua tentativa, muito bem sucedida por sinal, de acabar com Voldemort. Não se incomode com o fato de que tem tentado isso por anos, de que não tem recursos, não tem proteção, nem contatos.

 

—       Você acabou com o que eu tinha. – ele rosnou.

 

—       Para ter certeza de que você precisaria de mim quando o tempo certo chegasse. – Malfoy soltou e Harry sentiu suas unhas fincarem na palma de sua mão. - Eu sei montar bem meus jogos, Potter. Sou um Malfoy. Agora faça a matemática. Ou não faça, porque sei que já a fez quando decidiu entregar a Ordem da Fênix. Eu estou te dando uma chance de acabar com o que tem tentado por anos. Eu irei fazer todo o trabalho, você só precisa dar o cheque mate. Pense nisso. – ele voltou-se para Rony pela primeira vez. – Eu até diria para ajudar a trazer algum senso a Potter, mas não sei se um Weasley seria capaz de fazer isso. Talvez você pudesse me provar estar errado.

 

Harry viu as orelha de Rony ficarem vermelhas. Rony até provaria que Draco Malfoy estava errado com muito prazer, mas não para o benefício dele.

 

—       Vai reportar-se a mim quando tomar uma decisão. – O comensal que estava com ele pronunciou-se finalmente. – Vou estar cuidado de Godric’s Hollow enquanto isso.

 

—       Draco. – era a voz de Hermione o chamando da sala. Harry passou sua atenção para ela quase que imediatamente. – Estamos quase indo.

 

Como ela conseguia falar com ele como se ele fosse um ser humano comum? Como ela conseguia encará-lo sem ter nojo? Como ela conseguira fazer filhos com ele? Como ela conseguia ser parte da família dele? Não conseguia acreditar que ela pudesse gostar dele. Tinha que ter algo errado ali. Aquilo tinha que estar sendo contra a vontade dela. Eles não demonstravam afeto. Não se tocavam. Tudo entre eles parecia muito profissional. Até a forma como cuidavam da filha era quase automática. Eles tinham uma sintonia perfeita, não precisavam dizer muito para se entenderem, mas ao mesmo tempo era quase que robótico. Ou talvez eles estivessem operando em modo automático já que a situação em que estavam poderia ser quase traumática. Mas ainda assim, Harry continuaria a defender que algo de errado havia entre eles, que nem ele gostaria de estar com ela, nem ela gostaria de estar com ele, simplesmente porque eram Draco Malfoy e Hermione Granger. Havia uma energia que os repelia um do outro aos olhos de Harry que o impedia de ver qualquer coisa além daquilo.

 

Malfoy deu as costas e foi em direção a ela ainda carregando a filha no colo. A menina continuou a encarar Harry por cima do ombro do pai. Os olhos cinzas e frios bem abertos fitando Harry como se ele fosse algo bastante interessante deixava Harry extremamente incomodado. Na verdade, no geral, a menina o deixava muito desconfortável. Ela era a cópia de Hermione. O formato da boca, dos olhos, do pequeno narizinho, o desenho das bochechas, o jeito como o rosto se ajustava quando sorria incerta ou quando parecia triste. Era Hermione. Mas estranhamente, aquela pequena Hermione gritava o sangue Malfoy com a característica dominante que seguia a linhagem há séculos. Os poucos fiozinhos quase prateados no topo da cabeça e os olhos intimidadoramente cinzas exclamavam para quem fosse o brasão que levava no sobrenome. Harry sempre sentia o estômago revirar. Aquela deveria ser sua filha. Não dele.

 

Seus olhos ficaram tão vidrados nos da menininha que não percebera a outra comensal se aproximar. Ela tomou sua atenção quando bateu a junta dos dedos na mesa da cozinha.

 

—       Você é o líder, não é? – ela pronunciou-se.

 

—       Sou Harry Potter. – ele não se identificava como líder de mais nada.

 

—       Certo. – ela parecia enjoada de estar tendo de lidar com ele. Abriu um saco de galeões e os espalhou pela mesa. – Aqui estão todas as chaves de portal que vão precisar se decidirem ir. A ligação dos portais vai se abrir exatamente daqui a duas horas e será mantida por não mais que quinze minutos. Assim que chegarem a propriedade, teremos alguém pronto para recepciona-los e guia-los. Se forem estúpidos o suficiente e decidirem ficar, a única coisa que irão precisar fazer é não tocar nas chaves de portal pelos quinze minutos em que estiverem aberta. Alguma pergunta?

 

—       Como é a comida lá? – Rony perguntou.

 

A mulher o encarou com desgosto e decidiu ignorá-lo.

 

—       Vocês tem as instruções. Meu trabalho está feito aqui. – ela foi seca, deu as costas e voltou a fazer companhia para os Malfoy e o outro comensal que estava com eles.

 

Foi muito simples a forma como simplesmente desapareceram dali em segundos com a chave de portal. Malfoy e Hermione conversavam entre si num tom casual porém baixo quando o outro comensal pediu pela atenção deles. Juntaram-se em volta de um artefato decorativo que fora trazido pela comensal numa de suas idas e voltas e em um segundo apenas, já não estavam mais lá. Ele ainda sentia os olhos da garotinha Hermione de sangue Malfoy o olhando por cima do ombro do pai, mesmo que nenhum deles estivesse mais ali. Ainda sentia o desprezo de Hermione em nem mesmo despedir-se. Com um olhar que fosse. Sentia-se vazio.

 

—       Bem. – escutou Rony suspirar logo ao seu lado. – Eu já vou garantir a minha. – ele pegou uma dos galeões em cima da mesa. Levantou-se e foi embora.

 

**

 

A verdade foi que nem todos estavam dispostos a se associarem com Draco Malfoy. Por mais que existisse moedas para todos e por mais que a maioria estivesse indo a loucura sendo obrigados a ficarem confinados naquela casa claustrofóbica, a ideia de seguir o general do exército de Voldemort era loucura demais. Harry queria se sentir tentado a permanecer escondido, mas a verdade era que isso nunca fora uma realidade sua. Ele nunca se contentara em ficar debaixo das asas de nenhuma proteção, mesmo tendo plena consciência do perigo.

 

Foi exatamente isso, e a sede de ver o fim de tudo aquilo, que o levou a pegar uma moeda. Certo que a companhia de Luna, Rony, Neville também foi um fator determinante. Neville foi o primeiro a se justificar dizendo que seu estoque de poções e ingredientes estava chegando ao fim e que assim que isso acontecesse ele definharia sem ter uma distração para sua falta de propósito. Luna pegou sua moeda apenas porque não deixaria Rony ir sem ela. Não que eles estivessem juntos ou algo do tipo, mas definitivamente compartilhavam de algo não oficial. Harry foi o último a pegar a sua.

 

O resto não quis segui-los. Nem mesmo Arthur e Molly que prontamente sempre estiveram ao lado de Harry. Harry sabia que os dois já estavam saturados e por mais que não dissessem, Harry sentia que para eles, a decisão de Harry em escutar Malfoy e Hermione sobre a queda da Ordem os custara Gina, a Nora e mais uma lista de aliados da Ordem que eles consideravam família. Harry queria ter tempo para se sentir mal por isso, mas ele também havia perdido muito mais do que ganhado com sua estúpida decisão de ter confiado em Hermione sobre a queda da Ordem.

 

A chave de portal os levou diretamente para uma clareira num lugar que ele desconhecia completamente. O sol que brilhava alto no céu. A vegetação densa que os cercava parecia bem cuidada, como se fosse um bosque que provavelmente servira para muitas caças matinais de Lordes ingleses ou para um belo passeio de meio de tarde ou uma leitura ao ar livre. Os troncos das árvores e as densas raízes mostravam que aquele lugar tinha muita história.

 

Neville, Rony, Luna e ele ficaram se encarando por um longo minutos depois de analisarem bem o lugar que os cercava. O silêncio entre eles era um grande ponto de interrogação que não parecia fazer muito sentido.

 

—       Eles disseram que haveria alguém para nos direcionar. – Rony foi o primeiro a abrir a boca.

 

Neville soltou o ar pesado.

 

—       Eu não sei porque continuamos confiando em Malfoys. – ele parecia desapontado.

 

—       Estar ao ar livre me faz se sentir bem. – Luna disse fechando os olhos e inalando o ar com vontade.

 

Harry preferiu ficar em silêncio e agradeceu-se por isso quando, não muito tempo depois, escutou o som de rodas e cavalos se aproximando. Segundos depois, por um caminho que mais parecia uma trilha, surgiu a mais bela carruagem que seus olhos já haviam visto. Era cara, bem trabalhada, preta, completamente lustrada por onde ele conseguia ver perfeitamente seu reflexo. O brasão da família Malfoy estava cravado nos mais simples detalhes prateados de modo bem sutil, mas muito perceptível. Eram bruxos afinal, tomavam orgulho em suas carruagens. Carros era algo muito trouxa.

 

—       Apenas vocês? – perguntou um homem que saiu de dentro da cabine assim que a carruagem parou.

 

—       Sim. – respondeu Rony.

 

—       Bem. Melhor do que ninguém. – soltou o homem. – Teria sido uma perda de tempo no meio de todo esse tumulto. – ele desceu e segurou a porta da cabine aberta. – Vamos. Entrem.

 

Harry conseguiu ver um pedaço da Marca Negra no braço que ele usava para segurar a porta e por motivos óbvios, hesitou. Aquele homem era um Comensal. Mal podia acreditar que estava lidando com aquele tipo de gente. Mal podia acreditar que era com esse tipo de gente que teria que conviver.

 

Entrou na cabine. Era espaçosa. Estava pronta para receber muito mais gente do que eles três. Sentou-se no banco acolchoado de veludo vermelho quase vinho. O teto inteiro era trabalhado em detalhes prateados. Aquelas eram as cores Malfoy. O mundo sabia. Rony sentou logo ao seu lado seguido de Luna e Neville. O homem sentou logo a frente deles e quando disse que estavam prontos para irem. Rony manifestou-se:

 

—       Espere! – foi uma exclamação quase que de alerta. – Meus pais! – ele olhava pela janela.

 

Harry viu através do vidro Molly e Arthur confusos. Haviam pegado os últimos minutos da chave de portal para chegarem ali. Rony pulou para abrir a porta para eles. Os dois entraram e tomaram assento.

 

—       O que os fez mudar de ideia? – perguntou Neville.

 

—       Eu já perdi filhos o suficiente para deixar um deles se enfiar num ninho de Malfoys sem a minha supervisão. – Molly respondeu. Rony apenas revirou os olhos.

 

O comensal com eles perguntou mais uma vez se todos estavam prontos e com uma resposta meio indecisa de todos, ele decidiu seguir caminho. Andaram por uma trilha bem fechada por alguns longos minutos, que na cabeça de Harry pareceram ser muito mais do que realmente foram, até que as árvores se afastaram dando espaço para uma estrada mais bem pavimentada e larga.

 

Começaram a descer um pequeno relevo, como se estivessem rodeando um pequeno morro. Foi quando por entre o caule das árvores, por algo que não foi mais do que um segundo, ele teve um rápida vista da edificação que aquela carruagem estava os levando para encontrar. Foi tão rápido que Harry não conseguiu processar como real. Foi como ter tido o flash de alguma pintura renascentista tirada de um museu. Ele deveria ter imaginado. Só podia ter imaginado.

 

Ficou procurando por entre o caule das arvores uma outra visão daquela magnifica pintura, mas não a conseguiu por um bom tempo. Procurou enxergar além, mas não teve nada em resposta a não ser o verde. Foi quando quase desistiu de procurar que as árvores se espaçaram mais uma vez, para que ele pudesse ter mais um flash, dessa vez não tão inteiro quanto da outra vez. Viu uma torre. Um minuto depois viu mais duas por entre as árvores quando elas permitiram. Segundos depois viu quase uma ala inteira e outras pequenas torres. No segundo seguinte as árvores sumiram e ele teve a visão completa de uma mansão que ele nunca pensou que sequer pudesse existir.

 

—       É sério? -  Rony soltou rindo por baixo da respiração olhando pela janela. – Vocês só podem estar de brincadeira.

 

A carruagem atravessou em direção a mansão pelo meio de um jardim francês perfeitamente bem cuidado, com um verde e estátuas que cuspiam jatos de água que combinavam com as pedras claras das fechadas da mansão. Era sólida, comprida, grande, uniforme, simétrica e sem dúvida alguma, cara. Muito cara. Extremamente cara. Haviam pequenos morros ao fundo que completavam uma imagem quase de tirar o fôlego. Aquele lugar poderia pertencer apenas a um Malfoy porque ninguém no mundo inteiro, que não tivesse uma fortuna acumulada de séculos como os Malfoy tinham, poderia pagar para ter uma mansão daquela.

 

Quanto mais se aproximavam mais Harry conseguia se sentir pequeno em relação a escala daquele enorme lugar. Quando entraram num pátio principal onde haviam diversas carruagens como a que ele estava estacionadas, ele já se sentia minúsculo.

 

Deram a volta num enorme espelho d’água enfeitado por arbustos muito bem podados e pararam logo de frente a uma das enormes escadas que atravessavam todos os níveis de varandas até a entrada principal. O comensal a frente deles abriu a porta e soltou:

 

—       Bem vindos a Philbrook Palace na região do Vale do Bosque. É conhecido como Caverna de Vidro, mas não use esse nome por aí. A família não gosta dele. Preferem Malfoy Manor, e esse é o nome que temos usado.

 

—       Bem clássico inglês. Claro que eles iriam querer te lembrar que é uma mansão até com o nome. – ironizou Rony enquanto descia da carruagem.

 

Harry prestou atenção em cada detalhe, do momento em que pisou nos pequenos cascalhos do pátio, até quando subiu as inúmeras varandas até a enorme pesada porta principal que já estava aberta sendo guiados pelo homem da carruagem. Foram recebidos por vestíbulo gigantesco de teto alto pintado a mão com cenas e personagens que ele não soube reconhecer. Passaram pelo alinhamento de estátuas helenísticas das laterais pisando em um tipo de cerâmica que parecia caro demais para ser pisado até entrarem em um salão ainda mais gigantesco, com um teto ainda mais alto e mais bem decorado, com uma escadaria que mais parecia um convite para o céu e um gigantesco lustre de cristal que não parecia ter sido feito por nenhuma mão humana.

 

—       Merlin. – Neville soltou por debaixo do próprio fôlego. – Por que que isso me parece um exagero?

 

—       Talvez porque acabamos de sair de um lugar pobremente habitável. – Luna respondeu. Parecia estar em outro planeta olhando tudo que havia ao redor.

 

A casa parecia se abrir para todos os lugares daquele enorme espaço. Haviam algumas pessoas circulando aqui e ali. Outras pareciam apenas estarem engajadas em algum tipo de conversa séria. Parecia bem balanceado. Não era muita gente. Não pareciam estar correndo para nada. Mas pareciam muito centradas em um objetivo ou trabalho.

 

Pararam quando percebeu que havia uma mulher vindo em direção a eles. Ela era alta, tinha os cabelos loiros curtos bem ajeitados na altura no ombro, o rosto fino e longo. Uma postura impecável. Vestia roupas finas. Salto alto. Parecia com  Hermione vestida daquele jeito. Estava acompanhada de dois homens que escutavam o que ela tinha para dizer enquanto avançava. A companhia dela foi embora tomando rotas diferente e ela parou de frente para Harry, Rony, Luna, Neville, Molly e Arthur.

 

—       Bem vindos a Malfoy Manor. Sou Tina Hogefre assistente e secretaria agora da família Malfoy. Podem me chamar apenas de Tina. Todos me chamam assim. Nomes, por favor. – ela parecia quase um robô. Todos deram seu nome e sobrenome muito calmamente e desconfiadamente. Harry foi o último e o som do nome ‘Harry Potter’, vindo da boca de Harry Potter, fez a mulher parar um segundo para analisa-lo com cuidado dos pés a cabeça. Não parecia se sentir muito confortável com ele ali. – Bem. – ela limpou a garganta descolando os olhos de Harry. – Temos quartos para cada um de vocês. A casa é muito grande portanto vou ser obrigada a fazer um pequeno tour pelas partes mais importantes. Não vai ser nada muito demorado, meu tempo deve ser sempre otimizado. Sigam-me. – começou a andar.

 

Eles meio que se olharam e concluíram que essa era a única opção que tinham antes de seguir a mulher. No momento em que deu seu primeiro passo, seu faro quase que obcecado conseguiu se focar em Hermione aparecendo por entre uns pilares ao fundo do salão. Ela estava acompanhado de um pequeno grupo de bruxos vestidos com um jaleco escuro. Carregava uns frascos assim como o pessoal que estava com ela. O coração de Harry bateu uma batida forte contra seu peito no momento que colocou os olhos sobre ela, o que o fez perceber que estava longe de deixar de sentir qualquer coisa por aquela mulher.

 

Ela sequer notou que ele estava ali. Seguiu caminho com seu pessoal. Harry sentiu como se o tempo tivesse desacelerado quando sua esperança de receber ao menos um olhar que fosse cresceu sem que ele quisesse. Alguém do grupo dela o avistou e foi quando ela pareceu receber a informação de que ele estava ali que o olhar dela finalmente foi direcionado a ele. Foi quase que uma facada contra a pequena esperança dele. O olhar dela foi vazio. Sem significado algum. Foi apenas um olhar. Um olhar que logo piscou e voltou a se focar no caminho que estava seguindo.

 

Harry se sentiu desolado embora não quisesse. Por que infernos ela estava fazendo aquilo? Por que raios ela continuava a insinuar que ele não era nada, que ele não a afetava, que ele não importava. Ele sabia que era mentira! Não importava quantos olhares vazios, quantas expressões frias, quantas posturas superiores tentasse fazer ele engolir. Era mentira! Ela mentia! Nada do que haviam vivido podia simplesmente ser nada agora. E ele não estava se referindo as horas que passaram juntos abraçados, os sussurros que haviam trocado, os toques que compartilharam, ele se referia a tudo! Se referia a parte de terem crescido juntos, a terem aprendido sobre a vida juntos, a terem se enfiado e terem conseguido sair de tantas confusões juntos, a terem jurado lealdade, a terem sido amigos, aliados, amantes. A terem sido ‘um’ por tanto tempo.

 

Seguiu aquela mulher sentindo seu coração pesado. Tudo naquele lugar o fazia sentir-se assim e não era por causa de todo aquele gritante luxo e sim porque tudo aquilo agora era parte da distante vida que Hermione vivia bem longe dele e dos amigos.

 

A mulher os levou para cima e para baixo. Explicou que a casa tinha três alas. A central que consistia em salões que variavam de funcionalidade, uma grande biblioteca com um acervo que ele não acreditou, alguns escritórios e entradas e saídas para os jardins do terreno. A segunda ala era onde ficariam hospedados assim como aparentemente todo o resto também estava. Era uma ala independente, com uma lista infindável de quartos, lavatórios, salas comunais, pequenos salões variados, estações de entretenimento e mais um milhão de coisas. A terceira ala era outra também independente. A diferença era que essa tinha acesso restrito. Era a ala que pertencia exclusivamente a família Malfoy. Draco, Hermione, os filhos, os pais e qualquer outro que tivesse o sangue vinho e prata da família. Ou quem fosse íntimo o suficiente para ser convidado a se hospedar ali ou entrar ali. A ala tinha seus quartos, escritórios, versões estendidas da biblioteca principal, salões privados, estações temáticas, mais setores de entretenimento e mais uma lista de cômodos exclusivos que até mesmo Tina Hogrefe ficava chocada e pedia o fôlego ao dizer. Era uma palácio. Uma palácio moderno e grande demais para quatro pessoas e seus funcionários.

 

Eles foram lembrados de não usar a circulação de empregados e elfos e eram apontados constantemente para a direção que aqueles corredores tomavam, como se aquilo fosse fazer Harry se lembrar de não seguir todos aqueles milhões de caminhos diferentes espalhados pela casa a próxima vez que fosse se aventurar por ela. Por mais que se sentisse confiante nos ensinamentos que morar em um castelo como Hogwarts por anos tivesse o dado, aquele lugar era muito diferente de um castelo, mas conseguia ser tão grande quanto um.

 

Ao final de todo o tour, a mulher chamada Tina deu o horário e onde as refeições eram servidas. Eles estavam livres para explorarem a mansão, exceto a terceira ala, a ala privada dos Malfoy. Para Harry aquilo era quase um convite. Quando em sua vida ele dera as costas a algum alerta “proibido entrar”? Mas sentia-se diferente agora. Ele não tinha interesse. Não tinha o menor interesse naquela casa. Não tinha mais o menor interesse em nada. Tudo o que realmente queria era o fim daquela profecia. Tudo que queria era se livrar do peso dela.

 

Todo o restante daquele dia ele ficou no quarto que Tina o colocara. Rony lhe fez companhia por muito tempo e tentou convencê-lo de ao menos irem conhecer a biblioteca, mas Harry não cedeu. Rony acabou indo com Luna e Neville. Mais tarde, antes do jantar Tina retornou pedindo para que Neville a acompanhasse. Quando todos desceram para jantar no enorme salão multiuso da ala em que estavam, Harry continuou naquele quarto.

 

Encarou o teto alto e bem decorado deitado na cama por um bom tempo enquanto o sol descia. Encarou vista da janela por um bom tempo. Encarou o lavatório privado que tinha por um bom tempo. Encarou a decoração por um bom tempo. Encarou as roupas que haviam sido movidas de seu minimalista guarda-roupa para o enorme armário maciço e bem talhado daquele quarto que não o pertencia, mas que ele ocupava por um bom tempo. Perdeu-se em seus próprio pensamentos por mais vezes do que conseguia contar. Por muitas vezes ele se viu vazio. Vazio de tudo. Vazio de sentimentos, de pensamentos, de vontades, de propósito.

 

Estava tudo escuro quando escutou batidas na porta. Ele não teve vontade de levantar para abrir, mas ele já estava vivendo em modo automático fazia um bom tempo. Viu a cara de Tina Hogrefe quando abriu a porta. Ela o julgou pelo olhar no segundo em que ele apareceu.

 

—       Acaso alguém tomou sua varinha? – ela perguntou com um olhar estranho.

 

—       Não. – ele respondeu sem entender a pergunta.

 

Ela tirou a sua do bolso e apontou para o lustre no quarto que acendeu no mesmo segundo.

 

—       Você está sendo chamado na terceira ala. – ela foi direto ao ponto parecendo não querer perder tempo. – Siga me.

 

—       Quem? – ele perguntou sem se mover quando ela deu as costas. – Quem está me chamando?

 

Tina tornou a virar-se para ele.

 

—       Hermione Malfoy. – respondeu ela não dando muito crédito.

 

Harry sentiu o peso daquele nome apertar seu estômago. Hermione estava o chamado. Por que ele que tinha que ir até ela? Por que toda aquela formalidade? O que aquilo significa? Ela teve todo o tempo do mundo para trocar duas ou três palavras que fosse com ele quando estavam na casa de seus pais horas atrás. Qual o direito que ela tinha para requisitar suas presença após tê-lo ignorado por tanto tempo?

 

—       Não conheço Hermione Malfoy. – fez menção de fechar a porta, mas a mulher segurou a segurou antes que ele tentasse.

 

—       Escute. Existem pessoas aqui nessa casa e fora dela morrendo para poder trocar duas palavras que fossem com Hermione Malfoy, Sr. Potter. Ela definitivamente não tem tempo para você, mas ainda assim ela está se fazendo ter, portanto, apenas me siga. – a mulher foi seca.

 

Hermione tivera todo o tempo do mundo quando estavam em Godric’s Hollow e afinal, quando foi que Hermione havia se tornado a rainha da Inglaterra? Que tipo de realeza ela era agora para ser tão inacessível.

 

Pegou-se seguindo a mulher. Sua mente rodava em torno de tudo que queria cuspir em Hermione. Sentiu a raiva acordar dentro de si e começar a se preparar  para um combate importante. Um que ele havia esperado desde o momento que percebera que todas as decisões destrutivas que tomara depois que Hermione o deixara eram culpa dela! Ele estava pronto.

 

Quando atravessou para dentro da tal terceira ala, sentiu-se pisando em território sagrado. Tudo ali parecia mais solitário, mais vazio, mais silencioso. Tudo bem que a dita família Malfoy consistia em três pessoas naquele momento para ocupar aquela ala inteira, mas não era bem isso que falava mais alto naquele espaço que parecia até mesmo mais frio do que o restante daquele enorme palácio.

 

Atravessou um salão com um enorme espelho d’água onde esculturas de mármore emergiam da água cristalina que refletia a luz que entrava pela sequência de janelas nas laterais. O eco de pingos aleatórios na água ecoava pelo enorme salão e ele achou que já havia visto mais do que deveria de todo o luxo daquele lugar. Era um extremo exagero que existissem propriedades como aquela. Tina as vezes abria a boca para dar honra ao artista responsável pela decoração do espaço. Harry fingia não escutar, principalmente quando ela voltava no tempo para dar um relato histórico de como um específico cômodo ganhara vida nas mãos de fulano de tal durante um século tal... Ele não duvidava que aquela mulher deveria saber mais daquela propriedade do que os próprios proprietários.

 

Já estava cansado de seguir Tina quando entraram em um foyer meio arredondando. Haviam quadros decorativos por toda a extensão de paredes até o teto alto, como sempre. Uma escada na lateral, muito bem trabalhada, abria para um mezanino. Tudo de mármore. Enormes blocos de mármore bem polido. Chão, paredes e pilares. Ele subiu com Tina pisando no tapete escuro e espesso da escada. Ela pediu para que ele se acomodasse em um dos decorativos divãs de veludo do mezanino e basicamente esperasse Hermione aparecer. E então simplesmente deu as costas e desapareceu andando rápido como sempre parecia andar.

 

Harry não se sentou. Enfiou as mãos no bolso da calça e esperou. Não por muito tempo porque sua impaciência era parte viva de sua personalidade. Seus olhos pularam de decoração  para decoração na paredes, no chão, nos móveis, nos lustres, no teto, nos degraus da escada, no corrimão, nos tapetes. Tudo era demais. Era informação demais. Por mais que não fosse nada barroco, ainda assim era um clássico que não pertencia a modernidade do mundo em que viviam.

 

Pegou-se subindo o restante das escadas para o patamar além do mezanino. Foi guiado por um painel de quadros silenciosos. Deixou-se ser levado pelos pés e pelos olhos. O teto ali já era mais baixo. Parecia mais aconchegante. Menos frio. Menos solitário. Quando deu-se por si, o corredor que não parecia corredor o guiara para uma sala de luz controlada, tapete grosso, sofás vitorianos e lareira acesa. Lareira acesa. Aquele pequeno detalhe chamou sua atenção. Foi logo quando seu olhar pregou no enorme quadro acima da lareira. Draco e Hermione. Muito realisticamente pintados. Hermione estava sentada numa postura digna de rainha em uma enorme poltrona vinho. Draco estava de pé logo atrás. Os dois estavam sérios. Frios. Quase mortos. Parecia o contraste do gelo logo acima do fogo da lareira. Eram Malfoys. Talvez a intenção fosse essa. Nenhum Malfoy jamais havia sido caloroso e amigável.

 

Ele escutou um barulho abafado não vir de muito longe. Reagiu ao barulho voltando seu olhar para a direção de onde ele veio. Deparou-se com um painel de algo banhado a ouro. Era vasado e bem trabalhado com desenhos que formavam flores, pássaros e mais um monte de forma que ele não conseguiu distinguir. Os desenhos eram interessantes e ele se aproximou poder ver mais de perto, mas foi pelo vazado do painel que percebeu que logo do outro lado havia uma porta dupla de madeira maciça entreaberta. Ele poderia dar a volta no painel e ver o que havia dentro daquele outro cômodo, mas foi naquele exato momento que por entre um desenho de pássaro e um de flor daquele painel de metal coberto com ouro e pelo espaço aberto da porta que ele enxergou com muita clareza, com mais do que realmente gostaria que pudesse, Draco Malfoy.

 

Ele tinha um pedaço de pergaminho longo na mão e toda a sua atenção estava voltada para o conteúdo que lia. Estava de pé, encostado num enorme dossel de carvalho talhado. Harry não conseguia acreditar no tamanho da cama estava vendo ali. Pensou imediatamente em recuar e sair dali o mais rápido possível. Sua intenção não era chegar naquele nível de privacidade, mas no momento em que fez menção de ir embora, seus músculos travaram ao ter Hermione entrando naquele campo de visão.

 

Ela vestia um longo robe aberto de um tecido muito leve e brilhante que ia até o chão. Ele foi capaz de ver o par de peças íntimas caras e escuras que usava. Ela andava com pressa fazendo o robe voar e dançar muito graciosamente. Carregava dois vestidos pendurados em cabide. Um em cada mão. Parou de frente a um espelho e testou cada um deles colocando-os contra a frente do corpo esguio.

 

—       Qual dos dois? – a voz dela soou depois de parecer indecisa. Era claro que ela estava pedindo a opinião de Malfoy, que estava logo ao lado entretido com o documento que tinha em mãos. Tão entretido que ignorou Hermione. Hermione apertou os lábios e limpou a garganta propositalmente. – Draco. – o tom dela foi mais firme. Ele apenas piscou e levou os olhos calmamente para ela. – Qual dos dois? – ela tornou a perguntar mostrando os vestidos quando ele esperou em silêncio pelo motivo ao qual ela havia o chamado.

 

—       Para amanhã? – ele perguntou.

 

—       Sim. – ela respondeu.

 

Ele pareceu analisar os dois modelos com atenção.

 

—       Mão direita. – foi tudo que ele respondeu antes de voltar sua atenção para o que estava lendo.

 

Hermione analisou o vestido que segurava com a mão direita e fez uma rápida expressão de concordância. Como se entendesse o porque ele escolhera aquele. Ela sumiu de vista voltando para o lugar de onde tinha vindo. Harry se sentiu estúpido de estar ali. Pensou em fugir mais uma vez, mas então a voz de Hermione tornou a se fazer audível. Ela parecia estar em outro cômodo.

 

—       Como foi com Hera? – ela perguntou.

 

—       Ela dormiu rápido. Estava cansada. – Draco respondeu quase como se estivesse ligado no modo automático.

 

—       Consegui falar com Narcisa outra vez. – comentou. – Os espelhos tem funcionado. Estou preocupada que eles me deixem paranoica.

 

—       Ao menos estamos compartilhando da mesma preocupação. Não quero que eles me deixem paranoico. – Ele soltou o ar com calma e parou com o documento que tinha nas mãos. – Hermione. Preciso que leia isso. – ele enrolou o pergaminho que tinha nas mãos.

 

—       Deixe em cima da minha cabeceira. – ela reapareceu usando um daquelas roupas formais e caras que fazia parte de seu figurino agora. O zíper do vestido aberto nas costas.

 

—       Preciso de uma opinião até o final do dia. – ele disse colocando o documento na cabeceira dela.

 

—       Draco, o fim do dia é em apenas algumas poucas horas. – ela disse enquanto colocava os sapatos de salto que tinha nas mãos estando ainda de pé. - Eu ainda tenho dois estudos para terminar, uma conversa com o seu pessoal e uma entrevista para dar. – ela ficou de costas para ele que já estava a esperando para poder terminar de subir o zíper do vestido.

 

—       É importante. Véu. Dementadores. Preciso tomar uma decisão. Não quero ter que lidar com você reclamando não ter participado depois. – ele descansou as mãos sobre a cintura dela após fechar o zíper do vestido. A forma como eles faziam tudo no automático era quase uma prova de que aquilo já havia se repetido dezenas e dezenas de vezes entre eles. Aquela dança ensaiada. Aquela sintonia e sincronia que fluía entre eles. Doía assistir.

 

Hermione quase que no mesmo segundo virou-se para ele e descansou as suas sobre o peito dele, alisando o tecido de sua blusa.

 

—       Tudo é importante no ponto em que estamos agora, querido. – o tom de voz dela diminuiu tão consideravelmente que Harry quase não pode entender o que ela havia dito. Sentiu um tom um tanto ácido da parte dela para com ele, mesmo que houvesse um certo afeto. – Eu estou tentando aceitar que não vou dar a atenção que quero a tudo que preciso. Acha que pode me ajudar?

 

Ele processou aquilo em silêncio por alguns segundos. Assentiu finalmente.

 

—       Podemos conversar sobre isso durante a noite então. – o tom dele foi tão baixo quanto o dela. – Não acho que nenhum de nós dois vai conseguir dormir de qualquer forma.

 

Ela apenas assentiu concordando com ele de uma forma dolorosa. Foi naquele momento que uma âncora bateu contra o estômago de Harry e se fincou ali. Foi naquele momento que a força do olhar que eles trocaram, um olhar tão íntimo e tão afetuoso, que fez Harry perceber que eles não eram apenas duas figuras que passaram tempo suficiente juntos para terem se tornado familiares e confortáveis demais um com o outro. Eles compartilhavam de algo intenso. Algo significativo. E Harry sabia o que era e aquilo criava um nó gigantesco em seu cérebro. Aquele homem com quem ela compartilhava tudo aquilo que ele enxergava ali era Draco Malfoy.

 

Ele queria gritar.

 

Draco Malfoy, Hermione! – ele queria muito berrar - Esse é Draco Malfoy! D-R-A-C-O! M-A-L-F-O-Y!

 

—       Você está com medo. – ela comentou tocando o rosto dele e olhando tão fundo em seus olhos que Harry se questionou como ela conseguia fazer aquilo sem nenhuma dificuldade. – Eu não fiz parte de muitas fases da sua vida, mas posso dizer que já o vi preocupado antes, Draco. Mas nunca com medo. Nunca assim.

 

Harry não fazia ideia do que ela estava falando.

 

—       Eu nunca tive tanto a perder. – ele respondeu puxando-a mais para perto.

 

—       Eu sei que odeia que sejamos seu ponto fraco. – ela comentou aquilo com muita tranquilidade. Ele abriu um sorriso calmo.

 

—       Só não é uma boa hora para ter um, Hermione. – ele disse e tocou a mão dela em seu rosto. Levou o pulso dela até sua boca e o beijou como se já tivesse feito aquilo milhões de vezes. – Sinto falta do seu calor. – Laçou seus dedos nos dela com muita facilidade. Como se já tivesse feito isso tantas outras vezes antes também. Como se ela já estivesse esperando que ele fizesse.

 

—       Sinto falta do seu. – ela fechou os olhos.

 

Ele inclinou-se e beijou a boca dela muito calmamente. Harry desviou os olhos. Ele não queria ver aquilo. Que infernos fazia ali? Por que diabos não ia embora?

 

—       Temos que conversar sobre sua Marca Negra, Hermione. – quase não era capaz de escutá-los.

 

—       Me dê mais tempo, por favor. – ela pediu muito manhosamente.

 

—       As pessoas estão comentando e perguntando por toda parte. Eles sabem.

 

—       Eu sei. Eu preciso de tempo.

 

Eles se encararam muito de perto por algum segundos. Malfoy soltou o ar como se estivesse abrindo mão de alguma coisa e a beijou mais uma vez. Ficaram em silêncio com os rostos quase grudados parecendo apreciar muito a proximidade.

 

—       As vezes quando temos tempo um para nós me consome que não podemos ser prioridade um para o outro. – ele disse descansando a testa na dela.

 

—       Nós não temos tempo um para o outro. Essa é a verdade. – ela disse triste mas conformada. Suspirou e afastou-se dele abrindo os olhos. – Não vai ser sempre assim, Draco – alisou novamente sua blusa. Encararam-se como se estivessem despedindo-se um do outro. – E espero que não seja assim por muito tempo. - deu as costas a ele e sumiu novamente de volta para o outro cômodo. Foi como um ponto final para aquele momento de vulnerabilidade que pareciam terem se permitido viver.

 

—       Espero que isso não nos mate. – ele disse muito casualmente tirando a gravata e abrindo os botões da blusa. Tão casualmente que Harry se questionava o quanto ele realmente esperava que aquilo não os matassem mesmo. Eles haviam voltado ao casual tão rapidamente quanto apertar um interruptor. Havia algo dito e não dito naquela conversa entre eles que Harry não conseguia captar. – O que vai fazer agora? – perguntou ele seguindo o mesmo tom casual. Casual demais. Harry não conseguia entender aquela dinâmica fria, mas ao mesmo tempo calorosa.

 

Hermione pareceu hesitar e foi quando Malfoy percebeu a brecha dela que ele desacelerou o processo de se livrar de sua blusa, como se precisasse desviar mais atenção para a falta de casualidade dela em receber aquela pergunta.

 

—       Pedi para que Tina chamasse Harry. – ela respondeu não muito tempo depois.

 

Houve um silêncio da parte de Malfoy ao receber aquilo. Ele finalmente se livrou da blusa quase que em câmera lenta. Como se tivesse se prendido aos próprios pensamentos e perdido o modo automático. Hermione voltou para a cena. Tinha joias expostas por toda parte agora. Eles se encararam em silêncio quando ela desacelerou o passo e parou não muito longe dele.

 

—       Precisamos conversar sobre ele? – perguntou Malfoy quebrando um silêncio estranho entre os dois.

 

Hermione soltou o ar um tanto quanto incomodada.

 

—       Nós já temos muito no nosso prato para digerir, Draco. – foi o que disse.

 

Harry conseguiu perceber que Malfoy estava pronto para rebater aquilo, mas ao contrário do que ele esperava, a resposta foi apenas um aceno de cabeça concordando com ela. Eles se encararam estranho mais uma vez até que Malfoy desse as costas a ela e seguisse para um lado oposto do cômodo. Hermione ficou imóvel.

 

—       Vou me encontrar com Fox em uma hora. Seria interessante que estivesse junto. – a voz dele veio distante.

 

Hermione deu um suspiro grande parecendo voltar para a realidade após alguns longos segundos de imersão em seus próprios pensamentos.

 

—       Tenho uma entrevista com um daqueles jornalistas do Profeta Diário. – ela respondeu andando até a cabeceira de sua cama para pegar o pergaminho que ele havia deixado ali. – Não gosto que eles fiquem andando livremente pela casa, Draco. – ela desenrolou o documento e passou os olhos rapidamente pela primeira linha. - Quero que se certifique que eles não estejam mais aqui amanhã.

 

—       Fale com Tina sobre isso. – a voz dele veio dessa vez mais distante ainda. – E eles não estão andando livremente pela casa. Você sabe a necessidade deles estarem aqui.

 

Ela fez uma careta não muito contente e voltou o enrolar o pergaminho e abandoná-lo em sua cabeceira. Saiu de cena seguindo o caminho que o marido tinha feito. Dessa vez Harry conseguia ouvir que eles continuavam algum tipo de discussão casual, mas vinha até ele muito abafado e baixo. Ele não conseguia distinguir as palavras. Ficou ainda mais difícil quando um barulho de água corrente, como se fosse uma ducha, intensificou-se entre os murmúrios que escutava. Foi naquele momento que Harry se viu um patético espião cheio de sentimentos ruins sendo nutridos em sua cabeça.

 

Seus pés se moveram para longe sentindo um gosto na boca muito parecido com o de desgosto. Afastou-se tornando a tomar consciência do restante de seu próprio corpo quando por tanto tempo tudo com o que se importou foram o que seus olhos viam e o que seus ouvidos ouviam. Nunca pensou que pudesse se sentir tão invisível sem uma capa da invisibilidade.

 

Seus olhos grudaram mais uma vez na imagem acima da lareira. Draco e Hermione Malfoy. Um retrato congelado dos dois. Imóveis. Pareciam tão distantes embora estivessem um a frente do outro. Ele acabara de presenciar aquele retrato em forma viva, mas não distante como parecia. Eles se tocavam, se olhavam... Havia casualidade, familiaridade, afeto... Mesmo que houvesse frieza, algo que Harry não conseguia explicar, mas havia afeto. Afeto. Entre Draco e Hermione. Marido e mulher. Seu estômago revirou e ele sentiu ânsia.

 

Fugiu. Foi como se sentiu na verdade. Um fugitivo escapando a cena do crime. Um crime que ele cometera contra ele mesmo. Não deveria ter visto o que viu. Pelo bem da sua própria sanidade. Ele iria ter preferido morrer vendo apenas a curta e formal distância que Draco e Hermione mantinham em público.

 

Parou quando chegou no ponto onde havia começado. Aquele mezanino estranho no meio de um salão circular pequeno com moveizinhos vitorianos de veludo. Bem luxuosos no meio daquele chão de granito, colunar de granito, paredes de granito. Tapetinho de veludo descendo a escada como se estivesse pronto para receber algum tipo de realeza. Era isso que eles eram, não eram? Draco e Hermione o casal real. Queria poder explodir aquele lugar.

 

Seu pulmão se enxia e esvaziava rapidamente com sua respiração pesada. Talvez se ele explodisse conseguisse levar um pouco daquele lugar para o inferno com ele. Quis gritar. Alto. Ele não daria o luxo de sentar em um daqueles sofazinhos como um bom menino esperando pela chance de ser recebido pela rainha Hermione Malfoy. Ela era exatamente como Malfoy agora. Draco Malfoy. Ela era arrogante. Superior. Fria. Vazia.

 

Desceu aqueles degraus pronto para ir embora. Mesmo que isso significasse ficar perdido naquela casa enorme. Sabia que ia encontrar o caminho. Sobrevivera Hogwarts e toda a sua grandeza. Aquele palácio era apenas mais um para ele decifrar.

 

—       Harry? – era a voz dela.

 

Doce e fatal.

 

Ele congelou mesmo que não quisesse ter reagido. Por que? Que feitiço que ela tinha para causar tudo aquilo dentro dele?! Seus pés travaram. Ele travou.

 

—       O que faz aqui? – a voz dela pareceu confusa. – Tina sabe que não estou mais recebendo ninguém no salão oval.

 

Harry sentiu rancor. Voltou-se para ela com raiva.

 

—       Em que outro salão real gostaria de ter me recebido? – sentiu a ironia fluir de sua boca.

 

—       Tenho certeza de que avisei a um dos elfos que a deixasse saber do meu novo escritó....

 

—       Cale-se, Hermione! Apenas cale-se! – sentiu seus dentes quererem ranger. – Quem é você? Quem? Eu confiei em você! Eu confiei a vida de muitos a você! Seu eu soubesse que era uma Malfoy antes eu jamais teria sido capaz! Se eu soubesse que não se importa com nada além do seu próprio ganho, do seu próprio sobrenome, do seu cofre em Gringotes, da influência que tem! Se eu soubesse... Se eu soubesse que essa é você! Se eu soubesse que era uma Malfoy! Uma exatamente como qualquer outro! Eu nunca teria confiado em você. Nunca! – cuspiu. Ela permaneceu neutra. Odiavelmente neutra. Nem mesmo um pequeno espasmo em sua têmpora ele teve o alívio de ver. Ela ficou imóvel, no topo da escada, em toda a sua postura, toda sua realeza, toda sua superioridade, toda a sua arrogância. Neutra, fria, vazia de qualquer expressão. – VAMOS! – não era possível que ela não fosse reagir. Ele tinha que ter esperança. – VAMOS, HERMIONE! – a raiva corria dentro dele. Ele tinha que gritar. Talvez ela não estivesse escutando o que ele estava dizendo. – ME CONVENÇA DO CONTRÁRIO! ME DIGA QUE ESTOU ERRADO! DE QUE ESSA NÃO É VOCÊ! DE QUE ESSA NUNCA FOI VOCÊ! DIGA!

 

—       Não. – a voz dela saiu muito calma.

 

Aquilo o matou. Mas ele não abandonaria suas esperanças. Olhou confuso. Essa não era a resposta que estava esperando.

 

—       Não? – vociferou.

 

—       Não. – muito simples.

 

Silêncio.

 

Harry não conseguia processar. Hermione com muito cuidado desceu alguns degraus carregando toda aquela imponência que vinha com ela.

 

—       Eu sou uma Malfoy. – a voz dela foi continua, firme, longe de qualquer vacilo que fosse. – Não sou uma como qualquer outro, mas sou uma Malfoy e tudo com o que realmente me importo é o meu sangue e aqueles que o carregam. O meu. O do meu marido. O dos meus filhos. Essa sou eu. Uma Malfoy.

 

Que mulher era aquela de frente para ele? Seus olhos inundaram. Seus dentes rangeram. Seu coração gritou.

 

—       O que aconteceu com Hermione Granger? – sua voz saiu rouca.

 

—       Hermione Granger aprendeu o sacrifício que estabelecer prioridades carregam.

 

—       Ela está morta. – cuspiu ele.

 

—       Acaso eu pareço morta?

 

—       Você não é Hermione Granger.

 

Hermione puxou o ar com muita calma.

 

—       Eu sou quem eu sou. Sou o que não era ontem e sou o que não vou ser amanhã. Foi isso que aprendi.

 

Harry quis cuspir.

 

—       Por que me chamou aqui?

 

Hermione apertou os lábios e refez a postura puxando o ar para dentro do pulmão. Ela sempre havia sido orgulhosa daquele jeito. Desde sempre. A diferença agora era que carregava uma coroa na cabeça e tinha a influência que o restante de todo o mundo bruxo gostaria de ter.

 

—       Queria escutar tudo o que tinha pra dizer. Quando me olhava tudo que eu via era o vômito de palavras que você tentava conter. – ela continuava com aquele tom continuo e calma. Harry odiava aquilo. Odiava porque sabia que era a estratégia dela para se manter no controle daquela conversa.

 

Ele riu desgostoso sem nenhuma alegria.

 

—       Engraçado que quando te olho tudo que vejo é o seu silêncio. Não que eu não consiga ver que não tenha nada para falar. Pelo contrário. Eu sei que tem muito para dizer, Hermione. Mas o que me mata é que você opta pelo silêncio. Você não se importa.

 

—       Sim. Eu me importo, sim. Mas você nunca vai entender porque não importa o que eu diga, eu não vou ser capaz de fazer você enxergar além da raiva que tem. A raiva que eu te dou o direito de ter. A raiva de saber que eu te manipulei e te usei para conseguir o que precisava. Em especial a raiva por acreditar que perdeu o amor da mulher que amava.

 

Harry sentiu seu coração contorcer. Como? Como ela tinha a audácia de trazer isso a tona carregando uma expressão tão fria? Tão insignificante! Apertou os olhos. Aquilo era errado. Ele não deveria estar ali. Apertou os olhos. Ele tinha que encontrar uma forma de sair dali. Ele não se sentia confortável com ela. Ela não era quem ele esperava que ela fosse. Ele precisava de tempo de luto. Luto pela perda dela. A perda de Hermione Granger.

 

—       Eu entendo. – ele precisava atingir o nível dela. O nível superior dela. Por que ela parecia muito bem com o fato de ter abandonado Hermione Granger. Foi naquele momento que se sentiu patético por ser o alterado daquela discussão. – É bom saber que está tão bem onde está agora. Agora que já entendemos a posição de cada um, será eu que poderia pedir a vossa realeza permissão para me retirar?

 

Hermione ficou em silêncio por alguns segundos. Harry não soube ler se era raiva o que via nos olhos dela ou se era apenas uma continuidade da indiferença que ela projetava. Hermione se aproximou e Harry sentiu a necessidade de recuar, mas não conseguiu. Ela ficou muito próxima. Ele conseguiu ver a íris dourada e acolhedora que os olhos dela sempre tiveram. A maquiagem a fazia ficar diferente. Não menos maravilhosa, mas ele sempre iria preferir o rosto dela limpo.

 

—       Sua vida inteira você foi uma vítima, Harry. O garoto que sobreviveu. O que sofreu abuso dos tios, o que viveu debaixo das asas de Dumbledore em Hogwarts, o que precisou ser protegido pela Ordem por anos de guerra. A vítima número um de Lord Voldemort. Harry Potter. – aquela tranquilidade que ela usava para fazer as palavras fluírem de sua boca o matava. – Eu mais do que ninguém conheço a fome que tem para se tornar algo mais que apenas uma vítima. E você pode pensar que eu tomei isso como vantagem para te destruir, para te fazer tomar as decisões que tomou. Mas a verdade, Harry, é que eu pouco me importo com o que pensa ou deixa de pensar. O que realmente importa para mim, não para você ou para ninguém, para mim, é que eu nunca deixei de estar do seu lado. E isso é tudo o que eu preciso para mim. Eu estou bem resolvida, Harry. Sou eu quem tenho que digerir minhas motivações todos os dias e aprendi a lidar com elas com muita racionalidade. Agora é a sua vez de digerir as suas. Posso estar te oferecendo isso em uma bandeja muito diferente da que a que estava acostumado antes, mas eu ainda estou te oferecendo a chance de ser o homem que irá matar Voldemort.

 

Harry deixou aquilo assentar em suas entranhas. Deixou que seu estômago fosse revirado por entender a perspectiva dela. Doía. Simplesmente doía. A bandeja que ela oferecia era uma que não era oferecida só por ela. Draco e Hermione. Era como se eles fossem um agora. Era como se fossem o mesmo.

 

—       A bandeja que tem me oferecido tem me custado demais. – ele queria soar mais severo, mais desgostoso, mais angustiado. Mas ela estava perto e havia uma energia que emanava dela que o anestesiava. – Mas eu cheguei até aqui, não cheguei? Se me chamou aqui para sondar meu nível de comprometimento tudo que eu tenho para dizer é para não se preocupar. Eu me comprometi com todo esse seu jogo quando deixei que destruísse a Ordem. Sim, eu fui individualista e egoísta ao ponto de pensar apenas em mim. Em ter a chance de me livrar da profecia apenas. Você sabia que eu já estava farto de todos esses anos avançando para lugar nenhum. Mas eu pensei que estava comigo. Que a teria no final. Eu sacrifiquei todo o resto tendo a certeza de que apenas eu e você compartilharíamos e entenderíamos o final de tudo isso. Eu havia entendido para mim que só você era o suficiente. – soltou o ar sentindo-se patético. - Queria que pudesse entender a dor de saber que na verdade, o que eu vou ter será apenas eu mesmo, todas as decisões que tomei, aqueles que magoei e aqueles que matei.

 

Ela continuou aquele muro impenetrável em sua expressão. Mesmo depois de tudo que ele havia dito ela ainda continuava a olhá-lo como se não tivesse sido nem minimamente surpreendida. Aquele olhar frio ainda era parte da frieza que agora era parte dela.

 

—       Hum. – Ela soltou desinteressada. Ela sabia que o feria agindo daquela forma. Ela o conhecia mais do que ninguém. Hermione não era idiota. Sabia que ainda daquela forma o matava, ele queria entender porque ela continuava sem qualquer piedade sequer. Exatamente por isso ele queria saber que mulher era aquela parada ali a sua frente. – Imprevisível, não é? A vida. – disse. – Tudo que eu quero que saiba de mim é que estou do seu lado. Estou te ajudando a conquistar o que vai te libertar. A única diferença agora é que não estou te acariciando ou te sussurrando palavras reconfortantes no meio da noite. As coisas agora vão funcionar mais agressivamente do que antes porque a vida nos fez caminhar para esse lado. Eu não sou quem você costumava conhecer. Quem eu sou agora tem muito mais a perder do que antes. Eu dei a minha vida por você e pela sua causa o dia em que deixei que me capturassem no Ministério, Harry. Eu parei de viver por você aquele dia. Eu vivo por algo muito maior agora. Eu mesma.

 

Talvez ele precisava digerir com mais alegria e gratidão o fato dela já ter feito tudo que estava ao seu alcance por ele e que estava livre do fardo. Era isso que ela queria?

 

—       Soa bastante egoísta para alguém com filhos e marido agora. – ele queria provoca-la.

 

Ela soltou um riso fraco como se ele tivesse exposto um ponto muito crucial.

 

—       Talvez ainda não tenha entendido, mas quero que entenda. Minha família e eu somos um. Eles são eu mesma. Eu sou parte deles. Quando vivo por mim, vivo por eles. Eles são parte de mim. Quando se dirige a eles, dirige-se a mim. Quando dirigi-se a mim, dirigi-se a eles. Não existe nenhuma linha onde eu termino e eles começam. Não existe nada que me separa deles. – ela disse aquilo como se esperasse que ele já soubesse.

 

Ele engoliu em seco. Ele queria entender como Draco Malfoy ganhara aquela posição. Ele precisava de mais do que as palavras dela porque ainda não acreditava.

 

—       Acho que já se fez bastante clara.

 

Ela puxou o ar verificou a postura.

 

—       Ótimo. – concluiu ela satisfeita. – Seria bom que parasse de tentar me comunicar silenciosamente que lhe devo justificativas todas as vezes que acabamos cruzando olhares. Eu dei minha vida por você. Esse foi nosso ponto final. – passou por ele e seguiu seu caminho deixando Harry para trás. – Sei que pode encontrar o caminho de volta. – findou.

 

Ele não soube se queria gritar, chorar, correr, encolhe-se, lamentar, xingar. Tentou definir o que acontecia com ele enquanto escutava o barulho do salto dela contra o chão afastar-se.

 

—       Esse não foi o nosso ponto final, Hermione. – ele disse, mas quando deu as costas ela já havia desaparecido.



Draco Malfoy



Ele reconhecia aquele piso sob seus sapatos extremamente bem polidos. Era o piso do salão da Catedral. Por incrível que pareça, sentia-se em casa e aquilo trouxe a ele algum conforto. Ergueu os olhos para encarar o salão vazio. Havia recebido o título de general ali, havia declarado vitórias ali, havia matado e torturado ali, havia se casado ali, havia apresentado seus filhos ali e... exatamente ali, ele fora considerado traidor. Fora torturado.

 

 

 

Sabia que estava sonhando por que o salão principal da Catedral nunca fora tão claro e tão angelical. Ele nunca enxergara aquele salão além das pedras frias que o compunha. Queria destruir tudo aquilo, mas nunca realmente vira o peso do valor histórico que aquele lugar tinha em sua vida pessoal.

 

 

 

Ainda assim, queria destruí-lo.

 

 

 

Em seu sonho ele contemplou a possibilidade de estar pisando ali sem que ninguém estivesse tentando mata-lo ou tortura-lo. Era definitivamente um inimigo agora. Os anos de aliado haviam ficado para trás. Não que ele tivesse sequer sido realmente um aliado em algum momento de toda aquela jornada.

 

 

 

Foi como um segundo de distração até perceber que no fundo dos patamares do trono, Voldemort estava de pé acompanhando de um garoto. Uma criança. Draco pouco sabia sobre idades, apenas sabia que era uma criança. Uma criança que se parecia muito com ele. Não exatamente as feições, mas os cabelos extremamente loiros e os olhos intensamente cinzas. Eram traços Malfoy. Ele conhecia aquela criança.

 

 

 

“Scorpius...”

 

 

 

Voldemort sorriu e abaixou-se na altura do ouvido do garoto que olhava diretamente para ele, ali parado, no meio daquele salão.

 

 

 

“Conhece aquele homem?” Sussurrou Voldemort no ouvido da criança e em seu sonho Draco conseguiu escutar mesmo estando da distância em que estava.

 

 

 

“Não exatamente.” Respondeu Scorpius em sua voz infantil, mas ainda assim um pouco madura. “Mas sei que ele é meu pai.”

 

 

 

Não...

 

 

 

“E aquela mulher?” Voldemort apontou para uma das galerias superiores.

 

 

 

Hermione estava de pé ali. A postura firme e intacta, mas o rosto banhado em lágrimas silenciosas.

 

 

 

“Ela é minha mãe.” Ele respondeu mais uma vez. “Mas nunca falei com ela.”

 

 

 

“Scorpius!” Draco avançou. Aquele era seu filho!

 

 

 

O garoto recuou como se não entendesse porque um estranho estava indo até ele com tanta intenção e atitude. Draco sentiu as forças falharem ao encarar seu medo exposto ali. Era um estranho para seu filho. Ele não podia consolar sua mulher.

 

 

 

Parou.

 

 

 

Seu braço doía.

 

 

 

Por que parara?

 

 

 

Seu braço doía.

 

Seus olhos abriram-se quase que num susto. Seu coração batia forte. Sua cabeça doía. Seus olhos doíam. Seu braço doía. Estava deitado no sofá em frente a lareira da antessala de seu novo quarto. Ainda vestia sua roupa social. Seu sapato, a blusa com as mangas dobradas, a gravata no chão junto com mais um monte de pergaminhos, cartas e mapas. Sentou-se e encarou as cinzas na lareira. Ergueu os olhos e encarou seu quadro com Hermione. Soltou o ar e esfregou os olhos.

 

Seu braço doía.

 

Encarou a Marca Negra voltando a cortar a superfície de seu braço. Bufou soltando o ar. Livrou-se de alguns pergaminhos em seu colo e levantou-se.

 

Precisava de alguma fonte de energia.

 

Precisava saber que horas eram.

 

Entrou no quarto e viu Hermione sentada no nicho da janela principal. Ela vestia apenas as peças íntimas e seu robe. Não se dava mais o trabalho de colocar sua camisola. Tinha que trocar de roupa para atender algum chamado quase que a cada cinco minutos. Ela encarava a madrugada pela janela segurando em uma mão um espelho. Sabia que ela esperava a chance de poder ver o filho. Era deprimente. Ela apenas lançou um olhar cansado para ele e voltou a encarar a noite do lado de fora.

 

Ele foi até sua cabeceira. Abriu a primeira gaveta, puxou um frasco de poção e a tomou. Esperou para que a dor no braço passasse e a Marca Negra sumisse para largar o frasco vazio junto com outros acumulados ali.

 

—       Economize nas poções. – a voz de Hermione veio serena. – Estamos com o estoque baixo. Neville e Luna concordaram em ajudar com o processo de produção. – ela pausou por alguns segundos. - Molly Weasley tem insistido em ajudar com Hera. Queria te escutar primeiro sobre isso antes de dizer ‘sim’.

 

—       Não quero uma babá qualquer para Hera. Quero uma tutora. – sua voz saiu rouca, grave e cansada. - Alguém com formação e experiência. Algo que Molly Weasley não tem. Somos Malfoys, Hermione. Sabe como isso funciona. – disse aquilo embora soubesse muito bem que acabaria cedendo.

 

—       Hera mal tem um ano ainda, Draco. Confio em Molly Weasley. Ela está ferida, mas conheço o coração dela. E você sabe que precisamos de ajuda. É temporário. Tudo isso é temporário. – convenceu ela.

 

Ele soltou o ar cansado e passou os dedos pelos cabelos.

 

—       Eu confio no seu julgamento, Hermione. Faça o que achar melhor. – seguiu para outro lado do quarto onde derramou o restante do café frio de horas mais cedo em uma das porcelanas e bebeu. Estava horrível. Odiava café. Ainda mais quando estava frio. Amargo demais e nunca forte o suficiente. – O que é isso? – perguntou pegando um envelope fechado logo ao lado da bandeja.

 

—       Um dos elfos trouxe mais cedo. Mais um daqueles envelopes anônimos que pode ser de qualquer lugar do mundo. – ela respondeu.

 

Ele soltou o ar e largou o envelope.

 

—       Tenho ansiedade só de pensar em abrir. – disse e foi até Hermione. Encontrou um espaço para sentar-se de frente para ela logo ao seu lado. Encararam-se no escuro da madrugada em silêncio por alguns segundos.

 

Estavam exaustos. Ele conseguia ver os olhos fundos muito aparentes nela e ele sabia que os dele não estavam diferentes. A tristeza de não poder ver o filho parecia estar constantemente no brilho de seus olhos e a ansiedade junto com o receio e mais um milhão de sentimentos ruins ela só mostrava para ele quando sentia liberdade.

 

Hermione tocou seu rosto com sua mão macia e Draco sentiu-se instantaneamente confortado por ela. As vezes não conseguia entender como um gesto tão simples vindo dela tinha um poder tão grande de fazê-lo sentir-se completamente acolhido. Era como sentir o gosto de paz no meio do caos. Era em momentos como aquele que via-se dependente do efeito que ela lhe causava.

 

—       Teve um sonho ruim, não teve?

 

Ele quase pode rir ao escutar aquilo. Ela aprendera a conhece-lo bem. Draco gostava de ficar perto quase que silenciosamente pedindo por conforto quando não tinha paz nos sonhos ou quando tinha muito na cabeça para despejar.

 

Assentiu e inclinou-se sobre ela escondendo o rosto em seu pescoço. Hermione deixou o espelho de lado e enterrou os dedos em seu cabelo enquanto usava a outra mão para alisar suas costas muito calmamente. Ele permitiu-se ficar ali um bom minuto até finalmente depositar um beijo rápido sobre o belo pescoço de sua mulher e afastar-se um pouco.

 

—       Precisa ao menos tentar dormir um pouco que seja, Hermione. – ele murmurou para ela e estalou um beijo simples em sua boca quase que agradecendo por tê-lo envolvido com todo seu afeto. Ela sabia que aquilo era capaz de o curar de muita coisa.

 

Ela apenas assentiu. Ele se deu mais um tempo para convencer-se de que era melhor não insistir porque sabia que ela era incapaz de fechar os olhos em paz antes de se levantar e seguir para o lavatório oposto ao dela no quarto.

 

Inclinou-se sobre a pia e jogou contra o rosto água gelada. Ele precisava se livrar daquela aparência cinzenta e morta. Olhou-se no espelho logo depois de secar o rosto. Os olhos fundos. Vermelhos. Toda sua aparência parecia derrotada. Sentia-se mal. Sentia-se cansado. Sentia-se fraco. Sentia-se ansioso. Seu coração estava constantemente parecendo ser esmagado por um punho. Ele tinha medo.

 

Sua memória o transportou para os últimos anos de Hogwarts quase que imediatamente. Conseguia ver o medo estampado em seu rosto do mesmo modo como o enxergara anos atrás pelos espelhos dos banheiros de Hogwarts quando seu pai lhe dera a missão de subir dentro da cadeia alimentar de Voldemort.

 

Ele se lembrava muito bem da sensação de embrulho no estômago ao ser confrontado pela sua missão sendo o Draco patético que era aquela época. Fora um marco para ele. Não porque tinha que matar um bruxo como Dumbledore, mas porque sabia que seu pai finalmente decidira exigir dele a função de herdeiro Malfoy. E crescer estudando sobre sua família fora o suficiente para entender bem o que custava ser um Malfoy. O Draco mimado que era sabia que não estava pronto para ser o herdeiro daquele legado. O Draco mimado que era queria apenas continuar vivendo os benefícios da influência de carregar o sobrenome que tinha e nada mais.

 

Fora muito para sua pequena mente adolescente. Foi muito para sua mente adolescente ter que destruir um homem muito, mas muito, muito maior que ele. Foi muito para sua mente adolescente saber que dali para frente ele teria que caminhar ao lado de seu pai construindo o legado daquela geração. Foi muito para sua mente adolescente saber que aquele era o começo de uma de uma longa jornada com o pior bruxo das trevas já visto na história. Foi muito para a simples cabeça pequena de adolescente que, assim como a maioria, era incapaz de reconhecer além de seu próprio mundo pessoal. Mas foi ali, em sua adolescência, encarando o medo estampado no rosto sempre que se encarava no espelho, que aprendeu a acreditar em si mesmo, que aprendera a importância de não se permitir duvidar do sucesso. Foi ali que decidiu que tipo de homem iria ser para jogar aquele jogo que ele não tivera escolha de aceitar ou recusar.

 

Matara Dumbledore. Um adolescente ainda não formado, mimado que era e assustado demais, fora capaz de matar Dumbledore. Um dos maiores, mais nobres e mais inteligentes magos de sua geração. O dia em que fez aquele homem cair morto fora o dia em que ele deixara de ver o medo estampado em seu rosto. Agora Draco apenas se perguntava o que havia feito para que estivesse o encarando novamente no espelho estampado horrivelmente em seu rosto. Depois que havia se tornado o homem que era, ele não imaginava que alguma vez fosse ver novamente aquele medo ali.

 

Largou a toalha na pia após secar a mão. Continuou encarando-se. Não havia mensagem mais clara naquele momento para ele de que seria um homem diferente quando tudo aquilo passasse. Mas do mesmo modo que em Hogwarts fora capaz de enxergar seu estado de transição, ele precisava diagnosticar o momento que se encontrava agora.

 

Não precisou pensar por mais de um minuto para ver o porque o medo estava ali novamente. A verdade, é que ele sempre soube o porque o medo estava ali, mas ele nunca tomara uma atitude a respeito dele. Mais uma vez ele se via confrontado e mais uma vez ele se perguntava: Vai ser um Malfoy, ou não? É melhor que esteja pronto para ser um!

 

Deu as costas e voltou para o quarto. Hermione continuava onde estava encarando o jardim escuro da frente de casa. Ele se aproximou e sentou-se novamente ao lado dela. O estado deles eram deplorável. Era vergonhoso que fossem quem eram e estivessem se permitindo estarem vivendo como zumbis.

 

Descansou os cotovelos sobre os joelhos e encarou suas mãos quando elas se uniam. Hermione discretamente colocou a mão sobre sua perna e continuou a encarar o jardim do lado de fora como se apenas quisesse que estivessem conectados de alguma forma já que estavam perto um do outro. Draco ainda deixou que o silêncio tivesse mais alguns segundos de reinado.

 

—       Eu não gosto da palavra “esperança”. – ele quebrou o silêncio.

 

Hermione voltou seu olhar para ele por alguns segundos como se estivesse tentando captar algo nele que acaso poderia ter passado despercebido. Voltou novamente seu olhar para a paisagem do lado de fora quando concluiu que não havia perdido nenhum sinal.

 

—       Eu sei que não. – ela simplesmente disse.

 

Ele sabia que ela sabia que não.

 

—       Sei que me conhece. Acha que pode verbalizar o porque não gosto dessa palavra? – introduziu a atividade.

 

Ela suspirou soltando o ar com calma como se estivesse se preparando para entrar no diálogo que ele queria abrir. Hermione sabia que ele estava querendo chegar em algum lugar abordando aquela metodologia.

 

—       Esperança está no campo da incerteza. Você odeia incertezas. – ela foi curta e objetiva.

 

—       Nós estamos vivendo na esperança de conseguir passar por cima de tudo isso, Hermione.

 

Ela tornou a encará-lo.

 

—       Eu sei que não está contente com a situação em que estamos, Draco. Onde quer chegar?

 

—       Quero chegar no ponto onde percebemos que estamos nos permitindo ser fracos.

 

—       Eu não sou fraca. – ela quase cuspiu aquilo. Hermione odiava ser chamada de fraca. Muito provavelmente porque ela também reconhecia bem que nenhuma outra mulher era tão forte quanto ela.

 

—       Eu não estou falando que é. Estou falando que estamos nos permitindo ser. Olhe para você, Hermione! Posso quase sentir o medo na sua ansiedade de longe. Eu mal posso fechar os olhos sem ter um sonho ruim.

 

—       Voldemort tem Scorpius, Draco.

 

—       Esse é o ponto. Nós somos Malfoys. Nós deveríamos dominar o medo. Nós trabalhamos com o medo, não o medo conosco.

 

—       Sim. – ela não se sentiu tocada. – Esse é o discurso.

 

—       E quando foi que paramos de viver o discurso?

 

—       Nós nunca paramos de viver o discurso. O mundo inteiro nos vê de pé.

 

—       Do que adianta estarmos de pé para o mundo se para nós mesmos estamos quebrados? Nós paramos de viver o discurso para nós mesmos, Hermione. O que o mundo vê é o que mostramos para ele, mas eu e você somos a raiz de tudo que construímos, de tudo que mostramos, de tudo que vivemos e nós estamos nos permitindo viver o medo na esperança de que o nosso trabalho produza resultados positivos.  – ele a encarou. Será que ela conseguia enxergar? – Em que ponto deixamos que as coisas se invertessem? Eu ainda me lembro de como passávamos a noite fazendo amor e pensando juntos em como moveríamos nossos pauzinhos no dia seguinte para termos exatamente o que queríamos. Nós tínhamos tudo em nossas mãos. Nós estávamos acima de tudo. Quando foi que perdemos isso? Quando foi que deixamos de ser Malfoys?

 

—       Quando o poder deixou de ser sua motivação. – ela respondeu como se já tivesse chegado aquela conclusão fazia muito tempo. Eles se encararam em silêncio e Draco percebeu que ela tinha uma resposta para tudo aquilo que guardava para si mesma fazia um longo tempo. Uma resposta que ele também poderia ter tido a capacidade de captar mas optara por manter longe de seu conhecimento em seu inconsciente. – Não me diga que não percebeu que tudo mudou quando Scorpius e Hera nasceram, Draco. –Sim, muito havia mudado desde que os filhos haviam nascido. Tanto que muito ele nem tivera energia de nomear. Deixou que Hermione revelasse para ele um chão que não percebia estar pisando. – O dia em que eles nasceram nós começamos a viver uma família. Nós começamos a nos entrelaçar de uma forma completamente diferente. Se conseguir buscar em sua lembrança um dia comum em nossa casa, onde simplesmente passávamos o tempo depois do jantar no seu escritório com as crianças no tapete da lareira apreciando o tempo de apenas estarmos juntos e não for capaz de me dizer que experimentou algo mais forte do que sua própria ambição, eu desisto de acreditar em nós.

 

Ele processou o que ela disse e sentiu como se estivesse caindo em si. Não com relação a sua família, mas com relação a sua motivação. O homem que havia construído depois do assassinato de Dumbledore havia sido um homem de poder e ambição. O homem que ele era depois de Hermione, depois de seus filhos, não era o mesmo. Ele havia mudado. E sim, ele percebera que havia mudado, mas nunca havia reconhecido. Desviou o olhar.

 

Hermione, Scorpius e Hera haviam tomado uma prioridade para ele que ficava a frente de qualquer outra. Ele sempre conseguira enxergar aquilo, mas compará-lo com o poder que sempre almejou o fazia perceber algo que não percebera antes. Lutar por poder, influência, legado, havia se tornado uma parte muito pequena do que o fizera chegar até ali.

 

—       Nos salvar nunca deveria ter se tornado minha motivação. – disse.

 

—       Somos Malfoys. Não precisamos de salvação. Somos salvação. – ela disse o discurso com banalidade como se tivesse citando uma das leis do livro da família. Ele tornou a encará-la. – Eu deixei que você deixasse que tudo isso fosse sobre nós. Sobre Scorpius e Hera. Sobre eu e você. Eu deixei que você deixasse que essa luta fosse por nós. Mesmo sabendo que isso nos levaria a destruição, eu não queria roubar de você a poesia de viver o que nos une, Draco. Eu sei que você nunca viveu uma família além do que a que o fardo de seu sobrenome lhe deu. Eu estava apaixonada por ser parte do que te fazia enxergar além da ambição que foi construída dentro de você desde que nasceu. E honestamente, Draco, sabe que a racionalidade nunca dominou o que nos uniu, então não me julgue por ter nos deixado viver nosso ponto fraco com tanta intensidade sem fazer qualquer questionamento. – Ela desencostou-se da parede e o cercou descansando a cabeça em seu ombro. – Mas somos Malfoys. Sempre haverá esse elemento além de nós mesmos. Sempre haverá esse elemento maior do que nós.

 

Ele sentiu-se apunhalado no estômago. Deus. Ele entendia agora. Entendia tudo agora. Era incapaz de se mover ou ter qualquer reação enquanto sentia um véu ser tirado de seus olhos. Todo esse tempo ele reconhecera que sua família era seu ponto fraco e nunca enxergara que ele simplesmente não poderia permitir que eles fossem. Não era uma questão de escolha. Era uma questão de sobrevivência. Ele era um Malfoy! Nenhum Malfoy podia ser estúpido o suficiente para se deixar ter um ponto fraco. O que não faltaria no mundo seria alguém tentando destruí-los de alguma forma.

 

Ele entendia seu pai agora.

 

Ele entendia o porque Lúcio Malfoy era Lúcio Malfoy. Ele entendia o porque sua mãe era incapaz de abandoná-lo. Ele entendia o porque sua família era o que era. Tudo fazia perfeito sentido agora e aquilo lhe provocava uma angústia que parecia querer esmaga-lo. Lúcio Malfoy havia feito a escolha de ser um herdeiro exemplar, de cuidar do legado da família, de fazer com que continuassem intocáveis e inalcançáveis. Ele fizera a escolha de não ter um ponto fraco, de não permitir que o afeto de uma família tivesse o mínimo poder de roubar a prioridade que lhe havia sido confiada com o sangue que tinha. Era mais fácil escolher o sobrenome Malfoy e tudo que vinha com ele enquanto se esforçasse para que sua casa nunca fosse um lar. Talvez por isso bebesse tanto, talvez por isso permitira que tanto fosse feito de Draco e Narcisa, talvez por isso exagerasse tanto com mulheres. Talvez para ele não fosse tão fácil ignorar o afeto de uma mulher como Narcisa ao qual ele dizia amar tanto, mas rejeitar tanto. Talvez para ele não fosse tão fácil assim manipula e colocar tanto em jogo a vida de Draco, do próprio filho. Talvez para ele não fosse tão fácil ter que negar a própria família, mas talvez ainda valesse a pena se isso tornasse mais fácil sua obrigação de ter que cuidar do sobrenome Malfoy.

 

—       Eu não posso escolher nada que não seja nós. – ele mal escutou sua própria voz. Sua boca estava seca.

 

Hermione suspirou.

 

—       Vai estar nos escolhendo de qualquer maneira, Draco. Viver pelo sobrenome Malfoy não significa nos sacrificar, significa nos proteger.

 

Sabia disso. Mas tinha que haver outra maneira. Precisava que houvesse.

 

—       Você tem alguma ideia do que isso irá custar Scorpius? Tem alguma ideia do que isso pode nos custar? Nos custar como família, Hermione!

 

Ela suspirou.

 

—       Sim. – escutou algum tipo de dor vir com aquela simples declaração. Ficaram em silêncio. Como se precisassem de tempo para lamentar algo que não era bem uma escolha. – O que vamos ser daqui dez anos é parte do futuro, Draco. O que vamos ser um para o outro pode até ser duvidável, mas sermos fortes, intocáveis, indestrutíveis e poderosos como Malfoys deve ser absolutamente inquestionável.

 

Céus. Que mulher era aquela? Havia mais nela daquela família do que ele esperava que houvesse. Talvez ela tivesse crescido aquilo em silêncio dentro dela durante o tempo em que vivia uma realidade que confrontava com tudo o que dizia. A realidade da família que tinham e que eram. Eram completamente rendidos um ao outro.

 

—       Vamos machucar muito Scorpius. – exatamente como seu pai o machucara e sua mãe fora complacente.

 

—       Nós o queremos de volta, não é mesmo? Nós queremos que ele volte para uma família que ainda está de pé. Quantos sacrifícios fizemos para chegar até aqui?

 

—       Então está disposta a ser complacente? – aquilo o feria. Não deveria, mas o feria.

 

Ela ergueu a cabeça para encará-lo. Seus olhos estavam molhados. Encararam-se.

 

—       Eu não estou disposta a nada. Ele é meu filho e essa é a nossa família. Mas acaso tenho alguma escolha? Acaso você tem escolha? Eu queria bem simplesmente poder virar o lado Malfoy da moeda para baixo e viver apenas o que eu, você e nossos filhos somos para nós mesmos e um para o outro. Mas essa não é a nossa realidade. Foi bonito fazer com que fosse pelo tempo que durou. Foi perigoso. Foi um descuido. E aqui estamos agora. Vivendo o medo como resultado.

 

—       Temos que desvirar a moeda então. – concluiu ele.

 

Ela assentiu.

 

Silêncio.

 

Angústia.

 

—       Acha que está pronta? – seria o mais difícil de tudo que eles já haviam feito juntos.

 

Ela puxou o ar.

 

—       Pela manhã. – determinou ela. – Eu ainda preciso de tempo para me permitir sofrer pelo meu filho. – justificou.

 

Foi a vez dele assentiu. Inclinou-se e estalou um beijo rápido nos lábios dela. Ele também precisava de tempo parar sofrer pelo que poderia ser dele e da mulher com tudo aquilo.

 

Não teria mais espaço para medo pela manhã.

 

**

 

Subiu o zíper do vestido de sua mulher avaliando cada centímetro da pele maravilhosa que fora lhe dada. Qualquer um poderia dizer que ele fazia aquilo casualmente, mas só ele sempre saberia o quanto seu olhar era incapaz de não admirar qualquer pedaço que fosse do corpo de sua mulher. Sua.

 

O zíper era curto. O vestido mal tampava as costas dela e Hermione tentou avançar para seguir seu caminho quando ele terminou de ajuda-la com a roupa, mas Draco a segurou pelo pulso e a fez virar-se para ele calmamente. Deu um passo para longe dela para poder avalia-la por inteiro enquanto segurava sua mão no alto.

 

—       Você não se veste assim faz tempo. – ele comentou ao vê-la maravilhosamente imponente com aquele longo vermelho sangue, o decote bem acentuado por mais comportado que fosse, as costas quase inteira a mostra, o corpo bem desenhado embora o tecido fosse solto, os braços e o peito bem a mostra com a alça fina e uma fenda generosa.

 

—       Temos uma agenda diferente com a mídia agora. – ela respondeu. – Eu não preciso convencer ninguém de que preciso de pena. Preciso convencê-los de que tenho poder o suficiente para confrontar Voldemort sem medo agora.

 

Ele assentiu e a puxou calmamente para ele.

 

—       Você me parece com bastante poder usando esse vestido. – ele passou o braço por sua cintura. Hermione rolou os olhos sem muita paciência e ele apenas tocou seu rosto aproximando o dele do dela com muita vontade de sentir o calor da respiração dela bater contra ele.

 

—       Você sabe que não preciso de um vestido. – ela murmurou naquela voz profunda que mexia com as entranhas dele.

 

—       Sei bem. – Com sabia!

 

Tocou sua boca na dela sentindo o macio dos lábios dela se moldarem aos seus. Quase como uma dança ensaiada ele usou os seus para brincar pacientemente com os dela, tomando tempo para apreciar cada movimento, a sensação que o acompanhava e como Hermione se envolvia e se entregava. Ela deixou que ele abrisse espaço para sua boca e apertou o corpo dela contra o dele quando sentiu o calor dela invadi-lo. Bebeu do sabor de Hermione com saudade. Sua mulher não tinha uma gota de tédio que fosse. Era como beber um concentrado de energia sempre que a provava.

 

Quando afastou-se por obrigação, não querendo deixar que os lábios dela escapassem por entre os seus, viu ela abrir os olhos com muita calma, como se estivesse levando tempo para descer do céu de volta para terra. O rosto dela estava relaxado. Em sua boca havia uma linha muito tênue de um sorriso. Seus olhos se encararam de muito perto trocando o prazer daquele momento.

 

—       Gosto quando me beija assim. – ela sussurrou ainda parecendo tentar encontrar a voz.

 

Ele sorriu pacientemente.

 

—       Assim como quando quero leva-la para cama? – murmurou ele.

 

Ela suspirou e assentiu.

 

—       Sim. – respondeu.

 

—       Bem. Então quem sabe da próxima vez... – sugeriu ele encurtando ainda mais o espaço entre seus rostos.

 

Ela soltou o ar sorrindo. Fechou os olhos para sentir o prazer da proximidade.

 

—       Não faça isso comigo, Draco. – sabia do efeito que ele causava nela. Ela só não sabia que ele só conseguia lhe causar aquele efeito por causa do que ela causava nele. - Não quando sabe que não temos tempo para nós mesmos. – ela lamentou.

 

Ele soltou o ar sem ter muito mais o que lamentar além dela. Estalou um beijo simples em seus lábios querendo que ele durasse por muito mais tempo do que um beijo simples duraria e afastou-se. Ela soluçou entre a respiração como se não quisesse que ele fosse, como se a separação fosse precoce demais, cedo demais, rápida demais. Mas então quase que relutante deslizou os braços para longe dele e puxou o ar de volta para o pulmão.

 

Eles se encararam por um segundo muito rápido, como se quisessem afirmar um ao outro de que tudo estava bem, de que lamentavam, mas faziam o que tinha que ser feito. Hermione respirou fundo e passou por ele, tocando seu braço no caminho partindo de volta para o closet.

 

Draco precisou apenas de mais alguns segundos antes de voltar a se dedicar a abotoadura das mangas de sua camisa. Como que ele viveria assim com ela? Por quanto tempo? Soltou o ar cansado deixando que aquilo roubasse seu humor. Humor que ele só ganhara por aquele breve minuto que compartilhara com sua mulher.

 

Ficou pronto primeiro do que ela. Como sempre. Quase sempre. Esperou na antessala do quarto enquanto lia uma carta sobre reforços sendo enviados da África. Ainda relutava com o número de suporte que recebia vindo de tantos lugares. Ele precisava usar um pente fino antes de receber tanta gente dentro de sua casa. Ainda haviam muita lealdade a Voldemort espalhada por aí.

 

—       Pronto? – Hermione fez-se ser notada ao aparecer em toda sua glória.

 

Ele assentiu e elogiou sua beleza enquanto se levantava da poltrona onde havia se acomodado. Ela agradeceu a cordialidade tão casualmente quanto ele.

 

—       Fox primeiro. – ele informou. Ela assentiu.

 

Ele seguiram para fora do quarto. Encontraram Tina, Molly Weasley e Hera ao descerem do mezanino da torre que ocupavam. Draco logo tratou de dispensar Tina pedindo para que ela preparasse os homens no último salão da saída de sua ala. A mulher partiu rápido sob seu salto.

 

Hera dava pulinhos de excitação ao ver a mãe e o pai no colo de Molly Weasley. Estendeu os bracinhos esperançosa quando Hermione se aproximou. Ele já sabia que aquilo seria difícil. Hermione era extremamente protetora com Scorpius e Hera e sempre estivera pronta para parar o que fosse, para sacrificar o que fosse para atende-los.

 

—       Ela dorme depois do almoço. – começou Hermione. Draco conseguia sentiu a tensão da mulher. Conseguia sentir o esforço que ela fazia para se manter em sua postura, casual, fria, neutra.

 

—       Não mais do que duas horas. – completou Draco segurando a mãozinha de Hera que se fechou em seu dedo com muita força.

 

—       Sim. – Hermione concordou. – Ela pode dar trabalho de noite se deixa-la dormir muito.

 

—       Os elfos da cozinha conhecem o cardápio dela. – Draco informou.

 

—       Vegetais primeiro. Frutas por último. – Hermione.

 

—       Ervilhas são suas favoritas. – Draco.

 

—       Ela se alimenta sozinha, mas insista com os vegetais.

 

—       Não a coloque para dormir mais tarde do que sete da noite.

 

—       Ela pode te fazer acreditar que é comportada para tentar se aventurar quando achar que você está distraída, portanto fique de olho. Ela gosta de perigo. – reforçou, Hermione.

 

—       Tryn pode te ajudar com qualquer pergunta que tiver. – concluiu Draco.

 

Calaram-se. A mãe Weasley apenas assentiu com toda a informação. Draco sabia que ela tinha tido uns cinquenta filhos, mas nenhum deles era Hera.

 

—       Ela vai ficar bem. – Foi tudo que Molly Weasley disse.

 

Hermione assentiu agradecendo. Hera já estava frustrada por estar sendo contida em suas tentativas de se jogar para a mãe. Hermione a encarou tentando não mostrar nenhuma angustia e apenas aproximou-se da filha, segurou seu rostinho e tentou dar um abraço na filha sem tirá-la do colo da Weasley. Sussurrou para filha que a amava.

 

Hera agarrou-se a ela com todas as forças que tinha e tentou passar para o colo da mãe. Molly Weasley a deteve e eventualmente Hermione segurou seus bracinhos e vencendo a força dela, afastou-a de volta para Molly. Foi naquele momento que Hera percebeu que não iria com os pais. Seus olhinhos abriram-se num segundo de incredulidade. Foi naquele segundo que ela os acusou de abandono. O coração de Draco despedaçou-se por inteiro e então ela abriu a boca para chorar como se o mundo estivesse se desfazendo por completo ao seu redor.

 

Ele teve que fazer esforço para soltar seu dedo da mão dela. O ato fez com que ela chorasse ainda mais alto e com ainda mais dor. Molly disse mais uma vez que ela ficaria bem. Draco sentiu a tensão de Hermione. Tocou a coluna da mulher tentando lembra-la de manter-se focada. Foi então que os dois deram as costas para a filha para seguirem seu caminho.

 

Cada passo fazia com que aquela força esmagadora matasse mais seu coração. Cada passo onde o choro doloroso de Hera ficava mais distante e ele não fazia nada além de se afastar. Escutava o salto de Hermione o acompanhando. Cada vez segundo que passava aquele som se tornava mais sua companhia. Não havia nenhum sinal de hesitação em seu passo, mas sabia que ela estava morrendo por dentro.

 

Parou quando não escutou mais o som de seu salto contra o chão. O choro de Hera ainda chegava até eles muito, muito distante, fazendo com que aquela força ainda pressionasse seu peito numa angústia quase difícil de suportar. Ele encarou Hermione. Ela tinha as mãos sobre o estômago, como se a dor de ter que dar as costas a filha estivesse consumindo suas entranhas.

 

Isso está errado! Foi o que ele entendeu do olhar dela quando encontrou-se com o dele.

 

—       Não, Hermione. – ele não queria soar severo, mas seu tom seco teve que servir de alguma advertência. – Isso é só uma pequena parte do começo. Não seja fraca agora.

 

Os olhos dela quase ficaram vermelhos quando os estreitou com raiva.

 

—       Eu não sou fraca. – cuspiu ela.

 

—       Então não seja. – eles se encararam. O choro de Hera parou de chegar até eles. – Preciso de você, Hermione.

 

Ela puxou o ar. Confiava no bom julgamento dela. Não havia uma parte dela que cederia quando sabia a importância do que estavam fazendo. Ela passou por ele fazendo seu salto voltar a entrar em conflito com o chão. Draco a seguiu.

 

Foram até quase o final de sua ala privada até o salão de entrada. Devon e Mason estavam lá com um enorme mapa aberto sobre o chão marcado de vermelho em várias áreas. Um casal da equipe de Hermione discutia sobre uma linha qualquer de um enorme pergaminho que se desenrolava até o chão. Fox não demorou  para se juntar a eles. Longbottom o acompanhava.

 

Draco simplesmente odiava a forma como Fox olhava para sua mulher sempre que ela estava por perto. Sabia que ele era louco para experimentá-la. Não que ele fosse apaixonado por ela, mas conseguia ver a sede que ele tinha para pelo menos tomar uma gota dela. Hermione era completamente alheia ao interesse. Na verdade, sabia que ela se fazia alheia porque não duvidava da capacidade observadora dela.

 

—       Encontramos um ponto cego em Londres. – Fox proferiu tentando evitar colocar o olhar em Hermione. Draco sabia bem que ele não conseguiria esconder o fascínio por vê-la tão bem apresentada. Maldito bastardo! Draco podia odiá-lo se não tivesse tanta certeza de sua lealdade. – Podemos usar o local para passar um pente fino em todo suporte que temos recebido antes de trazê-los para cá.

 

Ótimo. Pensou Draco.

 

—       Coloque Denna para cuidar disso. – respondeu Draco.

 

—       Passarei a ordem. – Fox concluiu.

 

—       Bem. – Mason abriu a boca dirigindo-se a Longbottom. – Você sabe porque está aqui.

 

Neville Longbottom passou os olhos por cada um ali parecendo um tanto intimidado. Hesitante ele apenas limpou a garganta, tomou a frente e começou:

 

—       O arco do véu é um artefato muito enigmático para poder ser explicado. Logo que colocamos as mãos nele, nosso primeiro instinto foi traduzir as runas encravadas nas laterais. Elas nos desvendaram feitiços perdidos e talvez nem mesmo conhecidos. Assim que começamos a testá-los a resposta dos Dementadores foi imediata. Vocês conhecem bem como essas criaturas são. Eles são extremamente sensíveis a variação de poder e no momento que começamos a expelir feitiços tirados do arco do véu de nossas varinhas, eles foram quase que naturalmente atraídos. Eles sabiam que tínhamos em nossas mãos um poder maior que o de Voldemort. Remo e Tonks tinham essa visão de conseguir unir toda a ordem novamente agora que tudo parecia tudo tão promissor com o véu em nossas mãos. Os Dementadores apenas nos seguiram sentindo que o poder estava do nosso lado. Foi quando lideramos o último escape de Azkaban. Quando fizemos os Dementadores abandonarem seus postos e darem as costas a Voldemort. Mas então Remo Lupin morreu e ele era o único que realmente sabia decifrar o comportamento das criaturas e fazer algum tipo de contato com eles. Nós não conseguíamos ter domínio completo do poder que tirávamos do véu e nem sabíamos como usá-los. Então Harry começou a ficar paranoico com a ideia de termos Dementadores como aliados e eventualmente as criaturas nos deram as costas ao perceber que embora tivéssemos posse do véu, não sabíamos realmente usá-lo. Na verdade eu acredito que Harry encontrou uma forma de comunica-los que porque Remo estava morto e porque não sabíamos dominar o véu, a promissora visão que de uma Ordem unida com a posse de todo aquele poder era somente mais uma visão que não iria para frente. Eu nunca soube o porque Harry ficou tão paranoico em querer que os Dementadores nos abandonassem.

 

Draco sabia o porque. Lembrava-se bem da ameaça que fizera a Potter para ter os Dementadores de volta a Brampton Fort.

 

—       Então você acredita que atraiu os Dementadores pelo instinto natural das criaturas de se aliar a quem tem o maior potencial de domínio? – perguntou a mulher da equipe de Hermione.

 

—       Exatamente. – respondeu Neville.

 

—       Então como justifica o fato deles não terem voltado a dar as costas a Voldemort quando começaram a ter mais domínio sobre a magia do véu? – Devon questionou.

 

—       Essas criaturas tem instinto. Eles sabiam que éramos uma bagunça. Que não tínhamos estrutura. A Ordem era só um grupo de rebeldes tentando ir contra todo o imperialismo de Voldemort. Veja bem, Dementadores tem estado do lado do Ministério da Magia por anos. Eles sabem o quanto estrutura é fundamental para manter um poder estável independente de qual grupo tem mais força ou não.

 

Mason pareceu bastante satisfeito.

 

—       Então não vai ser nenhum problema trazê-los para o nosso lado. Temos algo muito mais promissor do que a Ordem quando colocou as mãos no véu.

 

—       Voldemort tem o Ministério da Magia. Não existe nada mais bem estruturado e consolidado do que o Ministério da Magia. – Devon disse.

 

—       Não. – manifestou-se Hermione. – Nós temos o Ministério da Magia. – nem todos pareciam estar se lembrando de que Isaac Bennett era Primeiro Ministro.

 

—       Por que eles não estão vindo até nós, então? Eles são sensíveis a mudança de poder. – colocou Mason.

 

—       Precisamos captar a atenção deles. – Concluiu Draco. – Quando a Ordem usou o véu eles foram alertados para o fato de que o artefato não estava mais no poder do Ministério da Magia e consequentemente no poder de Voldemort. Precisam ser alertados de que o véu está conosco agora. – sabia exatamente o que fazer. – Quantas magias concretas tiradas das runas do arco somos capazes de reproduzir? – perguntou ao casal da equipe de Hermione.

 

—       Temos uma lista grande aqui, senhor. – respondeu um deles apontando para o pergaminho longo que tinha em mãos.

 

—       Perfeito. – Draco desviou o olhar para a mulher de vermelho. – Hermione. – apenas disse seu nome avisando que daria espaço a ela porque sabia bem que o cérebro de sua mulher já tinha uma execução ideal para o resultado que estavam esperando.

 

—       Espalhem homens por todo o país. Pontos estratégicos como os que estão circulados aqui no mapa. Faça com que executem a magia mais simples e mais discreta da lista que temos aqui, todos juntos, no mesmo horário. Perfeitos e em sincronia. A mensagem será direta e discreta. Vai captar a atenção deles e eles saberão onde nos encontrar por instinto. – findou Hermione.

 

—       Fox. – direcionou Draco. – Prepare seu grupo. Escutou minha mulher. Sabe o que fazer. Quero Brampton Fort livre de Dementadores logo pela manhã. Devon, quero que esteja comigo quando Theodoro tentar contato portanto não vá para nenhum lugar onde não possa ser encontrado pelos próximos dois dias.

 

—       Senhor... – Fox manifestou-se incerto. Draco voltou sua atenção para ele. – Eu sei que não é meu lugar, mas Brampton Fort é completamente insegura sem Dementadores.

 

—       Esse é o ponto. – Draco não entendeu onde ele queria chegar.

 

—       É uma ação bem grande. Voldemort vai saber que veio diretamente daqui.

 

—       Onde quer chegar? – Draco o apressou.

 

Fox hesitou.

 

—       Ele tem seu filho, senhor. E sua mãe.

 

Silêncio.

 

Os olhares se cruzaram entre eles até Draco senti-los pararem apreensivos sobre ele e Hermione.

 

—       O que acha que nós somos, Fox? – Hermione manifestou-se. – Não somos um grupo de rebeldes tentando acabar com o império. Nós somos o império.

 

Draco puxou o ar sentindo a energia de Hermione alimentá-lo. Não havia outra mulher mais forte do que a sua. O risco era grande e mesmo assim ela estava pisando no próprio medo. Estava escolhendo o sobrenome.

 

—       Voldemort pensa que pode passar por cima da supremacia que minha família mantém por séculos. Ele não é nem nunca foi mais poderoso do que legado que carregamos. Nós o colocamos onde ele está. Voldemort não tem meu filho ou minha mãe. Nós temos Voldemort e porque ele é inteligente o suficiente para saber disso, não irá ousar usá-los contra mim. – Foi claro não somente para Fox, mas para quem estivesse ali o ouvindo. - O que nos separa de todo o resto é que não permito que ninguém trabalhe com os meus medos. Eles não tem o poder de me parar. – ninguém ousou contestar. – Fui claro com as ordens? – uma onda de ‘sim, senhor’ passou pela boca de todos. – Perfeito. Movam-se. – foi tudo o que precisou dizer para que eles se dispersassem, cada um para uma saída diferente. – Mason. – chamou a atenção do moreno antes que ele fosse embora. O homem parou e Draco aproximou-se dele. – Quero que treine Potter.

 

Mason mostrou-se quase que imediatamente insatisfeito.

 

—       Senhor, eu não acredito que Potter queira ser treinado.

 

—       Potter é minha arma, Mason. Quero ter a certeza de que ele vai estar devidamente equipado e capacitado para exercer o único papel que tem no meio de tudo o que estamos fazendo aqui. Estou otimizando minhas porcentagens.

 

O homem assentiu não muito disposto a ter que lidar com Potter, mas proferiu o seu ‘sim, senhor’ e seguiu seu caminho. Draco se viu sozinho com Hermione mais uma vez. Ela parecia analisar o mapa no chão, mas ele sabia que a cabeça dela estava em outro lugar.

 

Não queria apressá-la embora eles tivessem que seguir para o salão central. Ela estava lutando para não lamentar, para não sofrer, para não hesitar, para não chorar, para não voltar a trás. Ele também lutava, mas não queria se permitir ter espaços como aquele onde o silêncio procurava a chance de gritar a culpa entre eles. Hermione ergueu o olhar e eles se encararam em silêncio por alguns segundos. Ela estava fria. Vazia. Combinava com o vestido que usava, com a maquiagem nos olhos, com o salto nos pés.

 

—       Ele vai ficar furioso. – ela disse. - Ele sabe que Theodoro não tem a menor capacidade de trazer os Dementadores de volta como você fez logo depois do nosso casamento.

 

—       Esse é o ponto.

 

—       Ele vai ficar furioso, Draco. – ela pontuou novamente.

 

Draco soube que ela estava comunicando a ele que estava remoendo aquilo. Que estava remoendo o que aquilo significaria.

 

—       Scorpius vai ficar bem, Hermi...

 

—       Não ouse! – ela o cortou severamente. Por um momento muito rápido ele sentiu a voz dela fraquejar. – Nem ouse, Draco! – ela estava com raiva e estava deixando transparecer. - Você sabe que ele não vai! – Ela soltou o ar quase que irritada. Fechou os olhos percebendo o que ela mesmo estava permitindo ser dominada. Precisou de alguns segundos para regular a própria respiração e só tornou a olhá-lo quando estava vazia novamente. – Meus medos ainda estão tentando me parar.

 

—       Não pense que os meus não estão. – eles não deveriam estar conversando sobre aquilo.  – Não pense que eles nunca vão parar de tentar. – Ela assentiu. Vazia. Ele conhecia aquela Hermione. Ela guardava dor. Quieta e silenciosa. Guardava para ela mesma. Guardava e não mostrava para ninguém. Ele não tinha muito o que fazer por ela. Queria ter. Mas o risco seria muito maior. Puxou o ar. – Pronta?

 

Ela assentiu. Eles seguiram. Seguiram do fim da ala privada até o salão central. Era enorme. Logo atrás da escada principal do saguão de entrada. Não era nada como o salão principal de Hogwarts ou como o salão da Catedral, mas definitivamente atendia o padrão de sua casa. O local estava cheio. Vestidos caros por toda parte, aperitivos, bebidas, conversas muito sugestivas sobre tudo o que estava acontecendo. Aqueles eram seus aliados. Seus protegidos. Voldemort tinha os dele. Draco também precisava dos seus.

 

O evento era para a mídia. A mídia que ele tanto manipulava a seu favor. O evento era para o número de pessoas que alcançariam aquele acontecimento no dia seguinte. Era para trazer a lembrança da esperança do antigo mundo que as pessoas escondiam devido o regime do medo de Voldemort e direcioná-las para a família Malfoy. Aquele evento era para a história.

 

Seguiu com Hermione pela galeria superior recebendo cada vez mais a atenção daqueles que percebiam a chegada dos dois ao ponto de sequer precisarem fazer qualquer interferência maior para terem toda a atenção voltada para eles. Pararam ali mesmo, na galeria superior, a poucos metros da escada que descia para o salão não muito abaixo deles. Hermione parou e ficou ao seu lado, diferentemente do que teria feito em Brampton Fort  onde era obrigada a ficar em segundo plano sempre que o marido proferia qualquer depoimento oficial.

 

Os canais de mídia estavam prontos para receber o discurso para qual toda aquela opulência havia sido posta. Não eram muitos, apenas aqueles que ele confiava e que sabia que levaria levariam para as primeira páginas exatamente o que Draco queria que fosse levado. Estava disposto, juntamente com Isaac Bennett, a tornar o Profeta Diário uma circulação livre, sem interferência de Voldemort.

 

Encarou o povo que esperava para finalmente ouvir o que Draco Malfoy tinha a dizer publicamente sobre tudo que estava acontecendo. Talvez eles estivessem esperando uma enorme pauta cheia de justificativas, mas o que Draco tinha em mente era algo completamente simples, rápido e informal. Precisava mostrar que era alguém livre do constante olhar opressivo de Voldemort. Não carregava nenhum tipo de discurso pronto em uma pasta com o símbolo da Catedral visivelmente cravado na capa. Aquele seria um momento importante onde todos sabiam que Draco finalmente usaria palavras diretas ao invés de tentar coloca-las nas entrelinhas dos discursos estritamente revisados por Voldemort.

 

—       Nós acabamos parando aqui mais cedo do que planejava. – Draco começou sem qualquer formalidade. – Mas o território vinha sendo preparado há um bom tempo, portanto podemos concordar juntos que não fomos pegos de surpresa. – considerou aquilo uma boa introdução. A causa era conjunta, todos participavam. De onde estava conseguia ver Potter em uma sombra encarando-os com o olhar cheio de ressentimento. Provavelmente estava julgando Hermione naquele exato momento. – Preciso inicialmente esclarecer algumas figuras que a mídia vem impondo sobre minha família nos últimos meses. – a mídia que ele havia controlado para ganhar a afeição do povo. – Talvez possam pensar que minha família tem sofrido uma perseguição injusta por parte de Lord Voldemort, mas a verdade é que minha família vem o perseguindo há um bom tempo. As ameaças contra minha família são resultado de uma aliança que sempre esteve debaixo da desconfiança. Nós fomos feitos prisioneiros tanto quanto vocês da ditadura do medo. Ajudei sim a colocar Lord Voldemort onde ele está hoje, mas quem de vocês não? Sempre tivemos consciência da ameaça que ele era ao mundo e estivemos perto o suficiente dele desde muito cedo para entender o que levaria para derrubá-lo. Os sacrifícios que fizemos foram calculados desde o início e eu tenho plena convicção de que o que parece o início para vocês são apenas os últimos capítulos para minha família. Nós o trouxemos até aqui para derrubá-lo definitivamente. E antes que conspirem ideias sobre uma tomada de poder, o real interesse de minha família está apenas em restaurar o antigo mundo. Muitos podem não ter interesse em entender sobre o legado da família Malfoy, mas um dos princípios que nos rege é sempre caminhar ao lado do governo. Meu interesse pessoal e o de minha família nunca estiveram em cuidar do povo e do Estado como instituição. Como família prezamos pelos nossos interesses próprios e não acreditamos que isso seja saudável para nenhum tipo governo. Acreditamos no poder do Ministério da Magia e do Primeiro Ministro. O modelo nos trouxe anos de paz, estabilidade e prosperidade e está em nossas mãos a chance de restaurá-lo. – sabia que não agradava alguma clientela que estava ali naquele salão. Muitos acreditavam na família Malfoy assumindo um poder absoluto ao derrubar Voldemort.

 

—       Então nós celebramos. – Hermione fez sua voz entoar melodicamente e poderosamente pegando a taça de espumante que havia sigo trazida até eles. – Celebramos o começo do fim. O potencial que temos aqui é impossível de ser medido e cada um de vocês é responsável por ele. Temos muito no que trabalhar e enquanto estiverem empenhados em contribuir com a queda do império serão bem vindos em nossa casa. – ela levantou sua taça. – Ao antigo mundo.

 

Draco ergueu sua taça e juntamente com o restante do salão proferiu seu brinde. Bebeu um gole raso e encarou sua mulher. Ela apenas encostou a boca na taça e esperou todos beberem para que ela afastasse a sua bebida intocada. Ela piscou e calmamente voltou-se para o marido. Haviam completado mais uma tarefa. Estavam infelizes e vazios. O vazio que tinha nela era o vazio que tinha nele. Aprenderia a apreciar a sensação de dormência que vinha com ele enquanto a dor não chegava.

 

Inclinou-se e colou seus lábios no dela muito formalmente diante do público.

 

Ao menos estavam infelizes juntos.


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Notas finais do capítulo

NA: Opaaaam! Olá, depois de muito tempo! Como eu disse no último capítulo postado: não abandonei a fic! Não agora que o fim está quase chegando! Não pretendo abandoná-la e se isso acontecer, o que não tenho a mínima pretensão que aconteça, vou avisar! No capítulo passado eu disse que não colocaria prazos para as postagens dos capítulos, e infelizmente tenho que dizer que irá continuar assim. Estou escrevendo esse capítulo 42 on&off desde janeiro e juro para vocês que só fui conseguir terminar alguns dias atrás. A vida tem sido corrida e embora tudo esteja na minha cabeça, me falta o tempo de colocar meu pijama de mendigo, pegar meu óculo, minha taça de vinho e sentar na frente do computador. Vocês não fazem ideia do número de vezes que eu apaguei páginas e páginas que tinha já tinha escrito para reescrever simplesmente porque não tinha saído como eu queria que saísse porque acabei tendo que escrever na correria. Para vocês terem uma ideia, tive que esperar o feriado para poder ter a chance de sentar na frente do computador para postar o capítulo pra vocês! Como eu havia explicado, a fanfic não é uma prioridade e não posso fazer com que seja. Bem que eu queria. :(

Agora vamos para o que interessa: O capítulo.

É um capítulo tão grande e ainda assim ele é um capítulo de transição. Pode até ser frustrante parecer que não andamos muito na história, eu precisei tirar esse capítulo para construir a base do relacionamento entre Draco e Hermione para as coisas que vão vir pela frente. É necessário que vocês entendam que nós pulamos do nascimento das crianças até o aniversário de quase um ano deles e que durante todo esse tempo, eles criaram dentro do lar deles a energia de uma família comum. Viver assim por tanto tempo foi como passar uma venda nos olhos deles. Uma venda que foi arrancada quando foram obrigados sair/fugir as pressas de Brampton Fort. Foi como um trauma algo que eles estavam planejando que não fosse. Abrir os olhos fez com que eles percebessem que estavam priorizando viver uma fantasia enquanto deveriam estar sendo Malfoys no meio de todo o conflito ao redor deles. No diálogo que os dois tem na casa dos Potter a gente consegue ver essa frustração de não saberem exatamente a raiz do problema, a raiz do medo, a raiz do que estava os tornando tão frágeis e nos últimos diálogos que os dois tem a gente pode ver as coisas clareando para os dois. Eu só espero que a decisão de enfrentar o que vem pela frente puramente como Malfoys não os leve a ser como Narcisa e Lúcio acabaram sendo.

Tenho que focar também na questão do Draco finalmente conseguir entender as atitudes do pai. Isso me faz tão animada para escrever um possível reencontro dos dois. Am I saying too much? Hahaha

Como eles acabaram parando na casa dos Potter, me senti na obrigação de mostrar um pouco da visão da turma da Ordem com relação a surpresa de receber Draco e Hermione ali. Já deu pra perceber que eles estão se fundindo com o trabalho do casal Malfoy embora eles estejam extremamente relutantes, hesitantes e desconfiados.

Um conflito Harry e Hermione pra apimentar a coisa e dar uma base de onde a relação deles está com todos esses acontecimentos. Devo confessar que escrever o Harry espiando Draco e Hermione foi só para o prazer de satisfazer um desejo bobo. Mas me conta aqui que não foi quase que um pecado o prazer de ler essa parte vai?! haha

Capítulo que vem vamos ter a chance de ver o que está rolando em Brampton Fort enquanto isso. Tem muito pedaço solto ainda. Bellatrix/ Voldie+Nott/Narcisa... Vamos caminhar bem mais capítulo que vem!

Não esqueça de deixar seu comentário. Me conte sobre o que mais gostou no capítulo. Qual sua parte preferida. O que gostaria que viesse daqui para frente. Teorias? Me contem tudo!!!

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Vejo vocês no capítulo 43!!