The place that never sleeps escrita por Elizabeth


Capítulo 2
Escape




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Assim que abri a porta de casa um aroma convidativo encheu o ar, a casa cheirava a molho de tomate e orégano. Não pensei na possibilidade de ser minha mãe por que ela não costumava pôr os pés na cozinha, enquanto caminhava até lá meu estômago roncava cada vez mais alto, não me surpreendi ao ver que era Edith curvada em frente ao forno tirando uma fôrma fumegante lá de dentro. Depois de um dia estressante e tendo que ter respondido àquela pergunta estúpida que martelou na minha cabeça o tempo inteiro, o jantar seria a primeira e única parte boa disso tudo.

— Quando você vai parar de ser incrível? — perguntei a ela.

— Quando seu dia for melhor do que hoje — ela adivinhou.

— Seu sexto sentido nunca falha — enchi o peito com aquela essência de dar água na boca — Meu dia foi um lixo, mas isso aqui... Isso aqui...

Lasanha. Estava prestes a passar o dedo por cima daquele molho que cobria a massa quando senti uma leve tapinha na minha mão.

— Não até a hora do jantar, menina — advertiu Edith carrancuda.

— Tudo bem — ergui as palmas das mãos em sinal de rendição — Mas se eu não descer aquelas escadas até lá você será a responsável pela minha morte.

— Não vejo problema algum. Já tirei suas medidas para o caixão — ela sorriu e eu retribuí com uma cara de “não tem graça”.

Subi as escadas num átimo e fui direto para a minha “toca”, fechei a porta e joguei a mochila no canto. O banheiro do meu quarto era colado com o da minha mãe, as paredes finas e desgastadas não abafavam direito o som então eu podia ouvir claramente a voz de Rachel murmurando algo que não consegui entender, parecia estar conversando com alguém. Encostei meu ouvido na parede e ouvi apenas algumas frases soltas, uma delas foi “John, já falei para você não pôr os sapatos sujos de lama debaixo da cama”.

Aquilo me fez revirar os olhos, não querendo escutar mais nenhuma bizarrice do tipo tomei um banho demorado, deixei que a água lavasse toda a minha tensão e a expulsasse pelo ralo. Quando fiquei pronta desci para o jantar, como sempre eu era a última mas vovó ainda estava servindo os pratos. Não hesitei um segundo antes de começar a devorar aquela lasanha, ignorei até o suco que só deixei para tomar no final.

— Olhe os modos, Aurora — minha mãe falou em tom de repreensão como se eu fosse uma criança de cinco anos me lambuzando com a comida, seus olhos estavam centrados no próprio prato quando falou — Se John estivesse aqui lhe daria um bom puxão de orelha.

Ela não viu quando eu olhei de esguelha para Edith e esta balançou a cabeça como se dissesse “já é hora de mandá—la para um hospício”. Grace tentava disfarçar mas eu sabia que ela não fazia a menor ideia do que estava acontecendo na mesa, a cada minuto olhava para baixo dando a pensar que estava se endireitando na cadeira quando na verdade respondia mensagens no celular escondido. Não falei mais nada, depois que todos terminaram, ajudei vovó com a louça enquanto as outras duas estavam na sala assistindo um filme.

— Papai deve estar pensando “minha mulher é demente” — falei enquanto enxugava um prato.

— Eu não julgava sua mãe quando a morte dele ainda era recente, mas depois de tanto tempo... — Edith ensaboou um copo, enxaguou—o e me entregou.

— Quando isso vai parar?

— Creio que nunca, minha querida. A tendência é piorar.

De repente veio à minha cabeça a imagem de Rachel com uma camisa de força. Eu sei que não deveria pensar nisso, afinal é minha mãe, mas desde que John partiu dessa para melhor ela se distanciou tanto de nós que agora é como se cada uma vivesse em um mundo diferente.

— Amanhã vou receber o resultado das provas finais — mudei de assunto.

— E o que acha que vai ser? — Edith acabara de lavar o último garfo.

— Acho que me dei bem — tentei parecer indiferente já sabendo que ia passar.

— Não tenho dúvidas disso, puxou a inteligência do meu filho — ela sorriu um pouco e os sinais da idade apareceram no canto de seus olhos — A matéria preferida dele era...

— História — completei.

— Sim — ela concordou— E como vai seu namoro com Brad?

— Uma droga — revirei os olhos.

— Bom, já terminamos aqui.

— Vou subir, se precisar de mim, é só chamar.

Ela assentiu e eu pisquei. Quando passei pela sala apenas Rachel estava no sofá, subi as escadas e ainda no corredor vi uma claridade saindo pela fresta da porta do meu quarto. Andei sorrateiramente até lá e girei a maçaneta lentamente, quando enfim escancarei a porta e vi Grace remexendo por entre minhas roupas uma onda de fúria me possuiu.

— O que você pensa que está fazendo?!

— Shhhh — ela pôs o indicador nos lábios — Eu posso explicar.

Fechei a porta e exigi que ela começasse a falar.

— Vai ter uma festa agora à noite, vai uma galera para a casa do Guy e me convidaram. Queria ver se você podia me emprestar uma blusa, pelo menos — ela me olhou esperançosa e eu suavizei o rosto, afinal não era uma coisa tão grave.

— Não era mais fácil ter me pedido?

— Sua resposta seria negativa, com certeza.

— E a mamãe concordou com isso? — ergui uma sobrancelha.

— Mamãe está louca, Aurora, desde quando ela se preocupa com alguma coisa que não seja sobre a alma do papai que ela tanto vê? — Grace revirou os olhos e fui obrigada a concordar. — E, além disso, eu já falei com ela.

Pensei por um instante, mas por fim cedi. Ela sorriu imediatamente, aliviada e empolgada. Para mim não havia problema algum, mas observando-a assim Grace crescera tão rápido, num instante era a menina que sonhava com a casa da Barbie e agora uma pré-adolescente pegando minhas roupas emprestadas para ir a uma festa. Dispersei esses pensamentos que mais parecem daqueles pais que choram quando veem os filhos crescidos e levei um choque de realidade.

— Espere aí, Grace. O que vai ter nessa festa? Você sabe...

— Sexo, drogas e bebidas alcóolicas — ela respondeu e eu arregalei os olhos — Calma, não é nada disso. Na verdade uns meninos que tem uma banda vão tocar.

— Olha, eu não sou a mamãe, ainda bem. Mas só vou te dar uma dica, não faça nada de que vá se arrepender depois, okay? E eu acharia melhor você não... Exagerar.

Ela assentiu com a cabeça, me mostrou as duas peças de roupa que pegou da gaveta e dei espaço para que saísse. Peguei a mochila e me joguei na cama, coloquei uma música de fundo baixa e comecei a fazer o dever de casa, o último da minha vida. Depois de quase uma hora o barulho de um carro perto da janela me fez parar os exercícios de química, foi aí que notei a bagunça que se formou na minha cama, papéis e livros cobriam a superfície do colchão como um edredom. Aproximei-me da janela e a cena que vi podia se comparar a de um filme de adolescentes rebeldes, era Grace saindo pela janela de seu quarto e descendo pelo telhado em direção a um cara alto e forte que a esperava de braços abertos no gramado. Ele a pegou perfeitamente com seus músculos salientes sob a camisa e eles entraram no carro que arrancou cantando pneu. “Grace, Grace...”.


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