O homem dentro da cela era quase um fantasma. Pálido e com os cabelos desgrenhados, quase totalmente escondido pelas sombras, Gellert Grindelwald estava bem diferente da foto anexada ao seu registro no Ministério austríaco. Apesar da aparência horrível e exausta, os olhos continuavam os mesmos: um castanho, que transparecia serenidade, e outro pálido, arregalado e frio. Rudolph Spielman sentiu um arrepio ao ver aqueles olhos desviarem do rosto da Presidente Picquery e se fixarem em si, mas manteve-se sério e o encarou de volta. Grindelwald não piscou. Aos seus pés, um lagarto andava languidamente, volte e meia esticando a língua para fora da boca a fim de apanhar uma mosca que se arriscava a chegar mais perto.
“Tivemos que trocar os guardas várias vezes,” disse Seraphina. “Ele entrava na cabeça de todos que ficavam aqui. Falava demais, por isso tiramos a língua dele.”
Spielman arqueou uma sobrancelha, virando para olhar a bruxa ao seu lado. O semblante severo de Picquery tentava esconder o cansaço decorrente de passar meses com um bruxo como Grindelwald sob custódia. Ele havia lido os relatórios, havia visto a longa lista de feitiços usados para isolar o bruxo e a lista ainda mais longa de funcionários dispensados por conta da influência do prisioneiro.
“Fez um bom trabalho, madame,” ele falou, dando as costas para a cela. “Logo ele estará na Europa outra vez, onde vai responder pelos seus crimes.”
O homem viu os ombros da bruxa relaxarem por uma fração de segundos, antes desta se aprumar outra vez e o guiar ao longo do corredor. Com um aceno de mão, os aurores a postos se aproximaram. Picquery manteve-se em silêncio durante a caminhada até o porto, onde a carruagem os esperava. Atrás deles era possível ouvir os detentos, que berravam o nome de Grindelwald, assoviavam e batiam nas grades de suas celas. O barulho era infernal e Madame Picquery devia estar ansiosa para acabar com aquela bagunça.