Intercâmbio escrita por LaisaMiranda


Capítulo 16
Capítulo 16


Notas iniciais do capítulo

Mais uma vez obrigada pelos comentários, espero que esse capítulo atinja as expectativas de vocês.



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Enzo me contou que conheceu Claire na faculdade de direito. Disse que ela era muito inteligente e que isso chamou sua atenção. No começou não tinha sido fácil, ela o esnobava, pois achava que ele era o tipo de garoto que dispensava as garotas fácil, mas ela estava enganada. Enzo contou que demorou para eles ficarem juntos, mas que quando finalmente aconteceu ele soube que nunca mais olharia para outra mulher, pois Claire era a mulher da sua vida.

O namoro continuou depois dos cinco anos de faculdade e tudo estava bem, até Claire descobrir da doença. Enzo parou de falar nessa parte. A lembrança o atingiu com tudo, eu não podia permitir que ele continuasse.

— Enzo, está tudo bem. Você não precisa me contar mais - disse, olhando nos olhos dele, e quando fiz isso senti sua dor.

Já estávamos sentados na cama enquanto ele me contava a história.

— Não, tudo bem, eu quero continuar - recomeçou com a voz meio esganiçada, determinado a fingir que estava tudo bem, mas eu percebi que não estava.

Enzo disse que quando Claire descobriu da doença já era tarde mais. Pois o tipo de câncer que a atingiu era instável. Sua detecção e intervenção precoce eram muito difíceis, porque na maioria dos casos ele progride de maneira rápida e silenciosa, quase escondida. O câncer tinha começado nos tecidos do pâncreas, e interferido na regulação da digestão e do metabolismo. Em outras palavras ela não sobreviveu.

Enzo deu uma pausa e depois voltou a falar, navegando em suas dolorosas lembranças.

— Você não faz a menor ideia de como eu me senti naqueles longos dias - comentou Enzo, tentando engolir o choro.

Enzo não olhava mais para mim e fiquei aliviada por isso, pois a àquela altura, era eu, que quase estava chorando. Eu realmente não sabia pelo o que ele havia passado.

— Eu ainda não tinha decidido nada sobre o meu futuro. Quer dizer, nele eu só conseguia me ver com a Claire. E depois do que aconteceu, pensei que eu não fosse querer mais fazer isso sem ela. Minha vida não teria mais sentido sem ela.

Uma fascinação imensa invadiu meu corpo. Ele era tão diferente do que pensei que fosse quando o conheci. O que eu sentia, cada vez mais por Enzo, era um sentimento bem diferente daquele fascínio amplo e impessoal que geralmente me atraía em outros homens. Ele era diferente. Ele era especial.

— Então eu decidi não me apaixonar de novo - ele me olhou pela primeira vez, depois de contar a história toda. - Por que depois do que aconteceu eu só esperava o pior de tudo. Quer dizer, não era melhor desse jeito?

Eu não respondi, não sabia se ele queria que eu respondesse e também não sabia o que dizer.

— Na minha cabeça tudo era simples. Se uma situação acaba por ferir você, nenhuma das feridas será tão profunda se você não permitir que aconteça de novo.

Agora eu entendia o que Enzo queria dizer. Ele se machucou e não queria repetir aquele sentimento de novo. Não era só por questão de trair a Claire, ou substitui-la. Mas o que eu não entendia era por que ele estava me dizendo tudo isso, o que Nico tinha falado para ele?

Enzo pareceu ler minha mente.

— Nico me disse uma frase que não sai da minha cabeça - ele tentou se lembrar e disse: - Lamentar uma dor passada, no presente, é criar outra dor e sofrer novamente.

— William Shakespeare - disse, me lembrando.

Enzo assentiu e não olhava mais para mim enquanto continuava a falar:

— Ele também me disse que é besteira minha ficar passando a vida com medo de algo assim. Que a gente não tem controle de nada, que não podemos evitar sentimento nenhum, porque isso é mais forte que qualquer coisa.

O que ele queria dizer com tudo isso? Será? Será que Enzo estava querendo me dar uma chance?

— Eu não estou lhe prometendo nada - disse Enzo, voltando a me fitar. - Mas estou disposto a tentar, se você ainda quiser.

— Eu pensei que você não fosse querer mais fazer isso - disse finalmente, me lembrando da nossa ultima conversa.

— Eu também pensei. Mas talvez eu devesse tentar - Enzo estava diferente, de um jeito que eu nunca o tinha visto. Ele não era grosseiro, apenas uma pessoa normal. - Tirar minhas próprias conclusões sobre tudo isso.

Fiquei pensando no que ele estava me dizendo. Fiquei com medo por um momento. Eu já tinha achado melhor manter esse sentimento dentro mim, trancado à sete chaves para sempre e agora ele estava ali. Na minha frente, me pedindo uma chance. Uma chance para recomeçar.

— Eu não quero que pense que estou lhe usando. Não é nada disso - interveio ele. - Eu só pensei que já que a gente teve uma coisa... - ele abaixou a cabeça. - E você também me disse aquilo no outro dia.

Ele voltou a olhar para mim e eu soube exatamente a que ele se referia. Sobre o dia em que eu disse que gostava dele.

— Eu só vou pedir para que você tenha paciência comigo. Não vai ser fácil. Quer dizer. Eu já te beijei antes, mas o que estou pedindo agora é diferente. Eu quero te conhecer. Afinal eu não sei quem você é, só sei o que eu vejo por fora.

Eu não acreditava que aquilo estava acontecendo. Alguém precisava me beliscar para eu ver se era mais um sonho da minha cabeça.

— Então? - perguntou ele, não sabendo disfarçar uma ponta de ansiedade.

— Você precisa mesmo que eu responda? - disse, e não contive meu sorriso.

Ele não sorriu de volta, mas pude notar que seus olhos brilhavam.

— Eu só vou te pedir mais uma coisa.

Escutei atenta ao que ele ia me falar.

— Não comenta nada com a Lacey, por enquanto. Eu não quero que ninguém saiba até eu ter certeza se isso vai dar certo.

— Mas e o Nico? Ele pode contar...

— Não, eu pedi para ele não falar nada. Ele mesmo não sabe dessa nossa conversa. Por isso pedi para você me encontrar aqui. Eu quero que isso fique só entre nós. Será que estou pedindo muito?

— Não. Eu também acho melhor assim.

Ficamos nos olhando por alguns segundos até eu não conseguir mais e soltar um risinho. Eu era tão boba. Ele acabou sorrindo por causa disso. Aquilo era tão estranho, eu não sabia como me comportar perto dele.

— Bom, então eu vou para o meu quarto agora - disse me levantando. Meu Deus, como eu era idiota!

— Tudo bem - ele também se levantou. - A gente conversa mais amanhã.

Ele ficou me olhando nos olhos por alguns segundos, até eu abaixar a cabeça quase rindo de vergonha. Como eu era besta! Eu tinha que ir embora, antes que pagasse mico pior.

Enzo abriu a porta para mim e eu fui direto para o meu quarto. Me joguei na cama como uma menina boba de quinze anos. Mas realmente me sentia naquela idade, onde tudo é tão mais fácil, que a gente nem faz ideia, até crescer de verdade e enfrentar realmente as dificuldades.

Eu não sabia o que esperar disso. Enzo disse que queria ir com calma. Ele disse que queria me conhecer, saber mais de mim. Eu também queria saber mais sobre dele. Não a parte triste, pois ele já havia me contado sobre Claire, mas as outras partes, partes da vida dele antes de conhecer ela.

Me peguei pensando em tudo o que ele tinha me dito. Nas suas palavras. Ele era tão sincero, tão direto. Estava começando a me acostumar e gostar disso nele.

***

Acordei no outro dia disposta e fui para EIPB. Eu estava tão feliz que até o professor Fernando percebeu.

— Como foi o Natal, Giselle? - perguntou ele, depois da aula.

— Foi ótimo - disse, sorrindo ainda mais. - E o seu, professor?

— Foi bom. O natal dos ingleses é realmente especial. Eu queria te perguntar uma coisa. Você já sabe onde vai passar a virada do ano? Porque estou combinando com os outros alunos de irmos ao London Eye. Me disseram que é belíssimo ver os fogos de lá.

— Eu ainda não sei. Mas é um boa ideia. Vou ver e depois te aviso.

— Tudo bem.

O Professor Fernando se despediu e foi embora. Então Flávia veio ao meu encontro. Ela era uma menina baixinha de cabelos curtos.

— Giselle, tem um cara te procurando - disse ela.

— Quê? Que cara? - perguntei curiosa.

— Ele está lá fora. É bonito! - disse Flávia, sorrindo malicioso.

Será que era Enzo? Sorri, só de imaginar. Eu precisava ver para crer.

Ao sair do prédio, vi ele parado na escada principal. Enzo estava de costa, então não me viu se aproximando.

— O que está fazendo aqui? - perguntei, sem tentar assustá-lo. Ele se virou, não parecendo nenhum pouco assustado.

— Pensei que fosse querer uma carona - respondeu, fechando um pouco dos olhos, como se uma luz estivesse atrapalhando sua visão de mim.

Sorri e andei com ele até seu volkswagen. Enzo dirigiu em silêncio. Eu não sabia o que fazer, como me comportar. Por mais que eu quisesse aquilo, eu não sabia como agir com ele.

Quando percebi que não estávamos indo para a casa já era tarde demais, Enzo tinha estacionado o carro em uma rua deserta.

— Onde estamos? - perguntei, sem indiscrição.

— Você já vai ver - ele saiu do carro e eu desci logo em seguida. Quando me aproximei dele, Enzo estava com a mão estendida. - Tudo bem para você? - perguntou se eu podia pegar na mão dele. É claro que eu podia. Ele não precisava nem perguntar uma coisa dessas.

Enquanto caminhávamos juntos, senti a mão dele segurando a minha, meu coração batia como louco. Eu era tão idiota! Por que estava tão nervosa? Só estávamos de mãos dadas. Só isso!

Quando nos aproximamos do local, percebi onde Enzo estava me levando e não acreditei.

— Eu não acredito... - nem consegui continuar.

Estávamos no Trafalgar Square. Aquele lugar lindo e maravilhoso...

— Trafalgar Square! - disse Enzo, interrompendo meu surto pensativo. - Já conhece aqui?

— Tá brincando? Foi aqui que aconteceu a premiere do último filme de Harry Potter. Meu Deus! Não acredito que estou aqui.

Fiquei tão animada e emocionada que nem percebi como estava pagando um gorila na frente dele. Enzo me olhava, com vontade de rir. Abaixei a cabeça com vergonha.

— Você deve estar me achando uma idiota, né? - indaguei, levando minhas mãos ao rosto, o tampando, como se aquilo fosse esconder minha vergonha. - E não deve gostar de Harry Potter.

— Não é isso. É normal aqui as pessoas gostarem de Harry Potter. - disse ele sorrindo. - É que você fica engraçada quando está animada.

— Engraçada - repeti, tirando as mãos do rosto. Ele queria dizer imbecil. - Por que me trouxe aqui? - tentei mudar de assunto.

— Além de te mostrar o lugar, estava pensando que podíamos aproveitar a tarde juntos, sem que ninguém desconfiasse. E... como eu disse ontem, eu quero te conhecer. Então pensei de virmos aqui e você me contar mais sobre você.

— O que você quer saber? - perguntei sorrindo. Aquilo tudo ainda era tão estranho para mim. Era como se eu tivesse sonhando que Enzo estivesse sendo todo carinhoso comigo e que a qualquer momento eu pudesse acordar.

— Não sei. Qualquer coisa - ele abaixou a cabeça quase rindo. - Bom, eu já sei que você é fã de Harry Potter.

Não consegui conter o riso. Eu merecia aquilo. Algo me dizia que aquela tarde seria inesquecível.

Caminhamos juntos pelo Trafalgar Square. A praça era imensa. Enzo me explicou que ficava no centro de Londres e que o lugar celebrava a Batalha de Trafalgar, uma vitória da Marinha Real Britânica nas Guerras Napoleónicas. Haviam duas fontes ao lado de um monumento em homenagem a Horatio Nelson. Ao lado do monumento havia um Leão enorme esculpido. Não me contive e pedi para que Enzo tirasse uma foto de mim com a escultura.

— E você gosta de tirar fotos - disse ele, como se estivesse anotando na memória tudo o que descobria sobre mim.

— E você? - perguntei. Já não era de hoje que eu tinha percebido que ele não gostava de fotos.

— Eu o quê?

— Você não gosta de tirar fotos?

— Quando foi que as perguntas se voltaram para mim? - indagou ele, tentando mudar de assunto.

— Eu também quero saber mais sobre você.

— Eu acho que já te contei bastante coisa, não acha? - perguntou Enzo, de maneira profunda.

Me senti culpada. Não sei se era o que ele queria, mas ele conseguiu.

Nos aproximamos de uma das fontes de água e nos sentamos na beirada.

— Eu não sei mais o que dizer. Me pergunta alguma coisa, não sei - disse, depois de ele insistir para eu contar alguma coisa.

— Como você aprendeu a dançar?

— Eu fiz aula de dança - expliquei. - Aos 15 anos disse para minha mãe que queria dançar e ela disse que só pagaria as aulas se eu me dedicasse e não desistisse depois de algumas semanas. A dança do ventre me chamou atenção e eu escolhi ela. Não sei se é por causa das roupas legais, ou porque é uma dança muito bonita e sensual.

Sorri e Enzo continuou perguntando mais e mais. Parecia que havíamos acabado de nos conhecer.

— Me conta da sua vida no Brasil. Dos seus pais, seus amigos.

— Bom, meus pais... São meus pais - disse, Enzo me encorajou a continuar. - Eles se chamam, Dona Maria e seu Leonardo. Eles estão casados há muito tempo e eu sinto saudades deles. Do abraço deles. Eu sinto muita saudades.

Senti meus olhos arderem ao lembrar dos sorrisos e abraços dos meus pais. Enzo pareceu perceber que eu estava começando a ficar emocionada.

— E seus amigos? - perguntou ele depressa.

Comecei a rir e me levantei, ficando de frente para ele. Seus olhos ficaram da altura dos meus, agora que eu estava em pé e ele sentado.

— Tem a Vanessa. Ela é meio doidinha, mas é uma pessoa muito legal. Eu sempre posso contar com ela para tudo. E converso com ela todos os dias.

— E vocês falam sobre o que?

Sobre você. Pensei. Mas É CLARO, que eu não ia dizer isso para ele.

— Sobre muita coisa. Que não vem ao caso no momento.

Ele me olhou e pareceu não saber mais o que perguntar. Então fui eu que falei:

— E os seus pais? - Enzo já ia começar a me interromper, aposto que para dizer que as perguntas eram para mim, mas continuei: - Eu sei, mas é que eu os conheci ontem. Conheci seu pai - Enzo desviou o olhar. - Vocês não se dão bem?

— Não, a gente até que se dá bem - ele voltou a me olhar. - É só que meu pai passou a vida toda me controlando, e eu deixei. Mas depois que a Claire morreu, eu não quis deixar mais isso acontecer. Eu quis fazer as coisas do meu jeito. Sem depender mais dele. E como você pôde ver, ele não gosta muito disso.

Fiquei observando ele, tentando descobrir o que será que se passava naquela cabeça. Ele era muito difícil de se ler.

Enzo se levantou e pegou minha mão. Ele se aproximou de mim, pegando na outra mão.

— Faz tempo que eu não faço isso - ele sacudiu minhas mãos nas suas e entrelaçou-as. - Esse tipo de coisa. Tão simples. Tão ingênuo. E eu não imaginei que fosse fazer tão cedo.

Ele olhava com ternura para os meus olhos.

— Se passou muito tempo e acho que estou meio enferrujado. Talvez eu demore para entender como as coisas funcionam de novo.

Eu devia dizer alguma coisa, mas não sabia o que dizer. Só conseguia olhar para o rosto dele. Enzo olhou para minha boca, e senti meu coração acelerando como se tivesse à mil por hora. Ele percebeu que eu estava nervosa e se afastou. Por que ele se afastou?

— Acho melhor a gente voltar - disse ele, soltando uma das mãos.

Abaixei a cabeça para disfarçar meu desapontamento e fui a primeira a me mover. Então senti ele me puxar e no segundo seguinte eu estava a poucos centímetros do seu rosto. Ele me olhava com certo desejo. Enzo passou as mãos pelos meus cabelos, alisando-os e se aproximou para me dar um beijo. Ele se afastou depois de me dar um selinho e olhou nos meus olhos. Minha respiração já estava irregular e eu já apertava sua cintura com força nas minhas mãos. Ele voltou a me beijar, carinhosamente.

Quando enfim se afastou. Percebi que ele estava se controlando. Enzo encostou a testa na minha e fechou os olhos, com as mãos ainda no meu rosto.

— Eu acho melhor a gente ir agora - disse ele devagar, e se afastou. Eu não queria que ele se afastasse, eu queria mais e mais dele. Mas Enzo queria ir devagar. Eu precisava respeitar isso.


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Notas finais do capítulo

E então, vocês acham que essa "relação" vai dar certo? Me conta o que vocês estão achando nos comentários!!!