Minha Fraqueza escrita por Lady Morgana


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

"You did not break me. I'm still fighting for peace.
Well, I've got a thick skin and an elastic heart,
but your blade, it might be too sharp.
I'm like a rubber band, until you pull too hard.
Yeah, I may snap and I move fast.
You won't see me fall apart,
'cause I've got an elastic heart"

"Elastic Heart", da Sia.



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Hogwarts, 1922.

Caminhar pelos corredores de Hogwarts à noite sempre fora a fórmula perfeita para trazer o mínimo de paz para Albus Dumbledore, embora tal palavra fosse quase inexistente em seu vocabulário. Enquanto observava os quadros, e recebia alguns acenos das pinturas, tentava ao máximo levar seus pensamentos na direção das aulas que aplicara no dia; repassando cada palavra que falara e as perguntas dos alunos interessados. Em suas aulas era quase impossível alguém dormir.

Dumbledore possuía um dom que poucas pessoas na prática docente tinham: Transmitir saber de forma plena. E não havia mais nada no mundo que fosse capaz de distanciá-lo dos pensamentos perturbadores que ensinar. Ser uma pessoa inteligente fora quase sua ruína, pois, infelizmente, nem sempre a inteligência vem acompanhada de esperteza.

Sua sede pelo saber o levara a cair sem pensar, fascinado pelas palavras exultantes de Grindelwald sobre a superioridade mágica em relação aos trouxas. O brilhante rapaz que oferecia-lhe a chance de afirmar-se como o gênio que sempre fora, sobrepujando a imagem manchada da família graças ao seu pai. “Não, não foram só suas palavras.” Pensou, passando a mão pelos cabelos que começavam a acinzentar. Esse sentimento de algo mais era o que destruía Albus.

Após a morte de Ariana e a fuga de seu companheiro de planos, tudo que restou fora retornar para o lugar que sempre considerara seu verdadeiro lar: Hogwarts. Com o passar do tempo, os convites para assumir o Ministério surgiram, mas seu receio era muito maior. O medo de repetir os erros de outrora e deixar-se levar pelo poder, mais uma vez, poderia tomar proporções ainda maiores tratando de um posto tão alto hierarquicamente.

Lecionar fora a saída para lidar com tanto conhecimento absorvido ao longo dos anos de estudo, e ainda poderia transmitir — indiretamente — sua experiência de vida para que pudesse impedir que outro jovem promissor seguisse seu caminho. Precisava salvar aqueles que ainda podia, já que sua irmã estava além de sua alçada.

Só de pensar na possibilidade de ter matado a própria irmã seu coração doía em eterno pesar. Ainda assim, não podia deixar de perguntar-se o porquê de sua mente voltar-se com frequência para Grindelwald. Por que sua imagem o atormentava na mesma proporção que a imagem de sua irmã jazendo inerte no chão, morta? Deveria odiá-lo com todas suas forças, mas não conseguia. O rapaz jovial e cheio de ideias sobre dominação... Tudo parecia tão atraente, afinal, por que os bruxos deveriam esconder-se já que possuíam o poder em suas mãos, literalmente?

Porque o poder deve andar de mãos dadas com a sabedoria, e todas as suas implicações devem ser vistas com o máximo de responsabilidade.” Era isso que sempre dizia para si. Contudo, Grindelwald falara com tanta paixão que contagiara Dumbledore sobremaneira; de tal forma que nunca mais poderia ser apagada de sua mente e coração. Uma cicatriz que nenhuma magia seria capaz de remover, servindo como lembrete para suas ações. “Como um lembrete dele...”.

Quando a caminhada não era mais o suficiente para apaziguar seus sentimentos, sua única saída era dormir e torcer para que seus sonhos não o traíssem. Porém, quando estava prestes a abrir a porta de seus aposentos, pode ouvir o tilintar de algo se quebrando.

Com a varinha em riste, abriu a porta lentamente. A escuridão em seu quarto já era-lhe costumeira, por isso estranhara a vela acesa sobre sua escrivaninha. Aos pés desta, estilhaços de uma taça de vidro que sempre usava para tomar sua usual dose de uísque de fogo antes de deitar-se. Não costumava deixá-la em sua escrivaninha, assim como não era de seu feitio deixar qualquer janela aberta ao sair.

As sombras pareciam encobrir o seu visitante, pois tinha plena certeza que a pessoa que invadira seu quarto ainda estava ali. Até que uma leve brisa levou um perfume que conhecia muito bem.

— Você já foi mais precavido, Albus. — O toque da madeira contra sua nuca e a voz tão familiar quase puseram um sorriso no rosto de Dumbledore — A vida de professor o acomodou. — Ele estava tão perto agora que podia sentir o hálito carregado de uísque em sua face.

— A vida de professor me salvou. — Lentamente virou e deparou-se com Gellert Grindelwald, seu antigo amigo, o encarando. O tempo não foi muito gentil, embora ainda preservasse o típico olhar divertido e a postura imponente da juventude. — O que faz aqui?

Seu coração batia tão rápido que temia que o outro pudesse ouvir. Não era medo, de forma alguma, era ansiedade, nervosismo, raiva e... Sentimentos confusos que mal podia descrever, ou melhor, temia fazê-los. Estava tão perturbado com sua presença que não notou a diferente varinha que Grindelwald apontava para seu nariz torto.

— E já foi mais analista também. — Seu rosto estava mais magro e os olhos mais fundos. — Não notou nada de diferente? — Os olhos do bruxo voltaram-se para a própria mão e Dumbledore acompanhou seu olhar.

Admiração, curiosidade e temor cruzaram seu rosto e Grindelwald riu — finalmente —, abaixando a varinha. O bruxo andou em direção ao sofá e sentou-se confortavelmente, enquanto era observado por um Dumbledore perplexo.

— Quem?

— Gregorovitch. O velho estúpido estava tentando duplicar a Varinha das Varinhas. Uma grande perda de tempo, é claro.

Ele falava com tanta liberdade e calma que nada parecia ter acontecido. Dumbledore, de certa forma, sentia-se como no dia em que o conhecera em Godric’s Hollow: Animado, instigado. A paixão pelo poder faiscava nos olhos de ambos, num laço dissolúvel.

— Por que você voltou? — Mas a realidade sempre voltava, como um soco em seu estômago.

A imagem de Ariana, o enterro, seu irmão perdendo o controle; tudo isso não poderia ser apagado, ainda que a antiga chama tivesse sido atiçada. Tal fogo-fátuo que alimenta-se do que um dia vivera para surgir em flamas e, logo depois, desaparecer. “Mas Grindelwald não desapareça, desaparecera?” Ele estava sentado em seu sofá, observando-o em silêncio.

— Você me culpa pela sua irmã. — disse, enfim.

— Se há alguém culpado nessa história sou eu. Eu que me deixei levar pela soberba.

— É ser soberbo desejar a grandeza? — Grindelwald levantou-se e andou alguns passos na direção de Dumbledore antes de parar como se atingido por alguma barreira invisível. — Você sempre foi um gênio, Albus. Um bruxo além de sua época, cheio de vivacidade e desejo de mudar o nosso mundo.

— E a que preço? O “bem maior” levou minha irmã desse mundo. — O desprezo destilou de seus lábios ao dizer o lema que ambos utilizaram por tanto tempo. — E você me abandonou, fugiu para continuar seu plano.

— Nosso plano, Albus, nosso plano. Não há mais ninguém nesse mundo que eu queira ao meu lado mais que você. Nascemos para a grandeza.

— Pare de dizer essa palavra.

Dumbledore queria afastar-se, mandá-lo embora, mas não conseguia. Não tinha forças para isso. Grindelwald era o único que conseguia exaltá-lo e, ao mesmo tempo, deixá-lo de joelhos. Tão forte e tão fraco, era assim que se sentia. Completamente no controle do mundo, e fora de si.

— Venha comigo. — O bruxo venceu a barreira que separava ambos e segurou o outro pela nuca, aproximando-o de seu rosto e apoiando sua testa na dele. — Deixe o passado onde este deve ficar: longe. Ou melhor, vamos aprender com ele e seguir em frente.

Seus olhos estavam vidrados nos de Dumbledore que, vez ou outra, precisava fechá-los para recordar o porquê de não abandonar tudo e fazer o que seu velho amigo pedia. Mas era tão difícil quanto um viciado ficar longe de seu vício. “Por Merlin, que eu tenha forças para não ceder. Não permita que minha honra seja corrompida novamente.” Pensava ele, tentando engolir o bolo que se formou em sua garganta.

— Com a Varinha das Varinhas seremos invencíveis. Nós dois, juntos... — Grindelwald chegou ainda mais perto e selou os lábios de Dumbledore com os seus. Um beijo rígido, repleto de sentimentos que nunca foram ditos e lembranças dolorosas.

Dumbledore sentiu os lábios duros e ressecados do bruxo acariciando os seus de forma desajeitada, mas sincera. Desejara tanto esse gesto de carinho dele sem nem saber. Precisava, ansiara por isso quando ainda não sabia nomear o que sentia, e agora não sabia o que fazer.

Lentamente, Grindelwald começou a se afastar, ainda com as mãos segurando o rosto de Albus.

— Juntos, Dumbledore. — Ainda de olhos fechados, ouviu sua voz como se estivesse a metros de distância.

Embebido pelo perfume, intoxicado pelo seu gosto, sentia que estava prestes a desabar. Poderia ficar ali para sempre, mas algo o puxava de volta. Algo sempre o puxava de volta. Ao distanciar-se da bela utopia, os olhos de Albus prenderam-se, no segundo em que os abriu, no porta-retratos sobre a mesa de centro. Virada para ele estava Ariana, sua pequena e valetudinária irmã, contemplando-o por detrás de alguns cachos esparsos que caiam sobre seu rosto delicado.

Seus olhos transmitiam toda a dor que, até segundos antes, não passara de uma memória distante; reascendendo o desgosto da antiga cicatriz. Transmitindo-lhe um mau augúrio ao qual já deveria esperar. Novamente com os pés do chão, Dumbledore afastou-se daquele que sempre amara em segredo até de si.

Em seus olhos viu surpresa e pesar, que logo transformaram-se em ódio puro e simples. Ambos sentiam-se traídos, e a traição é o principal catalisador da aversão.

— Fez a sua escolha, Dumbledore.

— Fiz minha escolha no momento em que optei voltar para Hogwarts. Mesmo cedendo, por um instante, à minha fraqueza, minha irmã me lembrou a quem e ao que devo ser fiel, pois não há nada mais forte que a nossa vontade de fazer o que é certo.

Grindelwald sorriu, mas seus olhos transmitiam a obscuridade que tomara sua alma.

— Então esse é o nosso adeus. — Ele passou por Dumbledore e este não se virou. Era impossível esconder a amargura em sua voz.

Pode ouvi-lo subindo no parapeito da janela, e poderia jurar que virou-se uma última vez na sua direção.

— Parece que encontrou um bem maior para lutar. Uma pena que ele interfira, diretamente, no meu objetivo. — O silêncio caiu sobre os dois, até que Albus virou na direção da janela. — Nos veremos de novo, Dumbledore, ainda que em lados opostos.

— Nunca é tarde para mudar o que ainda está para acontecer. — O outro bruxo apenas negou com a cabeça.

— Assim como você, eu também fiz minha escolha. — Grindelwald pulou da janela, mas Dumbledore não se alarmou.

Não demorou muito para ver uma grande ave de pelagem avermelhada voar para longe, selando o destino de ambos para sempre, pois não há fraqueza maior que a dor de um coração partido, assim como não há honradez maior que transformar essa dor em algo grandiosamente puro.


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Notas finais do capítulo

Então, pessoal, muito obrigada por terem chegado até o final e espero que tenham gostado. Não esqueçam de deixar um review amigo ^^