Crônicas dos Elementais escrita por btfriend


Capítulo 27
Interrogatório




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— Acho que ele não será de muita ajuda nesse estado. - constatou Sylvie ao olhar para o ser robusto que se encontrava desacordado e jogado no chão ali frente deles.

Os guardas haviam decido com o prisioneiro assim que o Oráculo ordenou. Deixaram-o ali mesmo no centro do recinto e retiraram-se,  ficando de prontidão perto da saída.

— Não tem necessidade de afobamento. Eu lhe disse que teria respostas e você as irá obter. Apenas aguarde e observe. - nesse instante o Oráculo estalou seus dedos.

O homem começou a mexer lentamente seus braços e pernas, como se estivesse despertando de um sono longo e profundo. Levou suas mãos até o rosto e o esfregou seus olhos para adaptar a visão. Quando finalmente deixou seu rosto visível, revelou um rosto que aparentava ser de alguém de quase meia idade. Barba e bigode desleixados, onde já era possível notar alguns pelos brancos, tapavam feições faciais brutas e algumas pequenas cicatrizes de cortes.

— Quem são vocês? O que fizeram comigo? Pra onde me trouxeram? - desesperou-se assim que tomou ciência que não reconhecia o local onde estavam e nem as pessoas que estavam ao seu redor.

— Quem vai fazer as perguntas aqui somos nós. - prontificou-se Gustav. - E esperamos que você tire todas as nossas dúvidas!

— Desculpe, camarada, mas eu tenho mais coisas a fazer. Não vai ser dessa vez. - passou a mão direita alisando sua cabeça careca enquanto se permitiu soltar uma risada zombeteira.

— Não sei o que você tem a fazer, mas com certeza eu acho que pode aguardar por mais alguns minutos. Você não acha? Não temos porque tornar isso violento. - retrucou Sylvie.

— Violento, você disse... - disse procurando alguma coisa em volta de sua cintura, mas se deu conta que não estava lá. Deu de ombros. - E quem de vocês aí iria me impedir? A criança? A mulher? Ou o ferido?

— Talvez a criança aqui. - respondeu o Oráculo. - Junto com seus seguidores. Guardas!

O grito ecoou pelo local e imediatamente pode se ouvir a resposta dos guardas. O guardas que estavam de prontidão entraram num tilintar de metal estridente e se posicionaram, alguns bloqueando a saída e outros com lanças pontiagudas apontadas para o prisioneiro.

— É, acho que posso dar um tempinho por aqui. - ponderou. - Mas não garanto que falarei nada.

— Pois acho bom você soltar tudo o que sabe ou, senão... - ameaçou Gustav.

— Senão o que? - interrompeu. - Vão mandar essas guardas me espancarem? Torturarem? Ou quem sabe me matar? Em todo caso, vão continuar do mesmo jeito que vocês estão agora. Sem saber nada. - e riu novamente.

— Acho que você está falando muito e escutando pouco. - analisou o Oráculo. - Você não prestou atenção no que essa bela mulher lhe disse? Não existe razão para a violência. Já que sua audição não parece estar em bons estados, talvez seja melhor eu verificar os outros sentidos. Que tal começarmos pela visão?

Nesse instante os olhos do Oráculo começaram a brilhar. A íris ganhava uma coloração acinzentada enquanto a pupila diminuía de tamanho. Sylvie e Gustav se encaravam enquanto tudo estavam acontecendo. Os guardas permaneciam imóveis alheios a situação. E o prisioneiro olhava estaticamente para a criança.

— Pronto. - comunicou. - Agora ele não vai mais causar problemas. A fera foi domada.

— O que foi que você fez com ele? - questionou Sylvie.

— Só me assegurei que você consiga as respostas que você quer.

— O que você quer dizer com isso?

— Basta vocês saberem que ele não terá escolha a não ser dizer-lhes a verdade. E, acho que ele deve ter percebido que talvez ficar aqui seja uma boa opção, por enquanto. Não é mesmo? - explicou o Oráculo enquanto via o prisioneiro balançando a cabeça em concordância.

Gustav e Sylvie se entreolharam sem entender, de fato, o que havia acontecido. Decidiram não questionar porque sabiam que, no momento, tinham outras coisas para se preocuparem e precisavam de informações rápidas.

— Então, quem é você? - perguntou Gustav rispidamente.

— Edgar. - respondeu de forma mecânica e seca.

— E de onde você é?

— De nenhum lugar e todos os lugares. Não tenho local fixo. - iniciou. - Fico onde eu conseguir tirar maiores vantagens.

— Isso não é uma reposta muito esclarecedora. - protestou Sylvie e viu o Oráculo com uma expressão de quem não podia fazer mais nada. - Quem mandou você aqui?

— A pessoa pra quem eu trabalho. - era perceptível que Edgar resistia pra falar. - Razen.

— E o que ele mandou você fazer aqui? - rebateu Gustav.

— Bem óbvio, não? Ele queria que você fosse capturado.

— Só isso?

— Claro que não. Teria que levar seus dois filhos de bônus. - deu um sorriso malicioso. - Três pelo preço de um.

— Que pena que ele vai ter que se contentar com nenhum! - Sylvie se alterou. - Acho que aconteceram imprevistos e o plano não vai funcionar.

— Não diria que saí de mãos vazias, pelo menos. Consegui causar algum estrago. - debochou. - Como vai o braço aí, garotão? Pra um guerreiro que dizem ser habilidoso, você foi uma presa bem fácil.

— No final das contas eu estou aqui de pé e você sendo obrigado a me responder. Vejam só como o jogo virou! - retrucou com raiva por ter tido sua habilidade duvidada. Virou-se para o Oráculo. - Achei que ele ia apenas falar a verdade!

— E é isso que ele está fazendo. Nunca disse que a verdade seria o que vocês iriam gostar de escutar. - esclareceu. - Ele apenas não irá mentir, não significa que vai se ater apenas ao que for perguntado.

— Porém tenho que concordar que você estava com sua guarda muito baixa. Deixar ser atingido por trás desse jeito é coisa de guerreiros amadores. - provocou Sylvie.

— Chega! Não é isso que está sendo discutido aqui. - respondeu a contragosto. - E qual é o plano desse tal de Razen?

—  Não sei ao certo. Tudo o que sei são boatos que escutei durante um trabalho e outro. - contou Edgar. - Aparentemente está relacionado com o pai dele. Ele quer que você pague pelo que fez.

— Isso não foi de muita ajuda. - concluiu a caçadora. - Podem ser muitas pessoas.

— Na verdade, não. - discordou o guerreiro. - Pense bem! As ameaças que eu sofri são bem semelhantes as do passado. E pelas coisas que ele disse, esse tal de Razen quer vingança. Faz muito sentido se ele for filho do criminoso de tempos atrás.

— Então isso significa que... - Sylvie foi interrompida.

— Que quando eu achei que tinha me livrado de um problema, apenas dei brecha para a criação de um bem maior. - queixou-se Gustav. - E ainda arrastei meus filhos para isso.

— Sem crise de auto piedade, por favor. - indagou. - Você deteu alguém que estava causando problemas na época. Infelizmente ou não, ele morreu. Não significa que a culpa seja sua. Você pode parar com o drama e prosseguir?

— Não tenho outra escolha no momento, tenho? Então, prosseguindo... - fixou o olhar para Edgar com se tivesse ganho um aumento de determinação. - Como você começou a trabalhar para Razen?

— Contatos certos, digamos assim. - iniciou. - No mundo dos mercenários em que eu me encontro, tudo se baseia em quem você conhece. Um conhecido já estava dentro do círculo de Razen e disse que ele estava recrutando mais pessoas. Avaliei a situação e decidi aceitar a oferta.

— E o que você vai ganhar com isso? Porque, com todos os meus anos de viagens como caçadora, eu não consigo imaginar um cenário onde um mercenário faça algo de graça!

— E você está corretíssima, senhorita. Para muitos ali foi uma espécie de troca de favores. Razen ajudava com alguma pendência que eles tinham com alguém e, em retorno, eles auxiliavam no plano. - iniciou Edgar. - Para outros, como eu, foi uma simples questão de exigir uma quantia. Metade antecipado e metade quando tudo tiver concluído. Não sei como ele arranjou o valor, mas cumpriu com a parte do trato.

— E com o que você vai gastar esse dinheiro agora? - pronunciou-se o Oráculo ganhando a atenção de todos. - Pensei alto demais, desculpa. Esqueçam que estou aqui e podem dar continuidade a extorsão de informações.

— E quantas pessoas estão envolvidas nisso tudo? - prosseguiu Gustav.

— Impossível eu saber. Quando eu entrei, já tinham muitas pessoas envolvidas. O que eu sei é que isso começou faz tempo e que muitas pessoas foram recrutadas ao longo dos anos. Ajudaram na construção da prisão, obtendo informações sobre você e sua família e até mesmo a recrutar novas pessoas.

— Mas isso é quase uma conspiração! - exclamou Sylvie. - Todos eles aceitaram entrar numa vingança contra alguém que eles nem conhecem.

— Você ficaria surpresa com o que as pessoas são capazes de fazer dado o incentivo certo. - riu maliciosamente. - A prisão não é exclusiva para você, Gustav. - disse o nome com certo desprezo. - Como eu disse, outras pessoas aceitaram fazer parte por diferentes motivos. E talvez, somente talvez, algum desses motivos possam incluir inocentes.

— Quanta crueldade!

— Verdade, não é mesmo? Somos todos muito cruéis. Mas não acho que você queira medir o nível de minha crueldade no momento. - zombou Edgar.

— Ei! - gritou Gustav. - Responda apenas quando for perguntado. Já está me cansando! Entendido?

Edgar esboçou uma expressão de escárnio e desejava poder se libertar. Sabia que não teria chances contra todos aqueles guardas ali. Mas talvez a morte seria melhor do que continuar com aquela situação humilhante. Contudo, não conseguia fugir. Por mais que o pensamento de fuga viesse em sua mente, outros pensamentos aleatórios apareciam para dissuadi-lo. Não sabia de onde vinham, mas tinha suas suspeitas.

— E ele está armando isso tudo sozinho? Ou tem mais alguém ajudando nisso tudo? - o guerreiro não estava a fim de enrolações.

— Depende. Existem pessoas que ele confia mais, porém não são lá grandes coisas. Fora isso, ouvi falar de uma espécie de feiticeiro que anda sempre com ele. Como se fosse um conselheiro. Nunca vi a cara do sujeito.

— Acho que vocês já conseguiram tudo o que tinham de importante para saber. - interrompeu o Oráculo. - Ou tem mais alguma pergunta para fazer?

De fato, Gustav e Sylvie não conseguiam pensar em mais perguntas. Existiam pequenas coisas que tinham duvida, mas as principais coisas já haviam sido esclarecidas e podiam prosseguir a partir disso.

— Assim sendo, pode voltar a repousar.

O oráculo estalou seus dedos, assim como tinha feito antes, e Edgar tombou no chão inconsciente.  Sem precisar receber ordens, dois guardas pegaram o prisioneiro pelos braços e o levaram para o andar superior.

— E agora? - questionou Sylvie. - O que faremos com tudo isso?

— Temos que agir o mais rápido possível. - respondeu Gustav. - Se o plano de vingança desse tal de Razen é tão grande quanto foi falado, precisamos ir para Yor'Em o mais rápido possível. Antes que eles resolvam atacar lá.

— E como eu disse, o destino de vocês não se encontra aqui. Vão ajudar o filho de vocês! - sugeriu o Oráculo.

— Irei partir para Balchmont para conseguir ajuda assim que os primeiros raios de sol surgirem. E você deve ir para Valmees reunir-se com os caçadores. Acho que chegou a hora de juntarmos nossas habilidade mais uma vez. - Gustav tinha um tom de confiança.

— Acho que não tenho outra escolha, afinal. - rebateu Sylvie. - O que uma mãe não faz pelo seu filho. Mas e você? Vai ficar onde até amanhã?

— Já fiquei aqui por alguns dias. Mais algumas horas não fará diferença. - o Oráculo assentiu ao ouvir tais palavras. - Além disso, não acho que fará bem para Trent me ver agora. São muitas perguntas para serem respondidas em pouco tempo. Teremos tempo depois.

— Está certo. - concordou a caçadora. - Então acho que já vou indo. Ele deve estar preocupado, pois não é todo dia que eu saio escoltada de casa.

Sylvie estava numa situação constrangedora. Não sabia como se despedir apropriadamente do Oráculo e, depois de muito tempo sem vê-lo, nem mesmo de Gustav. Resolveu, então, simplesmente acenar com a mão e virou-se para a saída.

— Ei, Sylvie! - o Oráculo a chamou. - Possivelmente amanhã deve estar chegando um presente para você.

— Posso saber o que é? - Sylvie ficou curiosa.

— Apenas uma lembrança para não se esquecer de mim. Considere como uma forma de agradecimento pelas coisas que fez por Awalles. Tenho certeza que será muito útil daqui pra frente.

— Bom, estou agradecida. Mal posso esperar.

Sylvie deixou o recinto com um sorriso no rosto. Aquela criança não parava de trazer mistérios para sua vida, por menores que fossem.

"Pelo menos dessa vez é um presente.", pensou.


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