O Violinista Fantasma escrita por Leandro Zapata


Capítulo 1
Parte 1




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Taylor Reese, jornalista renomada internacionalmente e colunista permanente de um dos jornais de maior circulação nacional do Brasil, ouviu a história pela primeira vez de seu fotógrafo/estagiário/escravo, Fabián Delacour. Assim como todas as histórias de fantasmas que ela ouviu, se tratava de uma casa abandonada, em uma rua sinistra e com barulhos inexplicáveis. Antes de pedir autorização ao seu editor para a viagem, ela assistiu dezenas de vídeos no YouTube sobre a casa.

Era uma velha mansão abandonada em algum lugar afastado, mas que ainda pertencia ao município de Gramado, no Rio Grande do Sul. Os moradores da região costumavam dizer que ela era assombrada, pois podia-se ouvir o som de um violino sendo tocado durante a noite, sempre precisamente a meia-noite. A casa era aberta para os corajosos que quisessem passar a noite para ouvir a música, e todos que o fizeram saíram vivos de lá, confirmando que realmente haviam ouvido a música conforme diziam as lendas.

Para Taylor, porém, outro motivo a levava a querer conferir aquela história. Um motivo que nem mesmo Fabián sabia.

Com a desculpa de que queria visitar a casa para inspirar sua coluna, o editor concordou rapidamente, já que desde que ela começara a escrever para ele, as vendas do jornal triplicaram. Junto com seu escravo, ou estagiário, como queira, ela partiu de São Paulo em um avião para Gramado.

Uma vez na cidade, eles fizeram check-in em um hotel, que por sinal era ao lado de uma balada. Taylor sabia que Fabián estava planejando fazer uma visita a danceteria mais a noite e traria uma mulher com ele. Por isso, ela já deixou pago o extra cobrado pelo pernoite de uma terceira pessoa.

Antes que Fabián pudesse ir atrás de uma gaúcha loira, Taylor puxou-o pelo cordão da Nikon em seu pescoço para dentro de um táxi. Ela queria fazer uma visita a casa mal assombrada antes que escurecesse, para que Fabián pudesse tirar umas boas fotos do local iluminado pela luz do sol. O taxista, que era um senhor idoso, de cabelos ralos e brancos sob um boné de um posto de gasolina, fitava-a como se tentasse reconhecê-la. Essa era a vantagem de ser jornalista: mesmo você sendo conhecida, as pessoas dificilmente lembravam do seu rosto.

Antes de partir, o motorista entregou um cartão para Taylor, dizendo que podiam ligar quando ele precisasse buscá-los. A casa era feita de pedra cinzenta escura, com janelas de madeira e teto triangular. A porta de entrada era dupla, uma delas estava pendurada no batente; ela estava muito suja, tornando impossível a possibilidade de identificar qualquer desenho que possa haver nela.

Passaram algumas horas explorando a residência, mas não encontraram nenhum fantasma, apenas alguns viciados, casais de jovens fazendo sexo e teias de aranha. Levaram uma boa parte da tarde para conseguir cerca de três fotos boas o bastante para o jornal.

O relógio marcava 16hrs quando eles ligaram para o taxista, que chegou cerca de meia hora depois. Não era o mesmo velhinho da outra vez, mas sim um rapaz moreno usando um chapéu. Taylor não foi muito com a cara dele.

- Então, conseguiram encontrar o fantasma?

- Não. - Fabián perguntou, antes que Taylor pudesse dizer qualquer coisa. - Mas você sabe, não existem essas coisas de fantasma. Só a teimosa aqui que acredita.

- Isso é verdade, senhorita? - O taxista olhava pelo retrovisor.

Taylor achava engraçado a ingenuidade e ignorância dos homens, que acreditavam que havia apenas eles e seu planetinha. Mal sabiam eles.

- Sim, acredito. - Ela respondeu de maneira tão séria, que ele não ousou retrucar.

Eles seguiram viagem em silêncio até que chegaram a entrada da cidade, quando Taylor perguntou:

- Há algum lugar por aqui que consigo alugar coisas para acampamento? Tipo, saco de dormir?

- Conheço um lugar não muito longe. - O motorista respondeu. - A senhorita pretende passar a noite no casarão?

- Sim. - Ela respondeu simplesmente.

Eles pararam diante uma loja grande, mas apesar disso ela não pertencia a nenhuma grande franquia. Quando entrou, todos os funcionários eram loiros e com olhos azuis, todos muito parecidos; ela deduziu que eram descendentes de alemães, ou de qualquer outra parte da Europa, já que todas as pessoas daqueles países eram loiras de olhos azuis. Menos seu estagiário, que, apesar de ser filho de pais franceses e nascido na França, ele tinha os cabelos castanhos claros e olhos cor-de-mel, diferente dos brasileiros e dos franceses.

- Você vai mesmo passar a noite naquela casa? - Fabián perguntou.

- Sim. Por que acha que pegamos apenas um quarto de hotel?

- Porque eu finalmente achei que você cederia aos meus encantos! - Ela pensou em jogar uma faca de caça que estava na prateleira no coração do rapaz, mas pensou duas vezes: ela ainda não tinha pago pelos itens. - Por quê? Nós dois sabemos muito bem que você não está buscando inspiração para nada, mesmo tendo falado isso para o chefão.

- Não te interessa. - Retrucou. - Agora seja um bom escravo e arrume uma lanterna para mim.

Ele obedeceu, e não falou mais nada. Todos os itens juntos somaram um aluguel de R$50,00 por dia. Ela deu uma entrada no mesmo valor, sabendo que não precisaria do material mais do que uma noite. Taylor pagou do próprio bolso, afinal, se usasse o cartão do jornal, chamaria muita à atenção de seu chefe.

- Você sabe que eu não vou com você, né? - Fabián disse quando ela já estava na rua, chamando um táxi; pelo seu tom, sabia que ele estava preocupado com ela.

- Eu sei. - Ela sorriu, entrando no carro. - Divirta-se!

Agora sozinha, sem contar o motorista judeu, ela via a paisagem correndo pela janela do carro. Ela estava pensativa, não tirava o pensamento dele. Era motivo de ela estar fazendo aquilo; descobrir se o fantasma era verdadeiro ou não era uma esperança.

Antes de ir à mansão, ela pediu ao motorista que parasse em um restaurante, onde ela comprou comida e água.

Voltou a casa e se instalou em um quarto vazio no térreo. Precisou limpar um pouco, tirando algumas teias de aranha e muito pó; ela usou uma vassoura que encontrou no próprio casarão. Estirou seu saco de dormir no chão. Devorou seu sanduiche com gosto, estava com muita fome, e tomou a água quase num único gole.

O céu já estava escuro quando ela terminou. Não devia passar das oito da noite quando ela deitou, esperando. Ouviu movimentação na casa; soube que eram os ocupantes do local. Ninguém mexeu com ela ou entraram no quarto; assim que a viam, não entravam no quarto, respeitando seu espaço.

Em algum momento, antes da meia noite, ela se movimentou bruscamente, virando de lado. Ela acertou o cotovelo direito com força no chão. Sentiu raiva devido à dor, mas ao mesmo tempo se distraiu com o barulho estranho que o assoalho havia feito. Usou os nós dos dedos para bater no mesmo local; foi como bater em uma porta.

- Esse assoalho está solto! - Ela disse animada, achando que tinha descoberto algo maravilhoso.

Procurou na mochila, mas não encontrou nada que pudesse usar para abri-lo. Saiu de seu quarto vazio e correu segurando a lanterna pelo casarão. Encontrou um velho candelabro de ferro em cima de uma prateleira que estava sobre uma lareira. Taylor achou-se sortuda, já que ninguém havia roubado aquele candelabro em anos.

Voltou ao quarto e, sem se preocupar com o barulho, bateu no assoalho, que cedeu na segunda batida. A madeira estava podre e corroída de cupins. Usou a lanterna para enxergar ali dentro. Além das teias de aranha, sujeira, o corpo de um rato morto, havia uma caixa de metal. Com um pouco de nojo, ela pegou-a.

A caixa era lisa, porém sua tampa possuía alguns desenhos. Ela limpou a sujeira e as teias com um pedaço de pano que também trouxera da loja. Eram notas músicas saindo de alguns instrumentos; ela mal reconheceu o violino e o piano, o resto estava muito apago para identificar. Os anos preso naquele buraco tornaram a caixa difícil de abrir. Ela conseguiu, apesar de quase jogar o conteúdo pelos ares.

Havia ali diversas coisas antigas. Figurinhas, um soldado de brinquedo, um carrinho de fórmula 1 rústico, e diversas figurinhas de álbuns. Aquele tesouro tão antigo estava apagado demais pelo tempo, e talvez por alguma chuva, que ela não tinha como dizer de quando era.

Em baixo de tudo, enrolado em um saco plástico, ela encontrou uma foto. Nela, havia um homem e uma menina sentados à beira de uma janela, que milagrosamente Taylor reconheceu como uma daquela casa. A menina, de fato, estava ajoelhada sobre um objeto não identificável e olhava a paisagem pela janela; o homem, sentado em uma cadeira tocando um violino, o que explicava o tema da caixa. O amarelado da foto não tirou o brilho da felicidade dos dois, e Taylor não conseguiu evitar sorrir. Forçou um pouco a visão e notou que, sob o olho esquerdo do homem, havia uma cicatriz em formato de “X”.

- Isso é que é um achado e tanto! - Ela usou um pano para limpar os objetos da caixa.

Passou várias horas observando e analisando os objetos da caixa, como se tentasse encontrar algum detalhe que lhe passara despercebido. Contudo, nada encontrou. Guardou a caixa dentro de sua mochila e deitou sua cabeça no travesseiro.

Então, no que pareceu uma eternidade depois, já que ela não conseguiu pregar o olho, o violino começou a tocar. Era uma música belíssima, porém desconhecida, como se o fantasma a tivesse inventando naquele momento.

Taylor levantou, e com sua fiel lanterna, ela seguiu o som pelo corredor, até o seu final, onde o batente de uma porta arrancada guardava uma escada que descia até o porão. Com um pouco de receio, sem saber o que encontraria lá em baixo, Taylor desceu. O porão era um lugar amplo, com algumas tralhas inúteis e cheio de mendigos. O cheiro de urina ali era insuportável. Ela apontou sua lanterna para todas as direções. Deu passos até parar. Então ela soube de onde vinha a música do fantasma.

Ela estava diante de uma parede de tijolos de barro. O violino vinha de detrás dessa parede.


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