Enquanto o Sol Brilhar escrita por Gabriel Campos


Capítulo 7
Bob: Há sempre uma luz que nunca se apaga


Notas iniciais do capítulo

Música: Sing
Intérprete: Travis

https://www.youtube.com/watch?v=eYO1-gGWJyo

O capítulo que todos esperavam :)
Agradecendo ao Yuri Ferrer pela linda recomendação *-----*



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Escuto o som dos gatos vadios brigando em cima do telhado: é madrugada de uma sexta-feira e alguém precisa se divertir. Por um momento, até os invejo, , mas olho de relance para a minha cama e vejo aquele pequeno ser envolvido em um dos meus lençóis. O cachorrinho que salvei da morte está sentindo muita dor, e geme, tremendo as patinhas traseiras.

Quando tenho certeza de que o sangramento no meu nariz parou, jogo o cubo de gelo dentro da pia e me aproximo do cão. O animal me olha, seus olhinhos escuros estão brilhando, ele clama por ajuda e sei que ele será fiel a mim de alguma forma se eu o fizer. Cães são fieis por natureza. O pobre coitado está desesperado e traduzo por aquele singelo olhar que ele já não aguenta mais aquela dor. Eu preciso fazer alguma coisa antes que seja tarde.

🐾

É difícil andar de bicicleta no meio da noite; as ruas são escuras e gélidas, e as pessoas que transitam pela cidade me parecem suspeitas. Por que alguém estaria na rua uma hora dessas? Há prostitutas nas esquinas e mendigos aquecendo suas mãos em fogueiras improvisadas. E há um gordo manobrando uma bicicleta de cestinha com um cachorro moribundo dentro dela.

Avisto uma placa luminosa a alguns metros. "Clínica Sete Vidas: Plantão veterinário 24 horas". É ali, penso. Aquela luz bem me pareceu a luz que sai das mãos de Deus. E essa luz iluminará a vida sofrida deste pequeno ser, penso comigo mesmo. Você vai ficar bem.

Com cuidado, retiro o cão enrolado em meu casaco da cesta da bicicleta e o seguro contra o meu peito. Tenho cautela, pois sei que qualquer movimento brusco poderá piorar a situação do meu amiguinho. Ele chora, mas mesmo assim, enquanto está em meus braços, tenta lamber meu rosto. Sinto que seria uma tremenda falta de educação recusar os agradecimentos do meu novo amigo.

— Depois você me agradece, amigão. — digo, arfando. Lembro-me que por causa de toda essa confusão, ainda não comi nada. Melhor assim. E espero que meu estômago não perturbe.

Chego à recepção e não vejo ninguém. Apenas as paredes brancas da clínica e um balcão de mármore. Resolvo me aproximar do tal balcão e atrás dele uma garota dorme em cima de uma cama improvisada, feita com os assentos de duas cadeiras de plástico. Ela é tão tampinha que cabe naquele espaço perfeitamente, e eu fico com pena de ter de interromper um sono que me parece tão bom.

— Moça? — chamo-a.

A garota dá um pulo alto de sua "cama" e, assustada, põe-se rapidamente de pé. Há um bonito bordado do lado direito superior do seu jaleco: um símbolo, que me parece representar a medicina veterinária e, abaixo dele, o que me parece ser o nome da moça: Janaína Bernardes. Ela, ainda um pouco aturdida, tenta ficar de olhos abertos e posso notar que eles são tão verdes quanto um rio. Recomposta, ela sorri, dizendo:

— Boa noite! Em que posso ajudá-lo? — Janaína Bernardes nota a criaturinha frágil que carrego em meus braços.

— Encontrei esse rapazinho aqui no meio da rua. Estava sendo agredido por um bicho. O bicho mais terrível que existe na face da Terra: — explico, dando uma pausa — o bicho homem.

Ela dá um sorriso pelo canto da boca e toma o cachorrinho das minhas mãos, levando-o até uma outra sala. Minutos depois, reaparece com um homem grisalho ao seu lado, também de jaleco.

— Oi, eu sou o Doutor Patrício, sou o médico veterinário chefe da clínica.

— Sou Roberto, prazer. — digo meu nome de batismo e ele aperta minha mão. A garota que me atendeu primeiro fica ao seu lado, quieta. — cadê o cachorro?

— Infelizmente as notícias que trago não são muito boas, Roberto. É necessário fazer uma cirurgia de emergência, no entanto seu amiguinho está muito fraco e, devo alertá-lo que as chances de ele sobreviver são mínimas.

Fico cabisbaixo, o silêncio paira por aquele lugar. O ar-condicionado parece estar ligado no máximo, pois tremo de tanto frio.

— Roberto, talvez seja mais sensato sacrificar o cão. Será menos doloroso e...

— Não! — interrompo a fala de Janaína com um grito — Façam a cirurgia. Se há uma chance de ele viver, não podemos deixar que ela passe.

Patrício e Janaína se entreolham, talvez por sentirem a esperança brotando da minha voz, ou talvez por observarem meus trajes, humildes, dignos de alguém que não tem dinheiro nem para pagar uma consulta médica para si mesmo, quanto mais uma cirurgia para um cão.

— Então... é que...— o médico veterinário grisalho, sem jeito, tenta dizer algo.

— Vocês querem saber se eu tenho dinheiro? Ok. De quanto estamos falando? — indago. O homem puxa um bloquinho de anotações do bolso do jaleco e escreve algo. Arranca o pedaço de papel e me entrega.

Quando vejo a quantia, quase dou um salto mortal para trás. Sei que há custos por trás de todo procedimento cirúrgico e pedir àqueles dois que façam o trabalho de graça seria quase como contar uma piada estilo Zorra Total. No entanto, penso naquele pobre cão: ele não tem culpa de nada e não merece morrer por causa daquele homem que o atropelou. Para aqueles veterinários talvez seja mais fácil e mais barato aplicar uma injeção num animal e pronto, mas para mim, não. Eu vi como aquele cão me agradeceu por eu ter salvado sua vida. E eu salvaria mais uma vez se fosse preciso.

— Façam a cirurgia. — eu peço, vestindo o meu casaco, que outrora enrolava o cão — eu garanto que volto com a solução.

E saio, com uma ideia maluca na minha mente.


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Notas finais do capítulo

O que acharam deste encontro? :)