Crônicas de Kyveth escrita por Eduardo Ariedo


Capítulo 5
V — Torneios


Notas iniciais do capítulo

Olá, leitores! Em primeiro lugar, peço mil desculpas pela demora minha em postar esse quinto capítulo. Um bloqueio junto com alguns problemas dificultaram-me de escrevê-lo, mas aqui ele está!

Agora, queria agradecer através daqui todos os leitores de Crônicas de Kyveth, pois a fic alcançou as 700 visualizações hoje e eu estou mega animado e não sei como agradecer vocês, sério, estou indo mais longe do que esperava! São pessoas como vocês que não fazem a minha criatividade se extinguir.

Agora, sobre o texto, citei nas falas de Thiago dois mundos que existem aqui no Nyah, o primeiro, quando ele fala de seu "amigo" Andrean, está falando do universo fantasioso criado por Madlyn em Legados do Fogo, que pode ser lida aqui:
https://fanfiction.com.br/historia/571384/Legados_do_Fogo

A segunda, quando cita o amor e a guerra, é ao mundo antigo que Gisele retrata em A profetisa e a Queda de Troia:
http://fanfiction.com.br/historia/519981/A_Profetisa_e_a_Queda_de_Troia

Bom, agora, vamos lá! Espero que gostem do capítulo e que a demora tenha valido a pena, aliás, voltarei a postar regularmente se tudo der certo. :3



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Arthur lentamente se encolheu nos lençóis de sua cama de palha quando o brilho do sol golpeou sua face, abrindo calmamente os olhos e estudando o que estava ao seu redor. A luz tomava conta do quarto com velocidade, se espalhando rapidamente pelo chão e móveis. O homem, então, levantou-se com extrema tranquilidade e sentiu seu corpo doendo.

Entrar em combates durante dois dias distintos havia lhe trazido alguns incômodos, principalmente em seu braço direito, aquele no qual empunhava a espada. Seus olhos passearam pelo local onde estava e, após uma rápida busca, foi capaz de encontrar uma flauta de coloração azulada em cima do pequeno armário de carvalho próximo à uma parede. Thiago lhe visitara naquela noite, apesar de se encontrar mais no quarto.

— Estranho… — sussurrou Arthur enquanto pegava a flauta em sua mão. O bardo era uma pessoa um tanto quanto misteriosa para o guerreiro pois, ao mesmo tempo em que suas intenções aparentavam ser as melhores, ele poderia trocar sem hesitar a pessoa mais importante para si por um pequeno pedaço de fama e glória.

Deixando a flauta onde estava, Arthur desceu lentamente as escadas de madeira, indo para o primeiro andar onde a taverna, naquela hora da manhã, já se encontrava cheia. As garçonetes, de corpos esguios e orelhas pontiagudas, caminhavam fugazes por entre as mesas, levando em suas mãos pesadas bandejas repletas de bebidas e diversos pratos de aço, com comidas matinais. Uma dessas elfas, de longos cabelos brancos, entregou uma refeição para um homem de aparentemente quarenta invernos ou um pouco menos que, ao encarar o conteúdo do prato, queijo e pão, sorriu de forma confiante e entregou a ela um pequeno saco de couro com algumas moedas. Em seguida, o homem cravou seus olhos em Arthur. Era Thiago.

— Finalmente a princesa acordou, mas será que ela já está preparada para este grande dia que está por vir? — questionou Thiago quando Arthur já estava próximo o suficiente para ouvi-lo.

— Tenho o direito de escolha? — brincou Arthur, que se sentava na cadeira indicada pelo bardo. Antes de voltar a falar, o Filho da Tormenta estudou o amigo com os olhos e notou que no braço esquerdo do mesmo havia um pequeno pedaço de pano branco, como se fosse um curativo improvisado, achou aquilo estranho, mas resolveu ficar quieto.

— Nenhum — respondeu o bardo, coçando sua barba, enquanto mastigava um pouco do pão com queijo. — Você gosta da comida kyvethiana, Arthur?

— Existe outra? — questionou o homem, pescando uma das fatias do pão e mordiscando-a; para Arthur, existia apenas a comida de Kyveth, mas então qual seria o motivo de Thiago ter perguntado isso?

— Algumas tavernas de Kyveth são assim como você… Confortados com aquilo que tem, não pode ser um problema tão grande, mas pra mim, pior que a ambição dos gananciosos é a alma miserável dos contentáveis. Uma vez encontrei um rapaz chamado Andrean, comi com ele coelho ao molho de batatas, foi um dos melhores pratos de minha vida, mas por aqui você é capaz de encontrar algum caçador com vontade de caçar um animal tão pequeno como coelho? Não, também nunca consegui encontrar nenhum fazendeiro que produzisse batatas, mas enfim, não estou aqui para discutir comida com você, Arthur, queria dizer que já te registrei num torneio. Uma liça. Onde vários guerreiros lutam por um lugar nos salões da nobreza na festa que teremos a noite, o vencedor, obviamente, ganhará essa honra. Por isso, quero que você hoje seja um ganancioso cheio de ambição e não algo que está contente com o que tem, porque tu, Arthur, nasceu para ser grande e hoje começaremos a escrever o primeiro capítulo importante na história de sua vida.

O bardo, conforme tocava naquele assunto, sentia seus olhos brilharem ao mesmo tempo em que uma empolgação tomava conta de seu corpo. Arthur já havia presenciado aquilo algumas vezes e sabia que, certamente, devia estar impecável no combate que aconteceria naquele dia para satisfazer a vontade de seu mentor, por isso o melhor a ser feito seria apenas deixar o suspiro escapar de seus lábios e levantar-se da cadeira onde estava sentado — já que, segundo Thiago, aquele seria um grande dia.

Quando saíram da casa, após o desjejum matinal, Arthur realmente viu como a ambição podia fazer coisas estupendas quando era necessário. Numa noite, enquanto dormia, Ghardïa como havia visto no dia anterior parecia ter sido demolida e uma nova ter sido construída em cima da antiga cidade, já que ali, contrastando com a memória de Arthur na qual ele via muitos guerreiros caminhando na rua e nenhuma tenda, hoje era capaz de ver os dois numa organização perfeita. Panos grossos e coloridos, cada um representando alguma das grandes famílias de Kyveth ou apenas um único guerreiro que havia, por meio da espada, conquistado um lugar entre os nobres daquele mundo e agora tinha o direito de estampar sua própria marca em brasões. Thiago, o maior bardo dos dias atuais, conhecia como a palma de sua mão todos os símbolos que existiam por aquele lugar e Arthur tinha a leve impressão de todas pessoas — principalmente as mulheres mais jovens e belas — o estavam cumprimentando.

O músico, por sua vez, apenas ignorava e apontava com os dedos para alguns brasões e fazia uma leve explicação sobre o que representava cada um deles. Lá estava o dragão vermelho dos Boulevard, vindo do estado papal de Dhrim e as faixas negras atrás da criatura mística pertencia ao primogênito da família, Mark Boemundo, uma das únicas pessoas daquele reino que havia conseguido a alcunha de “o grande”. Se Thiago fosse explicar para Arthur todos os símbolos, certamente perderiam ali o dia todo, pois havia em diversas flâmulas postas em cima de cabanas um número enorme de animais — comuns e místicos, mas ambos os tipos capazes de encher completamente uma cidade, transformando-a num zoológico.Também havia um arsenal de todos os tipos de armas que se podia imaginar, com todas as cores possíveis que o Criador havia pensado em trazer para Kyveth. Existia, além do arsenal, versões levemente modificadas dos símbolos de todos os Santos, representando o fervor religioso de algumas famílias.

— Está vendo aquele brasão? O escuro? — questionou Thiago apontando com o seu dedo indicador para uma flâmula com muitas tonalidades de preto e cinza, onde uma espada em forma de balança brilhava.

— Sabe o que significa? Mesmo eu sabendo qual será a sua resposta… — Uma mulher em dias de fúria?

— Não. Combate por conta da espada. A cor preta representa a peste negra. É o símbolo dos Highwind, foram os primeiros a inventarem uma forma eficaz de enfrentar o grande mal e triunfar, durante a nossa tenebrosa idade das trevas.

— Ah… — respondeu Arthur sem entender quase nada do que Thiago havia lhe dito, mas se estava na mente do bardo, então devia ser importante.

As estruturas que foram construídas eram impressionantes por conta do tamanho do trabalho que havia sido posto ali no dia anterior. Quando havia chegado, apenas o esqueleto estava montado, mas hoje o rapaz era capaz de ver a cancha de batalha dos cavaleiros em todo o seu esplendor. De um de seus lados, dando as pessoas mais ricas e importantes de Kyveth uma visão muito vantajosa se comparada às dos demais lugares, estava construída a tribuna de honra. Qualquer uma das outras pessoas poderia assistir às justas com o leve incômodo da parede de madeira que se erguia ali, enquanto o andar superior estava destinado ao rei e seus convidados de honra. Àquela hora da manhã, um pouco antes de o evento começar, estava o grande rei de Kyveth, Richard Lionhart, ao lado de Reed, sua esposa de beleza sobrenatural, carregando o recém-nascido primogênito Willian. Em meio a confusão de pessoas andando de um lado para o outro, havia cavaleiros notáveis, checando seus cavalos e acariciando a cabeça dos animais com calma enquanto seus escudeiros traziam suas armaduras e eles se preparavam para as justas. Naquele momento, eram todos amigos, mas quando as cornetas soassem todos seriam rivais buscando a premiação de dez mil moedas de ouro.

— Está chegando a hora, Arthur. Dentro de alguns minutos, você irá para a cancha e eu ficarei aqui nas justas. Fui contratado para compor melodias sobre o grande campeão. Se posso lhe dar um último conselho, homem, é para tomar cuidado com as garotas que flerta. Uma enorme guerra já foi causada, dez mil homens foram mortos em suas armaduras, tudo isso porque duas pessoas importantes disputaram o coração de uma única mulher... Então cuidado. Alguns homens são ciumentos. Além disso, quero ver alguns de meus amigos bardos contando feitos sobre o seu desempenho no combate. Combinado? Não me decepcione! — Thiago falava com certa seriedade em sua voz, fazendo com que Arthur sentisse um pouco de pressão.

— Tentarei fazer isso, senhor — respondeu Arthur, balançando sua cabeça.

Foi nesse exato momento que o bardo se desvinculou de seu amigo, deixando-o só em meio a multidão de plebeus, cavaleiros e escudeiros que se juntavam no meio das ruas. O homem balançou sua cabeça para os lados durante poucos segundos e então sentiu mais uma vez seu ombro doer, olhou para o lado esquerdo e viu que uma estranha coruja o observava — contudo, não foi isso o que chamou sua atenção e sim a mulher de pele branca como a neve e cabelos curtos e negros. Joy também estaria participando daquele pequeno torneio; seus olhos de um azul claríssimo fitavam Arthur com certo divertimento.

No dia anterior, os dois haviam lutado lado a lado quando foram atacados pelos bandidos que se intitulavam Crânios Rachados, mas nos próximos minutos, um enfrentaria o outro num combate sem mortes, mas com apenas um vencedor.

Ele suspirou e caminhou em direção a pequena arena feita para a liça, enquanto fazia uma nota mental para questionar Thiago sobre a gangue que o havia atacado no dia anterior. Será que aqueles jovens bandoleiros tinham algum envolvimento com o seu passado? Bom, isso apenas as areias do tempo poderiam lhe dizer.

Arthur não podia usar sua espada, pois a mesma tinha fio cortante e isso era contra as regras do torneio — para não ter o risco de ocorrer mortes — e sua arma laminada havia sido trocada por uma esfera de metal presa a um bastão de madeira: uma maça. Outros guerreiros receberam armamentos parecidos e o Filho da Tormenta ficou aliviado quando notou que não teria que enfrentar a Skadyr de Joy.

Diferentemente do torneio dos nobres, que era uma competição repleta de regras, a liça, ou o Combate de Verão dos Aspirantes ao Exército, como costumava ser chamado pelos nobres era simples: diversos guerreiros em uma pequena arena, um enfrentando o outro até que restasse apenas um em pé. O vencedor ganharia um prêmio de mil moedas de ouro e todos aqueles que tivessem algum destaque seriam convocados para fazer parte do exército de alguém que tivesse dinheiro para bancá-lo.

Quando a pomba branca voou, cerca de trinta guerreiros se jogaram em meio a uma luta, onde atingir um oponente pelas costas era a melhor saída para se sair vencedor enquanto muitos plebeus gritavam e aplaudiam enquanto faziam suas apostas. Muitos daqueles eram espécies de espiões que observavam quem poderia lutar em guerras, mas Joy, trajando em seu corpo sua armadura com elmo de lobo, não parecia ter percebido ou fingia não notar os gritos atrás de si, pois num movimento rápido de seu escudo ela aparava um golpe que descia contra o seu ombro e logo em seguida contra-atacava, derrubando o seu primeiro oponente com um golpe doloroso em sua face.

— A Loba do Norte esmagará suas bolas! — provocou a mulher enquanto dois guerreiros estúpidos avançavam em sua direção, achando que poderiam surpreendê-la; azar o deles, Joy era esperta o suficiente para não cair naquele truque.

Os dois atacaram ao mesmo tempo e, com apenas dois segundos de diferença um do outro, caíram no chão.

Em uma das áreas daquela arena oval, Joy ganhara o seu devido destaque e notara que, no lado oposto ao seu, alguém também conseguia começar de forma primorosa aquele duelo. Ao apertar os olhos, viu que era o rapaz sem memória do dia anterior que, segundo boatos, agora era o favorito de Thiago — e ele tinha muito sucesso ao derrubar no chão um brutamonte de quase dois metros de altura e o dobro disso de músculos. A cada novo oponente derrotado, ele via aquele cavaleiro que julgava ser a última lembrança de sua cabeça antes de acordar na caravana de Thiago.

Conforme os golpes eram dados e as pessoas caíam, as apostas começavam a cair em cima dos favoritos para aquela tarde. Enquanto as moedas eram passadas de mão em mão, quatro mercenários de Agrak, que não haviam sido vistos até aquele momento, uniram suas forças numa aliança que duraria até os três ficarem em pé, quando se atacariam. O alvo dos agrakianos também já estava escolhido: após fazerem uma triangulação em volta de uma figura de armadura completa e prateada, carregando entalhes da igreja incrustados no aço de sua veste, atacaram e o guerreiro que empunhava em sua mão um pesado mangual de duas mãos derrubou os três, quebrando o braço de um desses com um forte golpe dado na diagonal. Surgia ali a figura de um cavaleiro misterioso e muitas garotas já soltavam suspiros apaixonados.

A liça rugia por muitos minutos e um pequeno tapete de corpos caídos, sendo estes de pessoas realmente desmaiadas ou apenas de alguns que não queriam fugir por conta da vergonha obtida por serem derrotados tão rapidamente, começava a se formar no chão, atrapalhando a movimentação daqueles que ainda sobreviviam àquele combate. Enquanto bardos já batiam em seus tambores ou tocavam seus alaúdes, aproveitando para inspirar os guerreiros e também praticar as baladas que movimentariam as tavernas naquela noite, Arthur ajoelhava-se com velocidade para desviar da investida de uma enorme espada de duas mãos que veio de encontro com o seu crânio que, apesar de não ter lâmina, ainda era pesada o suficiente para partir uma cabeça em duas. Usando o peso de seu corpo, ele jogou-se contra o guerreiro, agarrando sua cintura e levando-o ao chão.

Foi um golpe ousado de Arthur e ele poderia ter perdido se a sorte não estivesse ao seu favor naquele momento, pois apenas conseguiu derrubar o seu inimigo pois havia um corpo caído atrás dele, que desequilibrou-o ainda mais. O guerreiro caído deixou sua espada de lado e tentou enforcar Arthur com suas duas mãos, contudo, quando conseguiu alcançar o pescoço dele sua visão era apenas um borrão ao invés da arena construída para o Combate de Verão. O Filho da Tormenta finalizou-o com um golpe de sua maça na sua têmpora e levantou-se logo em seguida, sobre os aplausos da plateia, pois havia acabado de derrotar Owain, o grande favorito de muitos. A cabeça de Arthur girava, pois as mãos do seu oponente havia reduzido um pouco o seu ar. Ele ficou alguns segundos parados, enquanto sua respiração arfava. Nesse exato momento, do lado extremo da cancha, a Loba do Norte, já desarmada, quebrava o nariz de um homem ruivo com um gancho de direita certeiro em sua face e sorria de forma prazerosa, mesmo que o elmo com formato da cabeça de um lobo tampasse o seu rosto. Em seguida, a mulher fitou Arthur. Restava apenas ela, ele e o cavaleiro misterioso. Alguns plebeus que não haviam apostado nos já derrotados, gritavam agora o nome daqueles que restavam em pé.

Os três finalistas se entreolhavam e parecia ser uma parada amistosa de ambos, que recuperavam o seu fôlego enquanto preparavam-se para o combate final. Joy havia deixado o seu escudo no chão e usava agora apenas sua maça, o mesmo valia para Arthur. O cavaleiro misterioso também havia trocado sua arma, pegando de um dos derrotados uma arma quase igual à de seus oponentes. Foram alguns segundos de tensão, a plateia urrava, pedindo para que aquilo acabasse de forma épica e as melodias diferenciadas dos bardos, que tentavam captar a atenção tanto dos lutadores quanto da plateia, inspirava-os. Após um último suspiro incerto de Arthur, os três correram. Não tinham alvos planejados e alianças montadas. Era apenas um aproveitando uma falha na defesa do seu oponente que atacaria sem um pingo de pesar. Os primeiros movimentos ofensivos foram provenientes de Arthur e do cavaleiro misterioso, enquanto Joy recuava um passo para trás, evitando assim de ser atingida pelo golpe da maça do homem trajando um elmo. O Filho da Tormenta, o alvo original do golpe, conseguiu apenas desviar a enorme bola de metal que vinha em direção ao seu corpo utilizando o cabo de sua arma, mas ao fazer isso, acabara desarmado; seu oponente, além de habilidoso, era também inteligente.

O movimento feito pelo cavaleiro misterioso nunca tivera a intenção de acertar Arthur e ele apenas foi notar isso quando sua arma foi tirada de suas mãos pelas correntes que sustentavam o mangual do outro.

— Idiota — sussurrou Joy, de forma que ninguém ali, se não ela, fosse capaz de ouvir. Ele estava desarmado e em grande desvantagem contra o ser misterioso que girava o seu mangual no ar e preparava o golpe final.

Arthur não era capaz de ver, contudo o seu inimigo naquele exato momento, em que a pesada esfera de metal de seu mangual descia num golpe de cima contra a cabeça do outro homem, sorria de prazer. Contudo, novamente aquela energia que havia tomado conta de seu corpo no dia anterior e feito ele derrotar o bando conhecido como Crânios Rachados, novamente havia aparecido e ele não sabia explicar o motivo, apenas sabia que deveria aproveitar a oportunidade recebida. Conseguiu desviar, com um rolamento para o lado esquerdo, justamente onde estava sua arma, da esfera de metal no exato momento em que ela tocou os fios de sua cabeça desprotegida e a plateia urrou em aplausos. Para estes, a presença da Loba do Norte era extremamente irrelevante naquele momento, pois o combate mais emocionante estava acontecendo e certamente aquele que saísse vencedor dali seria mais aplaudido do que o verdadeiro campeão.

O giro de Arthur foi perfeito e caiu exatamente ao lado de sua maça e então, com um rápido movimento de seus braços, jogou o pequeno escudo de madeira que protegia o seu braço em direção ao cavaleiro misterioso e quando o mesmo conseguiu efetuar a sua esquiva, o Filho da Tormenta pulou, surpreendendo-o com um golpe em direção ao seu peito. O cavaleiro misterioso caiu de costas no chão, perdendo o elmo que lhe cobria a face e Arthur viu a face de Mark Boemundo. Reparou em sua pele morena e cabelos castanhos, mas contudo, não teve muito tempo para estudar os demais traços do rapaz, pois no exato momento em que havia derrotado o ex-ser misterioso, Joy atacou.

Arthur ainda tinha aquela energia em seu corpo, por isso, para ele não foi difícil de aparar o primeiro golpe da Loba do Norte, contudo a morena havia se poupado e também tinha folego para manter o ritmo de seus golpes e como ela havia surpreendido o seu inimigo, era ele quem teria de sustentar os rápidos golpes vindos da loba do norte e aquilo durou por longos minutos, levando todos que observavam ao completo delírio.

Uma garota suspirou de amores e xingou Joy quando a mesma finalmente conseguiu romper a defesa de seu adversário.

A Loba do Norte girou sua maça num rápido movimento selvagem que confundiu a cabeça de Arthur e o golpe que viria atingir o seu peito, acabou descendo um pouco mais e acertou a perna do rapaz, desequilibrando-o e fazendo-o cair no chão com o impacto recebido na região.

Joy pisou em seu peito com seus pés e sorriu. O corpo da garota estava umedecido por causa do suor que pingava de seus cabelos negros. O sol que batia em direção ao seu rosto dava um contraste a mais na beleza da mulher, contudo, Arthur não pode admirar muito, pois sentiu a mão esquerda dela em seu pescoço e em seguida a outra atingiu o seu rosto com um forte soco.

O público, ganhando ou não suas apostas, aplaudiu o desempenho dos participantes no mesmo momento em que muitos clérigos pulavam a cerca de madeira para prestarem ajuda aos feridos.

Havia um vencedor e, sendo assim, havia também farra.

Em cada extremo da giostra, sob os aplausos extasiados de todas as pessoas que se reuniam nas arquibancadas laterais e também o alaranjado do sol poente, os dois cavaleiros se encaravam ferozmente. Ou talvez isso não acontecesse e apenas fosse uma ilusão, já que com aqueles enormes elmos de ferro em suas cabeças, a visão era completamente estreita e limitada. O suor descia por suas testas e acrescentava peso em suas enormes armaduras de aço ornamentado. O último combate daquele dia estava por começar e Arthur, depois do seu combate contra Joy, tentava encontrar um lugar na platéia de plebeus para acompanhar a decisão.

Na extremidade direita, estava um homem alto e musculoso, sua armadura era uma das coisas mais belas vistas ali: polida, sobre o seu peito estava um fino pano vermelho e em dourado, posicionado exatamente onde o coração deveria ficar, havia bordado em fios dourados a cabeça de um leão. Richard Lionhart, o grande rei de Kyveth, era o seu nome e carregava em sua mão uma enorme lança, muito maior do que uma de combate. Media cerca de quatro ou cinco metros de comprimento e era colorida, com panos de diferentes tonalidades que a enfeitavam. Estava montado em cima de um cavalo marrom e o seu elmo, que protegia sua face completamente, tinha a sua coroa incrustada. Na extremidade esquerda, o outro finalista não parecia se intimidar com a perspectiva de enfrentar o rei. Edward Woodstock, o cavaleiro negro, era seu nome e sua armadura fazia jus ao apelido que recebia de seus oponentes: era pintada em preto, quase não havia detalhes de outras cores, a única coisa que ali entrava em contraste com a escuridão era o símbolo de sua família bordado em branco e dourado no tronco de sua veste: uma enorme árvore completamente sem folhas. A sua lança, diferentemente da que Richard utilizava, também era simples, tendo exatamente as mesmas cores de suas demais vestes. O cavalo que montava era marrom escuro e o animal, assim como o seu dono, pareciam encarar os seus oponentes com certa seriedade no olhar.

Um dos padres da igreja começou a fazer as preces finais e quando sua voz soou, a multidão se calou.

— Que o Criador abençoe os dois valorosos guerreiros que aqui competem e que sua coragem no campo de batalha o deixe orgulhoso. — finalizou, enquanto abria as mãos e soltava um pombo branco.
A luta, finalmente, havia começado.

O cavalo de Richard avançou velozmente, enquanto ele apontava sua lança enfeitada em direção ao peito negro de seu adversário, enquanto o Príncipe Negro fazia o mesmo que o Rei, mirando a arma que segurava em sua mão direita em direção a armadura de Lionhart, exatamente onde estava a cabeça do leão. Estilhaços voaram para todos os lados possíveis com o impacto das pontas das armas que explodiram ao entrar em contato com o escudo de seus oponentes. Tanto o rei quanto o nobre haviam conseguido efetuar aquela proeza, houve vivas.

Quando voltaram para seus devidos lugares com os seus cavalos, ganharam lanças novas e ambos não esperaram muito para novamente cavalgarem em direção ao outro. Conforme a pata dos corcéis tocava o chão, a areia já pisoteada durante um dia inteiro era levantada, fazendo algumas pessoas tossirem, mas ninguém se importava com aquilo, pois o espetáculo que estava ocorrendo diante de seus olhos faziam pessoas esquecerem de todos os seus problemas. Edward, dessa vez, havia batido sua perna no tronco de seu equino com mais força, indicando para o mesmo ir com velocidade total, enquanto Richard, tendo um pouco mais de cautela em seu movimento foi aumentando a velocidade de sua montaria ao longo do percurso. Assim que se encontraram, era praticamente impossível definir qual seria o vencedor, pois o Príncipe Negro estendeu o seu corpo para frente, enquanto erguia o seu escudo e golpeava fortemente o peito de Richard. A vitória parecia certa, já que ele pode sentir a madeira de sua arma tocando o peito do adversário, mas o Rei não tinha o respeito de todos apenas porque era o sucessor de seu pai e sim porque era forte e esperto, num último momento, quando ninguém mais pensava que fosse possível, ele fez um movimento minúsculo e rápido, tirando-se do trajeto da lança que vinha em sua direção e tão veloz quanto um piscar de olhos a sua própria arma impactou-se em cheio contra o peito de Edward, que quebrou-se com um grande estrondo. O cavaleiro de armadura negra foi jogado da sela na qual montava e o seu corpo acertou em cheio a areia quente.

Abalado pelo impacto do golpe, Edward retirou o elmo que protegia sua cabeça num sinal de fúria que não durou muitos segundos, contudo, ninguém havia percebido aquilo. Pois todos estavam ocupados aplaudindo o grande campeão. Richard Lionhart havia vencido e agora parecia ignorar toda a salva de palmas que recebia, pois avançava o seu corcel em direção a sua noiva e depositava sobre o seu colo uma pequena e delicada coroa feita com pétalas de rosas vermelhas.

Muitos na multidão suspiraram apaixonados pelo rei, contudo, em meio as comemorações, nenhum dos presentes ali foi capaz de perceber que um homem ensanguentado havia acabado de entrar pelos portões da cidade e caía de joelhos no chão.


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