Fiéis Infiéis escrita por Samuel Cardeal


Capítulo 8
Capítulo 7: A Sabatina




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Depois da noite maravilhosa que tive com Adelaide, acordei renovado. Ela nos preparou um café da manhã delicioso e, antes de ir trabalhar, repetimos a dose do que fizemos à noite no chuveiro. Já na empresa, o dia passou rápido, e foi ótimo. Nelson logo notou meu humor diferente, e me abordou com sua discrição de sempre.

— Que carinha boa é essa, Dedé? Conseguiu a gostosa de volta?

— Para de falar bobagens, Nelson! Qualquer hora o chefe vai te pegar falando essas porcarias e vai te “sentar no colo”.

— Aquele cara me adora. Agora, conta pro seu brow o que aconteceu.

— Vai trabalhar, cara. Eu tenho o serviço de ontem todo pra fazer.

— Depois você faz. Anda, conta logo!

A insistência de Nelson me venceu, e eu acabei contando tudo. Ele ficou decepcionado por eu não ter conseguido Aliane de volta, mas disse que estava feliz por mim e não conversamos mais sobre o assunto. Passei o resto do dia colocando o serviço em dia, mas não conseguia para de pensar na noite anterior e no que aconteceu no chuveiro. Desde que éramos namorados não ficávamos tão fogosos. Só de reviver em minha mente aqueles momentos, o calor tomava meu corpo e eu sentia o volume forçando o zíper da calça; não via a hora de voltar para casa.

*

Quando o relógio marcou 17 horas, eu já estava a postos para sair, feito um corredor esperando o tiro de largada. Dispensei o metrô e peguei um táxi, a ocasião era especial e um gasto a mais não ia fazer mal. Cheguei em casa com o dia ainda bem claro; fui direto para o quarto e me livrei das roupas. Tomei um banho demorado e desci de volta para a sala. Olhei para os copos no armário de vidro e para as garrafas de bebidas. Eu não costumava mexer ali, aqueles vinhos e licores eram coisa da Adelaide, que ainda assim só os usava quando tínhamos alguma visita, coisa cada vez mais rara.

Abri a porta e escolhi um vinho, o que me pareceu mais caro, e peguei a taça mais refinada que encontrei. Troquei um CD do carrossel pela coletânea do Waldick Soriano e me servi um pouco da bebida para acompanhar a música. O clima estava perfeito, faltava apenas Adelaide chegar e a noite seria inesquecível.

Meia hora depois, ela chegou. Levantei-me e fui em sua direção, segurando sua cintura e tirando-a para uma dança. No entanto, após um ou dois passos, ela me empurrou e pegou dentro da bolsa, parecendo com raiva, seu celular, colocando a tela bem perto do meu rosto, mostrando fotos que tirara há pouco. Aliane e Emílio, em um clima mais que romântico, comendo macarrão como os cachorrinhos do filme.

Ali eu soube, a noite estava acabada.

*

Após termos a noite estragada pela felicidade dos nossos (ex) amantes, jantamos uma comida congelada qualquer e fomos dormir. Não havia nada a ser dito; não naquele momento. A noite foi longa, com meu sono sendo interrompido com Adelaide falando enquanto dormia. Quando eu conseguia pegar no sono, também não durava muito, já que até em meus sonhos eu via os dois comedores de macarrão apaixonados. Foi difícil chegar inteiro até o amanhecer.

Quando, enfim, me levantei, minha esposa estava sentada na escrivaninha próxima à cama, analisando um caderno com o olhar compenetrado, mordiscando um lápis preto e fazendo algumas caretas, vez ou outra. Fui até ela e a beijei com a empolgação de uma tartaruga paralítica e me encaminhei para a cozinha; eu estava faminto.

Ainda descendo as escadas, ouvi os passos apressados de Adelaide aumentando em minha direção. No entanto, continuei andando, entrei na cozinha e fui direto até a geladeira. Estendi a mão para pegar uma caixa de leite, apanhei um copo no escorredor e o enchi até a borda, mas, antes que eu pudesse provar o líquido, ela se dirigiu a mim, agitada, gesticulando como louca.

— Precisamos reunir informações! — disse.

— Hoje é sábado! Por que acordou tão cedo?

— Precisamos reunir informações!

— Do que está falando?

— Informações! Sobre os dois, Emílio e Aliane.

— Posso comer primeiro? — perguntei, tentando não parecer muito sério. Na verdade eu só conseguia pensar no vazio do meu estômago.

— Você come enquanto responde! Vamos começar.

— Respondo o quê?

— Eu fiz um questionário, coisas sobre Aliane e Emílio. A minha parte está quase toda respondida, o restante teremos que investigar. Agora preciso que você me fale o que sabe sobre ela, então podemos ir para a próxima fase.

— Tá bom, pode começar. Mas já vou adiantando que eu não sei muito sobre ela. Não passamos muito tempo conversando — acho que não devia ter dito aquilo. Nós sabíamos o que acontecia quando encontrávamos nossos amantes, mas, assim como eu fazia, Adelaide devia evitar pensar nisso.

— Responda o que souber. Vamos lá. Pergunta 1: em que ela trabalha?

— Não sei.

— Ela estuda o quê?

— Sei que faz faculdade, mas não faço ideia de que curso.

— Mora com quem?

— Também não sei.

— Onde mora?

— Sei lá!

— Assim fica difícil, Anderson! Não é possível que nunca pararam 10 minutos para conversar!

— Meu amor, nunca foi o objetivo conversarmos com eles, e, afinal...

— Tudo bem, tudo bem! Não precisamos falar sobre isso. Vamos continuar, ainda faltam 87 perguntas.

— 87!? — espantei-me, mas Adelaide ignorou, seguindo com o questionário.

— Pergunta 5...

*

O interrogatório durou uma eternidade e, como eu já esperava, não nos levou a lugar nenhum; eu realmente não sabia nada sobre Aliane. Isso me trouxe pensamentos um pouco perturbadores, pois há dois anos eu vinha me relacionando “intimamente” com uma mulher cuja a vida eu nada sabia. Ao fim da interminável lista de perguntas, estávamos exaustos, e eu já estava com fome novamente. Olhei no relógio e constatei que estava quase no horário do almoço.

— E agora, amor? — questionei. — Não temos nada.

— Agora, meu querido, vamos para a próxima fase.

— E isso seria...?

— Trabalho de campo! Agora é a hora de colher os dados in loco.

— Como? Vamos bancar os detetives?

— Exato!

— Isso vai dar “ruim”!

— Vai dar certo! Só precisamos nos preparar para a ação.

— Tipo... Fazendo um curso de detetive particular?

— Não, Anderson, não temos tempo pra isso. Eu já assisti todas as melhores séries policiais que existem por aí, e sei exatamente o que vamos fazer. Primeiro passo: equipamento.

— Do que precisamos?

— Deixa isso comigo. Vai se vestir, vou tirar o carro da garagem.

*

Saímos para comer em um restaurante, pois com toda aquela “perguntação” não tivemos tempo de preparar nada, e os congelados acabaram. Depois de comer, Adelaide nos levou até uma grande loja de departamento, dizendo que encontraríamos lá tudo que precisávamos. Eu nunca havia entrado naquele estabelecimento, e me surpreendi com a enormidade do lugar. Rapidamente, Adelaide pegou um carrinho e avançamos pelos corredores.

— Então, o que vamos comprar? — perguntei.

— Tudo o que for útil para espionagem.

Sem se alongar na resposta, ela acelerou a marcha e começou a pegar mercadorias diversas nas prateleiras: lanterna, canivete, fita adesiva, filmadora, até mesmo sobretudos pretos.

— Chocolate? — questionei, ao vê-la pegar várias barras de chocolate.

— Sim! É pra tensão. Ficar de tocaia pode ser cansativo.

— Tocaia? Você não disse nada sobre tocaia.

— Precisamos conhecer a rotina dos dois, e não há outra maneira eficaz de conseguir isso a não ser ficando de tocaia.

— E isso vai demorar?

— Talvez. Provavelmente, sim. Mas pode ser que a gente tenha sorte e consiga tudo que precisamos em apenas alguns dias.

— Dias? Pensei que seria só hoje. Estou usando minha última folga, não podemos passar dias de tocaia.

— Eu vou adiantar minhas férias, você vai ter que fazer a mesma coisa. E você tem dois períodos vencidos na empresa, já passou da hora de entrar de férias!

Não respondi, apenas continuei andando ao seu lado, agora já a caminho dos caixas. Analisei o carrinho por um momento, e comecei a pensar o quanto aquilo era insano. Além disso, iria custar uma fortuna.

— Isso vai ficar “os olhos da cara”!

— Não se preocupe, aqui eles parcelam em até 12 vezes.

— Como se isso significasse que não vamos pagar de qualquer maneira — bufei; Adelaide ergueu as sobrancelhas e me lançou um olhar de reprovação. Quando uma mulher olha assim para você, o mais certo é se calar e evitar contato visual nos próximos minutos, e foi exatamente isso que eu fiz.

Saímos da loja com tudo ensacado, e foi preciso bastante esforço para fazer toda aquela “tralha” caber no porta-malas. Entramos no carro, prendi o cinto de segurança enquanto minha esposa ligava o som. Eu já estava tenso, e aquele rock em inglês não estava ajudando em nada.

— E agora, o que vamos fazer?

— Vamos a campo, baby! — ela sorriu, piscando de lado para mim.

Cada vez mais eu achava que estávamos fazendo uma loucura. Mas agora era tarde demais para mudar de ideia.


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