O Grande Palco da Vida - Live escrita por Celso Innocente


Capítulo 33
Angústia e dor.




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Às nove horas da manhã seguinte, estávamos todos novamente no hospital, inclusive Tony, que se levantou primeiro que todos nós.

Às dez horas me reuni com os músicos e sem nos preocupar com alguns jornalistas, ficamos discutindo assuntos que em nada adiantaria para nosso pequeno artista. Eram assuntos de passagens acontecidas durante nossas viagens e que todos tinham curiosidades em comentar. Cada um de nós tinha muitas coisas a comentar, a respeito das peripécias de nosso amiguinho arteiro e bondoso. Tudo bem que nos últimos dias, estava um tanto malcriado, acho que era o stress da responsabilidade e da vida corrida e cansativa.

De repente, um repórter se aproximou e outros o acompanharam. O primeiro a chegar me perguntou:

— As últimas notícias médicas lhes dão alguma esperança?

— Pra ser sincero — respondi abatido. — Nenhuma notícia médica me traz grande esperança. O próprio doutor Hernandes já me disse que a medicina está fazendo tudo o que é possível, mas que não nos dá nenhuma esperança. Somente um milagre poderá salvar a vida de Regis.

— Você não acredita que ele sobreviva?

— Claro que acredito! Não estou com esperanças nos médicos! Eles são apenas homens com todas nossas limitações. E além do mais, já fez o que poderiam. Mas acredito em Deus!

— Você sabe sobre o estado do menino?

— Ele continua em coma. Se acordar deverá ser induzido a continuar em coma! Por causa do coração que não pode pulsar forte.

— Quanto tempo ele deverá permanecer em coma?

— Até que se arranje um doador para fazer um transplante.

— Será necessário um transplante de coração?

— O médico insinuou esta hipótese, mas não tocou mais no assunto.

— Esse crime está sendo comentado pela polícia como um acidente. O que você acha?

— Um acidente? Pra começar, Regis estava na praia se divertindo, pessoas cruéis o sequestram e o ameaçam com um punhal. A polícia aparece e este homem o esfaqueia sem piedade, como se ele fosse um… porquinho! Você chama isso de acidente?

— Segundo consta, o homem se apavorou com a chegada da polícia. Você não acha que foi falha da polícia? Que ela deveria ter analisado melhor os fatos e agido com mais cautela?

— A polícia estava cumprindo seu dever e agiu com cautela até demais. Talvez tenha faltado melhor planejamento. Mas como eles poderiam esperar que o cara estivesse em cima do menino, com um punhal nas mãos?

— Como ocorreu o incidente?

— Eu cheguei depois que o disparo ocorreu. Mas pelo que vi, Regis estava sobre o carpete da sala e o homem o ameaçava com o punhal, pois o resgate não fora pago pela família conforme combinado. Com a invasão da polícia, ele se apavorou de fato e acabou por desferir um golpe violento sobre o tórax de Regis.

— Por que a família deixou de pagar o resgate?

— A polícia não permitiu!

— Significa outra falha da polícia!

— Pode ser! Mas quem garante que eles nos devolveriam Regis vivo, após receber o resgate?

— Qual era o valor?

— Vinte milhões!

— A família estava com esse dinheiro?

— O pai de Regis já estava indo pro local entregar o dinheiro, quando a polícia o interceptou.

— Se a policia tivesse deixado concretizar o pagamento, o final desta estória poderia ser outro!

— Com certeza! — dei de ombros. — Regis não estaria aqui! Talvez não estaria em casa também!

— O que você quer dizer, defendendo a polícia?

— Você sabe o que quero dizer! Normalmente a justiça bloqueia os bens da família, quando há casos de sequestro. Nem sei como não fizeram isso com a família Moura!

— Como é o garoto Regis, em sua vida de criança?

— Uma criança que juro a vocês, jamais fez mal a quem quer que seja. Aliás, só fez o bem. Só pra que tenham uma ideia, há poucos dias antes do sequestro, estávamos no Rio de Janeiro e assistimos pela tevê um noticiário, o qual mostrava que a chuva deixara centenas de desabrigados, numa cidade do interior de São Paulo, onde deveríamos fazer um show em poucos dias; assistindo aquilo, Regis me disse, Willian, todo o dinheiro do show, doaremos aos desabrigados pela chuva. Isto é só um exemplo. Eu ficaria aqui, horas, dando outros exemplos semelhantes. E não era pra fazer média, pois Regis nunca comentava com ninguém sobre suas doações. Nem com sua equipe! Eu só sabia, porque era eu quem controlava o dinheiro. Ele me dizia que na Bíblia esta escrito: “Não deixe que a sua mão direita veja o bem que a sua mão esquerda faça a alguém”. É mais ou menos isso. Sou leigo em religião.

— Então ele sempre doava parte do dinheiro de seus shows para alguma coisa?

— Sempre! Foram tantas coisas boas que este garoto fez em nosso mundo, que eu é quem lhe pergunto por quê? Por que matá-lo?

— E nada disso era divulgado?

— Por ele não! É claro que eu, tendo que prestar contas a seu pai, exigia recibos dessas suas atitudes. Mesmo porque, existe um cara bravo chamado imposto de renda, que não permite que minha mão esquerda não saiba o que faz à direita. Mas o menino em si não sabia disso! Ele é só uma criança, pra se preocupar com... Burocracias!

— O que é Regis pra você? Mais do que um menino artista?

— Pra mim é como se ele fosse um filho! Mas eu juro! Se ele voltar pra gente, eu o protegerei com a minha vida. Não me afastarei dele por nenhum instante. Mesmo durante o banho, estarei grudado na porta do banheiro. Apesar de que, eu nunca me descuidei dele, a não ser por alguns minutos... naquela praia... cheia de banhistas. Como eu poderia pensar que no meio de tantas pessoas, que têm tanto carinho especial por Regis, pudesse surgir criminosos?

Poucos minutos após aquela pequena entrevista, saiu o último boletim médico sobre a saúde de Luís Marcos. O boletim dizia que ele já recobrara os sentidos e estava fora do risco de morte. Sua permanência no hospital, sempre acompanhado por dois policiais e algumas pessoas de sua família, ainda se fazia necessária, para o restabelecimento e curativos.

Por medida de cautela, os familiares de Luís sempre entravam nas dependências do hospital, por entrada alternativa, evitando assim o encontro com qualquer um de nós.

Uma hora depois, saíra também, mais um boletim sobre o estado de Regis. O qual, como sempre, não trazia nenhuma esperança. Ele ainda estava em coma profundo e seu risco de morte ainda era muito grande.

Às doze horas fomos almoçar e não mais retornei ao hospital naquele dia. O músico Daniel, voltaria algumas horas depois e se prontificou a me ligar, para transmitir qualquer novidade. Se bem, que a televisão que eu deixava sempre ligada, se encarregava com muita precisão em transmitir todas as novidades e todos os boletins médicos. Com isso, aproveitei para ir até a delegacia, a fim de saber alguma coisa sobre os sequestradores. Por sorte encontrei o delegado, doutor João, que me pediu para entrar em sua sala:

— E aí doutor, como está caminhando o caso com os sequestradores?

— Estão presos! São quatro. Dois homens estão aqui comigo, o outro está no hospital, mas virá pra cá assim que tiver alta e uma mulher, que foi encaminhada a um presídio feminino.

— O senhor chegou a falar com eles?

— Conversamos bastante. Uma conversa apertada. Eles disseram que tinham a intenção de sequestrar o menino durante a viagem de vocês, entre São Paulo e Rio de Janeiro, mas não tiveram chance, pois vocês não fizeram nenhuma parada durante todo o percurso.

— Quer dizer que eles nos seguiram desde São Paulo?

— Isso mesmo! Fazia dias que eles estavam na cola de vocês! Acompanharam todos os shows de Regis e só conseguiram capturá-lo na praia. Foi até bom, pois eles disseram que se não tivessem conseguido pegá-lo sozinho, iriam fazer à mão armada. Com isto o sequestro poderia ter sido mais grave. Isso... quero dizer... na captura, pois sei que no desfecho o caso é grave. Estou acompanhando o caso pelos jornais e sei que o estado do menino é grave.

— Gravíssimo!

— É! Isso revolta a gente.

— E eles? O que vai acontecer a eles? Deverão sair logo da cadeia?

— Estão com um advogado. Ele esteve aqui falando comigo. Disse que está tentando conseguir um habeas corpus. Mas isso não é comigo! Só um juiz poderá conceder habeas corpus e nesse caso duvido que vá conseguir, apesar deles serem réus primários, pois a vítima, além de ser criança é muito conhecida, ou seja, diferente de um estranho, onde a imprensa não fica em cima. No caso de Regis, a imprensa e a população cobram muito. Outra agravante é que Regis saiu dessa história gravemente ferido. Além do mais, além deles terem sido presos em flagrante, o crime praticado por eles é considerado hediondo, onde não há pagamento de fiança.

— Como foi depois que pegaram Regis na praia? Quer dizer, eles falaram alguma coisa?

— Ficaram em São Gonçalo até a poucos dias. Só vieram pra São Paulo, após ligarem pra vocês a primeira vez e o menino ter dito onde estavam.

— Chegaram a maltratar Regis no cativeiro?

— Infelizmente sim!

— Por quê?

— A pior tortura foi deixá-lo amarrado na cama.

— Por quê?

— Pra que ele não fugisse! Quando você socorreu o menino, após o incidente, você não percebeu que ele estava com hematomas nos pulsos?

— Chegaram a bater nele?

— Mais de uma vez.

— Por que precisavam fazer isso?!

— Você conhece muito bem o menino! Ele no cativeiro não ia se portar como um santinho! Com isso acabou levando alguns safanões.

— É verdade! Regis não ia engolir desaforo, calado!

O delegado jogou um punhado de fotos sobre a mesa, dizendo:

— Veja estas fotos! Os próprios meliantes fizeram. Disseram que o objetivo era enviá-las a vocês, pra pressionarem na agilidade de pagamento do resgate.

— Meus Deus! Eles são doentes mentais! Judiam do menino e ainda fotografam!

— O mais grave, pelo menos pra nós da polícia, é que a mulher chegou a abusar do menino…

— Como abusar?

— Tentou praticar sexo com ele!

— Por quê?

— Desde que foi sequestrado na praia, ele permaneceu praticamente nu. Isso foi um incentivo a ela, quando esteve sozinha com ele.

— Como ele permaneceu nu?

— Os caras não tinham roupa pra ele. Então o deixou todo o tempo apenas de sunga. Só quando vieram pra São Paulo é que deram roupa pra que vestisse, pois não iriam arriscar uma viagem dessas com o menino quase pelado; poderia chamar a atenção.

— Custava ter comprado pelo menos um short e uma camiseta pro menino?

— Mesmo no Rio, eles maltratavam o menino e tiravam fotos, mas estas que lhe mostrei foram feitas aqui em São Paulo. A mulher, apesar de ter tentado abusar dele, disse que não conseguiu grande coisa…

— Claro que não! Ele só tem onze anos!

— É! Mas ela chegou a… Mexer com ele.

— Cretinos!

— Só pra você saber, Luís Marcos, que está no hospital, nunca relou um dedo no menino!

— Como?

— Ele era defensor do menino no cativeiro!

— Defensor? Tentando matá-lo?

— Quando ele estiver aqui, quero falar sobre isso.

À noite, a família Moura, cansada, resolveu retornar para casa para descansar e eu fui passar a noite no hospital, onde fiquei acompanhado por Jardel, João Batista e dezenas de fãs do garoto.

Aproximadamente onze horas da noite, o doutor Hernandes, pela primeira vez desde o incidente, me convidou a entrar no centro de terapia intensiva, para ver Regis, embora ele continuasse em coma e o local fosse de acesso proibido.

Ele parecia estar dormindo em paz, com ar sereno, como se fosse um anjo lindo. Mas continuava tomando soro e com aparelhos eletrônicos, desconhecidos por mim, semelhante a osciloscópio, que media constantemente sua pressão sanguínea, a temperatura de seu corpo e as pulsações cardíacas. Seu corpo despido de roupas estava coberto por um lençol branco e grosso. Não parecia para mim, que seu estado de saúde fosse tão grave como diziam os médicos.

Logo pela manhã de domingo de ramos, em conversa com Daniel, lhe disse:

— Estou pensando em pedir pra trazer nosso ônibus e deixar num estacionamento aqui próximo. Assim a gente fica mais perto do hospital e tem um local pra descansar.

— Acho uma boa ideia! Quer que eu providencie isso?

— Converse com os demais, se eles apoiarem a ideia...

Durante todo o dia de domingo de ramos, passamos no hospital, que continuava cheio de pessoas e jornalistas, mas não fora divulgado nenhuma novidade sobre o estado de saúde do menino.

Todos, inclusive os pais de Regis, concordaram com nossa ideia, então o micro-ônibus fora trazido até o hospital e deixado em estacionamento pago; com isto, a gente ficava no hospital e tinha um local, com cama, água fresca, café e outras vantagens para descansar. Ali a gente tinha frigobar, televisão, ar condicionado e até fogão.

A segunda feira também passou sem novidades. Porém, eu, Pinduca, Jardel e Charles, dormimos no ônibus.

Quase seis horas da manhã do dia vinte e nove de Março, terça feira, novamente convidado e acompanhado pelo doutor Marcio Hernandes, voltei ao CTI para ver Regis, que segundo o próprio médico acabava de acordar e estava sobre efeitos anestésicos, para resistir à forte dor em seu tórax enfaixado e seu coração partido. Ao mesmo instante, o médico pediu para Jardel telefonar com urgência, para a família Moura.

— Willian — pediu o médico. — Você irá vê-lo! Mas por favor, converse muito pouco com ele e aconteça o que acontecer, não chore! Ele pode até chorar! Você não! Não é com prazer que te digo isso, mas o estado dele continua muito grave!

— Oi... — disse-me ele com a vozinha muito fraca. — Porque foi acontecer isso comigo?

— Não se preocupe, Regis. Daqui a pouco você estará bom!

— Onde estão meus pais e Tony?

— Eles estão vindo ver você! Mas é bom você não falar muito!

— Por que eu estou pelado?

Estar nu era o que mais o deixava tímido. Mesmo dentro dos apartamentos de hotéis, ele geralmente já saia do banho vestido, pelo menos com uma cueca. E no caso de sair enrolado só com a toalha, quase sempre, esperava que eu entrasse no banho, para que ele se vestisse.

— Por causa do tratamento! Mas não se preocupe; ninguém descobrirá você! Evite falar!

— Preciso falar, Willian! Não tenho muito tempo!

— Pare de falar bobagens! Você ficará bom! Estou com saudade de seu sorriso bonito!

Ele deu um leve sorriso para satisfazer meu desejo, mostrando a covinha que surgia em sua bochecha toda vez que sorria. Mas logo parou, dizendo:

— Meu coração está doendo muito... Muito mesmo! Tenho vontade de chorar! Não quero morrer! Não quero!

— Você não vai morrer, garoto!

Segurou em minha mão direita e lentamente levou-a até seu rosto pálido e sofrido. Sentindo o calor de minha mão em seu rosto ele tornou a dar um leve sorriso e disse:

— Você me ama. Não é mesmo, Willian?

— Claro que amo você, menino! Você sabe disso!

— Eu te amo muito também!

Naquele instante, o senhor Pedro e dona Odete entraram apressados. Então, Regis voltou a sorrir; embora um sorriso amargo.

— Senti tanta saudade de vocês! — disse ele.

— Nós também, filhinho! — insinuou dona Odete, assustada.

— Cadê o Tony?

— Está ali fora, filho! — respondeu o senhor Pedro.

Sem nada dizer, me retirei, indo até a sala de espera, que estava repleta de visitantes. Acompanhado pelos músicos e João Batista estava Tony. Segurei em sua mãozinha e o levei comigo até o CTI. Ao entrarmos, Regis, talvez para não assustar o maninho, sorriu, se mostrando bastante alegre.

— Tony, eu senti tanta saudade de você!

— Você vai voltar pra casa logo, Regis?

— Vou sim! Não precisa se preocupar!

— Sabe filho — disse o senhor Pedro. — Quando você sarar e voltar a fazer shows, que você tanto gosta, nós viajaremos todos juntos, Eu, você, mamãe, Tony, os músicos… todos.

— É muito tarde agora, papai.

— Não! — assustou-se o senhor Pedro. — Não é tarde, meu filho! Não é!

— Papai, não brigue com Willian! Ele não teve culpa do que aconteceu!

Ninguém havia contado a ele sobre minhas brigas com o senhor Pedro.

— Sei disso, filho! Fique calmo.

— Eu amo o senhor! Amo a mamãe, o Tony, o Willian, os músicos…

— Sabemos disso. Você ama também seus fãs...

— Não tenho fãs! Tenho amigos! Milhões deles! Mas infelizmente… não pude conhecer… a tod…

— Você terá tempo pra conhecê-los, Regis! — insinuei.

Ele tombou sua cabeça de lado e perdeu os sentidos.

— Doutor! — gritei assustado pelo médico.


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Notas finais do capítulo

PS:- No início das postagens desta estória avisei que ela teria duas versões e que até determinado ponto ambas seriam iguais. Este é o ponto. A partir do próximo capítulo cada versão é completamente diferente uma da outra. Convido-o a ler também a versão "O Grande Palco da Vida" a partir do cap.34.



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