O Grande Palco da Vida - Live escrita por Celso Innocente


Capítulo 30
Desaparecimento




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Dia doze em São Gonçalo, onde faríamos show à noite, estivemos de manhã na praia, a fim de tomarmos um pouco de sol e curtir o mar, com intenção de descontrair o menino, que realmente andava diferente, com jeito assustado, nervoso, sensível e até mal educado comigo e com os membros da equipe.

Apenas os músicos Daniel e Pinduca nos acompanharam, mas acabaram ficando parado em uma barraca, a fim, segundo eles, tomarem uma cerveja.

Enquanto Regis, sentado numa cadeira de praia, pertencente ao hotel em que nos hospedamos, tomava água de coco, me levantei e o convidei:

— Vamos entrar um pouco na água!

— Vá você! Estou tomando água de coco. Espero aqui!

— Deixe o coco aí!

— Não quero entrar na água!

— Nunca vi um menino recusar água do mar!

— Pode ir. Depois eu entro!

Saí, indo em direção da água, seguindo até a profundidade de meu peito, onde permaneci me divertindo sozinho.

A praia, apesar do forte calor de início de Março e ser sábado, estava quase vazia e eu, aproveitando que, embora tivéssemos estado em diversas cidades praianas, eu mesmo jamais havia entrado no mar, permaneci pelo menos uns dez minutos dentro da água.

Quando saí do mar, retornando ao encontro de Regis, não o encontrei. As duas cadeiras; as suas e minhas roupas estavam sozinhas. O coco, estranhamente jogado no chão. Regis, desde muito pequeno aprendera que lugar de lixo é no lixo.

Imediatamente me preocupei. Comecei a olhar para todos os lados à sua procura.

— Você está procurando o garoto que estava aí? — perguntou-me um jovem, que estava sentado com a namorada a poucos metros.

— Você o viu? — perguntei-lhe angustiado.

— Chegaram dois homens e levou o garoto — disse o rapaz. — Eles estavam vestidos!

— Daniel e Pinduca! — insinuei.

Já saía em busca dos dois músicos, quando o rapaz ainda disse:

— O garoto parecia não querer ir! Desculpe minha intromissão, mas realmente estávamos observando o menino. Ele se parecia com Regis Moura.

— Isso mesmo! Obrigado! Vou ver se ele está com os músicos!

Na verdade, estava temendo coisa séria. Segui ao encontro de Pinduca e Daniel, que continuavam na mesma barraca, sozinhos.

— Vocês viram Regis? — perguntei de longe.

— Estava com você, Willian! — insinuou Daniel.

— Meu Deus! — apavorei-me. — Sequestraram Regis!

— Calma! Ele deve ter saído! — alegou Pinduca.

Juntos retornamos à praia. O mesmo casal de jovens continuava no mesmo local.

— Não encontrou o menino? — perguntou o moço.

— Nada ainda! — neguei. — Vamos ao hotel. Às vezes ele pode ter ido pra lá! O hotel é perto. Vocês ficarão mais algum tempo por aqui?

— Vamos ficar mais umas duas horas! — alegou a moça.

— Faz um favor pra gente — pedi. — Se ele aparecer, diga que fomos ao hotel!

— Com certeza! — disse o rapaz.

Já íamos saindo com nossas coisas, quando a moça chamou:

— Hei moço!

Olhei para eles.

— Boa sorte! — disse ela.

— Obrigado! — agradeci. — Assim que encontrá-lo volto aqui pra lhes dizer.

Voltamos quase correndo ao hotel, onde encontramos os demais componentes de nossa equipe; porém, ninguém havia visto Regis. Ninguém sabia dar qualquer notícia. Marcos, porém arriscou falar:

— Não se preocupem! Ele deve estar brincando com outros garotos! A gente sabe que ele adora brincar com outros meninos!

— Não sei não! — neguei. — Dois homens o pegaram!

— Como assim? — perguntou Marcos.

— Um casal na praia disse que viu...

— Willian, você conhece Regis melhor do que todos nós! — alegou Marcos.

— Por isso mesmo estou preocupado. Ele adora brincar com outros meninos; mas nunca fez sem antes nos avisar aonde iria.

— Claro que fez! — insistiu Pinduca. — Quantas vezes ele saiu escondido?! Você sabe disso!

— Ele estava de castigo! — justifiquei. — E ele pode até sofrer, mas leva estas coisas a sério.

— O que você acha que aconteceu? — perguntou o motorista.

— Ele foi sequestrado — insinuei convicto.

— Sequestrado!? — admirou-se Juliano. — Na praia repleta de gente?

— Exatamente! Não tinha muita gente na praia!

— Seria impossível! — exclamou Daniel. — Alguém teria visto!

— Aquele casal de jovem viu! — aleguei. — Ele disse que Regis não queria ter acompanhado os dois homens que o levaram.

— O garoto está fazendo arte por aí! — alegou Marcos. — Vamos aguardar um pouco que ele volta!

— Deus te ouça, Marcos! Deus te ouça! Tomara que ele esteja mesmo fazendo arte por aí!

— Daqui a pouco ele aparece. Você vai ver! — insistiu Pinduca.

— Dois homens que não são da equipe, o pegaram! — reafirmei. — Isto é fato! Vou à polícia!

©©©

— Será que o garoto não se afogou no mar? — perguntou o delegado.

— Ele não entrou na água! — neguei. — Eu lhe convidei, mas ele não quis entrar. — Pode ter decidido ir depois.

— Não foi! Acredito que ele tenha sido sequestrado!

— Por quê? Tem algum suspeito?

— Não! Nenhum suspeito! Mas um garoto rico! Famoso! Conhecido! De repente desaparece sem deixar pistas. Um casal de namorados, disse ter visto duas pessoas o levando. Só pode ser sequestro!

— Sequestro?! Numa praia lotada de banhistas?

— Doutor, eu conheço Regis há quase seis anos; ele não faria nada diferente sem antes me consultar.

— Criança é criança, rapaz!

— Regis é uma criança vivida! Mais inteligente do que muitos adultos que eu conheço.

— Está bem! Vou procurar seu artista! Ele tem show pra hoje. Certo?

— Tem! Mas não estou preocupado com o show!

— Existe algum lugar por aqui que ele tivesse vontade em conhecer?

— Apenas a praia. A gente já estava lá!

— Pode ter ido pra água e infelizmente acontecido o pior.

— Eu temo que aconteça o pior, mas não é na água não!

— Acho melhor ficarmos preparados pra qualquer coisa!

— Se ele tivesse se afogado na praia a onda o traria pra fora.

— Fique calmo que vou providenciar as buscas. Volte a se reunir com seu pessoal e qualquer novidade me avise.

— Que Deus nos ajude.

— Claro! Seu garoto vai aparecer!

Já ia me retirando, mas resolvi voltar e pedir:

— Doutor, por favor, não me leve a mal. Nem quero extorquir o senhor, mas sei que o estado tem problemas de verbas. Então, se precisar de alguma ajuda pra procurar esse garoto, eu posso colaborar. Por favor, eu sou responsável por esse menino e seu pai jamais me perdoará se lhe acontecer algo. Eu também não me perdoarei. Pelo amor de Deus, encontre-o pra gente.

O delegado colocou as mãos em meus ombros e disse:

— Vá pro hotel e se acalme. A gente vai encontrá-lo.

O dia passou lento e nervoso. Não parei no hotel, voltando à praia por diversas vezes e caminhando igual uma barata tonta. Sempre um dos músicos me acompanhava e quase ninguém da equipe parou para almoçar.

Às dezoito horas, sem nenhuma notícia de Regis, pedimos o cancelamento do show.

Pouco depois das vinte horas, embora sem muito interesse, assistíamos no hotel o mais famoso telejornal do Brasil. De repente surgiu o fato:

“Desapareceu hoje pela manhã, na praia das Pedrinhas em São Gonçalo, no Rio de Janeiro, o garoto cantor, Regis Moura. Regis aproveitava para visitar a praia com sua equipe, enquanto aguardava para realização de um show naquela cidade carioca, hoje à noite. Segundo seu empresário, houve apenas um momento de descuido e o menino desapareceu misteriosamente. A polícia já iniciou as buscas, mas até o momento não existe nenhuma pista de seu desaparecimento”.

Uma repórter me fizera algumas perguntas:

— Regis, já desapareceu alguma vez durante suas viagens?

— Nunca! Ele jamais me causou qualquer tipo de problemas!

— Você tem alguma ideia do que possa ter acontecido?

— Sequestro! Só pode ter sido isto!

— Mas em plena praia? Cheia de visitantes?

— Não sei como foi! Mas só pode ter sido sequestro!

— Qual seria a intenção dos sequestradores? — perguntou-me o repórter. — Dinheiro?!

— Creio que sim!

— O que o leva a crer em sequestro?

— Um casal na praia viu quando ele foi levado por dois homens.

— A polícia falou com o casal que viu o referido sequestro?

— A gente não tem o paradeiro do casal de jovens, mas acredito que eles se prontificarão a falar na polícia.

— E quanto ao show de hoje? Já foi cancelado?

— Era a única coisa que poderíamos ter feito.

— Há a hipótese de algum acidente no mar?

— Não! Essa hipótese já foi descartada pelos bombeiros.

A repórter se voltou para a câmera e prosseguiu:

— O show já cancelado, a equipe toda preocupada e a polícia de São Gonçalo e grande Rio toda mobilizada, em busca de um dos mais conhecidos garoto de onze anos de idade de nossa atualidade.

Assim que terminou a reportagem do jornal, procurei imediatamente ligar à São Paulo, para falar com os pais de Regis, pois noticiários em televisão, a gente sabe que todos acabam assistindo.

Assim que o senhor Pedro atendeu ao telefone, lhe perguntei:

— O senhor está assistindo jornal na televisão?

— Não! — negou ele. — Por quê? Algum problema?

— Sim! Temos um grande problema sim!

— Como assim? Onde está meu filho?

— O Regis… deve ter sido… sequestrado, senhor Pedro. Não temos certeza ainda.

— Mas como? Por quê? Você descuidou de meu filho, Willian?

— Nós estávamos na praia e ele desapareceu. Não sabemos pra onde ele foi. A polícia já está procurando.

— Não pode ser! Vocês são todos irresponsáveis!

— Não adianta o senhor xingar agora, senhor Pedro! Acho melhor o senhor ficar alerta pra qualquer telefonema suspeito.

— Se acontecer alguma coisa com meu filho eu não te perdoarei nunca!

— Calma, por favor! Eu volto a ligar pro senhor! Agora tenho que desligar.

— Onde vocês estão?

— No Rio de Janeiro.

— Encontrem meu filho, pelo amor de Deus!

— Nós iremos encontrá-lo.

— Como foi acontecer isso? Ele estava sozinho?

— Estávamos na praia e ele desapareceu de repente.

— O que vocês foram fazer na praia? Por que não ficaram no hotel?

— Isso agora não importa, senhor Pedro! Como a gente podia saber o que iria acontecer?

— Pra ele ter desaparecido na praia, é porque vocês o deixaram sozinho! Ele estava sozinho?

— Estávamos juntos! Mas... Eu entrei... Um pouco... na água...

— Você é um irresponsável!

— Isso não vai ajudar agora, senhor Pedro!

— Vá procurar meu filho! Depois você torna a me ligar!

À noite, após parecer infindável, passou sem que eu dormisse nem um minuto sequer. Na manhã seguinte, estive sozinho caminhando pela praia, na falsa esperança em encontrar alguma novidade sobre o ocorrido; depois, também sozinho, fui à delegacia, o que de nada adiantou: não tinham nenhuma novidade sobre o caso. Os jornais daquele dia, tanto escrito, quanto falado ou de televisão, ilustravam suas manchetes em primeira página, com a chata notícia, do desaparecimento de nosso pequeno artista.

©©©.

O show daquela noite em São José dos Campos também fora cancelado e um novo telefonema à casa dos pais de Regis, indicou que nenhum manifesto fora tomado por parte de algum suposto sequestrador.

Durante todo o dia, eu evitava entrar no ônibus, pois o senhor Pedro passou todo o tempo falando com alguns membros de nossa equipe pelo rádio PX e eu não estava preparado para ouvi-lo sempre gritando.

E também durante todo aquele dia, equipes da imprensa passaram na frente do hotel, em busca de falar conosco sobre algum tipo de novidades, sem, contudo nada conseguirem, pois sabíamos tanto quanto eles.

E assim, com muito desespero e angústia, aquele domingo terminou sem nenhuma novidade. Acabei por me deitar cedo demais, devido o cansaço de mais de quarenta horas acordado. Com isto, consegui dormir um pouco e sonhar muito com o pequeno Regis. Eram sonhos de pessoas o maltratando com espancamento e gozação.

A segunda feira amanhecera triste para toda nossa equipe. Retornei à delegacia, mas não me deram nenhuma notícia a respeito. Só diziam que estavam realizando buscas, mas que não tinham nenhuma novidade, com exceção de que a justiça já teria interceptado o telefone da família, para o caso de algum contato; além do retrato falado dos dois homens que levaram Regis da praia. Retrato este, conseguido, graças à observação do casal de jovens, que gentilmente foram à delegacia prestar ajuda.

Naquela mesma tarde, em comum acordo com toda a equipe, resolvemos retornar à São Paulo, para aguardarmos notícias em nossas casas.

Foi à viagem mais triste realizada por mim e creio que para toda a equipe, desde o dia em que conheci o pequeno Regis, quando ele ainda tinha seis aninhos de idade. Durante todo o percurso de quase seis horas, todos permaneciam em silêncio, sem se levantar e mesmo em uma parada, que o motorista resolvera fazer para descansar um pouco, quase ninguém desceu do ônibus.

A poltrona leito ao meu lado, na janelinha, a qual Regis sempre viajava, estava vazia e eu com o coração apertado, em dor, tristeza e profundo sentimento de culpa, passei quase todo o tempo da viagem deitado, pensando muito e com muitas lágrimas nos olhos. Embora eu não tivesse um filho para saber qual é a dor de um pai, acho que sentia também esta mesma dor.

Chegamos à São Paulo quase meia noite. Fui direto para minha casa dormir e na manhã de terça-feira, resolvi ir direto à casa do senhor Pedro. Quando entrei em sua sala, antes de me cumprimentar, me perguntou bravo:

— Como foi acontecer isso? Como você deixou meu filho desaparecer?

— Já lhe expliquei várias vezes... Estávamos na praia…

— Só estavam vocês dois na praia?

— Claro que não! A praia estava cheia de gente!

— E como um menino desaparece assim na praia? Sem que ninguém veja!

— Não sei! Juro que não sei! Mas a polícia vai encontrá-lo! Fique tranquilo!

— Como você ousa me dizer pra ficar tranquilo? Meu filho está desaparecido e você quer que eu fique tranquilo?

— De nada adianta o senhor ficar me xingando! Isso em nada vai nos ajudar!

— Não vai mesmo! Meu filho desapareceu por irresponsabilidade sua!

— Está bem! O senhor quer que eu assuma a culpa, então eu assumo. A culpa é minha! Pronto! E agora, o que isto vai nos ajudar?

— E o que você veio fazer aqui? Por que não ficou no Rio procurando meu filho?

©©©

Os dias passavam, sem que os sequestradores dessem qualquer notícia. Estávamos todos exaustos de procurá-lo e o pior era que não sabíamos se Regis estava mesmo sequestrado ou morto. Não sabíamos o que realmente havia acontecido com ele. Pior ainda, era que o senhor Pedro, nervoso, não sabia fazer nada a não ser me condenar, colocando toda a culpa do desaparecimento do filho em mim. Eu sabia que ele tinha razão... Que eu era mesmo o culpado e isso me fazia sentir muito mal.

— Você é um irresponsável! — insistia em dizer. — Ganhava pra proteger meu filho e, no entanto, deixou que criminosos o pegassem!

— Pelo jeito que o senhor fala, senhor Pedro, até parece que eu trabalhava com seu filho apenas pelo dinheiro, se esquecendo que eu o amo como se ele fosse meu filho! Que eu o amo, talvez mais que o senhor próprio!

— Pare de falar bobagem e dá um jeito de encontrar meu filho! Você ganha muito dinheiro sim! Pra cuidar de Regis!

— Não estou falando bobagem senhor Pedro! Quantas vezes ele insistiu com o senhor, pra deixar seu emprego e viajar conosco, juntamente com Tony e dona Odete, pra aliviar um pouco a saudade que ele sentia de vocês. Mas o senhor, orgulhoso como é, preferia vê-lo apenas uma vez a cada dez ou quinze dias, sendo que poderia estar com ele todos os dias. Regis poderia ser muito mais feliz, mas seu orgulho besta não o deixava ser!

Dona Odete praticamente não me condenava, embora também vivia nervosa e se manifestava através de estar sempre chorando, constantemente abraçada a um retrato do filho.


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Notas finais do capítulo

Mais um drama na vida de um menino simples. Sequestro? Será?



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