Olho de Enite escrita por Alex Sousa


Capítulo 4
Capítulo IV




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– Agora sim vocês podem entrar no nosso reino. – a Ursula ferida se levantou com um sorriso sarcástico, a lança cravada no braço, enquanto um líquido esverdeado jorrava aos poucos.

A criatura retirou a lança, e aos poucos todos os seus ferimentos foram cicatrizando. Sua pele anteriormente igual a da verdadeira Ursula tomou uma coloração roxa, e seus cabelos foram sumindo até ficar totalmente careca. Seus olhos eram pretos, e ela continuava sorrindo enquanto nos encarava.

Um metamorfo.

– Nós não aceitamos visitas tão fácil assim. – começou ela, se esticando e puxando uma espécie de bastão do cinto. E como se tivesse sido combinado, outros três metamorfos surgiram de dentro da mata se juntando a moça – Sou Ilena. Líder da segurança do reino. E provavelmente vocês foram enviados para nos auxiliar.

– Pelo que me parece vocês não precisam tanto assim de ajuda. – comentou a verdadeira Ursula do outro lado, ainda se recuperando da lança enviada por Martim. A garota ajeitou o arco na aljava, agora cheia, e decorada com as fitas vermelhas de sua marca.

– De fato é controlável, mas a destruição é eminente. – começou um dos metamorfos. Esse era grande, e portava uma marreta de quase seu tamanho. – E é melhor prevenir do que remediar. – sorriu e virou-se de costas, andando pela trilha em direção aos muros do reino, sendo seguido pelos outros metamorfos.

– Como você soube quem era a verdadeira? – comentou a metamorfo em direção à Martim.

– A Ursula não usa a mão direita para lançar uma flecha. – ele acenou para Ursula que vinha atrás do grupo, e voltou-se para a mulher – E nossa ligação é íntima demais para não saber quem é quem.

Íntima demais.

Soltei um suspiro e continuei seguindo-os pela trilha em direção ao castelo. De longe se via os altos muros que circundavam o reino, e o grande portão se abriu quando o guardião dos muros nos avistou, servindo como uma ponte para o lago ao redor dos muros.

Quando entramos no reino o portão se fechou as nossas costas, nos deixando presos naquela imensidão de construções.

Embora não fosse o maior, talvez nem o mais desenvolvido, Uja era conhecida pelas construções e torres altas. Aqui e ali se via banquinhas e mais banquinhas com frutos do mar e alguns peixes exóticos, que era o que movimentava a economia do reino, sendo vendidos, além de utensílios de pesca.

Um homem saltitava de frente a sua loja de redes e iscas, e afirmava ter pegado o maior pesadelo dos pescadores. Homens e mulheres andavam para lá e para cá carregando peixes em arpões, ou puxando canoas.

– Você aceita um petisco? – disse uma voz feminina ao meu lado, e me virei para dar de cara com uma mulher alta e esbelta, com um vestido longo e azul e os cabelos louros presos em um rabo de cavalo. Ela erguia um palito de espeto com alguns frutos do mar em minha direção.

– Quanto custa? – perguntei e ela simplesmente me entregou o palito sem sequer cobrar.

Dei um sorriso em agradecimento e voltei a acompanhar os outros na jornada pelo reino.

As construções eram verdadeiramente grandes, e quase todas eram decoradas com algum objeto marítimo, desde peixes empalhados a iscas tão bem feitas que provavelmente não fossem usáveis.

De longe se via o grande castelo pintado em um azul claro. Havia inúmeras janelas, e torres que se assemelhavam a ondas de tão irregulares que eram uma das outras.

O quartel era uma construção um quanto tanto grande. Também era pintado de azul, e duas estátuas guardavam a entrada no formato de dois guerreiros portando tridentes que se cruzavam no arco da porta.

Cruzamos a entrada e entramos no quartel, avançando até a sala do chefe da tropa.

~●~

Kyles era um homem de aproximadamente cinquenta anos. O cabelo ruivo emaranhado, com alguns fios brancos e rugas de preocupação amostra em sua testa lhe davam um ar de sério. Tinha um corpo alto e atlético, e usava um uniforme com medalhas de guerras e batalhas vencidas.

Quando entramos no gabinete o homem se levantou, espanando as roupas e cumprimentando cada um com um aceno, antes de voltar-se para a cadeira.

– Trouxe-os como dito. – falou a metamorfo e se retirou posteriormente a isso, sendo seguida pelos os outros três metamorfos.

– Vamos. Sentem-se. – disse Kyles se ajeitando na cadeira. Os cotovelos estavam apoiados na mesa, e um grande mapa do continente estava disposto ali em cima, com alguns pinos de cavaleiros e alguns estandartes em tamanho reduzido espalhados por toda a circunferência.

Sentei-me na cadeira de frente a ele e deixei a mochila no chão. Semicerrei os olhos enquanto estudava todo o ambiente: havia duas janelas abertas logo à frente, e mesmo assim o cômodo tinha um cheiro forte de mofo e sal. Prateleiras e armários decoravam todas as paredes, amarrotadas de livros e pergaminhos, além de troféus e lembranças de batalha.

Ursula sentou-se na cadeira ao lado e Martim e Nicolas ficaram em pé.

– Peço perdão caso tenha acontecido alguma coisa com a segurança. Eles têm alguns métodos bem atrasados de trabalhar. – disse o homem com um sorriso, dedilhando os dedos pela quina da mesa – Mas enfim. Vejo que atenderam o nosso pedido de socorro, e fico honrado em recebê-los em nossa terra.

– Ainda creio que sua segurança é forte o suficiente para controlar tudo. – protestou Ursula.

– De fato são. E embora nossa população de metamorfos seja bastante numerosa, receio dizer que nem todos estão aptos para este trabalho.

– E qual trabalho seria esse? – perguntei, me ajeitando na cadeira para ficar mais confortável.

– Precisamos expandir nossas defesas. Conseguimos controlar os ataques marítimos, e estão tendo bastante. Inclusive alguns barcos foram afundados ainda ontem por causa de dragões aquáticos. – o homem soltou um suspiro, e os olhos fraquejaram de cansaço - Já as defesas terrestres estão sendo trabalhas, mas aos poucos estamos conseguindo. Os lagartos optaram por criar uma sociedade bem próxima ao reino, e está repleto de covil ao redor de nossos muros. Sem contar com as Brumas, que vivem invadindo e destruindo alguns pontos.

– E você quer que quatro soldados. Apenas quatro, te ajudem nisso? – perguntou Nicolas do outro lado da sala. Durante todo o discurso ele havia se intrometido dentro das prateleiras, deslizando os dedos pelas capas dos livros e lendo troféus de honra – Não que não sejamos capazes. Mas seria mais efetiva uma tropa inteira.

– Sim, e nossa tropa estará disposta com todas as forças a ajuda-los nessa batalha. – respondeu ele, juntando as mãos e encarando cada um dos quatro.

– Certo... Mas vamos precisar de algumas coisas. – interviu Martim, se despregando da parede e se aproximando da cadeira em que eu estava.

– Ah sim. Nós já adiantamos tudo. Quando saírem por aquela porta irão ser acompanhados até a casa em que irão ficar. Já mandei entregarem todo o mapa do reino, sem contar com os pontos que estão tendo ataques. – Kyles se levantou da cadeira e andou até a janela, se escorando na parede e olhando para o reino, pensativo – Precisarei que me entreguem estratégias de batalha até amanhã.

– Amanhã? – protestou Martim, arqueando a sobrancelha.

– Não podemos evitar. Os ataques estão cada vez mais frequentes e... – ele virou-se de volta para nós e passou a mão na testa.

– Certo. Nós iremos fazer isso. – respondi e me levantei. O homem acenou e nós saímos do gabinete do homem.

~●~

Eliodor era um jovem de dezesseis anos que ainda estava no quartel, e treinava para ser um dos espadachins do reino. Ele nos acompanhou até a casa em que ficaríamos: uma construção um pouco grande, com os muros pintados de branco e algumas conchas no chão usado como trilha para o interior da casa.

O rapaz nos acompanhou para dentro da casa, e nos mostrou todos os cômodos. Eram quatro quartos, dois banheiros, uma cozinha interligada com a sala de entrada, e uma varanda com vista para o mar. Havia uma grande mesa na sala, com mapas e pergaminhos enrolados além de pinos e livros, todos organizados para fácil acesso.

– Isso que eu chamo de casa. – Martim se jogou na primeira poltrona, e se aconchegou ali mesmo.

– Irei voltar ao meu trabalho diário. Qualquer coisa pode chamar-me. – disse Eliodor calorosamente, acenando com a mão no ar e saindo da residência.

– Este lugar não me cheira bem. – comentei e encarei cada canto da casa.

– Fede a sal. – comentou Nicolas e avançou para a escada que levava aos quartos, sumindo de vista.

– Não. Fede a... – pensei no que responder e deixei a resposta no ar, andando em direção à varanda.

O anoitecer tão ao oeste do continente era lindo. O dia ficava alaranjado aos poucos, e o ar era tão limpo que o fôlego parecia dobrar. As flores eram mais vivas, e as cores mais exóticas, além da brisa que alvejava cada parte de seu corpo a cada segundo. O sol se punha mais adiante, um círculo amarelo sumindo no encalço do mar, dando um limite àquela infinidade de água salgada.

E por um momento aquela imagem natural invadiu meu corpo e pensei apenas em sentar na mureta da varanda, vendo o sol sumir aos poucos, e sentir meus cabelos balançando no ar e me causando arrepios pelo vento frio.

A paz daquele lugar traria qualquer guerra ao fim.

Principalmente nossas guerras pessoais.

– E com o sol, a tristeza do dia se esvai. – solto um suspiro e fecho os olhos por um instante.

– Bem filosófico. – ouço uma voz atrás de mim, e solto um sorriso.


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Notas finais do capítulo

□ Ei leitores, tudo bem?

□ Espero que tenham gostado desse capítulo. Eu estou tentando evitar criar cenas de ação em todos os capítulos porque isso chega a ser chato, principalmente quando se pode investir tanto no pensamento e o modo de vida de cada um dos personagens. Vou explorar bastante essa parte interna, sobre os "demônios interiores". Espero que isso ajude bastante no desenrolar da história, principalmente para entender as personalidades de cada um :)

□ E pra vocês quais são as personalidades de cada um dos personagens?

□ Pode parecer um pouco chato isso, mas eu queria chegar aos 10 comentários e pelo menos 8 acompanhamentos antes de postar o próximo capítulo. Será que podem me ajudar?