Algumas semanas depois Bernardo estava tomando um banho demorado. Já estava quase que completamente recuperado da prata, e podia fazer tudo que quisesse. A água estava bastante quente, embaçando os vidros e espelhos do banheiro.

Enquanto isso, Lívia estava sentada na cama devorando um pedaço de carne totalmente cru como se fosse a coisa mais normal do mundo. E o pior, ela já havia comido no mínimo meio quilo somente naquele dia, sem falar nos dias anteriores!

Bernardo saiu do banheiro somente com a toalha amarrada na cintura mexendo no cabelo arrepiado. Quando viu a cena recuou um pouco, não acreditando no que via.

– Lívia, assim você vai comer toda a carne do mundo. - disse o homem indo pegar uma cueca do tipo "samba-canção" no armário.

– Bê, isso aqui tá muito bom! Você tem que experimentar!

– Ahn... Não, obrigado. - ele riu se vestindo. - Eu sou um lobisomem, mas em plena consciência não como carne crua. E nem você deveria, isso faz mal.

– Mal? Carne tem ferro, proteínas...

– É, e crua tem também vermes, vírus, pode transmitir uma leva de doenças.

– Ah, para, Bernardo! - disse a loira fazendo bico.

– Eu só me preocupo com você. - o ômega a deu um beijo na testa e passou o polegar na bochecha de Lívia limpando a pequena mancha de sangue.

Lívia parou de comer. Olhou para a carne e depois para Bernardo com a boca cheia de sangue. A ômega começou a sentir um mal-estar terrível e quando percebeu já estava no banheiro vomitando.

– Viu? Eu disse para não comer carne assim!

– Cala a boca, Bernardo. - disse a mulher com os olhos azuis sérios fixos nos dele.

Quando o homem tentou ajudá-la a se levantar, Lívia o empurrou e se levantou sozinha, mesmo que cambaleante. Foi até a pia e lavou o rosto ensanguentado e saiu dali deixando o homem para trás.

– "Essa mulher é bipolar, não é possível!" - pensou Bernardo rindo.

Lívia POV

"Mas que droga! Odiava vomitar, e odiava mais ainda que sentissem perna de mim. Saí do banheiro batendo a porta com toda a força, fazendo um barulhão. Que se dane o que Bernardo pensaria! Droga, por que estou tão irritada? Seria a lua cheia? Ou somente os hormônios fazendo o seu "ótimo trabalho", pois ainda não havia menstruado aquele mês? Para falar a verdade, nem esse mês e nem o mês passado. Calma, Lívia, ômegas não podem engravidar de humanos e... Espera! Bernardo não é humano. N-Não, não é possível... Não..."

Lívia passou mal com tanto nervosismo e acabou desmaiando. Quando Bernardo a viu caída no chão e o sangue que saía entre as suas pernas ficou louco.

– LÍVIA! - berrou correndo para acudir a mulher. - LÍVIA! LÍVIAAAAAAAA!

Não havia resposta. Ele vestiu uma calça e uma blusa que estavam jogadas no chão mais rápido que o Flash, pegou a mulher e saiu correndo com a mesma nos braços em direção a cabana de seu pai.

...

Um pouco mais tarde, na cabana da floresta, Maurício e Luísa jogavam Damas. Já Vovô preparava um delicioso chá de erva-doce, que tratou de servir para todos.

– Aqui. - disse pondo as xícaras frente a eles.

– Obrigado, Vovô.

– Obrigada. - disse a menina tomando um pouco do chá. - Sua vez, Mau.

Maurício sorriu e "comeu" cinco peças de Luísa de uma vez, a fazendo ficar de boca aberta.

– Não é possível, você tá roubando. - disse a morena.

– Eu? Eu não. - o alpha riu.

De repente a porta foi arrombada e caiu no meio da sala. Bernardo tinha Lívia nos braços e a sua cara não era das melhores.

– PAI! ME AJUDA!

– RRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR! - Maurício se transformou em lobo e pulou para a frente de todos. Ele rosnava alto e seu focinho espumava constantemente.

– Você... - disse Bernardo fazendo uma cara muito feia. Depois viu Luísa e Vovô com uma cara de "EU NÃO ACREDITO NISSO!".

– Pai? - perguntou Luísa olhando Vovô.

– Calma aí, cãozinho, não vou fazer mal a ninguém. - disse o ômega. - Eu só quero que salve a Lívia!

– Maurício... - disse Vovô passando a mão sobre o seu pelo escuro. Ele voltou a forma humana e o deu as costas.

– Agora tudo faz sentindo. - disse Maurício pondo as mãos nos bolsos. - Por que nunca me disse que era pai dele?

Vovô precipitou-se para ajudar Lívia, pondo-a sobre a mesa da sala e a examinando.

– Me desculpe, Maurício. - ele correu para pegar sua maleta de utensílios médicos. - Fazia muitos anos que não tinha notícias de Bernardo. Como eu iria imaginar que ele iria aparecer por aqui e arrumar problemas justamente com você e a senhorita Luísa?

A menina virou o rosto para o lado tentando não encarar Bernardo. Não iria perdoá-lo nunca.

– Mas ele é meu filho, eu não posso abandoná-lo sozinho no mundo. - disse Vovô tentando estancar o sangue. - E o mesmo com Lívia, eu a adotei há muitos anos atrás, mas ela se revoltou e fugiu...

Maurício socou a parede com raiva. Não estava acreditando que todo aquele tempo Vovô havia ajudado o seu inimigo.

– Mau! - Luísa o puxou pelo braço, saindo da cabana. Precisava acalmá-lo antes que ele fizesse uma besteira muito grande.

– Droga, o que aconteceu com ela?

– E-eu não sei explicar direito! Ela tem estado muito estranha nos últimos dias, comido carne crua... E do nada vomitou, deu ataque de perereca e acabou desmaiando. Quando a encontrei estava no chão sangrando.

– Hum... - Vovô suspirou e fechou os olhos. - Como eu imaginava.

– O que foi, pai?

– Você e ela andaram tendo relações sexuais, certo?

– C-como sabe?

– Ômegas não podem ter filhos com humanos, mas com lobisomens nada impede disso acontecer.

– Então quer dizer que a Lívia está...

– Sim, grávida. E se estressou ao ponto de quase perder o bebê.

Finalmente Vovô conseguiu impedir o sangramento. Lívia estava totalmente pálida e um pouco gelada, fazendo o velho se preocupar mais ainda. Bernardo ficou com uma cara de "poker face" mais do que perfeita.

– Mas com a personalidade que ela tem vai ser uma gestação muito difícil... - Vovô suspirou. - Vou pegar uma poção. Cuide bem de Lívia.

– Tá.

Quando o velho saiu, Bernardo segurou na mão da loira e a levou até a testa.

– Aguenta, meu amor...

...

Enquanto isso, no lado de fora da cabana Maurício andava de um lado para o outro igual um louco.

– Mau! Para, Mau! MAAAU!

– Eu não acredito que aquele velho me traiu! Como pude acreditar em tudo que ele dizia? COMO?

– Maurício, calma! - disse Luísa o sacudindo.

– Desculpa, mas não dá! VOU MATAR AQUELE VELHO E O CANALHA DO BERNARDO TAMBÉM! Eu sinto vontade de destruir tudo! TUDO!
Luísa o deu um tapa no rosto.

– AI!

– TRATE DE SE ACALMAR! NÃO DEIXA ESSE MONSTRO TOMAR CONTA DE VOCÊ! PORQUE SE VOCÊ DEIXAR, NUNCA MAIS VOU OLHAR NA SUA CARA, MAURÍCIO!

...

– "Gritos? Na floresta?" - pensou Pedro andando ali por perto.

Foi quando ele viu Luísa e Maurício.

– "Não poderia ter mais sorte." - ele apontou sua arma na direção de Luísa, e depois mudou o alvo para o lobisomem. - "Morre, capeta!"

E Pedro apertou o gatilho.