Doutrinas Fatais escrita por J R Mamede, Klariza, Celso Innocente, Pedro Henrique Sales, Jean Pereira Lourenço


Capítulo 2
A Última Entrevista


Notas iniciais do capítulo

Olá queridos leitores/autores.

Quero agradecer o convite de Klariza Noronha que, pela segunda vez, ajudou a reunir um grupo lendário de autores.

Desta vez, o tema central é o terror. Seja ele em forma de violência bruta, realmente, ou em seu extremo, assumindo a designação "terrorismo".

Espero que gostem da minha estória e, também, das dos outros grandiosos autores desta coletânea.



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– Como diz a música, “as mentes são capturadas e doutrinadas e, como num computador, reiniciadas.” Isso explica tamanha loucura e ódio pelo próximo, vindos desses grupos, autodenominando-se “terroristas jihadistas islâmicos” – afirma Khaled, em uma entrevista para o jornalista Yutaku, um correspondente da TV estatal japonesa.

– E o fato de viver aqui no Afeganistão há mais de sessenta anos?

– Há quase trinta, isso aqui eram mil maravilhas. Podíamos empinar pipas, andar de bicicleta pelas ruas, ler um livro sentado numa praça... – e suspirou, com saudades daqueles tempos. – Eles nos tiraram, inclusive, o direito de todo e qualquer cidadão de assistir televisão! As nossas mulheres só podem sair às ruas devidamente vestidas e acompanhadas de seus maridos. Caso contrário, os talibãs as apedrejam, dão-lhe socos, chutes e pontapés. Isso ocorreu uma vez com minha esposa. Eu estava com uma pedra no rim. Sempre abusei no sal, no que explica a minha pressão alta. Mas enfim, havia dias em que eu rolava na cama de tanta dor, e neste dia não foi diferente. Aliás, foi pior. Estava insuportável e pedi para minha esposa comprar um remédio para mim em alguma farmácia ou algum posto de saúde. Em sua ida, foi interceptada por militares, que confiscaram seu dinheiro e a espancaram, sem ao menos perguntar o motivo de estar sozinha na rua. Moral da história: nós dois ficamos rolando de dor.

– O que mais te incomoda nesse caos generalizado? Mas, digo um incômodo significativo para você, para o seu bem-estar – perguntou Yutaku, com um olhar demasiado assustado e piedoso.

– Sem dúvida alguma a barba e os trajes. No calor é um horror! Fica completamente encharcado de suor. Principalmente no verão afegão. Mas no frio acaba sendo até um ótimo agasalho – e riu. – Em relação à barba, eu tenho problemas com pelo encravado. Inshallah! Há dois meses eles exigiram que tingíssemos o cabelo e a barba de preto. Não percebes? Sou um velho de sessenta e quatro e não possuo um fiozinho branco sequer! – e sorriu novamente, mostrando seus dentes amarelos e estragados.

– Tiroteios constantes fazem parte do cotidiano dos afegãos. Como o senhor lida com isso?

– Infelizmente me acostumei. Perdi meus três filhos, minha mulher e minha casa. Estava a trabalhar e os quatro estavam lá. Por volta das três horas da tarde um míssil atingiu a casa, que matou as quatro pessoas mais importantes da minha vida. Há dez anos tenho esta infelicidade de viver sozinho, no meio desse campo de guerra. Hoje em dia não se sabe mais quem é militar, quem é civil, nem terrorista. Eles ficam disfarçados. São como ratos! Se escondem em todos os lugares.

“Toda vez que nós, afegãos, quisermos ver televisão somos obrigados a desenterrar o aparelho no jardim de casa. Fizemos um buraco especialmente para a tevê. Se somos pegos pelos guardas do talibã cometendo esse delito... Não faço ideia do que possa vir a acontecer.”

“Mas, agora, fale de você. Por que aceitou ou por que optou ser um correspondente justamente daqui do Afeganistão? O Japão é um dos melhores lugares a se viver...”

– Amo minha profissão. Me considero um professor de uma nação, levando o máximo possível de informação que posso. Estou aqui há três anos e já presenciei enormes catástrofes, infelizmente. Uma delas, as vitimas foram cinco membros de nossa equipe.

“Minha família implora a minha volta, mas não preten... – e foi interrompido por um estrondo da porta da loja de Khaled caindo no chão.”

– Que merda é essa!? – gritou o homem vestindo um turbante preto até a cabeça, armado com um fuzil nas mãos. – Desliga a câmera! – ordenou.

Não deu tempo de o cinegrafista desligar, e logo uma bala do fuzil do homem já havia penetrado nas lentes enormes de sua câmera, seguida de outra em sua cabeça.

Khaled, Yutaku e sua equipe saíram correndo em direção às portas dos fundos, mas ao darem alguns poucos passos, o de turbante gritou “parem!”, mas a tensão estava tanta que eles nem obedeceram. E isso custou-lhes suas vidas.


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