Blue Falls escrita por Florels


Capítulo 5
Imprudências




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Quando a tensão finalmente se dissipou de meu corpo em meio a alguns goles de whisky, peguei meu celular para ver que horas eram. Aproximava-se das três horas da manhã e eu precisava voltar, torcendo para que ninguém tivesse notado minha ausência. 

—Acho que preciso ir para casa– falei para Abby, mas ela ria muito e não falava mais coisa com coisa.

Percebi que havia uma garrafa vazia ao seu lado e bufei.

— Acostume-se, essa aí não se controla – Oliver disse ao meu lado, revirando os olhos. – Sabe ir para casa daqui? - Ele falava de uma maneira muito suave e calma.

—Está escuro, jamais acharia o caminho de volta – declarei decepcionada.

—Zac é o único sóbrio aqui e apto para te levar para casa, Johanna – Abby disse em um tom de deboche ao deitar sobre o colo de Zac.

Mas— continuou ela, enfatizando a conjunção - ele vai ficar aqui comigo até eu me recuperar. Se puder esperar por isso... – Ela disse com um sorrisinho desafiador, levantando suas arqueadas sobrancelhas.

Bufei, imaginando o quanto isso demoraria. Nesse momento percebi que Zac realmente não havia bebido uma única gota. Mas havia algo errado. Ele estava muito sério e quieto.

—Que droga Abby! Pra que você faz isso? – Zac explodiu e se levantou bruscamente, deixando Abby cair.

—Acalme-se Zachary... – Começou Oliver se levantando.

—Vão à merda! – ele gritou indo para longe.

Ele então subiu no tronco da mesma árvore que usamos para chegar ali e pulou para o outro lado, desaparecendo de nossa visão. Fiquei assustada com sua transformação, me perguntando como poderia haver tamanha raiva por traz daquele caloroso sorriso.

—Ótimo, agora preciso cuidar de Abby e te levar em segurança para casa. Como é bom poder contar com Zac – Oliver bufou e chutou as folhas do chão.

—Não precisa me levar se não quiser – respondi em um tom rude ao me levantar, me desequilibrando em seguida sentindo tudo balançar em meu horizonte.

Lembrei-me então de como sou fraca com bebida e me odiei por isso. Imediatamente Oliver veio até mim apoiando suas mãos em minhas costas e segurou minha mão, preocupado. Um choque pareceu surgir em minha pele onde suas mãos encostaram.

—Esta tudo bem? Calma, eu não quis dizer isso, você não está sendo um peso, é só que... – ele fez uma pausa, olhando para Abby, sentada em seu tronco com o rosto entre as mãos – É só que Zac me irrita com esses seus surtos de raiva e irresponsabilidade.

Seguimos os três de volta em silêncio, com Abby se apoiando em mim e Oliver até o início da floresta, no começo de minha rua. Ao chegar lá, ela já estava um pouco melhor.

—Me desculpe por isso tudo Johanna, não quero que fique assustada, foi só que as coisas saíram um pouco do controle. Podemos sair outras vezes não é? – Sua fala era baixa e seu olhar arrependido. Era a primeira vez em que ela não parecia ser tão cheia de si.

—Tudo bem Abby, nos vemos outro dia ok? – Tentei soar amigável, embora estivesse com um pouco de raiva. Se não fosse Oliver ali, eu estaria perdida no meio da floresta com uma bêbada de madrugada.

—Obrigada por me ajudarem e obrigada por ser responsável Oli – Ela disse sorrindo para Oliver ao meu lado, deu-nos um tchau tímido e seguiu seu caminho.

—Vamos, eu te levo até em casa – Oliver me disse, passando o braço por meus ombros.

Chegando até meu portão, ele se virou para mim com os olhos ternos.

— Parece que você teve azar de sair com a gente justo em um dia de ataque Zachary.

—Isso é comum? – perguntei preocupada.

—Às vezes acontece. Mas hoje foi por culpa de Abby. Ele não gosta que ela beba, por motivos que eu não sei. Acho que ele tem alguma doença ou sei lá porque nunca o vi beber – dizia em tom despreocupado. – Mas chega de falar deles. Quero que saiba que gostei muito de te conhecer pessoalmente. Eles já haviam me falado de você, mas pessoalmente é muito mais bonita.

Imediatamente corei, não sei se pelo elogio ou quando os imaginei falando sobre mim. Afastei logo esse pensamento.

—Então essa é sua estratégia, senhor conquistador? – Cortei o clima sarcasticamente, embora mesmo percebendo que era um flerte idiota, eu tenha no fundo ficado lisonjeada com o elogio.

Oliver riu alto.

—Ah Johanna, então você é dessas. Ainda bem. Mas saiba que foi um elogio sincero.

Ele parou de rir aos poucos e me olhou nos olhos. Perguntei-me o que ele quis dizer com “você é dessas”.

—Eu realmente preciso entrar... - comecei a dizer.

—Me chame de Oli. E tudo bem, já está bem tarde, ou cedo, como preferir. –disse sorrindo, olhando para baixo.

Oli tinha um jeito irreverente de conversar.

—Adeus Johanna, espero que nos vejamos de novo logo – e então ele se inclinou e me deu um beijo na cabeça.

Enquanto fechava o portão, o observei indo embora. Ele caminhava silenciosamente com passos longos, enquanto passava a mão nos cabelos em um movimento para trás.

x x x x

Subi cuidadosamente as escadas de casa e chegando ao meu quarto, ao acender a luz, me deparei alguém dormindo em minha cama. Gelei. Com a claridade, as cobertas se mexeram e de lá apareceu um Johnny descabelado, me olhando com os olhos apertados:

—Pelo amor de Deus, apague isso.

Apaguei sem questionar e acendi somente o abajur. 

—Argh Johnny, como você descobriu? – bufei frustrada, sentando-me ao chão do lado da porta.

—Minha cara, eu sei de tudo que acontece nessa casa – se gabou levantando as sobrancelhas enquanto saia da cama. – Só queria que você soubesse que eu sei dessa sua saidinha e que agora estamos quites, então não poderá me chantagear pelo jeito que me viu ontem de manhã na cozinha - falou enquanto dava alguns passos no quarto.

Chantagear, eu nem me lembrava mais o que era isso. Era uma tradição comum nossa, ao flagrar o outro fazendo algo que não devia. Não que realmente entregássemos o outro, mas era divertido conseguir algum favor com esse pretexto. Johnny então aproximou o rosto de mim e estreitou os olhos:

—E esse cheiro por acaso é... Whisky? – Perguntou com um sorriso de vitória.

Revirei os olhos. Ele riu e foi para seu quarto. Que droga.

Poucas horas depois meu despertador tocou e eu acordei exausta demais para fazer qualquer coisa. A imagem de Zac me fitando do outro lado das chamas voltou à minha cabeça durante a noite de maneira perturbadora. Mas eu não poderia simplesmente ficar ali dormindo, ou papai suspeitaria de que eu não havia dormido direito, o que o implicaria a suspeitar outras coisas.

Relutante, levantei e preparei um café que me ajudou a criar forças para continuar. O dia amanheceu com um tímido sol entre nuvens, que fazia as gotas de sereno brilharem no gramado ao refletir a luz. Criei coragem e saí, chegando até o Masefield sem perceber como, me sentindo em um transe. Entrando na 212 vi Stanley sentado com Izzy conversando, ambos sorriram ao me ver.

—Johanna! Nossa, sua cara tá péssima. – Disse Stanley francamente ao reparar em minhas olheiras.

—Longa noite – limitei-me a responder.

Não sabia se deveria comentar com eles o episódio na floresta. Estava sendo tudo tão rápido, eu havia conhecido Abby e Zac em uma praça e alguns dias depois já estava saindo de madrugada pela floresta com eles. Comecei a refletir como eu estava sendo inconsequente. Ainda não sabia se poderia confiar em Stanley e seus amigos, assim como em Abby e os seus, lembrando que os dois grupos se divergiam. Eu me sentia como uma intrusa, um espião migrando entre dois clãs inimigos.

—Imagino que tenha sido – disse Izzy sorrindo compreensivamente. – Então Johanna, quero te conhecer melhor. Você não morava em Blue Falls antes não é?

Fiquei grata por ela ter mudado de assunto.

— Na verdade não, eu sou de Portland, no litoral.

—Jura? – Seu olhar se iluminou, assim como o de Stanley que acompanhava a conversa. - Nossa, deve ter sido péssimo vir para cá não é?

Com sua pergunta comecei a lembrar de tudo que já havia acontecido ali desde que eu me mudara.

—Sabe, estou gostando muito daqui, de verdade. Parece que esta cidade é mágica e complexa... Não sei explicar. Tem coisas a serem descobertas. Portland era tão superficial... – comecei a dizer, mas o sono não me deixava concluir as sentenças.

—Que idiotice Johanna – disse Stanley, e Izzy fez uma cara feia para ele. – Aqui é entediante e só tem gente estranha, por exemplo, olha só pra mim?

Acabei me limitando a rir junto. Não tinha energias para explicar meus devaneios sobre Blue Falls.

—Não fale assim Stan, só por que você repudia nossa cidadezinha – repreendeu Izzy. – Gostei muito da sua visão Johanna. Eu e Stan crescemos aqui e sabe como é, a gente acaba se acostumando com o que vê todo dia e não dá mais valor. É bom saber da visão de alguém de fora. O pessoal daqui costuma vangloriar o litoral, até porque é lá que tudo acontece e tudo mais – me explicou calmamente.

Refleti sobre aquilo. Talvez eu estivesse acostumada a Portland e não lhe dava seu devido valor. Logo afastei a ideia: não havia valor a ser dado para a futilidade, pelo menos para mim.

A aula começou e Izzy foi para sua sala, enquanto eu deitei a cabeça sobre a mesa e acabei cochilando. Acordei no intervalo quando Stanley me sacudiu.

—Ei dorminhoca, vai ficar aí o dia todo?

—A aula acabou? – acordei perdida.

—Calma, é só intervalo. Parece que Laurie faltou e Nathan está fazendo algum trabalho atrasado, vou ficar aqui com você – disse ao sentar do meu lado. Ele parecia ser um bom amigo.

— O que aconteceu afinal que te causou essa destruição? - perguntou ele depois de um tempo.

Refleti sobre o que eu iria dizer, mas acabei abrindo o jogo:

—Zac e Abby apareceram em minha casa ontem a noite.

—Sério? Só pode ter dado encrenca – disse com olhar curioso.

—É, ou quase. Stanley, o que exatamente aconteceu entre vocês? – Arrisquei a pergunta.

Os olhos dele se esteiraram. Ele respirou fundo e começou a falar. Percebi que viria uma longa história pela frente.


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