Blue Falls escrita por Florels


Capítulo 43
Memórias Póstumas: parte II




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– E depois disso foi apenas o vazio. Foi apenas eu, o caos de minha mente e o enorme e infinito vazio. Havia um silêncio ensurdecedor na realidade. Eu não sentia dor, não sentia alegria. Eu simplesmente não sentia nada - ele disse com os olhos úmidos e avermelhados, muito sério.

Seguiu-se uma longa pausa.

"A casa estava vazia, não havia mais ninguém. Eu demorei para entender o que se passava. Continuei os dias de minha eterna existência vagando pelo bosque, mas retornando sempre à casa quando precisava de algum conforto. Aos poucos eu fui entendendo que eu não era mais eu mesmo. Ouvi pessoas falarem que os Walker haviam retornado para Bloomfield após a tragédia. Minha mãe provavelmente nunca irá superar a culpa. E então eu não vi mais o tempo passar: finalmente entendi o que Leonard dizia sobre a eternidade, que o tempo perde o sentido quando sua existência é um eterno hoje."

Eram muitas informações para assimilar, mas eu conseguia compreender tudo. Senti uma empatia tão forte, que era como se tudo aquilo tivesse acontecido comigo. Me senti fraca. Permaneci imersa em minhas reflexões por bastante tempo. Zac respirou fundo e embora com um semblante triste, a conformação era explícita em seu rosto. Ele passou os dedos por meus cabelos sorriu:

–Gostei do novo corte.

O comentário inesperado me fez sorrir, afastando a atmosfera pesada por alguns momentos. Ele se deitou em meu colo, ainda enrolando meu cabelo em seus dedos, sua mente mais presente do que a minha, distante.

–Como você conseguiu entrar aqui? - perguntei.

–Não sei, só consegui - dizia despreocupado.

–Mas o amuleto...

–Magia Tenebris nunca teve qualquer efeito sobre mim - ele disse, surpreendendo-me com a possibilidade de que conhecesse aquilo melhor do que eu achava conhecer.

Zac continuou:

– Somente mais tarde fui entender o súbito interesse de Leonard sobre mim. Na verdade ele tem certo temor. Porque embora tenha conseguido em vida, ele sabe que em morte nunca será capaz de me controlar.

Permaneci um tempo absorvendo aquelas palavras, até que finalmente deitei-me para trás no tapete esfregando os olhos, como se aquilo ajudasse a clarear minhas ideias. Eram tantas peças para se juntar... Em meu campo de visão havia apenas o teto branco de sótão de meu quarto, e o silêncio era de como se o mundo inteiro, ali dentro ou lá fora, estivesse parado.

Zachary desencostou a cabeça de meu colo e deitou-se ao meu lado de bruços, olhando-me profundamente.

–E aí, como é que vai ser? - perguntou.

Olhei para ele, sem dizer nada. Não havia o que ser dito. Ele talvez estivesse acostumado com sua própria tragetória e superasse facilmente mencioná-la, mas eu tinha muito o que refletir ainda.

–Eu não sei - respondi impassível.

–Podemos dar um jeito nisso - ele falou baixo, reclinando o corpo para mais perto do meu em uma distância não mais tão segura.

A luz pálida da janela nos iluminava parcialmente, e deixava nossas peles com uma tonalidade pouco vívida.

–Johanna, eu deveria controlar meus instintos? - ele perguntou, ainda num tom baixo.

Zac agora estava tão próximo que a voz quase não era mais necessária. As pontas de seus cabelos roçaram em meu queixo enquanto Disorder recomeçava a tocar no toca-discos.

–Mortos têm instintos? - devolvi a pergunta, sarcástica e surpresa com minha naturalidade ao mencionar mortos.

Ele deu um meio sorriso, e dessa vez sussurou em meus ouvidos:

–Acontece que eu não tinha faz muito tempo.

–Então por que reprimí-los? - agora eu também sussurava.

–Medo de rejeição, talvez - ele disse em voz alta, se afastando um pouco.

–Você deveria correr mais riscos - decretei.

Aquelas palavras pareceram acender flâmulas em seus olhos, como se desafiados. Diz-se que os olhos são a janela para a alma; no caso de Zachary, ele todo era reflexo de seu espírito. Todo o seu eu refletia sua impertinência, sua imprudência e sua rebeldia, ao mesmo tempo em que sua alma de poeta, paradoxalmente sensível e frágil, manifestava-se presente. Mas naquele momento, seus olhos me mostraram que um incêndio iniciara em seu peito, em todo o seu ser. E mostravam também que aquele incêndio iria se espalhar e consumir, como fogo que necessita de oxigênio desesperadamente. E sem que eu percebesse, a distância entre nossos corpos tornou-se nula, e ele se certificou de me transmitir tudo isso mergulhando seus olhos azuis celeste nos meus antes de unir nossos lábios em um só, acendendo agora as chamas que haviam dentro de mim.

Seus lábios buscavam os meus intensamente, como se minha boca fosse ar e ele precisasse desesperadamente respirar. Nosso beijo começou tímido e terno, porém não demorou para que as chamas de nossos peitos o tornasse violento e apaixonado. Zac, agora sobre mim, percorria as mãos por todo o meu corpo, como se precisasse sentir cada centímetro meu para atingir a plenitude do momento e se certificar de que tudo era real. Eu apertava meus dedos em seus cabelos acima de sua nuca, segurando-os como se aquilo fosse me manter em um limite seguro. Mas eu sabia que já havia me entregado inteiramente, não havia mais volta, não havia mais onde se segurar.

Ele se sentou no tapete e encostou-se em minha cama, puxando me para cima dele logo em seguida sem manter nossos lábios longe em nenhum momento. Ele me guiava com seus movimentos, harmoniosos como uma valsa. Nossa sincronia era tal que sentia como se estivesse conectada à ele. Seu toque me provocava sensações extraordinárias, e sua intensidade fazia minha pele arrepiar.

–Johanna - ele disse ofegante, com os olhos fechados e os lábios encostados nos meus.

–Zachary - respondi aos sussuros, no mesmo estado.

–Eu acho que amo você - ele disse, e então o barulho descompassado de nossas respirações parou por alguns segundos.

Todo o meu corpo pareceu vibrar, e eu abri os olhos. Nossas testas estavam encostadas. Eu sentia os batimentos dele ressonarem por todo o seu ser. Delicadamente, desabotoei a camisa desbotada que ele vestia. Seu peito pálido revelou-se, evidenciando sua estrutura óssea definida. Percorri sua cavícula com os dedos, e desci sua camisa por seus ombros largos. Zachary então abriu os olhos suavemente, e puxou minha camiseta para cima, fazendo-me tirá-la. Minha pele alva contrastava com o sutiã preto que eu vestia, o qual ele também tirou no mesmo ritmo, sem dificuldade. Só então ele me deu um abraço apertado, e eu recostei minha cabeça sobre seu ombro, sentindo o calor compartilhado por nossos corpos unidos através do contato de nossas peles.

–Eu também te amo, Zac - eu disse, com os lábios próximos de seus ouvidos.

Ele então levantou meu rosto delicadamente até a altura do seu, e beijou-me profundamente. O tipo de beijo de quem ama e sabe que é amado.

x x x x

O som do disco chegando ao final me trouxe de volta à realidade. Tudo estava agora em silêncio. Ainda me encontrava ofegante, deitada nos braços de Zachary sobre o tapete. Ele observava o céu pela janela agora nourno enquanto acariciava meus cabelos. Nossas roupas estavam jogadas pelo quarto, e a pequena coberta estampada que repousava aos pés da minha cama havia sido puxada e nos cobria improvisadamente.

Eu me sentei e vesti o suéter de Zachary, que me servia de vestido. Tudo tinha sido muito intenso. Eu me sentia exausta, e enquanto estive sentada senti tudo girar e escurecer diante dos meus olhos. Vacilei e imediatamente voltei a repousar minha cabeça em seu peito inerte. Zac pareceu sentir que algo não estava bem.

–Johanna? - ele chamou, mas sua voz parecia distante demais.

E a última coisa que me lembro foi de seu rosto aflito acima do meu, um pouco antes da escuridão tomar conta de tudo.


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Notas finais do capítulo

(eita)



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