Blue Falls escrita por Florels


Capítulo 11
Retratos




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No dia seguinte, acordei mais disposta. Fui para a aula e no caminho a brisa fria da manhã batia contra meu rosto, o que deixava minhas maçãs do rosto rosadas. Chegando ao Masefield, encontrei Stan e subimos juntos a grande escadaria de entrada. Após me dar um abraço, ele começou a tagarelar:

–Você sabia que nessa semana o Masefield completa dois séculos de existência? – disse empolgado. – Pelo que dizem os boatos vamos ter que fazer uma série de trabalhos sobre a história daqui. - com o frio, suas sardas ficavam ainda mais evidentes na pele avermelhada.

–Puxa, trabalhos! – lamentei franzindo a testa.

–Sim Johanna, trabalhos e mais trabalhos. Mas toda semana de aniversário temos palestras também e tours pelo prédio – revelou animado. – mal sabem eles que o caminho para um dos terraços já foi descoberto.

Ri com suas palavras. O Masefield era realmente enorme, acredito que eu só conhecia apenas um quinto da estrutura toda. As únicas partes que eu frequentava além do enorme salão principal de entrada era o comprido caminho de colunas que formava o corredor 200, que levava até nossa querida 212. Às vezes, quando íamos até nosso terraço coberto por hera, ficávamos observando lá de cima os outros terraços ao longe, constantemente nos perguntando como se chegaria até eles. Ainda iríamos descobrir.

Aquela aula seguiu-se como Stanley havia previsto: professores anunciando o começo da semana de comemoração de aniversário do Masefield. Como primeira atividade nós teríamos de bater fotos criativas do colégio, as melhores participariam de uma exposição aberta ao público. Separaram-nos em duplas e para cada uma foi dada uma câmera. Teríamos uma hora para estar com fotos prontas.

– Vamos começar pelo clichê. – propôs Stan.

Seguimos para a entrada principal e tirei algumas fotos da fachada. Qualquer palavra que não fosse palácio ou castelo para aquela estrutura seria um mero eufemismo. Havia duas escadarias de cada lado e ambas terminavam na grande entrada, que ficava entre as enormes e imponentes colunas. Em cima, via-se diversas estatuas que rodeavam todo o telhado, incluindo os terraços. Eram imagens de anjos e divindades, todas remetendo à cultura local. As várias janelas iam desde pequenas aberturas de porão fechadas por grade na altura de nossos pés até as mais altas e detalhadas dos grandes salões. Tudo isso compunha aquele belo cartão postal que era a fachada do nosso colegial. Estávamos em silêncio admirando enquanto eu buscava alguns ângulos originais para apontar as lentes da câmera. Lembrei-me de Abby e sua fascinação por essa estrutura, compreendendo-a. As torres mais altas ficavam na parte de trás, então demos a volta para conseguir um ângulo melhor delas. No caminho, cruzamos com Izzy e Nathan que se juntaram a nós na sessão fotográfica, embora Izzy passasse mais parte do tempo tirando fotos engraçadas com Stan do que fazendo algo útil. Acabou que eu e Nathan nos responsabilizamos pelas fotos de nossas respectivas duplas, que só sabiam rir e brincar entre si.

–Como você consegue lidar com esses dois? – perguntei para ele rindo.

Eu nunca havia falado muito com Nathan, que preferia permanecer em segundo plano embora sempre soubesse de tudo o que acontecia. Quando falava costumava ser ouvido por todos, e era um tanto quanto irônico em seus comentários pelo que eu já havia presenciado.

–Muito tempo de convivência – ele respondeu me olhando pelo canto dos olhos. – eles parecem duas crianças quando se juntam. Acho que ainda termina em casamento.

Ri com a ideia, mais ainda depois de ver como ela era perfeitamente plausível. Enquanto caminhávamos, observei os detalhes de Nathan. Sua aparência era contrastante levando em conta as outras pessoas da cidade: seus cachos loiros cheios de mechas e sua pele naturalmente bronzeada lhe davam a aparência de um surfista que havia se perdido do caminho do litoral.

Chegando à parte de trás, entramos pelos fundos e fomos até a biblioteca. Eu nunca havia estado lá: era um enorme salão com o teto repleto de pinturas e acabamentos dourados, que arrisco dizer ser ouro. Rodeada por enormes janelas que iam do rodapé da parede até o teto, a biblioteca tinha um ar muito confortável. Seu chão de madeira era coberto por tapetes estilo vitoriano e as várias prateleiras antigas formavam corredores ao longo do ambiente. Havia uma enorme mesa de madeira central onde alguns alunos liam ou usavam notebooks, e um balcão próximo à entrada onde ficava o bibliotecário, que no momento era uma senhora de origem aparentemente japonesa. Ela tinha cabelos grisalhos muito curtos e usava um par de óculos estilo retro, parecia estar muito focada etiquetando uma série de livros empoeirados. Em silêncio começamos a entrar, Izzy e Stan atrás de nós contendo suas risadinhas que saíam abafadas. Ao ver as câmeras, a senhora acenou positivamente para nós como se já tivesse entendido nosso objetivo ali, indicando que talvez não fossemos os primeiros a aparecerem. Nathan seguiu para a ala oeste que era dividida da parte principal por um arco à esquerda do salão, já eu segui em frente me dirigindo até a ala sul, que era o fundo da sala.

Diversos bustos e estátuas estavam expostos entre uma prateleira e outra. Cercada de livros, o silêncio era muito agradável. Tirei algumas fotos do caminho, até que li a identificação do corredor que eu me encontrava: “História Masefield”. Comecei a observar minuciosamente os livros, que eram diversas biografias de antigos reitores e fundadores, livros de arquitetura, mitologia céltica além de memoriais repletos de fotografias da escola. Ri ao perceber que tudo ali parecia ser igual a como foi cem anos atrás nas fotos. Distraída, continuei andando até chegar ao fim do corredor, que terminava em um conjunto tão alto de estantes que havia uma escada fixa ali para alcançar os níveis mais superiores. Os livros que ali estavam tinham padrões muito semelhantes, sendo os superiores muito antigos e os de baixo gradualmente mais novos. Demorei a perceber do que se tratavam, até ler a pequena plaquinha dourada na prateleira: “Anuários Estudantis”. Fiquei boquiaberta. Começando de cima no século XIX, descendo década após década até chegar à prateleira na altura dos meus olhos que datava anos 2000 em diante, uma cópia de cada anuário existente desde a criação do Masefield em 1815 estava diante de meus olhos. Como seriam os alunos dos anos anteriores? Imediatamente recordei de Abby, qual seriam os anos em que ela estudou lá? Cuidadosamente, acompanhei com o dedo indicador a série de livros um pouco abaixo da altura dos meus olhos e puxei ao acaso o anuário de 2013. Fazendo as contas, minha turma estava no primeiro ano. Fui passando até achar a turma 212, que eram os calouros daquele ano. De cara reconheci o ruivo sardento com um sorriso alegre, e ri com o retrato do Stanley de 15 anos. Seus cabelos eram bem curtos e sua testa tinha espinhas. Embaixo da sua foto, depois do selo do troféu do clube de teatro, estava listado:

Bom amigo - Mais sardas do que bom senso - Tagarela

Sorri ao ler. Aquelas eram mesmo as melhores descrições possíveis para ele. Continuei observando os retratos e passei por Izzy, Nathan e Laurie, que na época tinha os longos cabelos na cor natural, castanho claro. Até que me deparei com um retrato de uma garota séria no canto superior esquerdo, o primeiro da página: Abigail Castenmiller. Seus cabelos pretos eram maiores e suas sobrancelhas não tão arqueadas. O mesmo traço quadrado delineava seu maxilar, mas sua maquiagem era sutil, lhe dando um ar delicado. Embaixo do seu nome a lista era um pouco diferente, que fez com que eu me arrepiasse:


Estranha – Bipolar – Suicida.


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