Quem foi Ally? escrita por Anne B Farrell


Capítulo 1
Capitulo único


Notas iniciais do capítulo

Essa one é muito especial para mim, uma das coisas que eu mais gostei de escrever.. Espero que gostem dela, tanto quanto gostei de escreve-la.
Link da musica que é perfeita para essa one:https://www.youtube.com/watch?v=gMp4-URITe8

Beijinhos doces ; *



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Quem foi Ally?

Se quando as pessoas passam por você não te veem. Se ninguém escuta tua voz, quando grita com todas as forças. Quer dizer que você não existe?

A carta de recordação:

Peguei-me pensando em você hoje. Isso é um pouco surpreendente eu sei, as pessoas pensam que não ligo para ninguém, além de mim mesmo. Há um pouco de verdade nisso, é inevitável quando se passa tanto tempo sozinho. No entanto, você, Alysson, tem uma incrível capacidade de provocar reações inesperadas nas pessoas, principalmente em mim. O que é um pouco estranho, pois você não era assim tão especial, mas você disse uma vez ‘O que torna alguém especial é a maneira como tocou a vida de alguém’, sempre disse que você seria filósofa, igual a seu pai. Tento me lembrar agora como você tocou minha vida, mas a verdade é que estou me esquecendo.

Eu me lembro do seu sorriso, mas já não lembro quando sorriu para mim. Lembro do toque da sua pele, mas esqueci quando te toquei. Havia covinhas em suas bochechas disso me lembro, você também sempre usava um perfume doce e suave, como o aroma de flores sendo levado pelo vento (Dei uma de Lysandre agora, não é?). Porém, Ally, os momentos se foram. As memórias estão sendo ocupadas por um branco, completamente vazias. Irei acabar como eles, aqueles que te esqueceram, por isso escrevo isso: Para recordar.

No entanto, sei que haverá uma coisa que nunca irá sumir. Nunca irá se apagar da minha mente a maneira como você partiu e, não posso deixar de acreditar que foi culpa minha.

***

A conheci em uma quarta, também foi em uma que a vi pela última vez. Eu estava de volta à escola, após faltar por dois dias consecutivos. Quando voltei, a confusão era generalizada. Você tem que entender que minha mente estava uma bagunça, a minha ex-namorada que magoou meu coração havia voltado com uma ótima proposta, quase irrecusável, se não significasse viajar por aí com Debrah. Porém, os problemas que você estava causando não me deixava pensar. Quando uma mente e um coração estão confusos, fazemos coisas idiotas. Talvez o meu maior ato de imbecilidade foi não acreditar em você.

Assim que a notícia sobre o balde de água jogado na minha ex, chegou até mim, nem precisei que Iris me dissesse quem foi, pois o meu pensamento automático foi dirigido até Ally, a mesma garota que sempre foi gentil comigo e com todos. Não me orgulho dessa parte.

Nem deixei Iris terminar de falar, fui logo atrás de você. Meu pensamento, lógico, é de que estaria no corretor, o mesmo local onde a diretora a chamou, há menos de cinco minutos. Fui com o sangue fervendo, andando em passos firmes, com uma mente em neblina feita de raiva. Também não gosto de pensar que estava com raiva de tu naquele momento, porém eu estava estressado e o acontecimento foi a gota d’água que fez tudo transportar. Então havia uma enxurrada de sentimentos saindo de mim.

O corredor feito de paredes de armários velhos, com um teto desbotado, um chão sujo e apenas duas portas sempre fechadas, estendia-se a minha frente, até acabar em uma parede branca e uma curva. Costuma ser uma locação lotada no intervalo das aulas, mas o sinal havia batido, e não havia nenhuma alma ali. Exceto a minha e a sua. Eu estava certo, você estava ali, porém sozinha.

Sua cabeça estava baixa, deixando seus cabelos loiros desgrenhado esconderem seu rosto. Seus ombros estavam encolhidos, enquanto olhava o chão fixamente. Você estava longe e te chamei de volta a Terra.

— Allyson! — Dessa vez a pronúncia de seu nome saiu diferente, como um esbravejo.

Você levantou o rosto. Sua aparência sempre foi angelical, ou talvez um pouco mais parecido com uma boneca de anjo. Seus olhos azuis, sempre pareceram uma parte retirada do céu, mas naquele dia estava uma tempestade, pois você andou chorando, o que tornava sua aparência mais frágil que o normal.

Foi a minha visão de você que acalmou um pouco meu coração e, permitiu-me pensar um pouco.

— O que você estava pensando? Por acaso tem três anos de idade para fazer algo assim? Poderia ter machucado ela. Qual o seu problema? — Minhas palavras saíram altas demais, raivosas demais.

Você tentou balburdiar alguma coisa, sem conseguir fazer com que as palavras saíssem direito.

— Não fui eu, Cassy. — Sua voz saiu fraquejando, e meu apelido carinhoso como uma súplica.

— Oh! Claro que não! o balde caiu sozinho — disse com um sarcasmo ácido — Eu nunca imaginei que você seria capaz desse tipo de coisa. Eu realmente não te conheço.

Eu vi o meu reflexo nos seus olhos. Eu te lançava um olhar que ninguém nesse mundo merece, um olhar de decepção, como se sua vida não valesse a pena. Já me deparei com olhos amargurados, com nojo. Como o que você viu, e sei, nada te faz sentir-se mais miserável do que isso.

Você abriu a boca para tentar falar algo, mas não quis te escutar. Dei-lhe as costas, quando girei nos calcanhares, enquanto você chamava meu nome, inutilmente, pois não quis te escutar. Sumi na curva final do corredor, deixando-a sozinha. Não sei se chegou a chorar, gosto de pensar que não.

***

Uma mentira que todos acreditam modifica a verdade, ou a verdade é algo imutável?

Você veio me procurar. Agora, pensando bem, percebo que você sempre voltava quando eu te mandava partir. Por que não voltou depois, então?

Estava na escadaria, com as costas apoiada na parede e olhando um mancha no teto. Sentia que em meu coração também se formava uma mancha de bolor. Naquele dia, parecia que o meu coração não parava de se machucar. Claro, sempre há outra coisa para quebrar.

— Castiel — chamou, fazendo-me baixar o olhar. Você estava rígida, confiante e mais disposta a falar o que queria. — Eu não fiz nada disso, não joguei o balde, não infernizei a Debrah, pelo contrário. Todos me olham como se fosse a vilã. E, só eu sei que ela está manipulando a todos.

Continuei calado, estreitando cada vez mais os olhos. Podia sentir meu corpo se aquecendo, como se eu fosse algum tipo de fera, preste a mostrar os dentes.

— Vá embora. — Palavras podem ser afiadas como facas, podem atravessar seu corpo e derramar seu sangue. — Não quero ver você nunca mais. Fique longe de mim e de todos que eu amo. — Aquelas palavras foram facadas.

— Por que você não acredita em mim? — Lágrimas escorriam por seu rosto, sendo puxadas pela gravidade até o chão, percorrendo o caminho mais fácil.

As lágrimas, assim como nós, tem que seguir uma força que é mais forte do que si próprio. Foi isso que aconteceu com você, com nós.

— Teria sido melhor se nunca tivesse te conhecido —Quando uma palavra é jogada ao vento, não pode ser recuperada. Quando um desejo é feito, não pode ser desfeito. Quando uma pessoa é magoada, não podemos curá-la?

Tenho a impressão que tudo parou. Quando estávamos naquele lugar frio, olhando no rosto um do outro, com olhares dolorosos, comigo agindo como uma pedra fria, e você como a chuva triste. Mas o mundo não freia para respirarmos, de forma que ele girou até o momento seguinte. Você saiu correndo. Eu soquei a parede. O sinal tocou, e a aula acabou. O momento se foi, e nunca te pedi desculpas.

***

Se não existo para os outros, não vivo

Você sumiu na multidão que irrompeu das portas. Saiu chorando pelo meio de uma multidão sorridente, até sair da escola. Acho que ninguém reparou em você, nem em nós, você disse que eles estavam te ignorando, te trataram como um fantasma antes mesmo de se tornar um.

Não me arrependi no mesmo instante. Os corredores ficaram quase vazios, e ainda não tinha mudado de ideia.

Quantas pazes não teriam sido feitas, se não fôssemos tão orgulhosos? Precisei que a culpa corroesse como ferrugem, não só o meu peito, como todo meu corpo, até me deixar doente. Só ai, deixei meu imenso orgulho de lado. Agora fico me perguntando se não teria sido melhor não ter ido, assim não teria visto a cena, assim teria doído menos. Mas não podemos ficar pensando no se.

Eu corri em passos desesperados para fora daquele prédio escolar, só para chegar até o portão e ver que não conseguiria te encontrar. Parecia que justo naquele dia todos decidiram se acumular a frente da escola, como uma grande reunião. Havia várias cabeças por todos os lados, vários rostos, você era tão pequena que era quase impossível encontrá-la.

Foi quando minha cabeça girava de um lado a outro em sua procura, que deparei-me com aquela velha escada do lado de fora da construção, nunca tinha reparado muito bem naquilo, até hoje aquela construção não faz sentido, mas não pensei nisso na hora, foi apenas depois, quando passei a analisar cada ponto daquele dia.

Precisei apenas subir quatro degraus para que te visse. Seus cabelos loiros brilhantes fazia um ótimo trabalho em se destacar. Você estava com a cabeça baixada, olhando apenas para seus próprios pés.

Só é necessário um segundo, uma imprudência, uma decisão errada para acabar com uma vida inteira. Foi assim com você, foi assim comigo.

Uma brisa soprou em meu rosto, fria, breve, mas principalmente com o seu perfume. Pode ter sido uma coisa da minha cabeça, um detalhe que acrescentei com o tempo, porém havia uma brisa, pois seus cabelos voaram, como se soubessem e quisessem fugir.

Quero entender o que te fez atravessar aquela rua com o sinal vermelho, você sempre foi tão responsável. Pensariam que foi irresponsabilidade, eu acredito que foram as lágrimas que embaçaram sua visão, ou a tristeza que embaçou sua mente.

Você tinha dado três passos. Eu já ia descer para correr atrás de você, para lhe pedir desculpas, quando ouvi a buzina. Um caminhão, foi isso que te acertou, acho que você nunca soube, então estou te contando.

‘Alysson’ eu gritei com todas as forças de meu pulmão, ao notar o que estava prestes a acontecer. Você olhou para mim, nossos olhares se cruzaram pela última vez, aqueles seus gigantes olhos azuis, que sentiria falta pelo resto de minha vida. Dói pensar nisso, relembrar isso. Só aproveitei um instante, antes que o caminhão te atingisse e te arrastasse.

Depois veio os gritos, muitos gritos.

Fiquei parado olhando o nada, pois era só isso que estava vendo. Parecia que minha alma havia fugido de meu corpo. Por alguns segundos eu era só uma estátua, na verdade, tudo naquele dia se passou em segundos, rápido demais para compreender.

Não sei quando desci as escadas, nem como passei pela multidão que te rodeava, tudo isso foi apagado. Como sua vida, foi apagado.

Você parecia uma boneca, uma boneca ensanguentada, uma boneca de olhos vazios, uma boneca quebrada.

O asfalto estava pintado com a cor de seu sangue, o ar estava preenchido com o cheiro de seu perfume misturado com o cheiro da morte. Você estava olhando para mim, com a cabeça virada para o lado errado, com um olhar morto, a boca aberta como se ainda tivesse algo para dizer. Você estava imóvel, seu peito não se movia, ali soube que a vida havia escapado de seu corpo.

Tem algo pior do que ver alguém que você ama morto?

A dor é algo comum, dói quando nascemos, dói quando morremos, dói para aqueles que nos amam.

Vermelho sangue, foram essas as cores que tomou conta da minha vista, ao mesmo tempo que lágrimas escapavam de meus olhos. Enquanto eu apagava, até cair na completa escuridão.

***

Posso sentir que estou desaparecendo. Sou areia levada pelo tempo, sou só pó que se junta a Terra

Continuei por algum tempo na escuridão, até compreender que o lugar macio que estava sob mim, era meu colchão, e o molhado do meu rostos, minhas lágrimas, lágrimas salgadas que chorei durante a noite. Somente quando abri os olhos, e a visão do meu quarto bagunçado se formou, que entendi que foi um sonho, real demais, mas um sonho.

Uma lágrima me escapou caindo sobre o meu colo, enquanto me sentava na ponta do colchão. Fiquei por algum tempo atordoado, olhando de um lado para outro cada quinquilharia minha no quarto, vendo se aquilo era real mesmo. E era: minha guitarra estava jogada no mesmo lugar que deixei no dia passado, minhas roupas estavam no mesmo lugar de ontem, ou seja, no chão. Tudo estava em seu devido lugar.

Um alivio tomou meu corpo, você ainda estava bem e viva. Acho que nunca fiquei tão contente com a realidade, do que aquela manhã. Toda a dor que teria que passar, não passou de um sonho. E essa não é a melhor sensação do mundo? Afinal, quanta vezes acordamos e ficamos descontentes ao ver que tudo foi um sonho, um incrível sonho que você queria que fosse real. Mas existem os pesadelos, aqueles que temos quando dormimos e os que temos acordados. No segundo sempre queremos que seja apenas uma tortura do seu cérebro, nada que realmente aconteceu, porém, quase nunca é apenas ilusão.

Lembro-me de ter ficado feliz, a mais pura e verdadeira alegria ao ver que aquilo não aconteceu. Talvez eu tenha sorrido. Em seguida fui lavar o rosto, tirar os resquícios do meu pesadelo, e apagar aquela marca de meu rosto.

A leveza que senti em minha alma durou pouco. Ao mesmo tempo que fazia meus afazeres normais, como tomar café, tomar uma ducha, ou arrumar-me para a escola, não parava de pensar em você.

Havia um buraco se formando em meu peito, como um buraco negro que estava me sugando para dentro de mim mesmo, só que para uma parte mais escura e desconhecida. Apesar de saber que não foi real, a sensação não se ia, é o que chamam de sexto sentido. Aquele mesmo que sempre nos avisa quando algo não está certo.

Mesmo quando meus pés iam um à frente do outro, enquanto fazia minha caminhada rotineira até a escola, algo me pareceu errado. Como se um dia eu tivesse acordado e o mundo não fosse mais o mesmo, por mais igual que pareça, há uma peça faltando, e isso podia sentir no ar.

Naquele dia não cabulei a aula de matemática, como sempre faço, decidi ir e te ver. Sabia que você estaria lá, nunca faltou antes, não importava que odiasse matemática, você iria. Sentei-me na última cadeira da quarta fileira, lancei meu caderno sobre a mesa, e coloquei os pés na cadeira ao lado, como o folgado que era, tudo como sempre foi.

A sala se encheu de alunos desinteressados, o velho Sr. Travis chegou com seu caminhar lento, sem a mínima vontade de dar aula. Tudo correu como sempre, a aula foi uma chatice, eu não fiz a lição. Porém, a aula já havia chegado a metade e sua cadeira continuava vazia.

Depois que o sinal bateu, depois que todos saíram para a próxima aula, continuei ali. Fiquei sentado no mesmo lugar. Observando a mesa que costumava sentar. Fiquei tão concentrado a ponto de poder ver você ali, como nas outras milhares de vezes. Sua cabeça estava inclinada para baixo, a mão direita apoiando a cabeça, e o cotovelo apoiado na mesa, os cabelos caindo sobre o livro que lia com atenção. Nesse dia você estava tão concentrada que não resisti e joguei uma bolinha de papel, imediatamente você se virou para mim, estreitando os olhos como se quisesse obter olhar de raio lazer, eu dei uma risada, pois você ficava muito engraçada brava. No entanto, sempre foi você que mais teve paciência com minhas atitudes irritantes.

As lembranças cortaram meu coração, fazendo uma ferida se abrir. Peguei meu caderno com brutalidade, saí a passos firmes, querendo com convicção encontrá-la de qualquer jeito.

Todos da escola pareciam ter decidido vagabundar no pátio. Mas nenhuma daquelas pessoas era você.

Sentados em um banco debaixo de uma arvore, na extrema direita do pátio, estavam Lysandre, Rosalya e Iris, todos juntos, todos bons amigos seus. As garotas estavam rindo, e Lysandre estava com aquela expressão calma de sempre, nenhum deles parecia compartilhar de minha aflição.

Estava indo em direção a eles, quando uma mão fria agarrou o meu braço, por alguns instantes imaginei que era você, Alysson, mas aqueles dedos finos e aquelas unhas pintadas de preto, com certeza não lhe pertenciam.

— Gatinho, o que houve? Por que ainda não me deu uma resposta?

Debrah estava igualzinha, a mesma roupa do sonho, com um decote enorme. A mesma aparência, com aqueles cabelos castanhos gigantes, e aquele olhar sedutor e o mesmo sorrisinho cínico. Ela continuava linda. Mas a encarei de uma forma diferente, da mesma maneira que se encara um fantasma. Ficando completamente branco.

Soltei o meu braço com um puxão, por algum tempo apenas fiquei olhando para ela, com a boca aberta sem consegui articular uma palavra. O fato dela estar ali, não podia ser real, assim como a sua morte.

Simplesmente a ignorei, dando as costas, como antes tinha feito com você. Teria gostado de ver isso, não é?

Todos ficaram me encarando quando parei a frente do banco. Minha expressão devia estar bem diferente do habitual, mais carrancuda e com toque de desespero, pois eu estava desesperado.

— Onde está a Ally? — Perguntei, indo direto ao ponto.

Lembro com exatidão a maneira como eles trocaram olhares, procurando no rosto um do outro a resposta a minha pergunta, e quando não encontraram, olharam para mim, franzindo a sobrancelha.

— Que Ally? — A pergunta veio do Lysandre, o mesmo garoto que adorava compartilhar poemas com você, o mesmo que sempre perdia o bloco de notas e você o ajudava a procurar. Esse mesmo garoto me perguntava do que estava falando.

— A Alysson, lógico — falei, perdendo a paciência.

— Ah! Você está falando da Alysson da oitava série? — Iris se intrometeu com um brilho no olhar, como se tivesse resolvido a charada.

— Não, estou falando da Alysson da nossa sala. — Eu praticamente gritei para eles.

Eles trocaram olhares novamente, mas dessa vez quando viraram para mim, pareciam estar meditando se eu estava louco. Aqueles olhares terríveis, vieram seguidos de palavras terríveis.

— Não há nenhuma Alysson na nossa sala, Castiel. — As palavras saíram devagar da boca do Lysandre, como se ele estivesse explicando um fato cientifico de conhecimento público.

— Você está bem, Castiel?

Não, não estou tive vontade responder na hora. Mas as palavras não saíam, se perderam no caminho entre minha boca e meu coração, pois era dali que as palavras vinham. Assim como o buraco que me sugava, pois nessa hora meu coração doía, e ele parecia ser a única coisa que eu tinha na hora.

Saí como um bêbado, tropeçando, sem conseguir andar em linha reta, como um perdido. Todos voltaram as suas devidas aulas, mas eu simplesmente me encostei em uma árvore. Como aquelas boas ideias que temos em filmes, decidi ligar para você, então ouviria sua voz, e, tudo não passaria de uma brincadeira.

Mas não havia ninguém na letra A, nenhuma Alysson, ninguém, só vazio. Eu ainda liguei para você, ainda disquei os números, simplesmente para uma voz eletrônica me dizer que esse número não existe, que você não existe.

***

Quando esquecerem seu rosto. Quando seu nome já não for mais citado em conversas. Quando lembranças suas forem sonhos. Será aí que você deixará de existir?

Eu corri, mais rápido do que meu pulmão fumante me permitia. Para um lugar que eu sabia que você estaria, que você tinha que estar. Com todas as forças, corri para o que deveria ser o nosso final feliz, onde eu encontraria com você e então te abraçaria. Pediria desculpas e diria que te amo. Pois parecia que meu corpo estava sendo consumido, pelo desespero, pela dor, pela saudade. No fim, descobri o que era aquele buraco, ao perceber que passaria uma vida inteira sem você, ele se formou, como uma resposta ao vazio que estava sendo deixado em minha vida, um vazio também se formou no órgão mais importante. Mas, até o último segundo, eu esperei por um final hollywoodiano, esqueci que a realidade é cruel.

O mato estava enorme, como se nunca tivesse sido capinado, as flores estavam mortas, um quintal completamente descuidado. A tinta estava descascando, além de ter manchas pretas por todo o lado. A janela da cozinha estava quebrada, como se alguém tivesse jogado uma pedra. A porta estava cheia de ferrugem. Parecia que nenhum ser humano jamais morou ali. Pelo menos era o que a placa com letras bem grandes dizia: À VENDA.

Meus joelhos se dobraram, fazendo-me cair sobre o asfalto cinza, bem ali à frente da sua casa.

‘Teria sido melhor se nunca tivesse te conhecido’, essa frase começou a girar em minha cabeça. Eu fiz um pedido e você atendeu. Eu nunca te conheci e isso é o que mais acabava comigo.

***

Se nossos méritos em vida fosse contado pelo número de pessoas que nos amassem, qual seria o tamanho de meu ídolo?

Em todos os lugares eu procurei, em hospitais, em cemitérios, em qualquer lugar. Cheguei até a encontrar seus pais, mas eles nunca tiveram filhos. Por quase dez anos, continuei procurando.

Depois, percebi que te amava. O amor passou a minha frente, mas o mandei embora. Agora, procuro uma Alysson, para preencher meu coração, ou minha vida. Sei que nunca encontrarei, pois, no fim, estou sempre à procura do mesmo sorriso, da mesma careta, da mesma pessoa.

Você se foi, Alysson, para sempre. Ninguém se lembrará de você, nem mesmo eu. Todas as brincadeiras, todos os sorrisos, todos os olhares, se foram. Sua existência foi apagada da minha. O pior é que a culpa me pertence, sempre estive afastando as pessoas, as mandando embora, sem perceber a falta que elas fariam.

Agora, enquanto choro sobre essa carta, que nunca será lida. Penso nas milhares de coisas que queria ter falado para você, ou as coisas que queria ter feito. Nada disso irá caber em palavras, muito menos em memórias.

Por muito tempo, desejei que você voltasse, pensando que talvez os mesmos anjos que te levaram a tragam de volta, mas eles só tiram. Não posso reclamar com eles, você esteve em minhas mãos, e eu fui um idiota. Incapaz de dar valor ás pessoas certas.

Agora, sou apenas um velho de mãos tremidas, que acabou sozinho. Um destino merecido, com certeza. Como você, não deixarei nada para trás, que prove que um dia estive nesse mundo. Eu estive e você também, é isso que importa.

Mas antes de partir, quero dizer duas coisas: Me desculpe e eu te amo.


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Notas finais do capítulo

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