Uma canção de esperança escrita por Lu Rosa


Capítulo 14
Quatorze




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Lucille irrompeu no camarim e jogou-se sobre o divã. Sentia-se furiosa pela audácia do capitão nazista. Ele a beijara! Beijara-a mesmo depois de ela ter dito que era casada. Era um descarado, arrogante, insensível!

Mas uma vozinha lá em seu inconsciente lhe dizia: Mas você derreteu com esse beijo, não foi?

O desgraçado até que beijava bem. Um toque másculo, mas ao mesmo tempo carinhoso. Como Gerard...

Lucille sacudiu a cabeça. Com certeza estava ficando louca ao comparar seu gentil marido àquele arrogante capitão nazista.

***

Claude levantou a cabeça das partituras que lia quando Gerard entrou novamente na sala. A agitação de seu irmão mais novo chamou a sua atenção.

– Eu a beijei! – Gerard exclamou, andando de um lado para outro. - Beijei! Não resisti.

– O que você está me dizendo, Gerard? – Claude levantou-se da cadeira.

– Beijei Lucille. Segurei-a em meus braços e a beijei. Eu não aguentei. Ela estava lá nos braços de outro homem – ele virou-se para Claude com uma expressão quase raivosa no rosto. – Ela é minha! Ela é minha esposa.

Enfurecido, Claude bateu a mão na mesa.

– Agora escute aqui, Vermont! Se você não conseguir se controlar e colocar toda a missão em perigo, vou ser obrigado a conversar com Huntingdon e te substituir. Não vou colocar a vida de Lucille, a sua e o sucesso da missão em risco por que você não consegue se controlar. – e bateu a mão na mesa novamente enquanto falava.

– Desculpe. – ele sentou-se na cadeira. – Eu tinha... Tinha que estar mais focado.

– Eu acho bom mesmo você se focar na missão. – respondeu Claude. – Eu concordei com isso por que Huntingdon me disse que você era o melhor agente dele. Agora, se você não consegue ficar longe de sua esposa, que aliás, pensa que você está morto não é? Eu vou conversar com ele e a gente dá um sumiço em você, entendeu?

– Está bem. Desculpe-me. – Gerard suspirou.

Claude colocou a mão sobre o ombro do irmão.

– Eu sei que é difícil pra você. Nós colocamos você nisso. Você estava feliz com ela. Mas Gerard, você tem que terminar isso primeiro. Toda segurança da Europa, o caminho para a liberdade da França, está em suas mãos. Você tem que conseguir esses dados. – ele dava tapinhas no encosto da poltrona enquanto falava.

Os dois ficaram em silencio por alguns instantes.

Claude se sentou em frente ao irmão e disse em tom conspiratório.

– Se você tiver... Com algum problema com abstinência... Eu converso com alguma das acompanhantes e vem aqui resolver o seu problema.

– E você acha que eu dormiria com outra mulher estando assim tão próximo de Lucille. – Gerard respondeu irritado.

– É o que você deveria fazer. – retrucou Claude com ar de troça. – Você quer que eu traga uma das meninas para cá? – ele perguntou levantando-se da poltrona.

– Não! Eu consigo me controlar. – ele disse com voz cansada.

– Acho bom. Acho bom mesmo que consiga, Gerard. Bem, eu vou ver como ela está. – Claude declarou indo para a porta. – Ela precisa estar controlada para o show mais tarde. Conhecendo-a do jeito que ela é, aposto que ela está horrorizada, furiosa, querendo dar um tiro na sua cabeça. – ele declarou rindo muito. – Até logo, irmãozinho. – e saiu gargalhando pela porta.

***

Hanna entrou esbaforida na casa já tirando as luvas.

– Nannau! Estou atrasada, eu sei! - ela revelou quando a idosa criada veio ao seu encontro. – Mas eu fiz um passeio tão bom que me esqueci da hora.

– Que ótimo, querida esposa. Talvez queira nos dizer onde passou a manhã. – uma voz masculina assustou as duas mulheres.

Otto Von Gorthel saiu do escritório posicionando-se de frente as duas, empunhando uma pequena bengala.

Hanna baixou os olhos para o chão.

– Fui à Igreja. – ela revelou com voz inaudível.

– Oh, à Igreja. E deve ter tido a companhia do próprio Jesus para voltar tão feliz.

– A religião é um conforto para mim, Otto. Eu me sinto feliz quando encontro o amparo de Deus.

– Falou como uma verdadeira santa! – ele bateu palmas debochando dela. – É por isso que você é tão interessante como esposa, senhora Von Gorthel. É a santidade personificada!

Hanna não respondeu, permanecendo com olhos baixos.

– Estou com fome e quero almoçar. Prepare tudo. E mais tarde vamos sair.

– Onde vamos, Otto?

– Um jantar que eu estou oferecendo ao comando. Hollinger vai voltar para Berlim e quero que ele leve ótimas lembranças de Paris.

– A que horas devo estar pronta? - perguntou Hanna.

– Exatamente às 19:00. Sairemos às 19:30. O jantar está marcado para as 20:00. Fui claro?

– Sim, Otto. – ela virou-se para a ama. - Nannau, avise a cozinha que o comandante já chegou para o almoço. Vou almoçar em meu quarto. - ela começou a subir as escadas. Von Gorthel voltou para o escritório.

Nannau, ou Clara Berger, olhou para sua jovem senhora subindo as escadas como se tivesse o triplo de sua idade. Uma pena. Ela havia chegado tão contente da rua. Incrível como aquele monstro a tiranizava. Quando ela viu as marcas que ele deixara em Hanna ainda nas núpcias, sua vontade era de matá-lo. Mas se o fizesse seria presa e morta. E a sua menina? O que seria dela? Juntas, as duas suportavam todo o sofrimento de Hanna naquele casamento infeliz. Todas as noites, em suas orações, a velha senhora pedia a Deus que livrasse sua menina daquele monstro e que lhe desse alguém capaz de curar as feridas daquela alma tão sofrida. Largando essas lembranças, Nannau correu para a cozinha para avisá-los do almoço do comandante.

***

Julian tendo deixado Lucille tranquila no Moulin, começou a percorrer as ruas de Paris na direção do local marcado por ele e seus companheiros.

Fora uma surpresa ver Giraud e Pierre vivos. Mas ele se sentiu triste ao saber que Madellion e Gustave tinham caído. Tinha sido uma missão suicida. Mas o que aconteceu durante o ataque era o que preenchia sua mente agora. Principalmente depois de ter visto aquela moça no Orfanato. Como e por que a amiga de Lucille estava viajando num comboio alemão?

Ele se lembrou de como foi fácil subjugar os batedores e parar o carro. Dentro dele estava a criatura mais linda que ele já tinha posto os olhos. Depois de sua amada Lucille, é claro. Os grandes olhos azuis amedrontados que o encaravam e ela se agarrava a uma idosa como se fosse sua mãe.

“- Por favor, não nos faça mal. - ela pediu num francês hesitante com os olhos mareados de lágrimas.”

“- Claro que não mademoiselle. Ao contrário dos nazistas não ferimos mulheres e crianças. E nem idosos.” – ele respondeu

A jovem pareceu relaxar, foi quando os primeiros tiros soaram. Ele entrou no carro e a fez abaixar para se proteger. A jovem e ele ficaram abaixados entre os bancos e a idosa senhora deitou-se no banco traseiro. O rosto dos dois ficaram no mesmo nível e quando os dois se fitaram, Julian sentiu um estranho alheamento. Como se a pequena escaramuça lá fora pertencesse há outro tempo e espaço. Ele não ouvia os barulhos dos tiros nem os gritos dos homens sendo atingidos. Somente quando um soldado alemão chegou perto do carro gritando uma ordem que ele não entendeu, foi que ele despertou. Deu um tiro certeiro no soldado e saiu do carro. Ele ainda olhou para a moça.

“– Julian, cuidado!” – ele ouviu Pierre gritar.

Foi quando ele levou o tiro de raspão do braço. Ao mesmo tempo ele atirou no soldado e gritou.

“- Corram! Fujam!” – Julian correu para encosta próxima. Rolou e rolou vários metros abaixo. Esperou anoitecer e correu para Paris onde, por sorte, encontrou o grande amor de sua juventude.

Julian chegou ao ponto de encontro e sentou-se em uma das mesas para esperar seus companheiros. Ele amava Lucille, mas rever a moça dos olhos azuis trouxe - lhe uma emoção desconhecida.


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