Life is Good - A vida é boa escrita por Valdir Luciano


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Este primeiro capítulo é uma introdução a um grande romance que tem como base a minha história de vida. Porém, gostaria de deixar bem claro que a trama central se trata de uma ficção, com traços de realidade.Espero que este seja o início de uma bela amizade entre eu, escritor, e vocês, leitores.Boa leitura!



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Prólogo -

06 de maio de 2000...

Estou chorando desde ontem.

Não consigo dormir. Não consigo acordar... Estou preso dentro de uma cadeia imaginária e torturante, no qual vejo e revejo interminavelmente a imagem pálida e inexpressiva de minha mãe... Morta.

Ainda consigo ver o sangue jorrado no chão. Os olhos dela

Lucas interrompeu aquela leitura. Faltavam palavras na folha suja e rasgada. Mas não importava. Ele já não queria saber mais sobre aquelas terríveis lembranças memorizadas em escrito. Aquele pesadelo precisava ser apagado. E ele o estava fazendo.

As folhas eram amassadas e arremessadas, uma a uma, dentro daquela pequena lareira acesa, cujas chamas queimavam e consumiam toda e qualquer visão do passado. Visões que Lucas teimava por esquecer.

A cada ofegar, pequenas nuvens de fumaça saiam de sua boca. A cada papel amassado e jogado sobre o fogo, um cigarro era tragado com gosto. Parecia amenizar a dor que estava sentindo. Porém, seu rosto não o expressava. Era como se a tristeza interna fosse consumida pela ignorância em sua face. Os olhos verde-profundos estavam secos e não lacrimejavam qualquer substância líquida. Eles encaravam a chama ardente da lareira, como se o pensamento estivesse longe, longe o bastante do tempo e espaço. Como se estivesse preso em algum lugar, momento no qual gostaria de reviver, se pudesse voltar atrás.

– A vida é linda! – soou a voz materna em seus ouvidos. Uma voz que não estava presente naquele lugar. Mas que ele daria tudo para que estivesse.

Seus olhos, de repente, fecharam-se. Ele se levantou da velha cadeira de madeira e, com toda a força que podia, arremessou o livro contra as chamas, fazendo as faíscas sobressaltarem da lareira. E então, todas as lembranças sumiram em meio às faíscas. Todas as confissões estavam sendo apagadas rapidamente, transformando-se em cinzas.

O diário estava sendo queimado.

O diário de seu irmão.

Lucas, instintivamente, dilatou seus olhos e encarou as chamas.

– A vida é uma droga – sussurrou, com ódio nas palavras.

Pegou a mochila que estava no chão e, antes que a jogasse nas costas, puxou o zíper e retirou de dentro um objeto de metal. Segurou-o com a mão direita e respirou fundo.

Caminhou em direção a saída daquela velha casa. No coração, um ódio inconsumível. Na mente, um amanhã incerto. Nas costas, uma pesada mochila.

E numa das mãos... Uma arma.

Capítulo 1

– Café expresso! – anunciou a balconista, analisando com os olhos quem era o cliente daquela bebida. Desviou seu olhar para o chão quando o crachá em seu peito caiu.

Rapidamente, abaixou-se para pegá-lo. E, quando se levantou, seu coração palpitou fortemente com a sombra à sua frente: O cliente estava de pé e paralisado, com os cotovelos sobre o balcão e as pernas cruzadas. A camisa de manga longa e os óculos escuros no rosto soaram perigoso, mas ao mesmo tempo charmoso para a mulher.

– Esse é o meu café? – ele perguntou, com suavidade na voz e personalidade nos lábios finos, exibindo um tímido sorriso fechado.

Meire, a balconista, não conseguia desviar o olhar daquele homem. Estava paralisada, apreciando aquela visão que seus olhos não queriam perder por nada no mundo.

– O seu nome, p-por favor – ela disse quase se engasgando de nervosismo. Ao mesmo tempo, observou a nota embaixo da xícara para confirmar o nome que seria dito naquele momento.

Um silêncio pairou por alguns segundos e, logo após, o homem disse:

– Silvio.

Ela voltou a analisar no bilhete e confirmou, deslizando a xícara em direção a Silvio. Ele sorriu, desta vez, exibindo os perfeitos e embranquecidos dentes. Se ele fosse uma mulher, perceberia que a moça já estava prestes a ter orgasmos em pleno horário de serviço.

– Obrigado – ele agradeceu e, antes que a moça pudesse lhe entregar a conta da bebida, sacou uma arma da cintura e apontou em sua cabeça – Você poderia colocar na conta do dono deste estabelecimento?

O sorriso e a timidez de Luana se dissiparam no mesmo instante. O medo e o bolo no estômago vieram de uma só vez. Ela começou a tremer. Não conseguiu emitir uma palavra sequer.

Silvio tirou os óculos do rosto e seu olhar era sedutor, porém ameaçador.

Luana, lentamente, assentiu com a cabeça.

– Obrigado, mais uma vez – ele baixou a arma, não se importando com os olhares duvidosos e pasmos daqueles que estavam no local. O silêncio era absoluto.

Com a xícara na mão esquerda e a arma na mão direita, o homem saiu pela porta da frente. Na calçada, uma Suzuki Hayabusa branca o esperava estacionada à frente do Starbucks, o estabelecimento onde havia entrado. Ele montou sobre a mesma, atirou a xícara, já vazia, para longe, guardou a arma, colocou o capacete sobre a cabeça e ligou a moto, fazendo-a rugir com toda a potência. Seus olhos brilhavam. Mas era um brilho ignorante, com um semblante de alguém que não se importava com as conseqüências de seus atos.

Logo, as pessoas o denunciariam, a polícia estaria atrás dele. Mas sua mente estava vazia de preocupações. Para ele, já não havia motivos suficientes para viver dentro da lei. Se precisasse mentir, ele mentiria. Se precisasse falsificar uma identidade, não seria problema algum. E se precisasse matar, ele o faria sempre que fosse preciso.

Porque, afinal, ele não era um homem. Ainda era um jovem de vinte anos. E seu nome não era Silvio.

Era Lucas.

Lucas Oliveira Martins.

A moto saiu em disparada pela pista, cujo lado direito esbanjava a imensidão do mar, que terminava à beira da praia. Em uma das placas cravadas na areia, as boas vindas aos turistas e viajantes:

“Bem vindo à Copacabana!

A melhor praia da cidade maravilhosa:

Rio de Janeiro”

L

O vento soprava forte contra a direção do garoto. O ranger da moto era ensurdecedor, fazendo as pessoas na rua voltarem seus olhos curiosos para ela. Os olhos vagos de Lucas encaravam o caminho à sua frente. Parecia não se importar com o rumo daquela viajem eletrizante. Mal sabia que estava acompanhado – muito mal acompanhado.

O som da sirene era mais alto que o da moto. Logo, ele pôde ver pelo retrovisor o automóvel da polícia militar do Rio o seguindo a toda velocidade, aproximando-se cada vez mais.

Você, Lucas pensou e, então, acelerou de forma drástica o motor do veículo, desaparecendo para aqueles que estavam caminhando na rua, emitindo um som completamente incômodo.

Pare! Lucas! – a voz dentro da viatura gritou.

O garoto não deu ouvidos e, de repente, virou à esquerda em uma travessa que dava acesso à favela do Pavão-Pavãozinho. O policial, na viatura, fez a mesma manobra com um pouco de dificuldade, já que era um automóvel pesado. Os quatro pneus dançaram e o veículo quase rodopiou. O atraso fez com que Lucas ficasse a alguns metros a mais na frente do seguidor.

As pequenas e estreitas casas eram vistas como borrões de tinta por Lucas. A velocidade da moto já atingia os 150 quilômetros. Porém, o garoto precisou desacelerar para desviar-se dos pedestres, dos meninos que corriam na rua, das barracas de feira e dos cachorros que perambulavam a favela. As manobras eram cada vez mais intensas, deixando a moto cada vez mais lenta. Logo, a silhueta da viatura podia ser vista quando Lucas olhou pelo retrovisor.

Ele não seria pego. Não queria ser pego. Mesmo que não sentisse tanto vigor em sua vida, era muito melhor curti-la do lado de fora das grades da prisão. Mas ele não estava tão preocupado em ser pego, tampouco preso. O que ele estava realmente temendo era ouvir.

Ouvir sermões.

Sem pensar, Lucas desceu da moto e a deixou jogada no meio da rua. Começou a correr com o capacete em passos largos, se esquivando das crianças e dos animais, esbarrando nos homens e nas mulheres, tropeçando nas pequenas barracas da calçada.

Por fim, virou à esquerda em uma estreita viela, cuja água de esgoto escorria para fora. Tirou o capacete e o jogou no chão, deixando-o para trás enquanto corria – agora desesperado – pelo beco em direção ao destino que ele não tinha a menor ideia de qual seria. As casas na direita e esquerda eram grudadas umas às outras. Algumas janelas estavam abertas e moradores observavam, curiosos, a estranha movimentação.

Lucas olhou para trás: Não havia polícia por perto.

Consegui, ele pensou com um sorriso largo e arfante. Quando olhou para frente, avistou o fim da viela e o início de uma rua – subida – que dava acesso ao interior extremo da favela.

Ele parou de correr e, aos cambaleios, começou a caminhar em direção à rua. Porém, seus olhos se dilataram e um bolo subiu à garganta:

A viatura de polícia estava parada na rua e o policial permanecia encostado sobre a porta com os braços cruzados e uma sobrancelha erguida. Um olhar intimidador.

– Fim da linha para você – ele disse, soltando os braços.

Lucas parou e o encarou veemente. O suor escorria de sua testa.

– Não posso mais ficar aliviando a sua barra, garoto – disse Marcos, o policial, caminhando lentamente em direção a Lucas – Neste momento há muitos bandidos de verdade, filhos da puta, que estão por aí no tráfico, roubando e matando pessoas... E eu estou aqui, livrando a sua pele. Mais. Uma. Vez!

O garoto, ao ouvir aquelas palavras que de alguma forma soavam como um sermão, deu um meio sorriso.

– Eu não estou pedindo nada a você – a arma foi exposta e apontada para Marcos.

– Onde conseguiu isso? – Marcos perguntou, respirando fundo. Aquela era uma surpresa para ele – Aonde você conseguiu essa porra?

– Conhece os classificados da internet?

Marcos assentiu, sério. Lucas começou a rir.

– Então, eu achei alguém que estava tentando desapegar disso – ele ergueu a arma e a contemplou como se fosse uma barra de ouro – e eu tinha algumas coisinhas que estava tentando desapegar já faz um tempinho...

– Que coisas, Lucas? – Marcos estava intrigado.

– Nada demais - Lucas disse com a cabeça baixa, mas logo se ergueu com um olhar sarcástico – Só tudo o que não tinha mais valor para mim.

Marcos estava completamente furioso. O sangue começou a ferver os seus nervos e circular rapidamente na cabeça. Ele respirou fundo e, lentamente, ergueu as mãos em direção ao garoto.

– Baixa essa arma, Lucas. Você não vai cometer nenhuma besteira ainda maior do que a que você já andou fazendo!

Agora a expressão de Lucas era séria. O garoto tinha a incomum habilidade de trocar de personalidade em questão de segundos, e isso assustava o policial que, naquele momento, tentava impor o controle da situação.

Encarando-o seriamente, com um brilho nos olhos, Lucas disse:

– Foi mal, tio Marcos... Eu só estou fazendo o que o meu coração pede. E, ultimamente, ele tem feito uns pedidos muito doidos.

Marcos sentiu pena. A arma nas mãos do seu sobrinho já não era um problema para ele naquele momento. Sabia que toda aquela rebeldia era resultado de um trauma ainda não superado pelo garoto. Por mais que os atos cometidos fossem imprudentes e fora das regras e leis, seria injusto e inumano não compreendê-lo. E Marcos compreendia tão bem quanto o próprio Lucas. Afinal, não existiam tantas diferenças entre tentar superar a morte de uma mãe e a morte de uma irmã.

– É difícil superar – Marcos começou a falar, após uma pequena reflexão – Eu sempre penso nela, todos os dias. Mas, Lucas, o que você acha que sua mãe faria se te visse segurando uma calibre 38? Existem tantas maneiras de se expressar e reprimir esse ódio e essa mágoa dentro da gente... Por que dessa maneira, Lucas? Você deveria estar formado no ensino médio, agora fazendo um curso superior, namorando e vivendo a sua vida... Mas, o que é isso que você está fazendo? Está te destruindo...

Lucas refletiu com as palavras de seu tio. Ele tem razão, pensou. E tinha. Naquele momento, ele deveria estar cursando Teatro, como sempre quis fazer; deveria ter finalizado o ensino médio, ter amigos para sair nos fins de semana... Enfim, viver.

Porém, no mesmo instante em que refletia passivamente sobre suas atitudes, uma explosão de ódio o tomou junto de pensamentos e memórias do passado.

Faça o que seu coração pedir, a voz de sua mãe ecoou em sua mente. Em seguida, aquela doce e serena voz foi dissipada por um estouro, seguido de ecos que se repetiam sem fim: O som de um tiro.

Lucas começou a ofegar, tremendo por fora. A arma tremia em sua mão e seus olhos, fechados, viabilizavam e ouviam o passado assombrando seu subconsciente. Ele podia ouvir a sirene da ambulância, conseguia enxergar as luzes da polícia e, pior, o corpo de sua mãe totalmente ensangüentado, estirado no chão, com os olhos vidrados e serenos. Se estivesse com eles fechados, era como se estivesse dormindo. Mas aquele era um sono. O sono eterno.

No entanto, a única lembrança que deixava uma peça faltando em sua mente era aquela que continuava a vagar nos dias atuais: Ninguém foi condenado, ninguém foi encontrado no local do crime e o caso continuava em aberto atualmente.

O ódio consumiu o seu corpo e alma. Sua mãe estava morta, ele já deveria ter superado aquilo. Mas seu coração era incapaz de esquecer e ocultar a vontade que ele tinha de encontrar o responsável pelo homicídio. Se fosse possível, ele mataria o assassino e o traria de volta, várias e várias vezes, cometendo diversos tipos de homicídios contra ele só para ter o prazer de torturar o culpado pela tragédia.

– Lucas – Marcos o chamou, intrigado com aquele estranho comportamento inquietante.

Logo, os olhos do garoto se abriram e ele ergueu sua cabeça num único movimento. As lágrimas desceram em profusão. Os lábios tremiam e o dedo ameaçava puxar o gatilho daquela arma.

E então, com a voz trêmula e feroz, Lucas disse:

Superar não é difícil, tio... A parte ruim de estar na minha pele é viver dia após dia com uma morte dentro da cabeça, cujo assassino nunca foi encontrado... Difícil é saber que há essa hora, nesse exato momento, o filho da puta que matou a minha mãe está por aí fazendo o caralho! Difícil é não conseguir se vingar do que fizeram com ela...

– Lucas...

– Vingança – o olhar do garoto agora estava vermelho – VINGANÇA! É só o que eu queria neste momento...

Marcos estava paralisado com aquelas doentias palavras obsessivas. Antes que pudesse dizer algo, Lucas mirou a arma em sua direção. O policial colocou a mão na arma em sua cintura, em um ato de reflexo. Ele não ia atirar em seu sobrinho. Jamais. Mas seu eu militar estava falando mais alto e seu corpo estava pronto para responder a qualquer ataque.

– Não faça isso! – Marcos ordenou.

Lucas gritou e, então, quatro tiros foram disparados.

Os pombos saltaram das lajes para o ar. O eco fez os cachorros começarem a latir em uma reação em cadeia. As pessoas nas ruas se esconderam aonde podiam...

Marcos não conseguiu reagir àqueles tiros. Mas não por imprudência ou medo. Seus sentidos estavam muito bem aguçados, o suficiente para perceber que aqueles disparos não foram direcionados a ele. Mas, sim, aos pneus da viatura.

– Essa sede por vingança não vai te levar a lugar algum – disse o homem, ainda paralisado – Se eu soubesse quem matou a minha irmã, eu mesmo teria me encarregado de fazer a justiça necessária... Eu me arrependo todos os dias da minha vida por não estar perto dela naquele momento...

Lucas derrubou sua arma no chão e começou a caminhar em direção ao seu tio. Naquele momento, Marcos não conseguiu pensar em quais seriam os próximos movimentos ou palavras de seu sobrinho. Ele estava totalmente imprevisível e louco. Quanto mais perto ele estava, mais apreensivo o policial ficava.

– Lucas, o que...

Lucas o abraçou, como se Marcos fosse o seu pai. O pai que também não tinha. O pai que não estava morto fisicamente, mas psicologicamente. Ele, por sua vez, retribuiu: Abriu os braços e depois o fechou envolta das costas do garoto, apertando-o forte, com carinho e todo o amor que um pai poderia dar ao seu filho – mesmo que ali fosse apenas um momento entre tio e sobrinho.

Houve um prolongado silêncio. Marcos sentia a respiração de Lucas, aparentemente calma. Queria dizer algo, o mais produtivo e consolador possível. Mas não conseguiu. Talvez Lucas só precisasse desabafar com alguém da família que ele já não tinha certeza em quantos eram. Talvez tudo o que ele precisasse, na verdade, fosse algo que há tempos não havia dado: Um abraço.

De repente, o policial sentiu uma leveza em sua cintura. Ao olhar para baixo, se assustou:

A arma tinha desaparecido.

O choque foi tamanho que, quando voltou a si, percebeu que Lucas já não estava mais abraçado com ele. Marcos olhou para trás e avistou o garoto dentro da viatura, dando partida no carro.

LUCAS! – ele gritou.

– Foi mal, tio – Lucas disse, acelerando o carro.

Antes que Marcos pudesse detê-lo, a viatura já estava seguindo o rumo em frente com uma arrancada de fuga, deixando o policial responsável para trás, abalado, furioso e frustrado por não conseguir entender os pensamentos de seu sobrinho.

Sem alternativas e imaginando o prejuízo profissional se perdesse aquela viatura, ele retirou o rádio de seu bolso e comunicou:

– Atenção, 932, preciso de apoio!

Tarde demais.

Algumas ruas abaixo, Lucas surgiu. Já estava com outro automóvel roubado. Deixou a viatura estacionada em algum canto da região para que não conseguissem monitorá-lo. A arma roubada de seu tio estava em sua cintura, o ódio ainda continuava ali, dentro das pupilas dos seus olhos, e muitos planos rondavam sua mente.

L

O ambiente do quarto escuro era quieto. Da janela, era possível avistar a imensidão do mar negro – quando à noite - e as luzes de Copacabana. Atrás da praia, as casas eram como tijolos postos um em cima do outro. O céu estava limpo e a lua resplandecia sobre a cidade maravilhosa.

As mãos deslizavam levemente sobre as costas definidas de Lucas. Ele estava relaxado, e o corpo acima dele era responsável pelo feito. Após aquela transa, nada melhor do que uma noite de descanso ao lado daquele que lhe proporcionara o prazer momentâneo.

– Está mais calmo? – disse Wesley, enquanto tentava estourar a única espinha contida nas costas do companheiro – Você tava muito tenso, gato. Andou se estressando muito.

– Só... Continua, ta? – Lucas disse com uma voz fronha e preguiçosa – Eu não estou pedindo consolo...

Certamente, gato. Você quem me consolou hoje.

Lucas soltou um ar de riso.

Wesley tirou as mãos das costas do companheiro e começou a acariciar o castanho cabelo ondulado. Observou, com atenção, aquele corpo no qual estava montado e disse:

Eu te amo, Lucas.

– Não pode – Lucas disse rapidamente, sem deixar espaço para que houvesse uma reflexão sobre o que ouviu – Sabe que não pode.

Wesley engoliu em seco. Ele não conseguia entender por que era tão difícil para Lucas aceitar aquele relacionamento. Era mais do que óbvio que ele sentia algo pelo garoto alemão de olhos azuis. Mas havia alguma barreira entre os dois. Uma barreira que Wesley não conhecia, e que Lucas também nunca se atreveu a contar.

– Vai dormir aqui hoje? – Wesley disse, tentando mudar o assunto – Minha mãe não está nem ai pra mim. E meu pai... Bom, você já conhece a peça: Fica tão bêbado quando vai ao bar que se eu contar que fizemos sexo ele vai é rir alto.

Lucas se virou e o encarou.

– Eu não tenho mais onde dormir...

– E a sua casa? – Wesley estranhou – Você mora em Copacabana, Lucas. A sua casa era grande e espaçosa o suficiente para você dormir... Mesmo que sozinho. E seu tio a mantinha, não é?

Lucas ficou em silêncio, encarando o nada. Aparentava esconder o que provavelmente já teria feito.

– Lucas – disse Wesley, agora intrigado – O que você fez com a casa?

– Ainda vou fazer...

L

02 de abril de 2014...

Estou bancando o escritor, assim como o meu irmão. A diferença é que eu falo e meu amigo Wesley escreve. Ele é melhor nisso do que eu. Essa é a primeira vez que decidi falar sobre a minha vida.

Hoje estou me mudando. Para onde? Não sei. Vou atrás das minhas origens, dos meus parentes de sangue, da família que me restou. Embora eu quisesse realmente encontrar o responsável pelo assassinato da minha mãe, seria difícil caminhar sozinho pela imensidão do Rio encarando cada bandido e traficante para descobrir se eles têm algo a ver com o passado que vivi.

Eu quero viver. E estou vivendo, à minha maneira, do meu jeito. Não sigo as regras da sociedade, porque sinto que ela não é justa. As leis não são justas. O mundo não é justo. Então, por que eu seria?

Não sei exatamente o motivo pelo qual estou contando essas coisas a uma folha, mas me sinto bem melhor agora. A folha é melhor que os ouvidos dos outros. Porque ela não responde, ela não opina... Apenas lê.

Hoje, partirei em busca de respostas. Mas também partirei em busca da minha felicidade. Se ainda houver uma maneira de eu ser feliz, eu vou encontrar.

Mãe. Se estiver lendo isso, aonde quer que esteja, quero que saiba que eu te amo muito. E que eu não vou descansar enquanto a justiça não for feita. Viverei dia após dia, ano após ano, buscando a minha felicidade. Mas, enquanto o culpado não aparecer... Eu não terei paz. Eu juro pra senhora: De algum modo, eu farei a justiça!

Deus. Se estiver em algum lugar deste mundo, e se realmente existir, peço que esteja comigo onde eu estiver. Vou utilizar o pouco de fé que me resta, e precisarei do Senhor, muito mais agora.

Bom, agora que desabafei, deixarei essa lembrança queimar, junto com você.

Lucas, então, deixou a pequena folha com palavras manuscritas ao lado da lareira. Observou os arredores daquela sala de estar feita de madeira maciça. Sorriu, e depois arfou.

Acendeu o isqueiro e o atirou para trás, como se já soubesse o que iria acontecer. E então, num passe de mágica, uma enorme chama foi formada, tomando todas as mobílias da direita para a esquerda, subindo pelas paredes até o teto.

Ele começou a caminhar em direção a saída. Do lado de fora, desceu as escadas enquanto a claridade das chamas o perseguia. A fumaça já era constante.

Lucas estava, mais uma vez, tentando apagar memórias. As atuais eram fáceis de esquecer. Porém, as antigas eram impossíveis. Estavam cravadas em seu peito como espinhos de uma rosa vermelha. Ele já não suportava ter que conviver com tanta amargura e ódio.

Estava na hora de procurar.

Procurar por respostas que ele não tinha. Procurar pela felicidade que não sentia, e pela vingança que desejava realizar. Estava disposto a se encontrar com o que sobrou de sua destruída família, e iniciar uma nova vida. Dar uma chance a si mesmo para ser o que ele, até então, não era:

Feliz.

O dia seguinte seria diferente para Lucas. Pois ele não seria o mesmo. E também já não estaria no mesmo lugar...

L

São Paulo, 03 de Abril de 2014

A campainha tocou diversas vezes, sem parar. Jéssica abriu os olhos, ainda sonolentos e com remela. Observou no despertador:

06h35min.

Sua cabeça só tentava imaginar quem poderia ser àquela hora.

Rapidamente, desceu da cama, deixando o seu namorado revirar-se para o meio, tomando todo o espaço que podia. Estava de olhos fechados e não percebeu quando a garota desceu as escadas em direção a porta da frente.

Os dedos na calçada continuavam a apertar a campainha de modo constante. De repente, a porta se abriu. Jéssica - de shorts rosa curto e camisola branca - observou aquela pessoa ali, parada: Não reconheceu.

– Posso ajudá-lo? – ela questionou, esfregando os olhos.

Daniel, seu namorado, surgiu atrás dela com uma aparência irritada e também sonolenta. Seus olhos estavam meio fechados. Porém, quando os dilatou, paralisou-se em uma expressão pasma, enquanto encarava a pessoa em pé na porta.

– Olá, irmão... Há quanto tempo! – disse Lucas, com um sorriso torto.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado deste primeiro capítulo. Gostaria de ressaltar aos leitores mais críticos que se houver algum erro ortográfico, por favor me comuniquem! O comentário de cada um é a melhor forma de iniciarmos uma amizade virtual e trocarmos experiências na escrita. Ficarei feliz com aqueles que gostaram, e também os que não gostaram por algum motivo que - se apontado - poderei melhorar futuramente.Grato.



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