My Little Runner escrita por Angie


Capítulo 6
Será que é apenas atração?


Notas iniciais do capítulo

Hello meus trolhos lindos!



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Já passava das 18 horas quando Camille acordou. Piscou os olhos algumas vezes antes de olhar ao seu redor. Estava em um quarto, sua mochila havia sido largada ali em um canto perto da cama em que se encontrava deitada. Um cobertor envolvia-lhe o corpo e ela logo percebeu que, fora a calça que agora estava aos farrapos, usava apenas sutiã.

Devem ter me colocado aqui depois que...desmaiei eu acho. Ela pensou.

Com um pouco de esforço por causa da dormência, conseguiu se sentar, fazendo o cobertor cair e revelar o curativo bem feito, na curva de sua cintura. Pensando bem, nem doía tanto quanto antes. Ela constatara.

Esperou mais um tempo ali, escorada na cabeceira da cama. Como ninguém apareceu resolveu se levantar e deixar de frescura. Precisava de um banho e nenhum socorrista a ajudaria naquilo. Pegou a mochila, envolveu seu corpo com o cobertor como uma manta e saiu.

Pelo corredor pode ver uma porta entreaberta, pela fresta da mesma Camille visualizou uma garota que dormia tranquilamente em um sono pesado.

Estreitou os olhos e abriu mais um pouco, olhando-a melhor.

Uma batida falhou em seu coração e uma estranha sensação surgiu dentro dela. Uma sensação que nunca sentira em nenhuma das clareiras.

Reconhecimento.

Sim, algo dentro dela se alarmou. Ela, de alguma maneira, já havia visto aquela garota antes.

Mas onde? Isso não sabia. Não sabia o nome dela, nem como nem quando a conhecera. Mas algo lhe dava essa sensação.

Balançou a cabeça.

Deve ser a minha mente me pregando peças. Pensou. Não tem como eu conhecê-la e eu só devo estar atordoada por causa do desmaio.

Rapidamente fechou a porta e seguiu adiante. Outro quarto. Dessa vez a porta estava fechada.

Mordeu o lábio inferior, imaginando que aquele deveria ser o quarto em que colocaram Minho. Respirou fundo e bateu na porta.

Nenhuma resposta.

Bateu novamente. Nada.

Será que ele está dormindo? Pensou.

Em um momento louco de coragem ela abriu a porta. Imaginou-se escancarando-a e falando tudo o que pensava e sentia para ele, mas quando tocou na maçaneta a coragem diminuíra. Tanto que abriu bem devagar, sem chamar atenção.

—Minho, eu..- começou.

Mas de nada adiantaria, pois ao contrário do que ela pensava o quarto estava vazio. Apenas com uma cama bagunçada e uma mochila esparramada em cima dela.

Suspirou.

É claro, ele já deve ter saído. Eu que desmaiei. Constatou desanimada.

Se aproximou da cama e balançou a cabeça negativamente ao ver as roupas limpas do garoto espalhadas por sobre ela.

—Garotos... -murmurou.

Ela só teve certeza que eram dele pois lá também havia as da noite anterior, aos farrapos. Deu um sorriso de canto ao ver a camisa com uma parte faltando. Se lembrou dele a rasgando para estancar o ferimento dela.

Comprimiu os lábios e já ia sair do quarto quando algo a parou.

Não, nem pense em fazer isso Camille! Não mesmo! Uma vozinha dentro de si falou.

Ficou ali parada por uns segundos, fechou os olhos e mordeu o lábio inferior.

Ah, eu sei que vou me arrepender disso depois.

Mesmo assim ela se virou e voltou rapidamente para junto da cama, pegando uma das camisas limpas de Minho e enrolando junto com sua mochila.

Na mesma rapidez que entrou ela saiu do quarto.

Foi direto para o banheiro tomar uma ducha demorada. Se esgueirou para não ser vista por ninguém. Não estava afim de dar explicações para alguém sobre ter saído sem a permissão de um socorrista.

Entrou no banheiro, tirou o restante das roupas e as jogou em um canto junto com a mochila e o cobertor.

Ligou o chuveiro e se deixou aproveitar o momento. A água deliciosamente quente. Ficou ali parada por um tempo antes de começar a se ensaboar.

Dizem que o banho é a hora ideal para pensar na vida. E não foi diferente com Camille.

Ela tentou se recordar de coisas da outra clareira e para falar a verdade até lembrava, mas eram como flashes que vinham e sumiam rapidamente. Pensou em tudo desde que chegara ali. Em como acordara com a enorme dor de cabeça e encontrado com os clareanos; pensou na primeira noite horrível no amansador; no dia tedioso que tivera depois; em como Minho a protegera daquele valentão quando ela estava triste e como ele a animara. Pensou na noite que passara no labirinto. Como quase morrera. O medo que sentira.

Fechou os olhos.

—O que vocês querem ein?- perguntou, como se de alguma forma os criadores pudessem ouvi-la.- Por que nos enviar para cá?

Mas como sempre, não obteve respostas. E temia nunca as obter.

Imaginou se teria uma família, se sentiriam falta dela, onde quer que estivessem. E uma estranha sensação de solidão a dominou.

Os clareanos poderiam nunca admitir. Mas tudo que precisavam era um pouco de carinho, um pouco de amor. Um lar para onde voltar.

Instantaneamente seus pensamentos se voltaram para Minho, na verdade, para o momento que tiveram depois de conseguir sair do labirinto. Como num reflexo ela tocou seus lábios. Ela não soube ao certo tudo que sentia; estava confusa e ao mesmo tempo tão certa sobre o seu querer. Se perguntou se o garoto também pensava naquilo ou se fora apenas coisa do momento. Mas sendo ou não ela precisava falar com ele. Não podia ignorar o modo como seu coração bateu forte ao vê-lo se aproximar, ao senti-lo a tocando.

Sim, iria falar com ele.

***

A fogueira já estava acesa quando ela se aproximou de Newt e Minho.

Eles arquearam as sobrancelhas e o asiático riu, meio encabulado.

—An... Cammie. -Newt chamou. -É impressão ou está usando a camisa do Minho?

Rá! Eu bem avisei para não fazer aquilo! A vozinha voltou a falar dentro dela.

Camille se forçou a sorrir e tentou falar o mais casualmente possível.

—Ah, bom não é impressão. Eu estava cansada de usar calça a noite e elas estavam ficando amassadas então..eu vi a camisa jogada e peguei. Preciso de uma roupa de dormir.- A desculpa esfarrapada brotou na sua mente.

—Aham... -Newt disse, fingindo ter acreditado.

Minho ainda tinha aquele sorrisinho irritante no rosto.

—O que foi? Se quiser eu devolvo.

—Não se preocupe, ficou legal em você. - ele disse, os cantos dos lábios erguidos maliciosamente.

Ta legal, vamos descrever a garota.

Ela estava com os cabelos soltos, partido de lado, recém lavados e quase enxutos. Os fios meio desgrenhados mas ao mesmo tempo perfeitamente arrumados. Isso era uma coisa que ninguém naquela clareira entenderia como fazer. Sobre a camisa... Bom, diferente de quando Minho a usava ela ficara enorme. Era de um tom azul clarinho. As mangas, que no garoto ficavam arregaçadas mostrando os bíceps, caiam-lhe até quase os cotovelos. Os dois primeiros botões estavam abertos e ela ia até alguns centímetros das coxas. Como um vestido, só que claro, curto. Ela usava um short de malha, mas a camisa o cobria por completo.

—Hm.. obrigada... eu acho.

Thomas apareceu do nada e parou seu olhar na garota. Mais precisamente nas pernas dela.

—Ta olhando o quê seu tarado!- ela ralhou, claramente irritada e envergonhada. -Eu estou de short!

E levantou um pouco a camisa, mostrando.

—Desculpe. -Thomas murmurou, também envergonhado.

Ambos, que até então estavam de pé, se sentaram.

—Como está se sentindo agora que acordou? -Thomas perguntou. -Você deu um baita susto na gente desmaiando daquele jeito.

—É, você precisava ver a cara do Mi.. Ei!- o asiático deu um chute em Newt, decididamente o mandando calar a boca.

Camille fingiu que não entendeu.

—Ah, eu estou bem, fizeram um bom curativo no corte.

—É um milagre que os socorristas te deixaram sair assim logo depois de acordar de um desmaio.

—Er.. sobre isso...

—Vai me dizer que saiu escondida?- Minho perguntou, arqueando uma sobrancelha.

—Me deem uma folga; eu precisava de um banho e ninguém aparecia para me dizer nada, o que queriam que eu fizesse?

—Falando neles... -Newt murmurou. -Parece que você está encrencada Cammie, o encarregado vem ai.

A garota se virou exatamente na hora que ele apareceu. Os braços cruzados e uma expressão zangada no rosto. Não... estava mais para indignação.

—Oi. -ela murmurou.

—Oi? Garota, você passou a noite inteira no labirinto; se feriu; quase teve um problema respiratório de tanto correr; desmaiou; saiu sem a minha permissão e ainda me diz oi?

Camille se encolheu a cada palavra.

—Tudo bem, tudo bem... Eu entendi, desculpa.

Clint balançou a cabeça negativamente. Suspirou.

—Vai ter que voltar para o quarto, pode ser que o ferimento..

—Epa, peraí. Está parecendo até que vai me colocar de castigo! -A garota o olhou indignada.

—Ah, se eu pudesse... Mas provavelmente você tentaria sair de novo.

—Nisso você acertou.

—E o ferimento era grave? -Newt perguntou, fazendo Clint voltar sua atenção para ele.

—Ah, mais ou menos. O sangue todo foi mais por ela ficar forçando enquanto corria. Olhando por esse lado foi bom ela ter desmaiado, caso contrário sentiria dor e ficaria se mexendo o tempo todo na hora de fazer o curativo. Agradeça ao Minho, -falou se virando para Camille. -Se ele não tivesse amarrado aquele pano você provavelmente teria sangrado muito mais. Aliás, o desmaio foi por causa disso, pela perda de sangue misturada ao grande cansaço. Você tem sorte de não ter pego uma infecção. Isso com certeza me daria uma grande dor de cabeça.

Ela fez que sim.

—Obrigada pelo curativo, aliás.

—O que eu posso fazer? É o meu trabalho. -Ele deu de ombros.

—Então... eu não posso mesmo ficar aqui? Qual é, não estou me esforçando nem nada.

Clint olhou para ela por um tempo antes de enfim responder.

—Ta legal... Mas amanhã pela manhã preciso refazer seu curativo.

Ela abriu um sorriso.

—Obrigada, obrigada!- E em um ímpeto momento lhe deu um beijo na bochecha.

O socorrista ficou encabulado, meio envergonhado. Pigarreou para limpar a garganta.

Minho bufou, revirou os olhos e desviou o olhar.

—Mas não vai correr amanhã.- Clint anunciou.

Instantaneamente o sorriso da garota se transformou em uma carranca.

—Ah, mas por quê? Eu estou perfeitamente bem!

—Não, não está. Precisa ficar pelo menos um dia sem fazer esforço, o que você quer, abrir esse ferimento?

Camille cruzou os braços e fez um beicinho teimoso.

—Ele tem razão. -Minho se pronunciou -Não seja teimosa.

—Não é teimosia! Mas vou ficar morrendo de tédio, e eu estou em perfeita condição para correr!

—Não está não.

—É claro que estou!

—Ainda sou o encarregado dos corredores, sendo assim te proíbo de correr. Simples.

Ele deu de ombros casualmente.

—O que é isso, complô contra mim? Mais alguém concorda com ele? -Camille perguntou indignada. Newt fez que sim e Thomas deu de ombros.- Ah, que maravilha. - murmurou.

—Vamos deixar de enrolação e ir logo falar com os outros clareanos. Os trolhos devem estar mais curiosos que tudo sobre como passaram a noite anterior no labirinto..- Newt disse.

—Ah, já estava me esquecendo disso. -Minho passou a mão pelos cabelos, pouco animado.

Como se tivessem adivinhado, Alby apareceu. E é claro, logo toda a clareira estava amontoada em volta para escutar.

Ninguém se pronunciou então, com um suspiro, Camille começou a relatar os acontecimentos.

—Espera, está me dizendo que viram besouros mecânicos desativados e depois explodirem?- Alby estreitou os olhos, desconfiado.

—Pois é, acredite. Também estou confusa. O engraçado é que eles não explodiram exatamente... eu não sei explicar. Explodiram... mas ao mesmo tempo não.

—Você não está falando nada que faça sentido...

—Ta, deixa eu começar de novo. Houve uma explosão, sim. Mas os besouros mecânicos não se destruíram, ficaram lá parados como se nem estivessem participando de nada.

—E depois que as portas do labirinto se fecharam o fogo cessou. -Minho acrescentou casualmente.

—Cessou? Como assim cessou?- alguém perguntou.

—Cessou, acabou, parou, apagou, sei lá. Estava pegando fogo e de repente, puff! Ele foi retornando para dentro dos besouros mecânicos pouco a pouco, e como um combustível eles voltaram a vida e correram.

—Minho, acho que você bateu a cabeça com força antes de vir pra cá. O fogo não faz essas coisas. -Newt comentou.

—Ah, então diz isso pra aquele que encontramos antes.

—Pode ser uma ilusão dos criadores.. -Thomas comentou.

—Aquilo realmente não me pareceu uma ilusão. -Camille fez uma carranca. - Não foi você que quase foi incinerado.

—Eu não duvido de mais nada. -Thomas continuou.- Se esses criadores foram capazes de roubar nossas memórias e fazer todo este local, dessa forma tão incrivelmente assustadora, eles também podem ser capazes de enganar a mente. Mas por que fariam isso?

Minho deu de ombros. -Sei lá, acho que estavam nos atrasando para termos de passar uma noite no labirinto.

—Por que?- Caçarola perguntou.

—Ah, essa vai ser a palavra do dia... -O asiático resmungou.

—Deve ter um motivo para fazerem isso logo agora.- Alby estreitou os olhos para Camille.

—Por que ta me olhando assim, você acha que eu sei de alguma coisa? -a garota levou seus braços para cima, indignada.

O líder suspirou. -Ficar te culpando não vai nos levar a lugar nenhum mesmo... E não foi você que eu vi depois da picada.

—Oi? Como assim, o que você viu quando foi picado Alby?

Newt e Thomas ficaram inquietos, se lembrando de como Alby pirou depois que tentou contar o que lembrava.

—Nada, esqueça. Continuem.

Eles balançaram a cabeça, concordando e continuaram o relato.

Já tendo explicado para todos o que aconteceu e depois de muita discussão eles resolveram finalizar o assunto.

O crepitar da fogueira era ouvido no meio do burburinho das conversas. Camille estava perto do fogo, se aquecendo. Ela viu Minho ao longe, um pouco afastado do grupo, Newt havia acabado de sair do lado dele. A oportunidade perfeita. Demorou uns dois minutos antes de tomar coragem.

Vamos Camille, você consegue. Será apenas uma conversa. Falou para si mesma em pensamento.

Se levantou e caminhou decidida até o garoto.

—Ei, an.. oi. Não tivemos a chance de nos falarmos direito...

Minho a olhou e fez um aceno de cabeça indicando para ela se sentar.

—Como está se sentindo? -ele perguntou, com uma postura relaxada.

—Bem melhor, para falar a verdade.

Eles ficaram um tempo em silêncio incômodo.

—O que foi aquilo antes?- ela perguntou meio receosa.

—Aquilo o quê?

—Não se faça de desentendido... aquilo depois que voltamos para a clareira.

—Um beijo. Dois, na verdade...

Ela revirou os olhos. -Eu sei o que é um beijo. Quero saber por que fez aquilo..

—Aconteceu.

—Aconteceu? -ela o olhou indignada. -Simples assim?

Ele desviou o olhar, sem respondê-la.

—Podemos pelo menos conversar sobre aquilo?

—Não tenho nada para conversar.- ele ainda não a olhava nos olhos.

A irritação e a sensação de ter sido usada a atingiu.

—Então é assim? O que pensa que eu sou, uma vadia qualquer que você pode sair por ai se agarrando e depois não dar satisfação?

Aquilo pegou o garoto de surpresa.

—Eu nunca disse que..

—Não precisa dizer!- O cortou- Sabe o que é mais revoltante? -ela perguntou, gesticulando freneticamente. - Nos conhecemos há dias, apenas isso. E eu não sei se estou ficando meio louca mas fico sentindo umas coisas meio estranhas toda vez que estou perto de você, parece que tem borboletas voando no meu estômago e isso é irritante pra caramba! Agora você vem e me diz que simplesmente aconteceu? Ah, quem diria. -despejou tudo de uma vez, nem acreditando que teve coragem de admitir.

—Você.. sente isso?

—Vai em frente, pode rir da minha cara! E eu aqui pensando que você ao menos se dignaria a conversar sobre isso.

Ele não respondeu, nem esboçou a mínima vontade de rir dela.

—Ficou mudo de repente? O Minho sarcástico que sempre tem uma resposta na ponta da língua de repente não sabe o que dizer?

Sim. Ela estava com raiva.

—Eu... -ele desviou o olhar. -Acho que está exagerando, não tem como alguma coisa

Ela não esperou ele terminar, virou de costas e já ia saindo quando parou. Se voltou novamente para o encarar.

—Acho que eu já te entendi. Você finge que não tem sentimentos e os esconde em baixo dessa sua máscara de insensibilidade, sarcasmo e ironia. Mas se quer saber, você sente sim! Como qualquer outra pessoa, você tem um coração. Não sabe demonstrar então finge que não liga. Mas se acha que não consigo perceber está muito enganado.

Em um rápido movimento ela o segurou pela gola da camisa e o puxou para um beijo, ficando na ponta dos pés. O garoto completamente surpreso pela atitude da garota ficou sem reação por alguns segundos antes dela separar seus lábios. Eles ainda estavam naquela mesma posição. A centímetros um do outro.

—Continue fingindo que não sente nada. Está mentindo para mim ou para você mesmo? -Ela falou antes de soltar a gola da camisa dele e sair apressada, deixando um Minho totalmente sem fala para trás.

***

Camille estava sentada em uma poltrona bastante usada enquanto Jeff, um dos socorristas, refazia o curativo em seu ferimento. Quando ele tirou o antigo ela viu que o corte já estava quase fechando, provavelmente no outro dia já estaria bem para fazer qualquer outra atividade normal. Ainda achava um exagero, pois poderia muito bem ir para o labirinto, mas no fim agradeceu por não ter que ver a cara do Minho novamente.

Ela virou o rosto e ficou observando os raios de Sol matinais que entravam por uma das janelas da Sede. Suspirou.

—Você não parece bem. -Jeff comentou, apenas para puxar assunto.

—Não é nada. -murmurou.

—Pronto. Terminado e muito bem feito, modéstia a parte. -ele riu.

—Ah, é bom que seja mesmo. Eu quero estar muito bem para correr amanhã.

—Só vocês corredores mesmo para gostar de entrar no labirinto.

—Acho que com o tempo você se acostuma, sabe.

—Se acostumam com os verdugos também? -ele arqueou as sobrancelhas. -Difícil de acreditar.

Ela bufou. -Não podemos fazê-los desaparecer com um estalar de dedos, então... o jeito é ir.

Ele balançou a cabeça negativamente. -Prefiro ficar aqui com meus curativos...

Ela sorriu.

—Cada um com seus gostos né... Acho que se eu tentar fazer um curativo machuco a pessoa ainda mais.

—Preciso te dar umas aulas qualquer dia desses.

—Melhor não, acredite.

Ele soltou uma risada. -Ta legal trolha, preciso trabalhar. Ande, vai arranjar uma coisa pra fazer.

Ela revirou os olhos e saiu, se despedindo com um aceno.

O dia de Camille começou normal, ela havia guardado o novo "pijama" dentro da mochila e teve de escolher entre uma das peças de roupa que os criadores haviam mandado quando chegara ali. Já que a que costumava usar desde que saiu do amansador estava aos farrapos na lata de lixo. Sendo assim pegou uma outra calça preta, amarrou os coturnos- graças aos céus que ela estava com os tênis de corrida no labirinto, caso contrário seus preciosos coturnos pretos estariam um horror e seus pés estariam cheios de calos. - e um suéter vinho, com duas listras horizontais brancas. Mesmo sendo um suéter, o tecido não era grosso, ou seja, não esquentava muito.

Resolveu não tomar café, não estava com muita fome desde a noite anterior.

Umas duas horas depois, quando todos já estavam trabalhando em seus devidos postos o seu estômago deu sinal de vida. Ela foi até a cozinha arranjar algo para comer; sorriu para Newt ao vê-lo trabalhando na fazenda, ele lhe acenou com a mão. Os outros que estavam com ele não fizeram o mesmo, alguns ignoraram e uns poucos lhe lançaram olhares meio desconcertados.

Entrou no "santuário do Caçarola" e já ia pegar uma fruta em uma sacola quando um pigarro a interrompeu.

—Ah, oi Caçarola - deu um sorriso amarelo, fora pega no flagra.

—Bom dia trolha, tentando roubar comida?

—Não é roubar... eu ia pedir.

—Depois de já ter comido?

—Bem, sim... -deu o seu melhor para parecer uma pobre garota sofredora que estava morrendo de fome e abandonada na chuva.- Eu não tomei café da manhã...

O cozinheiro bufou. -Vai lavar logo essa maçã.

Ela sorriu triunfante.

Enquanto comia ficou observando o garoto cozinhar.

—Posso ajudar?- ela perguntou.

—Não.

—Oh.

Ele continuou a fazer seu trabalho.

—Não posso mesmo ajudar?

—Não.

—Você só sabe dizer isso?

Ele suspirou e se virou para encará-la.

—Quer mesmo me ajudar?

Ela fez que sim animada.

—Por que eu me arriscaria a deixar uma trolha que só sabe correr mexer na minha cozinha?

—Bom, porque eu vou ficar te perturbando até deixar.

—Não tem nada melhor para fazer?

—Não.

Ele suspirou novamente. -Ta legal, vou te ensinar algumas coisas. Mas se começar a me atrapalhar eu te chuto pra fora daqui.

Ela levantou os braços em sinal de rendição. -Não vou te atrapalhar, palavra de honra!

—Comece cortando aquilo ali- ele apontou.

Ela lavou as mãos, coisa que ele gostou, ao menos não precisava dar todas as instruções. Enquanto cortava, com o olhar do garoto o tempo todo para ver se ela não errava, começou a puxar assunto.

—Por que alguns clareanos estão me olhando de um jeito estranho hoje?

—E como eu vou saber?

—Ah, não sei. Parece que tem alguma coisa na minha cara pois a maioria desvia o olhar ou sei lá.

—Deve ser por você ser uma das únicas a sobreviver uma noite no labirinto.

—É, pode ser.

Caçarola pensou um pouco antes de rir e dizer.

—Ou por outra coisa...

—Que outra coisa?

—Nada, esquece.

—Você sabe que vou insistir até que me fale, não é?

Ele deu de ombros. -Ou pode ser também que estejam receosos de ficar muito perto de você, por que tem uns trolhos covardes por aqui.

—Como assim? Estão com medo de mim? -ela perguntou, a testa franzida pela confusão.

—De você?- Caçarola riu- Bom, talvez um pouco. Mas acho que estão com medo é do Minho.

—Do Minho? O que ele tem haver com isso?

—Tudo ora, vai ver os trolhos estão com medo do que ele pode fazer se ficarem muito perto da garota dele.

Camille revirou os olhos.

—Não sou a "garota do Minho".

—Não?

—Não.

Caçarola deu de ombros. -Então ta né.

Ela ficou mais algumas horas ali, com Caçarola a instruindo.

—Até que você não cozinha mal... -ele admitiu. -Com um pouco mais de treino poderia trabalhar aqui.

—Eu até gosto de cozinhar mas.. não, ainda prefiro ser corredora.

—Você é que sabe.

Depois, quando já estava saindo da cozinha meio distraída, deu de cara com uma... ah, ela conhecia muito bem aquela "parede".

—Cammie.. -ele começou- o que está fazendo na cozinha a essa hora? -arqueou uma sobrancelha.

Ela revirou os olhos. -Caçarola estava me ensinando algumas coisas.

—Desde quando cozinha?

—Desde que estou no maior tédio aqui. Agora, se me dá licença.

Ela passou direto, indo para longe dele.

***

O dia passou lento na cabeça de Minho, ele tentava se concentrar na corrida, mas sua cabeça estava nas nuvens. Desde a noite anterior ele ficara meio encabulado, estava mais confuso que tudo sobre o que sentia; sabia que Camille estava certa, mas ainda assim parecia ser muito complicado.

Até ali, enquanto desenhava o esquema do labirinto na casa dos mapas, como todos os dias fazia, estava distraído.

—Você está sonhando acordado hoje, ein.- Thomas comentara.

—Nem me fale. -resmungou.

Thomas o observou por um tempo antes de dizer.

—Se quer um conselho, acho que deveria falar com ela.

—E o que te faz pensar que é sobre ela?

—Ta escrito na sua cara.

Minho bufou. -Você está parecendo até o Newt.

—E você parece um idiota apaixonado.

—Muito engraçado você, Tommie.

—Eu sei, obrigada. -deu de ombros.- Mas falando sério, ela é linda.

Minho o olhou de esguelha. -Sim, ela é. Mas o que você tem com isso?

Thomas levantou os braços. -Só estou dizendo que se você não for falar com ela logo outra pessoa vai. Você não é o único nessa clareira que deve ter gostado da corredora.

—Bom, ela não gosta deles.

—E de você, ela gosta?

—Acho que sim, cara.

—Então ta esperando o quê, um verdugo começar a dançar?

Minho bufou. -Cala a boca.

***

Já era noite quando Camille se sentou em um canto um pouco afastado. Ela amava ficar perto da fogueira, se sentia mais quente e confortável. Mas naquela noite não estava afim de se encontrar com ninguém, mais precisamente com certo asiático. Diga-se de passagem.

Depois de um tempo em silêncio começou a cantarolar. Sim, ela gostava de cantar. Não sabia quando aprendera, nem de cantoras ou nomes de músicas. Não se lembrava desde quando fazia isso. Só ficou com vontade e de repente começou. A letra da música vinha facilmente aos seus lábios, nem ela sabia como. Apenas se deixou levar e, baixinho, o fez.

—O que está cantarolando aí?

Ela se levantou num salto com o susto. Minho estava ao lado dela, com as mãos nos bolsos da calça.

—Ah... você.

Ela já ia passar por ele quando o mesmo a segurou pelo braço.

—Por quanto tempo mais vai ficar me evitando?

—O necessário. -Puxou o braço mas ele não cedeu, sabendo que se a soltasse ela provavelmente sairia sem o ouvir.

—Eu quero conversar.

—Ah! Agora você quer conversar?

—Olha, eu sei que fui um idiota ontem por fingir que não ligava e sei que você está certa, por mais que eu odeie admitir isso então não vou repetir.

—Continua, ta inspirado.

Ele revirou os olhos.

—Se eu te soltar, você vai correr?

Ela bufou. -Não. Me solta logo.

E assim o fez. Camille cruzou os braços.

—O que veio me falar, que aquilo foi coisa do momento? Que você sentiu atração e..

—Quer calar essa boca e me ouvir? -ele falou irritado.- Quem dera fosse apenas atração, eu não sou bom com essas coisas! -passou a mão pelos cabelos, exasperado.

—Quem sabe seja atração mesmo, ai você não precisará se preocupar. Pode continuar fingindo que não tem sentimentos para com os outros.

—Você quer que eu pare de fingir? Ótimo, eu paro. Quando pus os olhos pela primeira vez em você eu te achei a garota mais irritantemente linda que poderia encontrar; quando você fica vermelha eu acho a coisa mais fofa. FOFA! Eu, Minho, achando algo fofo! Eu nunca pensaria nisso! -ele começou a soltar tudo de uma vez.- Quando aquele trolho fez menção de te bater eu senti uma raiva que nem sei de onde veio! Quando te vi chorando quase que eu voltava lá para terminar de quebrar a cara daquele desgraçado. Quando passamos a noite naquele labirinto, eu vi o medo em seus olhos. Eu também estava, acredite. Mas algo dentro de mim me fez ser forte, eu queria te proteger e me agarrei nisso. Quando nos beijamos, pareceu que não existia mais nenhum problema a nossa volta. Eu só queria sentir o gosto dos seus lábios novamente. Queria que você fosse minha. Agora me responda, isso é atração? Eu não sei, como você espera que eu saiba de qualquer mértila que...

Ele não conseguiu terminar, pois assim como no dia anterior ela lhe interrompeu com um beijo. Tão intenso quanto o que deram na frente do labirinto. Ele ficou sem reação por uns segundos antes de começar a retribuir, colocou as mãos na cintura dela e, sabe-se lá como, acabaram no chão.

Pararam, um pouco ofegantes.

—Temos que parar de nos encontrar assim..Sempre acabamos no chão.

—Ou não.- ele comentou, observando o subir e descer de seu peito enquanto ela respirava.

—O que fazemos agora?

—Além de voltarmos a nos beijar?

Camille suspirou. —Isso vai ser tudo? 

Minho pensou por alguns segundos antes de responder.

—É bom você saber que eu não gosto de dividir.

—Como assim?

Ele deu de ombros e disse como se fosse a coisa mais normal do mundo. —Agora você é minha, e qualquer trolho que tentar encostar em você vai se ver comigo.

Ela revirou os olhos, que mania idiota de posse era aquela?

—Eu sei me defender, sabia?

—É, eu sei. -ele disse e logo após riu. -Mudando de assunto... sabe, eu realmente gostei de você usando minha camisa. -olhou para ela, que havia adotado de vez o "pijama".

—Eu sei, está escrito na sua cara.

—Acho que todo mundo resolveu me dizer isso. -resmungou antes de envolver o corpo da garota com seus braços, puxando-a para seu peito. —Finalmente esses criadores fizeram uma coisa boa te mandando pra cá.

—Bem, poderia ter sido qualquer outra que estivesse perto da caixa.

—Então eu devo agradecer ao acaso?

—É... Talvez deva mesmo.- sorriu convencida e ele revirou os olhos.

No fim, acabaram dormindo daquele jeito mesmo. E enquanto sonhava, Camille ouviu uma voz. Não era aquela vozinha irritante de dentro dela, era distante, mas ela entendeu perfeitamente quando a mesma dissera:

Nada é feito pelo acaso. Nada.

Ela acordou na mesma hora, Minho ainda dormia. Ficou uns minutos refletindo naquilo.

Apenas esqueça Camille, apenas esqueça. Ela pensou e voltou a dormir.

 


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Notas finais do capítulo

E ai, mereço comentários? *o* Pessoal, leiam a fic "Os garotos do Mazer" da Judy Souza. Ela é uma querida e eu recomendo!