"Então, em um momento de terror ela percebeu que não estava onde deveria. Percebeu que ali não era a clareira. Pelo menos, não a que costumava morar durante esses dois anos. Percebeu porque ninguém a respondia. Percebeu que a única coisa errada ali não era tudo ao seu redor.

Era ela."

Thomas por fim tomou coragem e falou quase num sussurro:

–Mas.. o que está acontecendo?- então ele aumentou o tom de voz- quem é essa garota, de onde ela veio?

–Parece que essas vão ser as perguntas do dia..- Minho murmurou para si mesmo. Por fim, relatou como a encontrara e o que ela lhe falara.

Camille ainda estava quieta, parecia em outra dimensão, mas prestava atenção em cada palavra dita.

Depois do relato, todos os demais se voltaram para a garota.

–Não olhem para mim. Estou tão confusa quanto qualquer um de vocês aqui. Quem diria que depois de dois anos procurando uma saída da clareira eu acordaria em outra!- ela falava e gesticulava como se estivesse conversando consigo mesma- ainda mais com um bando de garotos estranhos e..

–A gente pode ouvir cada palavra, sabia?- alguém comentou.

–Se querem a minha opinião..- Caçarola começou- o sol já se pôs, o jantar estava quase pronto, a fogueira já vai ser acesa. Por que todos nós não nos sentamos na clareira e vemos o que ela tem a dizer?

Muitos concordaram com um movimento de cabeça.

Alby suspirou. -Ta legal. Mas não pense que se safou de explicações.

–Ah, isso nem passou pela minha cabeça.- murmurou e seguiu o grupo.

Depois de tudo ser preparado, a fogueira acesa e os clareanos se acomodarem ela se sentou meio receosa em um banco no centro colocado especialmente para ela, de forma com que todos pudessem avistá-la.

–Prestem atenção, eu não quero saber de bagunça enquanto tentamos entender o que está havendo. Não vamos fazer uma algazarra.- então se voltou para Camille- agora trolha, comece a falar.

–Eu tenho um nome sabia? É Camille.

–Que seja. -disse e ela revirou os olhos.- Como apareceu no labirinto?

–Eu.. eu não sei direito. Eu só acordei perto do penhasco com uma dor terrível na cabeça. Não tenho ideia de como fui parar lá. Os criadores devem te me mandado ou coisa parecida.

–É.. mandada do Grupo B..- Newt refletiu.

–Grupo B? O que é isso?

–Ela deve ter vindo desse outro lugar- Zart comentou, ignorando a garota- deve ter sido transferida como no bilhete dizia.

–Epa, epa. Peraí, volta um pouco. Que bilhete?

Os clareanos se entreolharam receosos.

–Que foi? Estão com medo do que eu possa fazer? São uns 50 de vocês contra mim. Que chance eu tenho?

Newt suspirou e entregou-lhe o bilhete, que até então estava no bolso de sua calça. Aquela ideia de ela sair por ai assassinando todo mundo era ridícula, não poderia fazer nada com tantos contra ela. E parece que todos pensaram o mesmo, pois não reclamaram da entrega.

–Isso veio hoje de manhã na caixa.- explicou- não sabíamos o que significava até você aparecer.

Ela continuava a olhar para o bilhete sem saber o que dizer. Repetindo mentalmente a frase várias e várias vezes.

–Você disse que veio de outra clareira. - Minho se pronunciara.

Ela levantou a cabeça para encará-lo. -Sim. Só que com garotas. O engraçado é que tudo era tão igual aqui...

–Espera, acho que entendi!- Thomas se levantou num salto.- E se essa sua clareira for o grupo B? E nós o A? E se eles a mandaram aqui para um teste?

Alby estreitou os olhos. -É, pode ser. Mas me diga fedelha..

–Não me chame assim.- ela o interrompeu ríspida.- não sou uma novata. Estou na clareira há dois anos. Não me trate como se eu não soubesse de nada.

–Mesmo? Então me diga Camille- enfatizou de propósito o nome dela- como as coisas funcionavam por lá.

–Bom, nós tínhamos uma fazenda exatamente como essa. Só que mais.. an.. feminina eu acho.. enfim, nós dividíamos as tarefas. Haviam os construtores, embaladores, socorristas, retalhadores, de..

–Ta, já chega, entendemos! Me parece que as coisas eram iguais até demais. Também temos essas mesmas divisões.

Camille olhou para os clareanos por um tempo, como se imaginando quem fazia cada coisa. -Mas... tem uma coisa estranha.. eu me lembro das funções, me lembro do que fazia, me lembro de vozes.. mas não consigo me recordar de ninguém nitidamente. De alguns nomes talvez, das que eram mais próximas a mim.. mas nada além disso. Como se tivessem tirado uma parte da minha memória.

Winston não se aguentou. -Ah, que conveniência, não acham? Não vêem que ela está nos enganando? E se ela for uma espiã dos criadores? E se..- o que quer que ele fosse falar mais foi interrompido por uma gargalhada.

–Eu? Espiã?- ela voltou a rir- Ta brincando comigo né. Mas sabe, até que você tem razão. Na verdade, eu não sou nem uma garota. -todos a olharam como se ela fosse maluca- eu sou um verdugo. Um mutante, mudo de forma sabe.. Mas lembre-se, quando você estiver dormindo tranquilamente eu voltarei para minha forma original e te arrastarei pelo labirinto com as minhas pinças.- ela fez um movimento com as duas mãos em forma de garra. Abrindo e fechando.- Tchac-Tchac!

Todos abafaram o riso. Ela estava, claramente, tirando uma com a cara do Winston. Ele ficou vermelho de raiva e vergonha.

Ignorando os comentários sarcásticos dos presentes em relação a piada, Alby prosseguiu mantendo a pose séria.

–Qual a última coisa de que se lembra antes de acordar no penhasco?

Ela pareceu pensar um pouco. -Eu estava passando pela caixa, ia para a sede dormir quando... eu não sei, só me lembro de vê-la aberta. O que não é normal, no meio da noite. Me aproximei e eu vi uma luz... tão, tão forte.. fiquei tonta, quase cai. E então algo me puxou para baixo. Nem lembro se gritei. Tudo ficou nublado na minha mente. E ai eu acordei aqui, me levantei, corri e dei de cara com aquela parede ali- apontou para Minho que ergueu as sobrancelhas.

Como ninguém disse nada ela continuou.

–Bem, de qualquer forma elas devem estar me procurando.-e então murmurou para si mesma- afinal.. não é todo dia que a encarregada dos corredores desaparece no meio da noite.. e essa dor de cabeça que não passa..-massageou as têmporas com os dedos.

Minho meio que engasgou com o jantar que Caçarola servira.

–Espera, eu entendi direito? Você era a encarregada das corredoras?

–Aham.

–Você?

Ela se virou para encará-lo irritada. -Sim, por quê? Algum problema com isso?

Ele levantou os braços em sinal de paz, mas seu olhar e sorrisinho sarcástico indicavam o contrário.

–Por nada ora, só fiquei curioso. Vocês lá devem ser muito estranhas mesmo, para colocar no comando uma baixinha sem força nenhuma.

Ela se levantou , ficando frente a frente com ele.

–Em primeiro lugar, não me chame de baixinha. Em segundo, sou mais forte do que pensa.

–Não foi o que pareceu no labirinto princesa. -os cantos dos lábios se ergueram em um sorriso presunçoso, ela sentiu o rosto esquentar.

Não fique vermelha, não fique vermelha. não fique vermelha. Repetia sem parar para si mesma.

–Aquilo? Você me pegou de surpresa. Eu já estava no chão, então não foi uma experiência válida. -sorriu triunfante, aquele era um bom argumento.- E enquanto você usava sua força eu estava muito ocupada tentando achar seu cérebro, príncipe.

Alguns clareanos taparam a boca para não rir.

Minho ia responder, ele sempre tinha uma resposta na ponta da língua, mas Alby foi mais rápido.

–Que parte de não começarmos uma algazarra vocês dois trolhos não entenderam? Ainda estamos discutindo isso aqui!

Camille lançou um último olhar em direção a Minho e voltou a se sentar.

Nos próximos minutos que se passaram, eles ficaram discutindo se poderiam acreditar nela ou não. Ignorando seus protestos e continuando a discussão. Quando alguém disse que ela poderia estar mentindo sobre tudo da outra clareira foi quando não se aguentou mais.

–Como vocês acham que eu me sinto ein?- disse, a raiva emanando- Acham que estou me divertindo? Minha cabeça ta quase para explodir com essa dor, eu fui interrogada e disse tudo que sabia, procurei uma maldita saída por todo aquele maldito labirinto e no fim sou puxada por não sei o quê e parei aqui junto com todos vocês, garotos idiotas, com essas suas manias idiotas de falar, afinal o que diabos é uma trolha? Ah, esquece, não quero saber. E agora ficam ai me olhando como se eu fosse culpada de algo. Eu nem mesmo sei o nome de vocês, como esperam que eu tenha respostas? Também estou confusa, droga! - todos ficaram surpresos com a repentina irritação da garota. Ela respirou fundo se acalmando- Olha.. eu não estou pedindo para acreditarem em mim de imediato.. também duvidaria se estivesse no lugar de vocês. Acreditar ou não vai ser decisão inteiramente suas. O que eu quero dizer é que.. caramba, eu to cansada. Cansada mesmo, como se não tivesse dormido por um bom tempo. Então, se puderem parar de me julgar eu agradeceria.

Ninguém disse nada por quase um minuto.

Alby suspirou, ela percebeu que ele devia ser o líder, já que era o que sempre tomava as rédeas da situação.

–Ela tem razão. Está tarde para tudo isso. Amanhã pela manhã reuniremos o conclave para decidir o que fazer, então vocês encarregados, tratem de acordar cedo.

–Como se já não fizéssemos isso- Newt murmurou.

– E onde ela vai dormir hoje? -Winston perguntou

–Que foi, ta com medo dela se transformar em um verdugo e te levar?- Minho voltou com seus habituais comentários, rindo.

–Ah, cale a boca Minho!

Minho. Ela pensou. Então esse é o nome dele.

–Eu já tomei minha decisão quanto a isso.. ela fica no amansador. Amanhã resolveremos se ela deve ou não ser solta.

Camille abriu a boca de pura indignação.

–Ah, que maravilha. -disse com sarcasmo- adorei a ideia.

–Melhor do que ser jogada do penhasco.- Zart comentou.

Ela o olhou horrorizada.

–Que tipo de comentário animador é esse?

Eles não responderam, apenas fizeram um sinal para dois garotos, que a levaram a protestos para dentro do amansador.

Ela tateou no escuro após trancarem a porta, por fim se recostou em uma parede.

–Tinha que ser justo eu a parar nesse lugar.. tinha que ser.. - continuou resmungando até enfim ceder ao cansaço.