Once In a Lifetime escrita por selinakyles


Capítulo 32
I broke your heart.


Notas iniciais do capítulo

Meu Deus, eu nem lembrava mais o que era escrever nessa caixinha.
Olá meus padawans lindos! Estou fugindo das pedras contando que vocês vão me perdoar depois de lerem o maior capítulo de OIAL até agora.

A música que toca na pista de dança é essa: https://www.youtube.com/watch?v=CiVDzTT4CbE (Lembrem-se que é um gosto pessoal da Clarke músicas de jazz, blues e clássicas.)

https://pin.it/h2ssdxq6vu3o4r (Essa pasta é dos vestidos das meninas pra quem quiser ter uma imagem melhor)
Verde - Gina.
Prateado - Clarke.
Roxo - Octavia.
Preto - Raven.

Divirtam-se e qualquer erro é de responsabilidade minha.
Não está betado.



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Chapter thirty-two –


Bellamy balançava a perna freneticamente na tentativa de amenizar toda a tensão que tomava cada centímetro de seus músculos, analisando outra vez o relógio em seu pulso com uma certa irritação surgindo ao se dar conta de quanto tempo estava plantado ali.

Octavia estava atrasada, e teria que ter uma ótima desculpa para que ele não lhe passasse o maior dos sermões.

A música acústica reverberava pelo recinto de um jeito quase aconchegante, e o conhaque em seu copo já não lhe apetecia. Nem mesmo o pior dos destilados seria capaz de tirar o gosto amargo impregnado em seu paladar, provindo de um desgosto que parecia estar longe de se findar.

No bolso de sua calça cargo, seu celular vibrava incessantemente ao anunciar mais uma chamada de sua companheira. Uma porção delas que ele não se incomodaria em ignorar naquele dia.

Precisava calar aqueles pensamentos, caso contrário, enlouqueceria mais cedo do que imaginava.

“Eu vou fazer de conta que não sei o motivo desse encontro repentino...” A voz familiar o tirou de seus devaneios, e logo Octavia se acomodava na banqueta ao lado da dele. “E espero que isso me livre de um sermão insuportável sobre atrasos.”

O Blake mais velho a olhou de relance, notando as bochechas pigmentadas em um leve tom de carmim. E quis sorrir, realmente quis, mas se limitou a virar de uma vez em sua boca o que restava do líquido amargo em seu copo.

“Vou te perdoar só pela sua aparência, ela demonstra bastante o seu esforço.” O moreno deu de ombros, e Octavia se limitou a revirar os olhos claros.

Ela direcionou a ele um olhar repleto de escárnio, não precisando chamar o bartender para que ele viesse lhe atender. A atenção de Bellamy pesava em seus ombros, a curiosidade emanando por cada detalhe de suas feições, inclusive na ruga que ele tinha entre as sobrancelhas negras.

Ele a observava como se estivesse procurando por algum sinal, qualquer indício que lhe daria a resposta para a pergunta que piscava freneticamente em letras neon garrafais dentro de sua cabeça.

“Não precisa fazer essa cara de quem está constipado, Bell.” Octavia disse, se divertindo com as expressões contidas do moreno. “Eu sei o que você quer saber. Sim, ela me contou tudo.”

“Ela contou? Tudo?” Suas sobrancelhas se arquearam na mais pura surpresa.

Certamente não esperava aquilo vindo de Clarke, ainda mais com a situação abalada em que se encontrava a amizade das duas. Talvez ele estivesse errado, no final das contas.

“Não entendo a surpresa... ela é minha melhor amiga.” A Blake desviou sua atenção do cardápio que havia sobre o balcão para o rosto confuso do irmão. “Você não me parece muito bem, Bell. Gina perguntou se você estava comigo e eu me limitei em dizer que seu celular descarregou. Eu imaginava que isso iria acabar acontecendo quando ela me contou da conversa que tiveram essa manhã, ninguém recebe uma notícia daquelas e fica numa boa...”

Bellamy suspirou ao passar os dedos sobre o cabelo antes perfeitamente penteado para trás, fazendo com que uma mecha teimosa caísse em seus olhos.

 “Eu não consigo acreditar ainda. Se eu me permitir acreditar, eu acho que vou perder a minha cabeça.” O moreno pressionou os olhos com a palma de suas mãos, custando acreditar que tudo aquilo fosse real. “E novamente, depois de cinco anos, eu me encontro mais perdido do que nunca.”

“E novamente, Clarke Griffin está envolvida. Que coincidência!”

Octavia assistia o desespero reprimido de seu irmão, notando que os círculos escuros em volta de seus olhos se tornaram ainda piores do que da última vez em que o viu. Ela conseguia perceber no castanho escuro de suas íris o quanto ele estava desolado com tudo aquilo, com o passado que ele jamais seria capaz de deixar para trás.

“Não foi sua culpa tanto quanto não foi dela. Não se culpe, não haveria nada a ser feito mesmo se estivesse presente.” A Blake sugou uma lufada de ar, cerrando os olhos com pesar. “Eu era quem deveria estar lá. Era meu papel de melhor amiga ajudá-la a superar todo aquele pesadelo, mas não, estava focada demais em meu próprio umbigo.”

“No final, tudo isso é minha culpa. Você se afastou dela por minha causa, por ter tomado as minhas dores... e ela teve que sofrer as dela sozinha. Eu sou o culpado, O.”

Ela jurou que Bellamy começaria a chorar a qualquer momento. Ele parecia inquieto, ansioso, preocupado. Dentro de si, a necessidade de fazer algo para ajuda-lo ardia como brasa, mas ao mesmo tempo, a deixava completamente impotente e frustrada.

Como raios a situação havia chegado naquele ponto? A vida era mesmo uma vadia.

“Bell, tudo isso já passou. Nós estamos reconstruindo as pontes que foram queimadas na nossa amizade, na verdade, estamos até melhor do que éramos antes. As coisas têm que acontecer e elas simplesmente acontecem, do que adianta ficar se remoendo e se culpando?”

Bellamy ergueu os orbes escuros para o rosto sereno de sua irmã, assimilando a sabedoria que se expressava em suas palavras. Ela havia crescido tanto, e era em momentos como aquele que ele era verdadeiramente capaz de enxergar seu progresso.

O garçom apareceu, depositando o drink espalhafatoso de Octavia sobre o balcão e servindo novamente uma dose de conhaque para o Blake.

“Hoje era para ser um dia feliz. Eu finalmente consegui o encerramento que eu tanto quis durante esses anos, o passado vai ficar onde ele tem que ficar, mas...” Os olhos escuros avaliavam a bebida em seu copo, aéreos. “Por que eu continuo me sentindo um fracassado? Por que essa sensação sufocante de que eu falhei?”

Havia tanto pesar ali, no rosto sempre tão belo de seu irmão. As roupas denunciavam que ele veio direto do trabalho para encontrá-la, depois de uma ligação bastante vaga que a Blake mais nova sabia que significava um pedido silencioso de ajuda.

Seu irmão estava quebrado, e ela gostaria de poder dizer que compreendia. Octavia desejava entender verdadeiramente o que ele estava sentindo naquele instante, contudo, sabia que era algo fora de seu alcance.

Tudo parecia inútil diante daquela situação, a impotência fazia com que seu maxilar se retesasse.

E Bellamy... Bem, esse parecia mais perdido do que jamais esteve.

“Eu não sei, não vou conseguir olhar nos olhos da Gina e contar para ela que engravidei a amiga de infância da minha irmã, e ela teve que passar pela perda dolorosa de um filho sozinha.”

Octavia revirou os olhos claros, bufando em meio a irritação que aquelas palavras lhe causaram.

“Pelo amor de Deus, Bell.” Ralhou, bebericando sua bebida como se dependesse dela para se manter calma. “Você não sabia! Pare com isso, e simplesmente conte a verdade a ela. Onde está a pessoa tão irritantemente correta que eu conheço? Use de toda essa integridade para algo além de ser um pé no saco.”

“Eu não consigo, O.” Bellamy abaixou seu olhar, a sensação de derrota lhe revestindo como uma armadura. “Vai ter um evento para o escritório onde ela está trabalhando amanhã, e tudo o que sabe falar no momento é o quanto Marcus Kane é incrível. Não consigo jogar essa bomba no colo dela logo agora, não é justo.”

“E justo é você querer casar com a mulher e não ter coragem de colocar as cartas na mesa? Você sequer contou a ela que o cara que ela tanto idolatra é seu pai.”

O moreno estava prestes a degustar de sua bebida quando dirigiu à irmã um de seus olhares repletos de censura. Aquele assunto estava morto e enterrado, não tinha nada a ser contado porque ele não teve e nem tinha um pai.

Seu pai era um homem desconhecido que abandonou sua mãe quando ele ainda se desenvolvia em seu ventre. E isso era tudo o que Gina saberia sobre o cara que lhe concebeu, nada mais.

Jamais conseguiria ver aquele homem como seu pai. Se recusava a fazê-lo, mesmo com as investidas nada sutis de sua irmã. As coisas aconteceram como tinham que acontecer, ela mesma havia dito.

“E nem vou contar, porque eu não tenho pai e nunca tive.”

Octavia o encarou novamente, toda a culpa havia se transformado subitamente em irritação. Ela sabia que aquele assunto era como pisar em ovos, e ainda assim, não poderia se importar menos.

O que ela não daria para saber quem era seu pai? Sinceramente, Bellamy conseguia ser ignorante como uma porta quando queria. E aquele era exatamente um daqueles momentos.

“Ele enterrou o próprio neto sem nem saber da verdade. Você leu a carta da mamãe, Bell... ele não sabe.” A morena insistiu. “O mínimo que você poderia fazer pela mamãe é dar a ele o benefício da dúvida.”

O rosto do Blake se contorceu em uma careta de desgosto, bastante insatisfeito com as palavras da irmã.

“Já parou para se colocar no lugar dele por um instante? Pense, poderia ter sido você se o bebê tivesse sobrevivido, se Clarke não lhe contasse sobre ele. Nós dois a conhecemos perfeitamente, sabemos que poderia ter acontecido. Você gostaria que seu próprio filho negasse a você a oportunidade de ouvir o seu lado da história?”

Bellamy ponderou, os olhos escuros vasculhando o rosto sereno de sua irmã. Ele sabia perfeitamente que ela estava certa, entretanto, nada fazia aquela situação mais atraente em sua cabeça. Seu bom senso apitava como um maldito alarme, indicando mais uma vez que ele não poderia simplesmente fechar os olhos e fingir não ver.

A verdade se mantinha ali, intocada mesmo com o passar dos anos, pronta para ser proferida assim que o momento chegasse.

Ele engoliu mais uma golada de seu conhaque, beliscando a fonte de seu nariz ao sentir os indícios de uma cefaleia desnorteante.

“E se você realmente planeja levar em frente esse casamento, tem o dever de contar para ela tudo isso. Desde a verdade sobre suas origens até o que realmente aconteceu entre você e a Clarke.” Sua mão buscou pela dele, confortando-o enquanto levava novamente o canudo enfeitado de seu drink até os lábios rosados.

Bellamy a observou por mais alguns instantes, enlaçando seus dedos nos dela.

“Você teria sido um ótimo pai, Bell. Vai ser algum dia, eu tenho certeza.”

Ela abriu um sorriso, os dentes brancos e perfeitamente alinhados se exibindo no processo, e ele se limitou virar de uma vez o que restava da bebida em seu copo, sentindo a ardência anestesiar sua garganta.

“Eu não teria tanta certeza.” Seu timbre rouco ostentava toda a amargura em seu peito.

“Mas eu tenho. Toda a certeza do mundo.”

E então ele sorriu, pela primeira vez naquele dia repleto de dissabores.

Aquela garota era mesmo algo de outro mundo.

***

“Sim, mamãe! Eu já entendi e já busquei o vestido assim que saí do hospital. Pela milésima vez, está tudo bem.”

Clarke revirou os olhos azuis, sentindo os músculos de sua nuca reclamarem devido a condição desajeitada em que prendia seu celular entre seu ouvido e seu ombro. As mãos buscaram a chave no fundo de sua bolsa, quando novamente a voz de sua progenitora penetrou seus ouvidos.

“Por que eu não consigo acreditar em você? Você viu o vestido pelo menos? Eu mandei fazer com todas as suas medidas. Acredito que elas não tenham mudado, não é?”

A loira bufou, mudando o aparelho de lado e equilibrando o famigerado vestido em seu antebraço para procurar com mais afinco o objeto que em todo tempo se escondia de seus dedos.

“Eu não tive tempo, estou chegando em casa agora. Nós nos veremos essa noite, certo? Então verá com seus próprios olhos que estou ótima e que tudo está bem. Raven está ansiosa para te ver.”

“Tudo bem, querida. Eu e Marcus estaremos aguardando vocês ansiosamente. Evitem atrasos, sim?”

O milésimo suspiro exasperado daquele dia escapulia por seus lábios assim que finalizou a chamada, guardando o celular no bolso de seus jeans enquanto assistia a porta de seu apartamento se escancarar diante de seus olhos, revelando tudo o que ela menos esperava naquele dia.

Jasper exibia seus dentes estupidamente brancos como se estivesse vendo uma das sete maravilhas do mundo, e o mesmo gesto parecia se replicar no rosto do rapaz de olhos levemente puxados paralisado ao lado dele.

O coração da Griffin parecia ter pulado uma batida assim que seus amigos de infância a envolveram em um abraço sufocante, resumindo ali as dimensões de sua saudade. A bolsa escorregou por seu braço assim que ela os retribuiu.

“Clarkey, parece que faz uma eternidade que eu não te vejo.” A voz de Jasper saiu abafada pelos fios dourados de seus cabelos, causando o repuxar sucinto de sua boca.

“Não é justo você se esconder em New York dessa forma e abandonar seus amigos sem mais nem menos.” Monty argumentou, destinando a ela um olhar ressentido ao se afastar.

O Jordan, no entanto, perdurou aquele momento o máximo que pode, apertando ainda mais a silhueta franzina contra seu corpo.

“Jas, você est... tá... sufocando!” Os leves tapinhas em seu ombro fez com que ele a soltasse, o sorriso largo ainda adornando suas feições.

O brilho infantil ainda reluzia daquele homem, e olhar para ele era como enxergar uma criança ansiosa e inquieta em uma manhã corriqueira de Natal. A familiaridade que Jasper Jordan exalava era acolhedora, afável.

“Desculpe Monty, de verdade. Acho que você me conhece bem, não é?” Clarke disse simplesmente, resgatando sua bolsa para que pudesse entrar em sua casa. “Eu não sabia que vocês viriam! Teria preparado algo.”

“Era uma surpresa. Nós pedimos para que Raven não contasse nada, queríamos ver a sua cara.” Monty deu de ombros, e no segundo seguinte, a figura morena entrou em seu campo de visão com um Robbie perfeitamente vestido em seu encalço.

O rosto do pequenino se iluminou assim que seus olhos cor de mel se fixaram na mais velha, correndo até ela para se jogar em seus braços como se sua vida dependesse disso.

“Oh, que recepção calorosa, chiquito!”

“Tia, você viu que meus tios vieram? Eles vão para a festa dos seus pais também!” O lábio inferior de Robbie se dobrou em um biquinho adorável, as feições se torcendo em uma carranca ao direcionar o olhar mal-humorado para Raven. “Mamãe disse que eu estou parecendo um pinguimzinho... É mentira, não é tia? Eu estou parecendo um príncipe.”

Os gritos desesperados de Octavia ganharam a atenção da Griffin, assim como o pequeno furacão de cabelos cacheados que descia degrau por degrau das escadas cuidadosamente em seu vestido vermelho de tule.

Os cachinhos negros emolduravam o rosto em formato de coração, e o esverdeado de seus olhos se contrastava com tom de sua pele levemente bronzeada. Nas bochechas salientes pinicava o tom rubro de quem parecia estar fugindo do enlace de sua mãe, como uma Blake genuína faria.

A teimosia era mesmo de família.

“Olivia, eu juro que se você não voltar aqui agora...” Octavia ameaçou, ignorando a presença de todos os outros enquanto cravava os tempestuosos olhos claros em sua filha. “Você ainda não está recuperada, sua pestinha!”

“Não mamãe, eu já estou bem, não tem mais dodói.” A pequenina se virou para a mãe que permanecia a encarando no topo das escadas, com um de seus braços na cintura. “Vamos mamãe, tia Clarke chegou, vamos.”

A satisfação se manifestava na curva de seu sorriso, e o divertimento fagulhava no azul de seus olhos ao assistir toda aquela cena. Sua casa nunca esteve tão cheia, e chegar do trabalho depois de um turno cansativo no hospital sendo tão bem recepcionada nunca foi tão reconfortante.

Talvez Niylah estivesse certa. Talvez devesse parar de passar tanto tempo sozinha.

“Mas veja só se não temos mesmo uma mini Octavia aqui.” Raven puxou a pequenina para seu colo, cutucando sua barriga. “A diferença é que você é uma princesinha e sua mãe uma ogra.”

Jasper soltou um riso nasalado e o pequeno Reyes bufou nos braços de Clarke, completamente ultrajado com as palavras de sua progenitora.

“Mama, por que ela pode ser uma princesa e eu tenho que ser um pinguim?” Resmungou Robbie, sentindo os lábios de Clarke pousarem em suas bochechas com um estalo.

“Você é um príncipe também, chiquito. Minha mãe e Kane estão ansiosos para te conhecer hoje, acredita? Tenho certeza que não haverá nenhum garotinho tão lindo quanto você por lá.”

O garoto esboçou o mais largo de seus sorrisos, envolvendo o pescoço da loira com seus bracinhos antes de se afastar e correr de volta para o sofá com seu jogo em mãos.

“Mentir é feio, Clarke.” Jasper murmurou, cutucando suas costelas.

“Dá um tempo, Jas.” Ela revirou os olhos, trombando seu quadril com o dele. “Já tem os smokings prontos?”

“Para onde vamos mesmo?” Monty arqueou uma das sobrancelhas negras, beliscando os biscoitos que permaneciam em cima do balcão de sua cozinha americana.

Clarke olhou para o relógio em seu pulso, depositando o saco que protegia seu vestido no apoio de seu sofá. Cinco e quarenta e dois de uma tarde agradável de primavera, e o início de uma noite que prometia muito mais do que ela poderia imaginar.

“Baile de gala, é o aniversário de vinte e cinco anos do escritório do Marcus.” Ela respondeu, sugando a quantidade de ar suficiente para que seus pulmões reclamassem.

E ao avaliar os sorrisos travessos dos dois marmanjos em sua frente, se deu conta de que provavelmente, aquela noite estava longe de ser monótona e tediosa como pensou que seria.

***

Bellamy virou em um só gole mais uma das incontáveis taças de champanhe que já havia ingerido, depositando todo seu esforço em ignorar o olhar repleto de censura que sua noiva lhe direcionava sem nenhuma discrição.

Em sua juventude, não fora nada incomum participar de eventos como aquele tendo Jake Griffin como seu padrinho e mentor. Em todas as ocasiões, o melhor amigo de sua mãe fazia questão que ele se sentisse familiarizado em suas tentativas falhas de incluí-lo em um ciclo social que claramente não lhe pertencia.

Ele era um Blake, e Blakes não estavam destinados àquele tipo de glamour. Sua inquietação o fazia ponderar sobre o que não daria para degustar de uma boa dose dupla de conhaque, chegando a conclusão de que somente aquilo poderia fazê-lo passar pela tortura infindável que seria aquela noite.

“Você está inquieto desde ontem.” Gina murmurou em seu ouvido, o braço se envolvendo no seu.

Ela era de uma beleza única e cativante, e naquela noite em especial, Bellamy reafirmava suas certezas de que aquela mulher era demais para ele. O vestido de gala verde abraçava perfeitamente sua silhueta curvilínea, realçando a formosura de sua companheira.

As bochechas enrubesceram e logo a covinha que tanto adorava se revelava, acanhada diante do olhar tão minimalista que Bellamy insistia em lançar por cada detalhe de seu corpo.

“Eu estou me sentindo um peixe em uma floresta.” Seu sorriso breve não chegou até os olhos escuros, tão artificial quanto o público presente naquele evento. “Consegue entender essa metáfora? É estranho assim.”

Gina girou seu corpo até que se encontrasse em frente a ele, segurando o rosto do Blake entre suas mãos para que dessa forma, ele fosse obrigado a encará-la. As mãos quentes escorregavam vagarosamente em um carinho aconchegante, e se tornou cada vez mais difícil não fechar os olhos para prolongar aquela sensação.

“Você não me engana, Bellamy. Há algo de errado, eu estou sentindo.” Ele revelou as íris castanhas apenas para cravá-las nas dela, complacentes. “Por que você ainda pensa que pode me enganar?”

Um suspiro ruidoso escapuliu por seus lábios entreabertos, o desconforto que se alojava em suas entranhas fez com que a rigidez em seus ombros se esvaísse. A verdade sobre todas as partes de sua vida que ela desconhecia estavam travadas na ponta de sua língua, contudo, ainda assim, nada fazia com que elas se exteriorizassem.

Toda a atmosfera que os envolvia foi quebrada no instante em que a atenção do Blake foi sugada até a entrada principal do salão extravagante, onde sua irmã mais nova segurava firmemente a mão de sua sobrinha acompanhada de ninguém menos que Raven Reyes e seu filho, Clarke Griffin, Jasper Jordan e Monty Green.

E em apenas um minuto, era como estar em Arkville novamente.

***

“Eu não acredito que Abby Griffin inventou o bom gosto!”

Raven vasculhava cada mínimo detalhe daquele ambiente com seus orbes reluzindo uma euforia desenfreada, estudando desde o tapete vermelho sob as sandálias que já torturavam seus pés até os lustres de cristal.

Tudo ali era como um sonho, um filme onde a Cinderella poderia perfeitamente encontrar seu príncipe e perder seu sapatinho.

“E eu estou custando a acreditar que Clarke está vestindo um maldito Elie Saab.” Octavia resmungou, ainda roçando os dedos delicadamente pelo tecido prateado do vestido da Griffin, que em seguida tratou de afastar a mão enxerida. “Como deve ser difícil ser você, uh loira?”

A garota se limitou a revirar os olhos, destinando a ela um de seus sorrisos enviesados antes da voz de Monty tomar completamente sua atenção.

“Eu estou sentindo como se estivesse do MET Gala, sinceramente.”

O riso descontraído da Griffin fez com que os olhos puxados de seu amigo deixassem de apreciar o local para assisti-la agir naturalmente pela primeira vez em muitos anos. Ele sentia falta da versão leve e sem preocupações de Clarke. Uma que apenas existia enquanto Jake Griffin estava vivo.

“Minha mãe exagera quando quer corresponder às expectativas do Marcus. Ela sabe como esse evento é importante para ele... só que realmente, dessa vez ela exagerou um pouco.” Ela enlaçou seu braço livre no de Monty, apertando a mão pequenina de Robbie com a sua ao lança-lo um sorriso.

Jasper tossiu, engasgando com sua própria saliva antes de direcionar seu espanto para a loira.

“Um pouco? Sério?” O deboche em seu timbre era perceptível ao comtemplar todo o luxo diante de si. “Caramba, agora estou tentando imaginar como seria se ela tivesse exagerado muito. Maya iria adorar presenciar tudo isso...”

“Então você deveria tê-la trazido, Jordan.”

A presença reluzente de Abby Griffin surgiu entre seus convidados, o entusiasmo de vê-los ali se tornava bastante perceptível quando os estudava daquela forma tão contenta, bastante satisfeita ao focar sua atenção em sua garotinha e se dar conta da mulher maravilhosa que ela havia se tornado.

A simetria perfeita de seus genes e os de Jake combinados em uma só pessoa. Clarke tinha uma beleza tão natural, e ao mesmo tempo, tão peculiar. Formosa e elegante, seus encantos eram aprimorados pelo vestido que a mãe escolheu com todo o carinho do mundo.

“Eu sabia que ele ficaria perfeito em você.” A mais velha afirmou, segurando os ombros da loira enquanto cravava seu olhar no dela.

Clarke sabia o que ela estava fazendo, e justamente por este motivo não foi capaz de conter o revirar de seus olhos azuis.

“É impossível um Elie Saab não ficar perfeito em alguém.” Octavia acrescentou, dando de ombros.

“Vocês todos estão deslumbrantes.” Abby sorria, a sinceridade se mesclando ao seu contentamento. “Marcus ficará muito feliz em vê-los.”

Um dos cantos de sua boca se curvou ao estudar a figura tão delicada e ao mesmo tempo tão imperativa de sua mãe, enxergando perfeitamente em seus olhos castanhos que havia a convencido sobre seu estado emocional.

Talvez agora ela pudesse afrouxar um pouco o cabresto e deixa-la respirar sem ter que lidar com as ligações incessantes que efetuava no dia-a-dia. No final, uma mãe sempre seria uma mãe. Complicadas, superprotetoras e exageradas.

Seus olhos azuis se desviaram para observar Octavia, que censurava a pequena Olivia em sussurros exagerados. A pequenina se soltou de seu enlace para correr diretamente até a silhueta máscula, que a ergueu em seus braços no momento que o corpo pequeno se chocou em suas pernas.

Os cintilantes olhos escuros admiravam a garotinha tão intensamente, todo o amor refletido neles fez com que ela perdesse o chão por instantes. E bem, assim que eles se fixaram nos dela, Clarke teve certeza de que nada poderia ter mudado durante todos aqueles anos.

Ela ainda se sentia e sempre se sentiria como uma adolescente apaixonada ao encarar a escuridão acolhedora daquele olhar.

Restava aceitar.

***

Conversas superficiais eram uma habilidade que Clarke adquiriu de berço.

O carisma de seus olhos azuis cativava facilmente os convidados ávidos em seus diálogos monótonos, da mesma forma sutil e refinada que Jake fazia ao se dirigir a qualquer pessoa que fosse. Entretanto, haviam tantas coisas que lhe agradavam mais do que jogar palavras ao vento com pessoas que ela sequer tinha a ínfima afinidade.

E nisso, ela e seu pai também combinavam.

Difícil era conter o sorriso ao se lembrar das diversas vezes em que seu progenitor se jogava no sofá da sala, soltando um longo suspiro e afrouxando a gravata borboleta depois de intermináveis horas que passou em eventos como aquele. Ele faria piadas sobre os comentários indiscretos de algumas pessoas, arrancando as mais entretidas gargalhadas de sua única filha.

Sua pequena princesa. Sempre tão graciosa e paciente ao carregar o fardo que aquele sobrenome lhe concebia.

E foi engolindo de uma só vez o resto do champanhe em sua taça que ela finalizou mais uma prosa nada agradável com um dos sócios de Marcus, o olhar vagando por todo o salão em busca de alguma coisa, qualquer rosto conhecido que lhe serviria de válvula de escape.

Em seu campo de visão ela pode reconhecer os ombros largos e a silhueta robusta de Lincoln, a surpresa de vê-lo ali logo se esvaindo ao se recordar que as empresas de sua família tinham negócios com o escritório de advocacia há muitos anos.

No entanto, a forma nada amena que as feições de Octavia se contorciam lhe indicavam perfeitamente que o que acontecia ali não era exatamente uma conversa amigável. Seus pés se mexeram involuntariamente, parando no segundo em que sua razão se apossou novamente de seu corpo.

Não era da sua alçada o que acontecia entre sua melhor amiga e o marido, e se ela bem conhecia Lincoln, logo aquela conversa continuaria em um local mais adequado. O fato de ele estar presente garantia a ela alguma esperança de que consertaria o que havia se quebrado entre eles, afinal, um amor daqueles não se abala tão facilmente.

As safiras azuladas observaram por tempo demais aquele lugar enorme, desistindo de encontrar Raven ou até mesmo Monty e Jasper. Sua mãe e Marcus pareciam engajados demais em suas próprias confraternizações, se juntar a eles significaria mais uma hora de conversas chatas e banais para lidar.

O cansaço aos poucos se instalava, e ao que indicava no relógio de seu celular, não se passaram ao menos duas horas da tortura infindável que aquela ocasião estava lhe causando.

O olhar atento se fincou nos olhos perdidos de Bellamy pela segunda vez naquela noite, só então se dando conta de que provavelmente ele a observava já há algum tempo. Seus lábios tingidos pelo batom vermelho se repuxaram em um sorriso tímido, o mesmo que morreu ao sentir o olhar curioso bela mulher de vestido verde sobre ela.

Seus joelhos nunca apresentaram tamanha fraqueza. O nervosismo a fez buscar por mais uma taça da bebida borbulhante assim que outro garçom passou em sua frente, desejando com todo o seu ser que aquele líquido se transformasse em algo mais forte.

Algo que lhe daria coragem o suficiente para lidar com o que viria a seguir.

Com todas as forças que reuniu em um suspiro profundo, Clarke caminhou até eles ainda analisando cada detalhe nas feições inexpressivas do Blake. A conversa que tiveram na manhã anterior voltou em flashes diante de seus olhos, pesando em seu estômago como uma maldita âncora.

“Noite agradável, uh?” Seu timbre transbordava a gentileza que nem de longe era genuína como deveria ser.

“Só se estiver sendo para você.” Bellamy resmungou mal-humorado, recebendo um cutucão e um olhar estarrecido de sua companheira.

O riso de Clarke escapuliu com a atitude do moreno, sua cabeça balançando brevemente ao degustar da sinceridade tão familiar daquele homem. Ele nunca soube muito bem o que significava pensar antes de falar ou agir.

“Sempre tão sincero.” A loira sorriu, direcionando sua atenção para a mulher que o acompanhava ao estender uma de suas mãos em cumprimento. “E também desligado, por isso... Clarke Griffin, muito prazer.”

A morena prendeu os grandes orbes castanhos na figura exuberante em sua frente, os cabelos claros da loira refletindo sob a iluminação do salão, dando a ela o ar angelical que poucas vezes Gina foi capaz de reconhecer em alguém.

Nem mesmo os adornos prateados de seu vestido brilhavam tanto quanto as duas lagoas azuladas que a encaravam com uma simpatia acolhedora, uma presença realmente marcante. Ela não esperava menos da filha preciosa de Abby Griffin, o requinte em pessoa.

“Oh, perdão.” Gina balançou sua cabeça brevemente na tentativa de colocar seus pensamentos em ordem, apertando a mão de Clarke com a sua conforme o sorriso ressaltava sua covinha. “Gina Martin, eu sou...”

“A nova colaboradora do escritório.” Clarke completou, ciente de que o olhar atento de Bellamy oscilava entre elas. “E futura esposa do irmão da minha melhor amiga.”

O embaraço pinicou nas bochechas da Martin, que não demorou a fixar novamente sua atenção no homem ao seu lado. Os lábios finos do Blake se crispavam, incomodado com algo que fugia de sua compreensão, os vigilantes olhos castanhos cravados na enteada de seu chefe. 

A Griffin a encarou, o silêncio tornando densa a atmosfera entre eles. A inquietude do moreno pesava sobre si, e ela tinha a mais plena noção de que ele se segurava para não trazer o assunto à tona na frente de sua noiva.

Um breve suspiro escapou pelos lábios tingidos pelo batom vermelho.

“Tudo bem se eu o roubar para uma dança, Gina? Prometo que não vai demorar.”

“Fique à vontade, senhorita Griffin. Vou procurar por Octavia.” A morena esboçou um sorriso amarelo, trocando um olhar bastante íntimo com o Blake. Algo tão pequeno, mas que Clarke jamais admitiria acender dentro de si a faísca da inveja.

Bellamy beijou a mão de sua noiva, resmungando algo em seu ouvido que a fez rir, assistindo-a sumir em meio as pessoas que já preparavam seus pares para a próxima música.

A mão forte e levemente calejada se estendeu para ela, tirando-a de seus mais tormentosos devaneios. A língua se estalou no céu de sua boca, trazendo de volta o questionamento se aquele seria um momento apropriado para degustar um pouco mais de champanhe.

O amargo impregnado em seu paladar como um castigo. Talvez fosse o receio, mas Clarke sabia melhor que aquela era apenas uma reação causada pela imagem do que poderia ter sido.

“Você é péssimo em disfarçar.”

“Você está bem?” As íris de Bellamy se suavizaram assim que a mão dela se encaixou na sua, seu braço antes livre envolvendo-a e dissipando um pouco mais a distância entre seus corpos. “Parece um pouco pálida.”

A loira sorriu assim que os primeiros acordes de Wild is the Wind de Nina Simone ressoaram pelo majestoso salão e a voz suave da vocalista se manifestou no ritmo da melodia. Seu olhar não demorou a se fixar no de Raven, que se encontrava entusiasmada ao lado do palco onde a banda tocava.

A Reyes lhe lançou uma piscadela cúmplice, o riso engasgado em sua garganta calhando como réplica. Sua amiga era mesmo uma em um milhão.

“Está tudo bem, Bell. Você não precisa me olhar como se eu fosse cair no choro a qualquer momento.” O canto de sua boca se repuxou, e brevemente ela sentia a tensão esvair pelos ombros largos do Blake. “Eu estou bem, eu vou ficar bem.”

Os castanhos enternecidos vasculhavam cada centímetro daquele rosto, o coração martelando dolorosamente em sua caixa torácica. A mão delicada de Clarke - a mesma que parecia ter sido feita somente para se encaixar na sua - pousou sobre a lapela de seu smoaking.

Bellamy cerrou seus olhos, umedecendo seus lábios antes de abri-los novamente apenas para se deparar com a imensidão azul celeste daquelas íris, estudando-o detalhadamente. Não era difícil enxerga-lo quando o a calidez no escuro de daqueles olhos acolhiam a invernia que se solidifica nos seus, cristalinos.

Ele estava diante de si, mais exposto do que Clarke jamais pensou que o veria novamente. Suscetível a tentar o que quer que fosse que ela estivesse disposta a oferece-lo, mesmo quando tudo o que fez no passado foi trazer a ele sofrimento.

“Por quê?” O questionamento escapuliu de seus lábios vermelhos como um segredo.

O cenho de Bellamy se franziu, seus pés ainda guiando-a conforme o ritmo lento e agradável da melodia.

“Por que você me perdoou? Por que você está aqui, agora, na minha frente quando não deveria sequer estar olhando na minha cara depois de tudo o que eu fiz?”

Ele parou por um instante, os músculos se tencionando novamente. Mil e uma possibilidades passaram por sua mente em uma fração de segundo. Tantas respostas, mas nenhuma parecia responder verdadeiramente as perguntas sem sentido que ela estava lhe direcionando.

Por que? Por que ele estava perdoando quando seu coração ainda dói apenas com o vislumbre daquele rosto? Por que ele garantia a ela a única coisa que não era capaz de dar nem a si mesmo?

“O que você fez?” Bellamy fixou sua atenção apenas nela, incapaz de se lembrar que existia um mundo em sua volta.

Ele assistiu Clarke Griffin engolir a seco, sua compostura se desestabilizando como um lutador que acabou de ser golpeado em um ringue. O embaraço que aquela confissão lhe trazia aumentava sua sede por qualquer tipo de álcool que a colocasse em seu estado entorpecido.

Estar perto dele sempre significava sentir demais.

“Eu parti seu coração.”

O riso nasalado do Blake lhe invadiu os ouvidos, a surpresa se apossando das feições da loira quando o braço de forte apertou um pouco mais sua cintura. Um gesto súbito que trouxe de volta o formigar na boca de seu estômago, como há tanto tempo não vivenciava.

“Isso é passado, Clarke. Eu estou vivo, não estou? Ninguém morre por ter um coração partido, pelo contrário, isso te torna mais forte.” Bellamy voltou a conduzi-la pela pista de dança, os minutos passando mais rápido do que ele gostaria.

“Você seguiu em frente.”

“Eu segui em frente.” Ele repetiu com o mesmo sorriso que não se harmonizava em nenhum momento com o negrume de seus olhos.

Sem mim.

“Eu tenho trinta e um anos, Clarke. Eu não sou mais um adolescente, estou velho o suficiente para saber que nenhuma dor é para sempre. Isso foi algo que seu pai me ensinou, e que eu passei a entender somente depois...”

Depois que perdi você.

Não era difícil compreender na intensidade daquele olhar as palavras não ditas. Elas eram óbvias demais, as confissões do que poderia ter sido.

“Não acha que está na hora de me casar e constituir uma família?” Indagou, esperando pelas risadas que ela daria de sua cara.

No entanto, a única reação que Clarke foi capaz de transparecer foi um lampejo de confusão no azul safira de suas íris. Aquela conversa estava doendo mais do que ela imaginaria.

Seria ingenuidade demais pensar que estar perto dele seria algo simples. Seria pedir demais não desejar desenhar com seus lábios a constelação de sardas cravadas naquele rosto. Seria estupidez demais cogitar que estar na mesma presença que ele não afloraria dentro de si o sentimento desmedido que lhe causava tantos pensamentos egoístas.

E Clarke Griffin não era e nunca seria egoísta. Não com Bellamy Blake. Nunca com ele.

“Não sei... você a ama?”

Os olhos da loira se fecharam, a melodia aos poucos entrava em seu último refrão. A hesitação de Bellamy quase alimentou um pouco mais a chama da esperança que se mantinha viva, queimando a cada olhar enternecido que ele a direcionava.

“Eu não entregaria a ela o anel da mamãe se eu não a amasse.”

A resposta veio como o vento cortante de uma noite de inverno. Frio e desolador. O amargo se impregnou em seu paladar no momento em que seus lábios se abriram no que era para ser o mais sincero de seus sorrisos, mas que se resumia a apenas um esboço de sua simpatia.

“Para mim é o suficiente.” Clarke abriu seus olhos, cravando-os no dele como se sua vida dependesse disso. Apenas desse momento. Como se ela estivesse pronta para deixar o passado ir da mesma forma que ele conseguiu. “Afinal...”

Afinal, foi para isso que eu te deixei ir.

“Você merece toda felicidade do mundo, Bellamy Blake.”

E ela nunca pensou, nem mesmo por um momento sequer, que um coração já quebrado poderia se partir novamente. No entanto, era exatamente isso que parecia. Como se estivesse reprisando em sua mente o momento em que teve que abrir mão dele, para que ele pudesse ser feliz sem ela.

Amor também é altruísmo. Amor também é sacrifício.

E esse último Clarke Griffin conhecia perfeitamente bem.

A loira respirou fundo, seu corpo protestando a falta de calor conforme se afastava dele. A música havia terminado, e Gina Martin já entrava em seu campo de visão. A mão segurava a de Olivia, que saltitava ao seu lado. Até mesmo sua forma de andar era graciosa e harmônica, como a mulher bela e cheia de personalidade que aparentava ser.

As análises pessoais de Clarke sobre a futura esposa do Blake se cessaram no instante que Marcus e Abigail estacionaram ao lado deles. Bellamy se empertigou ao notar a presença poderosa daquele homem, cada polegada de músculo em seu corpo se retesando em pura irritação.

Gina puxou Olivia para seu colo, lançando um olhar cheio de admiração para o casal diante de si.

“Fico muito feliz com a presença de vocês.” Kane ainda sorria ao estender sua mão para cumprimentar o moreno, observando minunciosamente cada pequeno detalhe que compunha o semblante rígido do mais novo.

Uma das sobrancelhas negras se arquearam ao fitar a mão de Marcus ainda estendida em sua direção, aceitando-a assim que Gina cutucou sua costela. Sua respiração se encurtou, suas narinas se inflaram e nada em sua linguagem corporal demonstrava algum sentimento bom por aquele homem.

“Bellamy Blake... nos encontramos novamente.” Atestou o mais velho, um brilho repleto de satisfação refletindo no escuro de seus olhos.

O olhar confuso de sua companheira pesava sob seus ombros, e ele sequer precisou vacilar sua atenção até ela para saber que mil e uma perguntas rodeavam sua mente. Ele envolveu a cintura de Gina de forma quase possessiva, usando-a como sua âncora para a sanidade.

Os olhos azuis de Clarke seguiram seu gesto, só então oscilando entre seu padrasto e o homem que há pouco sorria descontraído para ela naquela pista de dança. A tensão que se criou ali era quase palpável, provocando os esforços frustrados de sua mãe em apaziguar.

“Você deve ser Gina Martin.” Abby sorriu gentilmente, fitando afetuosamente a garotinha que a morena carregava em seus braços. “É realmente de uma beleza estonteante, querida.”

A mulher de feições ligeiramente latinas lhe direcionou um sorriso enviesado, as bochechas salientes adquirindo um tom rubro quase adorável.

“Obrigada, senhora Griffin. Eu digo o mesmo.” Gina escutou Bellamy bufar ao seu lado, olhando significativamente para Clarke.

Abby se limitou a crispar os lábios finos, envolvendo o braço de sua filha como um pedido silencioso de socorro. Suas interações com o filho mais velho de Aurora eram tão limitadas quanto as de Kane, e por mais que estivesse acostumada a lidar com situações desagradáveis e pessoas inconvenientes, nada parecia se igualar ao olhar resignado nos olhos escuros de Bellamy.

A loira direcionou a ela um sorriso consolador, ainda abalada demais pelos acontecimentos daquela noite para ingressar no meio de uma briga silenciosa entre egos masculinos, ou o que quer que seja aquele acontecimento estranho significava.

Estranho talvez fosse um eufemismo.

“Ouvi dizer que está com o caso dos Wallace nas mãos... é verdade?” Bellamy ignorou as apresentações e elogios superficiais, o castanho escuro de seus olhos tão densos quanto metal.

Marcus se remexeu desconfortável, a conversa que tanto esperou ter com aquele garoto não seguindo nem um pouco o roteiro que havia montado em sua mente. Mas o que ele realmente esperava? Ele era um Blake antes mesmo de cogitar que pudessem ter alguma ligação. Ele era filho de Aurora, e apenas esse pensamento foi suficiente para esticar o sorriso cantineiro em seu rosto.

“Sim, e você parece bem informado. As negociações ainda estão sendo feitas, não há nada concreto ainda.”

Clarke assistiu Bellamy trincar a mandíbula, a linha forte de seu maxilar se contraindo da mesma forma que sempre acontecia quando ele estava prestes a fazer algo impulsivo. A realização de que o moreno poderia deixar seu temperamento explosivo vir à tona a qualquer momento fez com que o medo se revirasse em suas entranhas.

Ele não seria capaz, seria?

O sorriso sarcástico e um cintilar sucinto de zombaria em suas íris foi o bastante para confirmar o que mais temia. E com certeza nem mesmo ela seria capaz de prever o que viria a seguir.

“Hmmm... interessante.” Sua cabeça tombou levemente, a acidez em seu comentário fazendo com que o estômago de Clarke se revirasse e o semblante contento de Kane se desmanchasse. “Você me parece ser tão bom em proteger bandidos quanto é em fugir de responsabilidades.”

Marcus ainda o encarava, tentando suprimir sua expressão estarrecida. Ele deveria saber que nem tudo seria as mil maravilhas, no entanto, quem poderia culpa-lo por ter esperanças?

As reações nos rostos de todos ali variavam. Gina estudava Bellamy com o cenho franzido, Abby tinha os olhos levemente arregalados em meio a sua surpresa, e Clarke... bem, esta estava apenas pedindo aos céus para que o moreno se acalmasse e aquela conversa sem sentido não se tornasse em uma cena deplorável.

Há coisas que nunca mudam, e uma delas era o temperamento único que Bellamy Blake carregava em seu DNA. Nada diferente da garota que ela tinha como melhor amiga desde seus primeiros passos.

“Então você sabe...” Kane suspirou, o pesar carregando suas palavras.

“Pelo visto você também. Que choque, não é mesmo? Uma pena que não é nada além do que eu já esperava de um cara como você.” O veneno no timbre de Bellamy agora combinava com o desprezo que refletia em seu olhar. “Minha mãe pode ter sido enganada por toda essa sua máscara de bom moço, mas eu nunca fui.”

O mais velho ajustou sua postura, o discurso raivoso lhe atingindo como um maldito punhal.

“Você não sabe do que está falando, rapaz.”

“Oh eu sei sim, eu sei perfeitamente do que eu estou falando. Essa falsa simpatia que você está me direcionando agora sequer faz sentido, afinal, você sempre me desprezou não é mesmo?”

Todas as vezes em que se encontrou com Marcus Kane agora piscavam como flashes diante de seus olhos, a raiva ardendo em seu peito como não fazia há muito tempo. O desprezo, a sensação de sentir tão inferior diante da expressão estoica e o olhar austero, a forma como ele o encarava como se fosse um nada.

Ele o ressentia, sempre o ressentiu. O filho bastardo de Aurora Blake. O erro que cometeu jovem demais, que abandonou fácil demais.

A boca de Marcus se abriu, na ponta de sua língua estavam os mais diversos argumentos para rebatê-lo, para derrota-lo em uma discussão qual ele nunca poderia sair com a razão.

Céus, como ele odiava advogados. Como ele detestava aquele homem.

“Não tem porque negar, se há algo que eu nunca irei esquecer é a forma repulsiva que sempre me olhou. O filho bastardo, não é? Que não merecia carregar o seu sobrenome ridículo.” Bellamy continuou interrompendo qualquer tentativa do mais velho em se defender, os punhos se cerrando conforme as veias saltavam no dorso de suas mãos.

Clarke sentiu sua visão arder, as gotículas salgadas queimando no canto de seus olhos ao estuda-lo tão minunciosamente. Não era um homem de trinta e um anos na sua frente, mas sim o adolescente cheio de raiva que carregava a responsabilidade do mundo em suas costas quando deveria estar apenas aproveitando sua juventude.

O mesmo que se tornou perdido e sem esperanças ao encontrar sua mãe sem vida naquela cama de hospital, em um trágico dia nublado de domingo.

Ela se lembrava perfeitamente do desastre ambulante que Bellamy havia se tornado. Sempre com raiva, sempre impulsivo, a perda o corroendo de dentro para fora como o pior dos ácidos.

E se deparar com o mesmo olhar de tantos anos atrás, o mesmo que ela também teve por tanto tempo ao se olhar no espelho e se sentir machucada e traída por sua própria mãe, fazia com que seu coração se contraísse dolorido.

O que se sucedeu tornou oficial as desconfianças da loira, nada de bom poderia acontecer daquele momento em diante. E ao ver Bellamy sair em passos largos até o palco onde a banda antes tocava, a confirmação acertou a todos como um golpe súbito.

Com o microfone em mãos e o sorriso sádico nos lábios, ele prosseguiu com seu discurso como se nada no mundo pudesse lhe afetar. Não naquele momento. Não com toda aquela satisfação que borbulhava dentro de si ao se misturar com o rancor e a raiva acumulada por anos.

“Adivinha só, Marcus Kane? Eu não quero o seu maldito sobrenome. Eu nunca quis o maldito fardo de ser filho de alguém como você. Mas, afinal, já estamos todos aqui não é mesmo? Que tal eu dar o orgulho que todo pai sonha em sentir pelo filho?”

Clarke escaneou o local com seus olhos, buscando por Octavia em meio aos convidados, se frustrando ao perceber que ela certamente estaria conversando com Lincoln em algum lugar mais privado.

Gina continuava perplexa ao seu lado, assim como sua mãe e também Marcus, conforme o moreno sorria e jogava aos sete ventos segredos de família que nem mesmo ela tinha noção que existiam.

Octavia não estava ali, Miller também não.

Não havia ninguém que pudesse parar a força da natureza que era Bellamy Blake.

Ninguém além dela.


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Notas finais do capítulo

HOLY BELLARKE!

Agora quem surtou foi nosso rapaz Bell! Oh Lord. Acho que o reencontro com o papis não foi exatamente o que nenhum dos dois esperavam... E nossos meninos de volta? Acho que nossa Clarke nunca esteve tão rodeada de pessoas desde que mudou pra Nova Iorque. Será que eles vão aprontar algo agora que estão de volta? HMMMM. Amém, Bellarke. Bellamy finalmente está mais aberto perto da Clarke, uh? E ela finalmente mais leve pra seguir em frente, recomeçar. Caramba, será que agora vai? Será que vão voltar a ser amigos? E a Clarke, como será que vai lidar com rapaz Bellamy full mode pistola? OIAL tá chegando na reta final, padawans. Aproveitem enquanto podem, haha.

Quase nove meses (?) sem atualização. E vocês não desistiram de mim e nem de OIAL de forma alguma. Vocês são demais, sabiam? VOCÊS SÃO INCRÍVEIS! Foram mensagens privadas, foram tweets no Twitter, foram recomendações e comentários. Eu sou tão grata, imensamente grata. Sem vocês OIAL não existiria, não iria pra frente. Estou emocionada real. Sem comentários pro significado disso tudo.

Comentários irei responder ainda essa semana, com a graça de Deus! (Eu sempre respondo os da atualização anterior quando eu atualizo, então sejam pacientes e continuem mandando que eu vou amar responder TODOS!)

Mil desculpas pela demora, padawans. A vida entrou no meio e o bloqueio criativo também, espero que não volte a acontecer, but who knows né nom? Espero que tenham gostado tanto do capítulo quanto eu gostei de escrever.

Quero todas as teorias e tudo o que vocês querem ver/tem em mente na minha caixa de comentários. O final tá chegando e eu quero saber mais do que vocês tem pra propor como leitores ávidos, hahaha.

Beijinhossss! May the Force be with you.
(BTW, ALGUÉM AÍ ASSISTIU THE LAST JEDI PELO AMOR DE DEUS?)